Cidades mobilizadas para salvar o clima


Enquanto nações hesitam em combater mudanças climáticas, cidades organizam esforços para reduzir emissões 

Por David Biello

                              

Na cidade que nunca dorme, as luzes ficam acesas a noite toda. E Nova York precisa de energia para essa iluminação, assim como
para aquecimento, ar-condicionado e muitos outros serviços públicos. Para atender a essas demandas, a Big Apple lançou quase 60 milhões de toneladas de gases de efeito estufa na atmosfera em 2005.
Oito anos depois, apesar de um aumento populacional e novas construções, as emissões dos nocivos gases poluentes haviam caído em mais de 11 milhões de toneladas. Como Gotham City [a cidade fictícia de Batman] conseguiu ficar tão “verde”? Ao proibir os óleos mais sujos para aquecimento e se beneficiar de uma mudança para gás natural como fonte de produção de eletricidade.

Nova York não está só em levar a mudança climática a sério. Cidades em todo o mundo estão ocupando o vácuo de liderança deixado por nações que fracassaram em seus esforços para tomar medidas significativas contra o aquecimento global durante mais de duas décadas. Cidades costeiras, particularmente vulneráveis ao aumento do nível do mar e outros efeitos negativos do aumento das temperaturas, estão liderando o esforço.

Copenhague, Melbourne e algumas outras apresentaram planos para se tornarem neutras em [emissões] de carbono. Na cúpula climática da ONU, em setembro de 2014, o chamado “Pacto de Prefeitos”, um grupo de 228 cidades que representam 436 milhões de cidadãos, se comprometeu a evitar a emissão de 2 bilhões de toneladas de gases poluentes de efeito estufa por ano. Até cidades chinesas participam da ação: em 2013, mercados cap-and-trade [“limite e negociação”] para poluição por carbono foram inaugurados em sete regiões da China, inclusive Shenzhen, que reduziu suas emissões de dióxido de carbono (CO2) em 2,5 milhões de toneladas em 2014, informou o vice-prefeito da cidade Tang Jie. 

Esse avanço contrasta com o fracasso da China, como nação, de reduzir sua intensidade de carbono, a poluição associada à atividade econômica, como havia se comprometido, no plano quinquenal que expira este ano. China, Estados Unidos e o restante do mundo emitem mais de 36 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa por ano, e esse número continua aumentando.

Em resposta a essa falta de progresso, pelo menos 100 mil pessoas tomaram as ruas de Nova York em setembro passado para exigir ação de líderes. Participantes da Marcha Climática do Povo manifestaram esperança de que, quando representantes internacionais se reunissem em dezembro passado, em Paris, para a 21ª iteração de conversações internacionais, produziriam um novo tratado, legalmente vinculativo, para reduzir as emissões. Mas muitos peritos em política climática temiam que a reunião não conseguiria produzir, nem de longe, um resultado suficiente.

Independentemente do andamento de negociações internacionais, as grandes cidades do mundo poderiam cortar 8 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa até 2050, de acordo com uma análise do grupo de cidades C40. Embora significativa, essa é uma meta apenas ligeiramente superior ao limite estabelecido pelo Protocolo de Montreal, de 1987, o maior passo isolado já tomado para conter as mudanças climáticas.

Aquele único tratado conseguiu o mesmo que centenas de leis locais poderiam fazer.

 

Publicado na edição 152 de Scientific American Brasil, de janeiro de 2015