Floresta fossilizada oferece indícios sobre mudanças climáticas


Nas profundezas úmidas de uma mina de carvão no sul de Illinois fica a maior floresta fossilizada descoberta até hoje, pelo menos 50 vezes mais extensa que a última encontrada.

Os cientistas estão explorando vias de gotejamento com a luz de faróis, mapeando um ecossistema de 307 milhões de anos atrás, que data de pouco antes de as primeiras grandes florestas do mundo serem dizimadas pelo aquecimento global. Essa vasta paisagem pré-histórica pode lançar uma nova luz sobre a mudança climática que está em curso hoje.

Datando do período Pensilvaniano do Carbonífero, a floresta jaz em uma série de oito minas ativas, que estão entocadas nos ricos filões da mina de carvão de Springfield, uma fonte energética de importância nacional que vem sendo explorada há décadas e exerce um papel prioritário em Illinois e dois estados vizinhos.

Empurrada para baixo ao longo dos tempos pelo peso esmagador das camadas de rocha superiores, a floresta de Springfield está a profundidades que variam de 75 a 240 metros. Até agora, os cientistas só pesquisaram amostras nas proximidades de Galatia, Illinois, mas acham que a floresta se estende por mais de 160 quilômetros de comprimento; a largura não foi determinada. Uma descoberta anterior da mesma equipe, a floresta carbonífera Herrin, mais ao norte de Illinois, tem apenas três quilômetros de comprimento.

“Trata-se realmente de um mundo perdido”, disse Howard Falcon-Lang, paleontólogo da Royal Holloway, Universidade de Londres, que explorou o sítio. “É praticamente uma viagem no tempo”, acrescentou.

Curiosamente, a floresta pode ser vista apenas de baixo. Os cientistas dobram o pescoço, iluminando o teto com um capacete com lâmpada de mineiro. Centenas de milhões de anos atrás, árvores e outras plantas cresceram sobre uma espessa turfa que veio a se compactar em carvão; durante a escavação, foi possível ver os restos fossilizados da floresta no teto de xisto da mina.

“É uma Pompeia botânica enterrada em um momento geológico”, disse William A. DiMichele, paleobiólogo e curador de plantas fósseis do Instituto Smithsonian, em Washington, e um dos descobridores da floresta. DiMichele acredita que ela foi suavemente sepultada pelas inundações que passavam sucessivamente por meio de um pântano.

Um rio com a largura do Mississippi serpenteava pela paisagem da floresta fossilizada; seu curso ainda é claramente visível. Como o clima ficou mais seco com a elevação das temperaturas no Carbonífero tardio, a chuva se tornou sazonal e acumulou sedimentos fora do solo, enchendo o rio de lodo. À medida que o rio foi transbordando ao longo de suas margens, a floresta foi sufocada.

A inundação foi progressiva e gradual. Mal desordenava as folhas de samambaia que ficaram sepultadas na lama e que podem ser vistas, até o mais ínfimo fronde, nos tetos das minas de carvão. Árvores fossilizadas enormes ainda estão de pé, enraizadas em seu solo original, mas compactado, rodeadas pelos resíduos de folhas que antes voavam rasteiramente sobre o chão.

Répteis primitivos, parecidos com lagartos, evoluíam nos pântanos na época, mas quase não há fósseis de animais na floresta de Springfield – salvo ocasionais asas de barata – uma vez que tais criaturas fugiam facilmente com a água que subia.

Esses retratos sucintos de um passado muito distante – dezenas de milhões de anos antes da era dos dinossauros – são difíceis de encontrar. “É extremamente raro encontrar florestas fossilizadas de qualquer tamanho”, disse Kirk Johnson, paleobotânico do Museu da Natureza e da Ciência de Denver. “Geralmente, aparecem apenas algumas árvores aqui e acolá. Mas essa descoberta traz uma imagem realmente inédita de uma geografia antiga.”

DiMichele e seus colegas exploraram um caminho ou transecto de oito quilômetros, começando na margem do rio antigo e, em seguida, limitando-se ao pântano. Como se a floresta estivesse viva, eles fizeram paradas ao longo do percurso para identificar folhas individuais ou estudar troncos caídos. Ao se afastarem do rio, viram um matagal de pteridospérmicas dar lugar a samambaias e uma vegetação rasteira. Mais adiante, as samambaias pareceram ficar pequenas frente às gigantes da floresta conhecidas como árvores de escamas.

“Parecia um mundo criado pelo Dr. Seuss”, disse Johnson sobre as florestas de árvores de escamas: charcos lavados pelo sol, repletos de caules verdes gigantes, como hastes de aspargos, de centenas de metros de altura. (As árvores de escamas só desfraldam sua coroa perto do fim do seu ciclo de vida.) DiMichele observou uma árvore de escamas caída de 30 metros, antes de ela desaparecer por trás de um carvão ainda não extraído. Com uma base de 1,85 de largura, ela praticamente não ficava mais estreita ao longo de seu comprimento.

As árvores de escamas tinham cascas fotossintéticas com aparência de réptil que os mineiros de carvão, às vezes, achavam que eram restos de dinossauros. Em forma de tubo, com um bulbo esponjoso no interior, as árvores se partiam em duas quando tempestades assolavam o pântano. Imensas raízes cilíndricas mantinham os tocos firmes, na posição vertical, como visto nas minas.

Por coincidência, o mais antigo ancestral dessas árvores de escamas acaba de ser descoberto em uma floresta fossilizada no estado de Nova York. Consertos realizados na barragem de Gilboa, ao norte das montanhas Catskills, trouxeram à tona o que pode ser a floresta mais antiga do mundo, conforme os cientistas relataram no mês passado na revista Nature. Datando do período Devoniano, ela tem 78 milhões de anos a mais que a descoberta em Springfield, mas os resquícios mapeados são muito menores, cobrindo cerca de 0,12 hectare.

Não havia pássaros no período Pensilvaniano, de modo que os insetos se desenvolviam no ar rico em oxigênio. Caminhar pela floresta de Springfield significaria encontrar milípedes de 6 metros de comprimento e libélulas do tamanho de corvos. Ainda assim, descobriu-se que as folhas fósseis eram muito menos mastigadas por insetos do que a vegetação dos nossos quintais modernos. Os animais mal tinham evoluído para o herbivorismo, hábito de comer plantas vivas. Em vez disso, sobreviviam com restos que estavam em processo de putrefação no pântano fétido.

Dois milhões de anos mais tarde – um piscar de olhos em termos geológicos – houve uma vasta extinção de plantas, eliminando muitas das espécies encontradas na floresta de Springfield. Todas as poderosas árvores de escamas morreram. Seus parentes modernos são as isoetáceas, de apenas 15 centímetros de altura.

A extensão da floresta de Springfield deve permitir que os cientistas realizem análises de todo o ecossistema de uma forma nunca antes possível em paisagens tão antigas. Tais estudos podem ajudar a prever os efeitos do aquecimento global hoje.

“Com nosso próprio aumento de concentração do CO2 e mudanças no clima”, disse Scott D. Elrick, membro da equipe do Centro de Pesquisas Geológicas do Estado de Illinois, “podemos olhar para o passado e dizer: ‘Isso já aconteceu antes’”.

Hoje, nós queimamos as árvores de escamas do Carbonífero aos bilhões: todas elas se tornaram carvão. Recém-descoberta, a floresta de Springfield já está desmoronando, como acontece rapidamente com o teto das minas de carvão após a exposição. Mas com a mineração contínua, mais tetos são revelados a cada dia.

“É preciso escavar para encontrar fósseis, adentrando a anatomia do planeta”, disse Johnson. “DiMichele sabe que dispõe de toda uma indústria de escavação, criando um porta de entrada para um mundo antigo.”

Fonte: Ambiente Brasil