Desmatamento pode prejudicar frigoríficos e exportações do Brasil, diz agência


Os efeitos do desflorestamento continuam sendo um desafio para o país (Pixabay)

A agência de classificação de riscos Fitch afirmou na quarta-feira (6) que o desmatamento na Amazônia pode causar danos de reputação a frigoríficos brasileiros e levar à redução das exportações de carnes do país.

Para a Fitch, os efeitos do desflorestamento no maior bioma do país e a eficácia da sustentabilidade no setor continuam sendo um desafio para o Brasil.

A agência disse crer que amplas normas ambientais melhoram os perfis de crédito das empresas da área de proteínas, acrescentando que as consequências dos incêndios na Amazônia colocaram sob holofotes os setores ambiental, social e de governança dessas companhias.

Apesar do alerta ambiental, as exportações de carne do Brasil acumulam fortes ganhos em 2019, estimuladas especialmente pela forte demanda da China, que enfrenta um grave surto de peste suína africana.

Reuters/Redação São Paulo

Desmatamento na Amazônia cai 33% em novembro, mas continua elevado


             

Boletim divulgado pelo Instituto do Homem e do Meio Ambiente (Imazon) nesta quinta-feira (12/12) aponta que o desmatamento na Amazônia Legal teve queda de 33% em novembro de 2013, em comparação com o mesmo período do ano anterior. A prática ilegal desmatou 37 km² de floresta no último mês, contra 55 km² em novembro de 2012. Pará foi o estado que mais desmatou (26%), seguido por Roraima (22%), Amazonas (17%) e Rondônia (17%).

                

O Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Imazon ainda trouxe outra notícia: a degradação florestal – causada, entre outras atividades, pela exploração madeireira insustentável – também caiu. Em novembro deste ano, 9 km² de floresta foram degradados, 91% menos do que no mesmo período do ano passado, quando a degradação florestal somou 100 km². De acordo com o Imazon, por conta da cobertura de nuvens, em novembro de 2013 foi possível visualizar 42% da área florestal da Amazônia Legal, enquanto, no ano passado, 80% do território foi monitorado pelo SAD. Confira o Boletim de Desmatamento do Imazon, referente a novembro de 2013. Em outubro, a queda no desmatamento, registrada pelo SAD, foi ainda maior, de 91%.

                

Somando todos esses dados, ainda não é possível mensurar até que nível a degradação da Amazônia desestabiliza o equilíbrio ambiental necessário para a manutenção da vida na floresta. Detemos a maior floresta tropical do planeta, com uma mega biodiversidade e inclusive com espécies de plantas e animais ainda desconhecidos da ciência. É urgente a necessidade de frear essa degradação desmedida e parar com o desmatamento e o assassinato desmedido da fauna e da flora, que ali habitam e procriam.

               

É preciso fiscalizar e monitorar com rigor as práticas de desmatamento e uso indevido da floresta. Pois seus recursos são finitos, ao contrário do que a demanda consumista e a extração desmedida pensam. É necessário planejamento e engajamento para se posicionar na defesa da Amazônia, para assim conservar seu delicado equilíbrio ambiental que sustenta a vida e a biodiversidade da floresta. 

Inconseqüentemente, estamos destruindo àquela que nos dá a vida, para sustentar um mercado insaciável e descartável, de curtíssimo prazo, que ainda gerará resíduo, que volta pra a terra, sem sequer conseguir assimilá-lo devido à alta demanda diária. Ou seja, estamos degradando para consumir. Mas consumir o que afinal?  Prazeres efêmeros, satisfação imediata, vaidade desmedida. Parafraseando Leonardo Boff, ou mudamos, ou morremos.

Fonte: http://viajeaqui.abril.com.br/national-geographic

Fotos: http://infoamazonia.org/pt#!/map=2528

Laísa Mangelli 

Incêndios diminuem na Amazônia e se multiplicam no Pantanal


(30 out) Incêndio florestal no Pantanal (Governo do Mato Grosso do Sul/AFP)

Os incêndios se propagam de forma alarmante no Pantanal brasileiro, ao mesmo tempo em que diminuem rapidamente na região amazônica, segundo informes oficiais.

O número de hectares devorados pelas chamas em quatro municípios do Pantanal do Mato Grosso do Sul passou de 50 mil na semana passada a 122 mil (+144%) nesta segunda, indicou a assessoria de imprensa desse estado. As autoridades mobilizaram três helicópteros e três aviões para combater as chamas, acrescentou.

Neste ano, 8.875 focos de incêndio (+486% em relação ao mesmo período do ano passado) foram declarados nessa região de grande diversidade de flora e fauna, de acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Em outubro houve 2.430 focos de incêndio nessa região, um recorde desde 2002.

Na Amazônia, onde até agosto o desmatamento parecia fora de controle, a situação se reverteu nos últimos meses. O número de focos caiu de 30.901 em agosto (um recorde desde 2010) para 19.925 em setembro e 7.855 em outubro, um mínimo desde o início da série histórica, em 1998, segundo dados do Inpe.

Essa redução refletiu na superfície desmatada: 2.255 quilômetros quadrados em julho, 1.702 quilômetros quadrados em agosto, 1.447 quilômetros quadrados em setembro e 405 quilômetros quadrados em outubro.

A redução ocorreu devido a dois motivos: as chuvas e a ação do exército, mobilizado após as campanhas de sensibilização que questionaram a política do governo de Jair Bolsonaro, explica Paulo Moutinho, especialista do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).

Segundo Moutinho, tanto na Amazônia como no Pantanal os incêndios “estão muito ligados à ação do homem e raramente ocorrem por causas naturais. Muitas vezes são para limpar a área, e muitas vezes por acidente”.

“As queimadas [na Amazônia] diminuíram, mas o desmatamento não parou” e em muitas zonas desmatadas as queimadas que precedem a utilização de terras para atividades agropecuárias ocorrerão “nos próximos anos”, prevê o pesquisador.

AFP

UFRR promove Seminário de Geografia e Sustentabilidade na Amazônia


 

UFRR-prorroga
 

A Universidade Federal de Roraima (UFRR) através do Programa em Pós-Graduação em Geografia e do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Amazônia realizará no período de 18 a 20 de dezembro, o I Seminário de Produção do Espaço Geográfico e a Sustentabilidade na Amazônia. O evento vai ocorrer no auditório do Núcleo de Estudos Comparados da Amazônia e Caribe (Necar), no campus Paricarana.

 

A ideia do seminário é fomentar e fortalecer redes de pesquisadores interessados em temas afins e contemporâneos das linhas de pesquisa dos Programas, e formatar possíveis parcerias entre pesquisadores e instituições, principalmente da região amazônica.

 

O projeto também pretende possibilitar uma integração dos discentes e docentes dos Programas de pós-graduação, envolvendo-os em discussões relacionadas ao desenvolvimento sustentável e produção do espaço geográfico.

 

Participação no Seminário- O seminário contará com a apresentação de trabalhos científicos desenvolvidos por acadêmicos de graduação e pós-graduação da UFRR. A análise e seleção dos trabalhos, submetidos para fim de apresentação será realizada com base nos seguintes critérios: relevância social e científica do trabalho; relação com a temática espaço geográfico e a sustentabilidade na Amazônia.

 

A taxa de inscrição custa R$ 25 para alunos de graduação e R$ 50 para alunos de pós-graduação e profissionais. A apresentação ocorrerá durante o seminário, o acadêmico tem até segunda-feira, 16, para enviar seu trabalho.

 

A ficha de inscrição para submissão de trabalhos está disponível nos sites do Necar e do Mestrado. Depois do preenchimento deve ser enviada junto com o resumo simples até o dia 16 de dezembro de 2013 para o email: ispegsa@gmail.com. Observar que na ficha há duas vias, uma para quem irá apenas participar do evento, e outra para quem vai enviar trabalhos científicos. Os arquivos estão logo na página principal e também no item Publicações / Seminários 2013.

 

Programação

1° dia (18/12/2013): 19 horas- Abertura Oficial

19h30 – Conferência: Planejamento e Gestão Pública do Desenvolvimento da Amazônia

 

2° dia (19/12/2013):

Tarde – 16h às 18h – Mesa Redonda

Noite – 18h30 às 20h30 – Mesa Redonda

 

3º dia (20/12/2013):

Temática: Produção do Espaço Geográfico e a Sustentabilidade na Amazônia

Tarde – 16h às 18h – Mesa Redonda. Prof. Flávio Rodrigues do Nascimento

Noite – 18h30 às 20h30 – Mesa Redonda. Prof. Carlos Alberto Franco da Silva

 

Fonte: Boa Vista Já

‘De que forma você traz um morto à vida?’, diz indígena krenak sobre Rio Doce


Líder indígena, Geovani Krenak, falou sobre a situação de seu povo que foi vítima do crime ambiental da Samarco ocorrido em Mariana Foto (Patrícia Almada/DomTotal)

Rômulo Ávila

Perto de completar quatro anos, o crime socioambiental da Mineradora Samarco, em Marina, Região Central de Minas, continua impactando na vida de milhares de pessoas. Os cerca de 700 indígenas da etnia krenak sofrem com doenças respiratórias, de pele e, principalmente, com a ‘morte’ do rio Doce, de onde tiravam parte do sustento e mantinham suas práticas culturais e espirituais. Os problemas foram relatados por Geovani Krenak, que participa da  4ª Semana de Estudos Amazônicos (Semea), realizada em Belo Horizonte até a próxima sexta-feira (1º). A aldeia fica na cidade de Resplendor, região do Vale do Rio Doce de Minas Gerais.

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Cobertura sobre a 4ª Semana de Estudos Amazônicos

Geovani participou do painel ‘Direitos Humanos, Meio Ambiente e Sustentabilidade’, nessa terça-feira (29), junto com os professores Caio Lara e André de Paiva Toledo (Dom Helder), Chantelle Teixeira (advogada do Conselho Indigenista Missionário – Cimi); Joaquim Belo (Conselho Nacional das Populações  Extrativistas); Daniel Seidel (Repam) e Edmundo Antônio Dias Neto (MPMG).

“Vivemos agora uma situação diferente. No início, veio a questão da lama, a morte dos animais e dos peixes. Costumo dizer que o Rio Doce ficou inabitável, porque não há vida no rio. A longo prazo, estão vindo os outros problemas, como doenças de pele e respiratórias”, disse Geovani. Ele explica que os problemas respiratórios têm relação com os caminhões-pipas que levam água potável à aldeia. O problema não existia antes da lama da barragem de Fundão atingir o Rio Doce.

“Minha aldeia ficou irreconhecível depois do crime. Desde então, nosso povo luta por reparação, por Justiça e para tentar manter as práticas culturais espirituais que tínhamos antes do rompimento”.

Geovani explica os rejeitos de minério da barragem estão assentados no fundo do rio. Além dos impactos ambientais e econômicos, Geovani cita a importância espiritual do Rio Doce para o seu povo. “É o que nos causa mais tristeza, porque o espírito do rio está morto. Uma anciã nossa, Dejanira Krenak, fez a seguinte pergunta para um representante da Vale: ‘De que forma você traz um morto à vida? E é essa a situação do Rio Doce’, diz.

“Desde o rompimento da barragem nosso povo não faz o mais sagrado, que eram as práticas religiosas dentro do rio. Nosso povo vem tentando, se é que isso é possível, retomar essa cultura na sua forma mais plena. É o principal enfrentamento do povo krenak”, diz.

Estudos recentes da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) revelam que a contaminação no Rio Doce e no mar de Regência estão piores do que na época da tragédia.

Território dos Sete Salões

Segundo Geovani, a luta do seu povo agora é para conseguir a demarcação de terra do Território dos Sete Salões, onde funciona um parque estadual. “Mas não há políticas públicas para a preservação do parque. O que a gente tem lá é um cenário de destruição, de extração de madeira e de pedras. O que a gente reivindica é demarcação do território Sete Salões, já há uma ação civil pública movida pelo estado brasileiro em favor do povo Krenak”.

Eram 10 mil

Durante o painel, Geovani lembrou que, há 200 anos, estima-se que 10 mil indígenas krenak viviam no país. Citando Dom Helder Câmara como um humanista defensor do Direitos Humanos, ele disse seu povo foi morto. “Somos hoje menos de mil”.

Dom Total

Cobertura sobre a 4ª Semana de Estudos Amazônicos


O evento acontece entre os dias 29 de outubro e 1º de novembro em diversas instituições ligadas à Companhia de Jesus (Thiago Ventura/DomTotal)

Centro das atenções mundiais nos últimos tempos, a Amazônia ainda é uma grande desconhecida da população brasileira. Reunindo representantes da sociedade civil, do poder público, dos povos amazônicos, de instituições eclesiais e da comunidade acadêmica, a 4ª Semana de Estudos Amazônicos (Semea) é uma resposta a essa lacuna. O evento acontece entre os dias 29 de outubro e 1º de novembro em diversas instituições ligadas à Companhia de Jesus na região de Belo Horizonte, entre elas a Dom Helder Escola de Direito, que recebe grande parte das atividades.

Confira abaixo a cobertura completa do Semea!

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Ecossistema da Amazônia tem mais valor que hidrelétricas e mineração


Águas do Rio Xingu liberadas da comporta da casa de força auxiliar no Sítio Pimental da usina hidrelétrica de Belo Monte. (DANIEL TEIXEIRA / ESTADÃO CONTEÚDO)

Patrícia Azevedo

Neste mês, a usina hidrelétrica de Belo Monte alcançou um total de 10.621,97 megawatts (MW) de potência instalada com o início da operação comercial de uma nova unidade geradora (UG). Quando totalmente concluída, contará com 24 UGs e capacidade instalada de 11.233,1 (MW). Será a maior hidrelétrica 100% brasileira e a terceira maior do mundo, perdendo apenas para a chinesa Três Gargantas e para a brasileiro-paraguaia Itaipu. O empreendimento de R$ 42 bilhões, no entanto, descumpre uma de suas principais promessas – o desenvolvimento sustentável da Amazônia. Entre as queixas da população local estão o aumento do custo de vida e da energia elétrica, piora dos sistemas de habitação, água e saneamento, e a diminuição da produção de alimentos e da pesca.

“A reflexão que se deve fazer é por que necessitamos de usinas hidrelétricas na região? Considerando as fontes alternativas, os grandes potenciais do país estão praticamente todos na Amazônia. No entanto, apenas a eólica aparece na nossa matriz energética com alguma contribuição, mesmo assim com limitações de ser considerada como fonte complementar”, aponta o professor José Cláudio Junqueira, da Dom Helder Escola de Direito. Nesta terça-feira (29), ele coordenará a apresentação de trabalhos científicos relacionados ao tema Biotecnologia, populações tradicionais, mineração, hidrelétricas e terras indígenas na 4ª Semana de Estudos Amazônicos (Semea).

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Engenheiro civil por formação, José Cláudio possui especialização e mestrado em engenharia sanitária, e doutorado em saneamento, meio ambiente e recursos hídricos. Foi pesquisador pleno e presidente da Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais (Feam-MG) por três mandatos. Tem ampla experiência em sistemas de gestão ambiental, avaliação de impacto, licenciamento e normalização. “O projeto de Belo Monte era um projeto antigo, que foi modificado ao longo do tempo para não inundar a volta do Xingu – curva de 180º do rio Xingu – área muito importante para as comunidades indígenas da região. Apesar desse ganho, o licenciamento ambiental da usina foi bastante tumultuado, tendo a implantação sido interrompida várias vezes pelo judiciário, que só postergou a obra”, afirma.

De acordo com o professor, a visão antagônica das partes interessadas, sem maior participação mediada, as lacunas nos estudos ambientais e a pressão política para agilização do processo de licenciamento só geraram o acirramento dos ânimos, inclusive com conflitos entre operários e comunidades indígenas. “É claro que a implantação de uma hidrelétrica impacta o bioma da região, seja ele floresta amazônica, cerrado ou qualquer outro. Inicialmente porque, para a formação do reservatório, há que se desmatar a área. No caso de Belo Monte, esse impacto foi minimizado porque a técnica utilizada foi a de usina a fio d’água, que exige menores áreas de inundação”, explica.

Professor José Cláudio Junqueira, da Dom Helder

Professor José Cláudio Junqueira, da Dom HelderDessa forma, na construção da usina, optou-se por dois reservatórios interligados por um canal de derivação, com 20 km de extensão. O reservatório principal, formado no rio Xingu, conta com 359 km². Já o reservatório intermediário, com 119 km², foi estruturado por 28 diques e canais de transposição. “Todavia, a casa de força foi localizada bem distante, mais de 10 km, o que gerou outro impacto: a vazão reduzida na volta do Xingu, restringindo atividades como pesca e navegação nesse trecho”, informa José Cláudio. Em entrevista ao DomTotal, o professor prossegue o debate e aborda os outros temas que estarão em pauta na tarde desta terça-feira (29), como biotecnologia e mineração.

O senhor comentou acima que o licenciamento ambiental da usina foi bastante tumultuado. No fim das contas, ele ficou de acordo com a legislação?

Se a usina de Belo Monte está de acordo com a legislação? Depende de como a legislação está sendo interpretada. Formalmente sim, porque as liminares foram cassadas, a obra se implantou e a Licença de Operação (LO) está válida. A reflexão que se deve fazer é por que necessitamos de usinas hidrelétricas na região? Enquanto isso, a demanda de consumo só aumenta. Nosso estilo de vida é “eletro intensivo”, a começar pelas nossas edificações “modernas” que só funcionam com luzes acesas e ar condicionado, sem contar a variedade de equipamentos eletroeletrônicos do nosso cotidiano. Será que alguém já fez a conta do gasto energético para carregar diuturnamente os mais de 200 milhões de celulares no país?

Além das hidrelétricas, a mineração é outra ameaça ao ecossistema amazônico. Como minimizar os impactos ambientais e os prejuízos para a população local?

A implantação de obras para hidrelétricas e mineração possui impactos ambientais significativos, potencializados pela abrangência das áreas necessárias para a implantação e operação desses empreendimentos, que normalmente são extensas, denominadas áreas diretas de impacto e, ainda, pelas áreas impactadas indiretamente. Isso se traduz em elevados impactos nas populações existentes nessas áreas. No caso de povos indígenas e tradicionais, a complexidade aumenta, pois, são comunidades com cultura e estilo de vida diferenciados.

Para tanto, a Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) deveria se aprofundar no conhecimento das relações existentes e prognosticar como se dariam as novas relações, a partir da implantação e operação do empreendimento. Para os impactos nessas relações, propor as medidas mitigadoras capazes de minimizar os efeitos negativos e as medidas compensatórias nos casos em que haveria incompatibilidade de mantê-las. O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) deveria aprofundar essa questão e ser capaz de apontá-la com clareza e objetividade para subsidiar a tomada de decisão.

Seria muito importante a participação das comunidades atingidas para a tomada de decisão, o que ainda não ocorre no Brasil. As audiências públicas no país são realizadas quando a decisão já está tomada. Esses foros têm sido importantes apenas para acomodação de insatisfações pontuais. Nesse sentido, as relações têm sido conflituosas com alto grau de judicialização.

Como está atualmente a exploração do subsolo na região?

O grande projeto de mineração na Amazônia é Carajás, da Vale, que já está consolidado, com tecnologia de beneficiamento a seco, que dispensa a construção de barragens de rejeitos, com grande área de preservação, protegida das invasões. A grande questão é o potencial mineral existente na Amazônia que desperta grande cobiça, inclusive internacionalmente.

Constitucionalmente, o subsolo é da União, sendo os proprietários da terra denominados superficiários. Se isso vale para todos brasileiros, há que valer para todas comunidades em solo pátrio. Todavia, a exploração dessas riquezas do subsolo deveria ser confrontada com os valores dos serviços ecossistêmicos prestados pela floresta. Se esses serviços beneficiam brasileiros e estrangeiros, todos deveriam pagar pelos mesmos.

De toda forma, se a decisão for explorar essas riquezas minerais, que seja pelo menos subsidiada por uma Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) com participação da população na tomada de decisão. E não apenas das populações tradicionais, mas de todo brasileiro. O subsolo da Amazônia não pertence apenas à população da região.

Por fim, a biotecnologia. Quais os benefícios ela pode trazer?

A biotecnologia, como os novos materiais, são a chave do futuro. A Idade da Pedra não acabou porque as pedras se esgotaram. Muitos minerais de grande utilização na atualidade não o serão no futuro. A transformação de materiais pela biotecnologia, inclusive a digestão de resíduos por bactérias gerando novas substâncias, é uma grande expectativa. Na minha opinião, a floresta amazônica encerra muito mais riqueza em si do que as jazidas sob suas raízes. Demonstrar isso em números é o nosso grande desafio.

Dom Total

Como ações sociais podem ajudar a reduzir o desmatamento na Amazônia


A comunidade São João Batista do Rio Apocuitauá, na Floresta Estadual de Maués, recebe uma caixa d´água de 5 mil litros para o poço artesiano do programa Bolsa Floresta (Foto: Kátia Serique )
 
 

Grandes ações de fiscalização envolvendo o Exército, a Polícia Federal e representantes dos órgãos ambientais são as imagens mais lembradas quando pensamos na luta contra o desmatamento na Amazônia. Outro recurso comum em nosso imaginário contra o desmatamento é a criação de novas unidades de conservação na região. O que poucos sabem é que a criação de alternativas econômicas para as comunidades da floresta também pode ajudar a controlar, a longo prazo, o desmatamento.

A Amazônia não é um território desabitado. Vivem na região cerca de 24 milhões de pessoas ou 13% da população nacional. Cerca de 4 milhões estão na floresta, seja em comunidades indígenas e ribeirinhas, seja vivendo como seringueiros ou pequenos produtores rurais. São essas pessoas que vivem em contato direto com à floresta e que também estão fortemente ligadas ao combate ao desmatamento. 

O Brasil enfrenta hoje os menores índices de derrubadas dos últimos vinte anos. Porém, a perda anual de cerca de 5 mil quilômetros quadrados de floresta  ainda é a maior do planeta. Cerca de 30% desse desmatamento ocorre dentro de assentamentos rurais. Se considerarmos que os pequenos produtores também vivem fora das áreas demarcadas pelo governo, em unidades de conservação, comunidades ribeirinhas entre outras, podemos afirmar que 50% dos índices de desmatamento ocorrem nas pequenas propriedades rurais. 

Existem dois tipos de desmatamento. O primeiro é o que ocorre entre os grandes donos de terras. “Esse desmatamento está associado à especulação da fundiária. A pessoa desmata pela perspectiva de valorização da área, mas não produz nada”, afirma Paulo Barreto, pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). Uma solução proposta para este problema seria a cobrança efetiva do Imposto Territorial Rural, criado justamente para evitar esse tipo de ação e que hoje não atinge nem 6% de seu potencial. “O grande problema é que muitos adulteram o valor da terra para reduzirem a cobrança”, diz Barreto. O outro tipo de desmatamento é o dos pequenos produtores rurais. É a devastação dos assentamentos, que perpetua a pobreza. A saída para isso é criar alternativas de renda, associadas a exigência de floresta em pé. “Essas ações vão desde o pagamento pelos serviços florestais até o desenvolvimento do turismo em unidades de conservação”, diz Barreto.

>> Leia as reportagens do Especial Amazônia

Resolver os graves índices sociais da região são outros efeitos esperados dessas ações. Segundo dados do último relatório de desenvolvimento humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), em 1990, 48% da população da região vivia em situação de pobreza. O Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) desenvolveu, em 2014, o Índice de Progresso Social da Amazônia (IPS), que considera exclusivamente os indicadores sociais e ambientais em sua análise sobre a região. O diagnóstico abrangeu 772 municípios dos nove estados da Amazônia Legal. Um dos dados mais relevantes foi que o IPS médio da Amazônia (57,31) ficou inferior também à média nacional (67,73). O quesito oportunidades foi a que teve o pior desempenho, com 48,33 pontos. A questão é reconhecida como um ponto-chave para garantir o combate ao desmatamento e a continuidade do progresso social da região.

Os programas de pagamento por serviços ambientais oferecidos pela floresta, com a controle do regime hídrico, a fertilidade dos solos e a biodiversidade, são considerados como uma das melhores opções para remediar a falta de oportunidades para a população da Amazônia. Tanto Aécio Neves quanto Dilma Rousseff afirmam que vão investir para melhorar essa questão. Um dos possíveis modelos para essa ação seria um dos programas mais bem-sucedidos de transferência de renda e promoção de oportunidades da Amazônia: o Bolsa  Floresta. Executado desde 2007, pela Fundação Amazonas Sustentável  (FAS), do governo do estado do Amazonas. O programa paga uma bolsa para as populações ribeirinhas moradoras das unidades de conservação. Também oferece assessoria educacional e profissional a 40 mil moradores de uma área de 10 milhões de hectares no Amazonas. As atividades da mini-universidade de formação profissional estão entre as opções de novos modelos para a geração de renda associada à preservação da floresta em pé. Em novembro, 45 jovens das comunidades do Amazonas, que integram os projetos da FAS, vão estar formados com mil horas de treinamento em um currículo inovador. O curso é voltado para atividades que possam promover o desenvolvimento sustentável da floresta, como o manejo de peixes e como usar os ativos da floresta para melhorar a nutrição das famílias locais.

O desenvolvimento de novos negócios que façam a conexão entre a biodiversidade da floresta as indústrias é outra opção de novas oportunidades. Um exemplo disso são as novas produtoras de pneus que usam borracha nativa da Amazônia e que antes operavam com matéria-prima importada da Indonésia na Zona Franca de Manaus. “Garantir o progresso social e o desenvolvimento da Amazônia não é apenas uma medida eficaz para combater o desmatamento.  Esse é um desafio enorme, pois estamos mudando uma visão de mundo e criando de fato um caminho sustentável para o planeta”, afirma Virgílio Viana, presidente da FAS.

Fonte: Época

 

José Mirabal: indígenas da Amazônia devem ser protagonistas de seu futuro


José Gregorio Mirabal, coordenador-geral da Coordenadoria das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica (Coica) (AFP)

José Gregorio Mirabal, coordenador-geral da Coordenadoria das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica (Coica), que reúne organizações indígenas dos nove países da região amazônica, insiste em que as populações indígenas devem ser “protagonistas” de um futuro desenvolvimento que respeite a natureza.

O ex-líder do povo indígena kurripaco da Venezuela respondeu a perguntas da reportagem à margem do sínodo de bispos dedicado à Amazônia (de 6 a 27 de outubro) que é realizado no Vaticano e no qual participa como “convidado especial”, já que não foi batizado.

Está preocupado com o futuro da Amazônia?

“Neste sínodo estamos ouvindo propostas da ciência, da Igreja, de especialistas, do mundo cultural. Muitas propostas têm a ver com nossa ciência, nossa forma de vida”.

“Nós acreditamos que uma nova economia é possível só se a floresta amazônica for salva. Se a Amazônia continuar sendo destruída não é possível uma nova economia. E também não é possível sem nós, que estamos lá há milhares de anos. Que conhecemos os segredos da Mãe Terra. Tem que ser uma aliança, uma nova parceria”.

“Um processo onde nós sejamos também protagonistas da proposta de ‘floresta em pé’, que pode gerar muito mais benefícios que destruí-la”.

É possível salvar a Amazônia? Vocês são acusados de frear seu desenvolvimento. Qual é sua opinião?

“Na prática, nós lutamos há muitos anos para defender nosso território. O sínodo entendeu isso, Greta, uma criança, entendeu, e o papa também. Nós queremos que a humanidade entenda de uma vez que não podemos viver sem oxigênio e água potável. As comodidades desse desenvolvimento na Europa são boas, mas são nocivas, destrutivas para a vida”.

“Não é que queiramos mudar este desenvolvimento por um primitivo. Não, não. Queremos uma harmonia. Neste momento não há harmonia. O sínodo está colocando isso, que haja harmonia na Terra. Além dessas portas, da Igreja, do discurso religioso, o papa está colocando a salvação do mundo, do planeta. E ali nós entramos. Sentimo-nos parte desse processo de mudança que a humanidade necessita. Nossa sabedoria, nossa experiência estão dentro do sínodo”.

Os bispos são favoráveis a ordenar padres indígenas casados. É importante para vocês?

“São vozes dentro da Igreja, escutamos o debate e o respeitamos. Escutamos também mulheres que falam com o coração. Há nossos irmãos indígenas, que foram evangelizados, que fazem parte da Igreja, que querem que seu trabalho tenha um nível mais alto, que sejam levados em conta dentro da Casa de Pedro. Acredito que isso é válido. Mas nós somos espectadores nesse debate”.

AFP

Mato Grosso aposta na restauração florestal


Mato Grosso aposta na restauração florestal para apagar a fama de vilão do desmatamento da Amazônia e garantir mercados para o agronegócio

De Cuiabá, capital mato-grossense, são 927 quilômetros por terra até Querência (MT) [1], um dos 100 municípios de maior renda per capita do País. No longo percurso com intenso tráfego de caminhões, pastagens e cultivos de grãos a perder de vista imperam no lugar da vegetação nativa, restrita a nacos isolados de mata aqui e acolá. De lado a lado no caminho a dinâmica da paisagem retrata a força do agronegócio e seus impactos. Após 10 horas de estrada, o Cerrado que restou se torna mais alto e frondoso. E surgem no horizonte palmeiras e árvores de grandes copas, sinal de que um pouco mais adiante já estaremos em território amazônico. No destino final, a cidade de 15 mil habitantes, ruas largas, feições europeias e sotaque gaúcho não esconde a origem dos que ali chegaram há três décadas para ocupar terras, derrubar a floresta e produzir.

[1] Palavra típica do vocabulário gaúcho que significa lugar amado; nostalgia e saudade da terra natal

No comércio, os altos preços condizem com a riqueza circulante, gerada nos campos do entorno. Ninguém duvida: a imensidão das propriedades rurais dá uma sensação de dever cumprido para quem migrou de longe e construiu tudo do zero, aproveitando cada palmo de terra como patrimônio para filhos e netos. Mas, ao mesmo tempo, percebe-se um sentimento de orgulho ferido, porque o passivo ambiental dessa história expõe uma imagem negativa para a sociedade e para o mercado. Em 2008, Querência foi incluída pelo Ministério do Meio Ambiente na lista negra [2] dos municípios que mais desmatam a Amazônia – o que significou barreiras para crédito e risco de sanções comerciais. Três anos depois, após ações para reduzir o desmatamento, o município conseguiu livrar-se das restrições.

[2] Atualizada pela última vez em 2013, a lista contém 41 municípios, a maioria de Mato Grosso

Mas a mancha de vilão do desmatamento não desapareceu por completo. Em seu território, 43% ocupado por reservas indígenas, há 248 propriedades rurais embargadas pelo Ibama, porque não obedecem às leis ambientais. O desafio de virar o jogo e mudar a imagem tem mobilizado prefeitura, fazendeiros, empresas, sindicatos e organizações não governamentais em torno de soluções. Na iniciativa “Querência + Paisagens Sustentáveis”, o plano é recuperar 2,7 mil hectares de mata na beira de rios até 2019, para que as propriedades sejam desembargadas e possam produzir. “Queremos trabalhar com segurança, porque é possível conciliar conservação ambiental e produção agrícola”, enfatiza Marcelo Marinho, presidente do Conselho Municipal de Meio Ambiente.

Não por acaso a sigla APP, Área de Preservação Permanente [3], virou hit no vocabulário por aquelas bandas – inclusive entre os produtores rurais mais antigos e resistentes. De igual modo, o termo “restauração florestal” se torna mais presente em região onde para muitos a grandeza da floresta parecia não ter fim. Em meio ao milharal que aguarda a colheita para dar lugar à soja a partir de novembro, o fazendeiro Neuri Wink é taxativo: “Nenhum produtor vai querer colocar mato de volta em terras produtivas de alto valor e ótimo relevo, clima e solo para agricultura, mas a preservação de nascentes não se discute”. Como um dos pioneiros que desbravaram a região, Wink deixou a cidade natal de Victor Graeff (RS), de colonização alemã e italiana, e chegou ao novo eldorado amazônico em 1988. “Antes podíamos desmatar até 80% da área, em algumas situações”, conta o produtor, dono da Fazenda Certeza – “certeza de que com muito trabalho faríamos acontecer”.

[3] Situada na beira de rios, ao redor de nascentes e em topos de morro, tem a função ambiental de preservar os recursos hídricos, evitar erosões e proteger a biodiversidade e o solo

Marcada pela tradição gaúcha do cooperativismo e pelos valores da comunidade luterana, a aventura produtiva na floresta exigiu investimento em estrada, energia, banco, hospital, escola, telefone. “Quando cheguei, as ruas estavam apenas demarcadas no chão”, diz Wink, que inicialmente ocupou 670 hectares e hoje tem área três vezes maior. Cerca de 30% é mata que protege a beira do Rio Betis. “Aqui tem um jatobá e mais na frente tamboril, mamoninha e ipê-roxo”, aponta o produtor, ao mostrar a sua APP com árvores já altas após seis anos de recuperação.

Durante o trabalho, baseado no plantio de sementes e mudas, nascentes antes sufocadas por pastagens minaram. Apesar disso, o antigo fazendeiro é resistente quanto ao benefício da floresta para o clima: “O desafio está em empregar práticas de conservação do solo, nosso maior patrimônio”. Se alguns fazem a restauração florestal apenas para cumprir a lei e evitar encrenca com os órgãos ambientais, outros enxergam ganhos a longo prazo. “É melhor para todos usar menos solo sem derrubar tudo”, recomenda Cláudio Dalbello, produtor no Assentamento Pingo D’água, em Querência, ao ver a situação do vizinho “que hoje nem sequer tem madeira para colocar uma antena de TV”. Com auxílio do filho, Cristian Mariani, formado em gestão ambiental, o proprietário implantou o Sistema Agroflorestal (SAF) [4] com espécies frutíferas. E a chegada da energia elétrica permitiu puxar água para o gado beber longe do rio. “A APP foi restaurada e cercada; ninguém mexe.”

[4] São consórcios de culturas agrícolas com espécies arbóreas que podem ser utilizados para restaurar florestas e recuperar áreas degradadas

No Assentamento Brasil Novo, Armando Menin, dono do Sítio Modelo, mantém soja e gado em consórcio com seringueiras e uma floresta de espécies frutíferas e madeireiras plantada onde antes só tinha pasto. O produtor fornece frutas para o proprietário vizinho, Aldo da Rosa, fazer o beneficiamento em polpa e assim garantir renda o ano todo. “O clima mudou e quem só plantou soja está sofrendo”, afirma Menin, que se fixou na Amazônia por meio de grilagem [5] de terras, desmatou e vendeu a área para conseguir o atual lote, onde hoje tem soja, pupunha, caju, seringueira, pequi e mangaba. “Quem não plantou árvores para diversificar a renda e viver melhor, além de não ter sombra e fruta para fazer um suco, está trabalhando de peão nas grandes fazendas”, diz Rosa, ao se referir à realidade socioambiental nos assentamentos rurais [6].

[5] Ocupação ilegal de terras públicas para obtenção fraudulenta de documento de posse com aparência de legalidade

[6] Na Amazônia, há 450 mil famílias em 3.450 assentamentos, responsáveis por um terço do desmatamento da região

“É preciso fortalecer a agricultura familiar, pois há 40 mil hectares de soja plantados em assentamentos da localidade”, conta Cecilia Gonçalves Simões, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). A instituição dá apoio técnico ao município para a governança socioambiental, mapeamento dos passivos e elaboração de um plano participativo para solucioná-los. Uma das tarefas é o registro das propriedades no Cadastro Ambiental Rural (CAR). “Todo mundo sai ganhando quando o território inteiro é reconhecido pela legalidade e sustentabilidade”, completa Simões.

Na Fazenda Tanguro [7], onde o Ipam mantém uma base científica, experimentos avaliam a eficiência de seis diferentes métodos de restauração florestal: plantio de sementes nativas; cultivo de mudas; regeneração natural sem intervir na mata; e transposição de folhas para cobrir o solo e recuperar áreas degradadas, por exemplo. Também são formadas “ilhas de vegetação”, onde os esforços de plantio se concentram em um ponto central, para se obter uma resposta mais rápida, com posterior aumento por meio de dispersão de sementes. Por fim, em outra parcela foram instalados “poleiros” de madeira para facilitar o pouso de aves que comem os frutos e espalham as sementes.

[7] Pertencente ao grupo Amaggi, a propriedade tem 82 mil hectares, 46% ocupados por lavoura

Nessa linha, pesquisadores estudam no local o papel dos mamíferos, especialmente o das antas, na regeneração natural da floresta. Elas são monitoradas por câmeras fotográficas em área degradada por fogo e a cada três meses as fezes são coletadas para análise. Em 62 amostras, foram encontradas cerca de 2,7 mil sementes de vários tipos. Isso permite inferir como os serviços ambientais podem ser comprometidos com o declínio das antas decorrente da caça e do desmatamento. Assim, ações para conservação da espécie poderão ser estratégicas no contexto de um futuro mercado de crédito de carbono e de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA).

Em paralelo, há pesquisas sobre como o uso da terra interfere no clima da região e sobre qual a função das matas para a proteção de nascentes e para a dinâmica de nutrientes do solo nos cultivos. “O objetivo é fornecer elementos científicos para a tomada de decisão e políticas públicas”, explica o pesquisador Divino Silvério. “Já existe conhecimento, mas falta pôr em prática por meio de incentivos, porque o custo do que dá certo é alto.”

O movimento de Querência integra-se ao plano estadual de até 2020 repor 2,9 milhões de hectares de floresta – área superior ao território de Sergipe – como medida-chave para Mato Grosso cumprir o que apresentou à ONU na reunião de Paris sobre clima, em dezembro. Em abril, foi criado um comitê para colocar as metas em prática. “Será necessário definir áreas críticas e fomentar a cadeia produtiva da restauração, prevendo planos regionais e modelos que gerem retorno financeiro”, afirma Elaine Corsini, representante da Secretaria de Estado do Meio Ambiente.

“Com o novo Código Florestal, as regras se tornaram claras e os produtores ficaram mais abertos ao diálogo para a adequação, mas é preciso acelerar a validação do CAR para se saber quanto será recuperado e como”, avalia Lucélia Avi, analista de meio ambiente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso (Famato).

As ações compreendem também a redução de conflitos fundiários. “O compromisso estadual atraiu o interesse de investidores internacionais, entre eles o governo norueguês”, revela Daniela Mariuzzo, representante do IDH – instituição holandesa que investe na garantia de origem sustentável para a soja que entra na Europa pelo Porto de Roterdã.

Segundo Laura Antoniazzi, pesquisadora da Agroícone, “as soluções devem acomodar as projeções de crescimento da produção agropecuária [8]”. Assim, considerando a restauração florestal e técnicas para maior produção sem desmatamento, o investimento necessário para atingir as metas estaduais chega a US$ 9 bilhões em dez anos – custo que pode ser bancado pelo retorno financeiro dos projetos. “Para ser viável, a reposição de árvores tem de ser incorporada à conta da atividade produtiva principal, e não vista como uma despesa isolada.”

[8] Em Mato Grosso, a área de grãos deverá adicionar 3 milhões de hectares até 2025 e o crescimento da produção de carne está projetado em 40%, sem aumento de pastagem

Plantar árvore não é tão simples como se imagina. A ênfase deve estar na busca por “paisagens integradoras e inteligentes”, conforme diz Rodrigo Junqueira, coordenador do Programa Xingu, do Instituto Socioambiental (ISA). Mais que isso: na Amazônia, “é necessário superar o lugar-comum de dizer que a floresta se regenera sozinha”. Isso depende da região, do relevo, do clima e do uso anterior do solo. Estudos já comprovaram: em áreas de antigas pastagens, conforme o estágio de degradação, só cresce naturalmente o capim. Ele precisa ser controlado e substituído por árvores nativas. “Devemos olhar para o que já está dando certo”, recomenda Junqueira, ao se referir à técnica de semeadura direta ou “muvuca”, em que ocorre o plantio de um mix de sementes – e não de mudas – com viabilidade técnica, maior aderência cultural e menor custo [9].

[9] O valor das sementes, plantio e manutenção da área por três anos é de R$ 5,4 mil por hectare, 50% inferior ao custo mínimo do cultivo tradicional de mudas

A inovação se desenvolveu nos últimos dez anos a partir de uma demanda dos índios: a proteção dos rios que correm no Parque Indígena do Xingu, cujas nascentes – situadas fora da reserva – encontravam-se ameaçadas pela pecuária extensiva. A campanha Y Ikatu Xingu se desdobrou no trabalho que hoje mobiliza 420 coletores indígenas e agricultores familiares ligados à Associação Rede de Sementes do Xingu, com capacidade produtiva de semear 500 hectares por ano. E inspira soluções para o País plantar floresta e cumprir as metas climáticas.

Experiências se multiplicam no Pará

Com 84 mil quilômetros quadrados, o dobro da área do Estado do Rio de Janeiro, o município de São Félix do Xingu, no Sul do Pará, tem o maior rebanho do País – 2,2 milhões de cabeças de gado. Foi um dos campeões do desmatamento na Amazônia e agora se destaca como palco de projetos que demonstram ser possível produzir com menor impacto ambiental. “Na região, disseminar boas práticas na cadeia da pecuária é o caminho para reduzir o desmatamento e promover a restauração florestal”, analisa Francisco Fonseca, coordenador da iniciativa Pecuária Sustentável – do Campo à Mesa, da The Nature Conservancy (TNC).

Em troca de assistência técnica e de reconhecimento por parte de compradores como a indústria frigorífica Marfrig e a rede varejista Walmart, parceiros do projeto, produtores rurais assumiram o compromisso de zerar o desmatamento, fazer o Cadastro Ambiental Rural e adotar um plano de boas práticas. As medidas incluem a recuperação de áreas degradadas para pastagem e a restauração da floresta para proteger rios e nascentes. Cerca de 1,2 mil hectares de APP estão sendo isolados do gado.

No município, uma segunda frente de trabalho mobiliza a agricultura familiar para a expansão dos cultivos de cacau como estratégia de restauração florestal nas áreas de reserva legal. A planta, nativa das regiões tropicais da América do Sul, precisa da sombra das demais árvores para crescer e produzir. “E está sendo consorciada com a pecuária de corte e leite na região”, informa Rodrigo Freire, coordenador de floresta e clima da TNC.

O objetivo é repetir na Amazônia o que aconteceu na Mata Atlântica do Sul da Bahia, onde o cacau sombreado pela floresta teve importante papel na conservação. Em São Félix do Xingu, 82 famílias de agricultores recebem auxílio técnico e estão substituindo pasto pelo fruto do chocolate, em alta no mercado. Com a produção média de 1 tonelada por hectare ao ano, é possível obter renda complementar de R$ 10 mil no período. Até 2020, o plano é expandir os atuais projetos demonstrativos e atingir 1 mil produtores, totalizando 5 mil hectares de cacau.