O aumento de queimadas na Amazônia provoca reação global


Localização e gráficos comparativos dos focos de incêndio no Brasil e região (AFP)

O aumento das queimadas no Brasil e, sobretudo na Amazônia, provocaram reações em todo o mundo, mobilizando políticos, celebridades e ambientalistas, além de despertar críticas na imprensa internacional.

O apelo mais importante veio do secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, que se mostrou “profundamente preocupado” com as queimadas na Amazônia. “Em meio a uma crise climática internacional, não podemos permitir que se produzam mais danos em uma importante fonte de diversidade e oxigênio”, disse Guterres, em sua conta no Twitter.

De 1º de janeiro até essa terça-feira, 20, foram contabilizados 74.155 focos, alta de 84% ante o mesmo período de 2018, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Um pouco mais da metade (52,6%) desses focos têm ocorrido na Amazônia. A atuação do governo do presidente Jair Bolsonaro, assim como suas declarações, causaram perplexidade e indignação.

O presidente francês, Emmanuel Macron, recorreu ao Twitter para definir os incêndios como uma crise internacional. “Nossa casa está em chamas. Literalmente. A Amazônia, pulmão de nosso planeta, que produz 20% do nosso oxigênio, está pegando fogo. Essa é uma crise internacional. Membros do G7, vamos discutir esta emergência nos dois primeiros dias” da cúpula do grupo, em Biarritz, na França.

Mais tarde, o presidente Jair Bolsonaro lamentou que Macron “busque instrumentalizar uma questão interna do Brasil e de outros países amazônicos para ganhos políticos pessoais”. “O tom sensacionalista com que se refere à Amazônia não contribui em nada para a solução do problema”, disse o brasileiro, acrescentando que “a sugestão do presidente francês, de que assuntos amazônicos sejam discutidos no G7 sem a participação dos países da região, evoca mentalidade colonialista descabida no século 21”.

Na América do Sul, a Colômbia ofereceu ajuda para conter as queimadas. “A tragédia ambiental no Amazonas não tem fronteiras e deve chamar a atenção de todos. Do Governo Nacional oferecemos aos países irmãos nosso apoio para trabalhar conjuntamente em um propósito que nos urge: proteger o pulmão do mundo”, escreveu no Twitter o presidente Iván Duque. O Peru decretou alerta diante da possibilidade da propagação dos incêndios sobre seu território.

Grupos ambientalistas convocaram protestos em todo o mundo para esta sexta-feira (23) e o movimento Fridays for Future, da jovem sueca Greta Thunberg, propôs a realização de manifestações diante das embaixadas e consulados do Brasil. Greta Thunberg, de 16 anos, declarou que “ouço sobre a quantidade recorde de incêndios devastadores na Amazônia. Meus pensamentos estão com os afetados. Nossa guerra contra a natureza deve acabar”.

Em Brasília, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse no Twitter que a Casa vai criar uma comissão externa para acompanhar o problema das queimadas que atingem a Amazônia. O parlamentar informou que vai realizar uma comissão geral nos próximos dias para avaliar a situação e propor soluções ao governo.

Imprensa internacional

A declaração de Bolsonaro de que ONGs poderiam estar por trás das queimadas teve ampla repercussão negativa na imprensa internacional. O jornal britânico The Guardian traz a informação de que o presidente acusou ambientalistas de atear fogo na Amazônia para constranger seu governo, mas sem fornecer evidências.

O site da revista alemã Spiegel traz a manchete “Floresta tropical do Brasil está pegando fogo”. O texto diz que Bolsonaro tem uma política ambiental inconsequente. Já a BBC News, do Reino Unido, cientistas dizem que a floresta tropical sofreu perdas em um ritmo acelerado desde que Bolsonaro assumiu o poder em janeiro. Em Portugal, o jornal Público disse que a Amazônia está ardendo e já é possível ver do espaço.

No canal de notícias árabe Al Jazira, sediado no Catar, uma reportagem traz informações sobre os incêndios na Floresta Amazônica do Brasil que atingiram um recorde neste ano. A publicação disse que imagens de satélite da Agência Espacial Americana (Nasa, na sigla em inglês) mostram fumaça cobrindo a metade norte do país – uma área maior do que a Europa. Na internet, a hashtag #PrayForTheAmazon (reze pela Amazônia) chegou a ocupar o primeiro lugar no Twitter.

Diante das reações, Bolsonaro mudou o tom sobre os incêndios uma live numa rede social, afirmando que as queimadas são prejudiciais a todos e sobre o possível envolvimento de fazendeiros. Depois de levantar suspeitas contra ONGs na véspera e na manhã desta quinta sobre as queimadas, Bolsonaro deu mais ênfase à possibilidade de envolvimento de fazendeiros nos incêndios, que disse terem “viés criminoso”.

Madonna, DiCaprio e Cristiano Ronaldo

A causa mobilizou figuras do espetáculo e dos esportes, como Madonna, os atores Mark Hamill e Leonardo DiCaprio e o jogador Cristiano Ronaldo. “Os incêndios que devastam a Amazônia seguem ardendo… Isto é a devastação do Brasil, dos povos indígenas que vivem lá – e das plantas e das espécies animais da mais importante reserva de biodiversidade!!! Por favor, presidente Bolsonaro”, escreveu Madonna no Instagram.

Leonardo DiCaprio usou as redes sociais para lamentar as notícias sobre o aumento das queimadas. No perfil oficial no Instagram, o ator republicou uma imagem postada em outra página, com a hastag #regram, que noticiava o ocorrido. Nos comentários de DiCaprio, a atriz Lindsay Lohan questionou: “Como podemos ajudá-los? Ações falam mais do que palavras, meu amigo”, escreveu.

ONGs

O coordenador de políticas públicas do Greenpeace, Marcio Astrini, afirmou que a declaração do presidente é, antes de tudo, covarde, feita por um presidente que não assume seus atos e tenta culpar terceiros pelos desastres ambientais que ele mesmo promove no país. “A Amazônia está agonizando e Bolsonaro é responsável por cada centímetro de floresta que está sendo desmatada e incendiada”, disse.

O WWF-Brasil afirmou que a prioridade do governo deveria zelar pelo patrimônio, e não criar “divergências estéreis e sem base na realidade” do que ocorre na região. Segundo análise técnica do Instituto de Pesquisas Ambiental da Amazônia (Ipam), só a seca prolongada não explica a alta nas queimadas no bioma. As dez cidades amazônicas com mais focos de fogo também tiveram as maiores taxas de desmate. Para os cientistas do Ipam, a concentração nessas áreas, com estiagem branda, indica o caráter intencional dos incêndios para limpar desmate recente.

Agência Estado/Reuters/AFP/Dom Total