Capitão dos bombeiros lança livro sobre desastre de Mariana


Crime socioambiental da Samarco em Mariana completa quatro anos nesta terça-feira (Rogério Alves/TV Senado)

Bárbara Teixeira*

O rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, completa quatro anos esta semana. Até a recente vazamento de petróleo na costa brasileira, era considerado o maior desastre ambiental do Brasil. A tragédia não apenas destruiu Bento Rodrigues, mas deixou feridas que até hoje não foram cicatrizadas.

De forma intensa e reveladora, o capitão do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (CBM-MG), Leonard Farah, traduziu em livro a sua experiência diante daquela “cena de guerra”. Além da lama, será lançado nesta terça-feira (5), às 19h30, com debate no projeto Sempre um Papo, na Faculdade de Direito da UFMG.

O capitão, um dos primeiros a chegar no local da tragédia, pretende contar sobre a experiência vivida em campo. Segundo ele, o intuito do livro é “inspirar as pessoas e trazer para perto a realidade dos bombeiros, mostrando que somos pessoas comuns”.

“O público vai se identificar muito com o livro. Os leitores vão ver que os bombeiros são pessoas totalmente normais como qualquer um. Às vezes, o público nos enxerga como super-heróis, mas nós só temos um treinamento especializado”, explica. Para o militar, o livro vai permitir que as pessoas conheçam melhor o trabalho do Corpo de Bombeiros, lendo a respeito dos bastidores, “tanto na nas horas mais decisivas, como nas que a gente arrisca a vida pelos outros” diz o capitão.

Ainda de acordo com Farah, Além da lama foi idealizado através de uma atividade rotineira dos bombeiros. Como é de costume da corporação, os militares escrevem relatórios das operações como forma de controle interno. Entretanto, o relatório do capitão sobre aquela operação se destacou por ter tomado grandes proporções. Contando o dia a dia dos trabalhos de resgate, as dificuldades e alegrias, o livro envolve o leitor nos sentimentos dos bombeiros e das vítimas.

“Ele começou a partir de um relatório, mas comecei a colocar mais emoção e realmente tentar mostrar a operação. Durante um ano, atentei a outros fatores, ouvi outros militares que estavam na ocorrência para que eles colocassem o ponto de vista deles e para que o livro não fosse um relato só meu, mas de vários bombeiros”, diz o autor sobre o processo de escrita.

Com apoio dos amigos, principalmente da corporação, o militar teve ânimo para levar aos leitores algo que “fosse interessante e que não ficasse igual a um boletim de ocorrência, mas algo que o leitor realmente possa sentir as emoções e todas as horas de desespero e de perigo daquela operação, para que conseguissem enxergar tudo que a gente vivenciou naquele dia”, diz.

Expor as emoções vividas não foi tarefa fácil, aponta o bombeiro. “Em alguns momentos, cito certas situações em que realmente me emocionei e outros que chorei lembrando dos momentos de maior dificuldade. Quando mais relembro, mais entendo que foi uma catástrofe”, relata.

Inspiração

A história narrada por Leonard Farah traz um olhar entre os muitos sobre uma história que precisa ser contada. De acordo com Leonard, as pessoas precisam saber e conhecer as “coisas incríveis” que o CBM-MG fez em Bento Rodrigues. No dia do rompimento da barragem, haviam somente 10 militares no local, mas esse pequeno grupo conseguiu evitar uma tragédia ainda maior, salvando o máximo de vítimas.

É por isso que, segundo o capitão, seu relato poderá servir de inspiração. “O meu objetivo é que as pessoas realmente saibam o que aconteceu, conheçam uma história que quase ninguém conhece, uma história de superação. Tomamos as decisões mais difíceis pensando no outro. Isso é algo que quero levar de inspiração para as pessoas, não desistam e enfrentem os problemas da vida da mesma maneira que a gente enfrentou”, comenta Leonard.

O capitão pretende escrever mais livros contando suas experiências em grandes operações. Segundo ele, um próximo livro sobre o treinamento dos bombeiros nas tragédias de Mariana e Brumadinho já está sendo escrito. Um terceiro livro, sobre a maestria e gerenciamento da operação realizada após um ciclone devastar Moçambique, na África, também deve virar livro.

Tragédia de Mariana

O rompimento da Barragem de Fundão, da mineradora Samarco, ocorreu em 5 de novembro de 2015, por volta das 16h. Foram derramados cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério, que destruiu o município de Bento Rodrigues e atravessou a Bacia do Rio Doce até chegar ao mar. Este foi, então, considerado o maior desastre ambiental da história do Brasil. Ao todo, mais de 300 famílias ficaram desabrigadas, 19 pessoas morreram e 300 mil pessoas foram atingidas diretamente.

A lama tóxica matou 11 toneladas de peixes e atingiu cerca de 40 cidades de Minas Gerais e do Espírito Santo. As famílias atingidas, que após o desastre foram abrigadas em hotéis, estão recebendo indenização da Samarco e receberam a promessa de novas moradias, que até hoje não saíram do papel. Até o momento, das 22 pessoas denunciadas, nove seguem como réus, mas nenhum responsável foi preso pelo crime.

SEMPRE UM PAPO:

Quando: Terça-feira, 5 de novembro, às 19h30.

Onde: Auditório da Faculdade de Direito da UFMG (Av. Álvares Cabral, 100, Centro, Belo Horizonte).

ALÉM DA LAMA

De Leonard Farah

Vestígio/Autêntica

208 páginas

R$ 44,90

* Estagiária sob a supervisão de Pablo Pires Fernandes

Barragem de Brumadinho rompeu por liquefação estática, dizem especialistas


Bombeiro trabalha no resgate de pessoas em Brumadinho no crime ambiental que chocou o mundo (Mauro Pimentel/AFP)

O rompimento mortal de uma barragem da Vale em Brumadinho (MG), em 25 de janeiro, foi resultado da “liquefação estática dos rejeitos dentro da barragem”, concluiu um painel de especialistas contratado pela assessoria jurídica externa da mineradora para avaliar as causas técnicas do ocorrido.

Em relatório publicado nesta quinta-feira (12), o painel pontuou que a estrutura não continha drenagem interna suficiente e, portanto, tinha um alto nível de água no talude a jusante. “Isso fez com que uma parte significativa dos rejeitos permanecesse saturada, o que é um pré-requisito para a liquefação estática não drenada”, disse o documento.

O painel, que não teve como objetivo apontar responsabilidades pelo desastre, que deixou mais de 255 mortos, concluiu ainda que não houve atividade sísmica ou registro de detonações antes do desastre e que nenhum dos dispositivos de monitoramento detectou precursores de rompimento.

“Em vez disso, o rompimento da barragem foi súbito e abrupto, decorrente de altas tensões de cisalhamento no talude a jusante da barragem e da resposta frágil e não drenada dos rejeitos”, apontou a análise. Segundo o relatório, que foi divulgado pela Vale, características do projeto e da construção da Barragem I estão entre os fatores que contribuíram para seu rompimento.

“Especificamente, o projeto resultou em uma barragem íngreme, com falta de drenagem suficiente, gerando altos níveis de água, os quais causaram altas tensões de cisalhamento dentro da barragem”, afirmou. O rompimento de Brumadinho liberou uma onda de lama, que atingiu mata, rios e comunidades da região, além de refeitório e área administrativa da própria Vale, durante a hora do almoço. Grande parte das vítimas fatais era de funcionários da mineradora.

Em fevereiro, uma autoridade do governo mineiro afirmou que tudo indicava que o desastre teria ocorrido por liquefação, o que já ocorreu em outros grandes desastres no mundo em estruturas com o mesmo método de construção de Brumadinho, com tecnologia de alteamento a montante.

O sistema a montante custa menos que outros tipos de design, mas apresenta maior risco de segurança, porque suas paredes são construídas sobre uma base de resíduos, em vez de em material externo ou em terra firme. A liquefação, com o maior acúmulo de água na estrutura, foi também o motivo apontado para o rompimento de barragem da Samarco (joint venture da Vale com BHP) em novembro de 2015, que utilizava o mesmo método de alteamento.

Reuters / Dom Total

Livro-reportagem revela detalhes do crime socioambiental da Vale em Brumadinho


Lucas Ragazzi (à esquerda) é repórter investigativo da Globo Minas, e Murilo Rocha (à direita) é editor-executivo do jornal O Tempo (Foto: Mariela Guimarães)

Bárbara Teixeira*

“Foi crime”. “Não foi acidente”. Assim que os jornalistas Murilo Rocha e Lucas Ragazzi definiram, junto à comunidade do Córrego do Feijão, a tragédia do rompimento da Barragem 1 da Vale, em Brumadinho, Região Metropolitana de Belo Horizonte. Testemunhas do crime socioambiental da mineradora, os jornalistas contam detalhes da tragédia no livro-reportagem Brumadinho: Engenharia de um crime.

O lançado oficial ocorrerá nesta quarta-feira (23), no Teatro da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, às 19h; e no próximo sábado (26), na Livraria da Rua, às 11h, em Belo Horizonte.

Barragem gigante é vistoriada após tremor de terra atingir Congonhas


Casa de Pedra tem 76 metros de altura e capacidade de acumular cerca de 50 milhões de m³ de rejeito (Reprodução)

Equipes da Agência Nacional de Mineração (ANM) e da Defesa Civil de Minas Gerais vistoriam, nesta terça-feira (26), a situação da barragem Casa de Pedra, da mineradora CSN, e de outras estruturas de Congonhas, região Central do estado. Na noite dessa segunda-feira (25), um tremor de terra de magnitude 3,2 na Escala Richter assustou a população, que já vive apreensiva por causa das 24 barragens que cercam a cidade.

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A mineradora CSN, responsável pela barragem Casa de Pedra, garante que o tremor não abalou a estrutura, que tem 76 metros de altura e capacidade para 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos. Trata-se da maior barragem em área urbana da América Latina.

O Observatório Sismológico da Universidade de Brasília (UNB) registrou que o epicentro do tremor aconteceu no território de Belo Vale, também na Região Central, às 20h27 e teve magnitude de 3.2.

“O tremor sentido em Congonhas não causou nenhum dano na estrutura da barragem Casa de Pedra. Todas as inspeções realizadas evidenciaram que elas estão estáveis e nenhuma anomalia foi identificada. Também não houve dano nas demais áreas da unidade”, diz nota da CSN, que segue monitorando a situação.

A Prefeitura de Congonhas informa que fez contatos com diversas pessoas para verificar a origem do fenômeno, se de ordem natural ou provocada por algum acidente. “Equipe da Prefeitura segue monitorando informações sobre a segurança das estruturas de barragens. A primeira preocupação foi com a condição de estabilidade da estrutura da Barragem Casa de Pedra, que é a mais próxima da área urbana”.

“Não tem nenhuma informação de que há risco iminente de rompimento. Isso é totalmente inverídico, não tem essa informação. A casa de Pedra continua estável, segundo a geotecnia da CSN”, tranquilizou o tenente-coronel Flávio Godinho, coordenador da Defesa Civil estadual.

Barragens

Congonhas tem 24 barragens. Além da CSN, Gerdau, Ferrous e Vale operam na cidade. No entanto, a operação da Casa de Pedra é a que gera mais insegurança. Em 2017, um parecer do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) apontou risco de rompimento da estrutura e determinou que a CSN Mineração tomasse uma série de medidas para sanar danos. Conforme o órgão, a empresa executou as determinações.

Com população de aproximadamente 54 mil habitantes, Congonhas seria destruída em caso de rompimento das barragens. Das 24 estruturas, 54% têm dano potencial associado considerado alto.

Relatório da Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Congonhas mostra que a cidade histórica que abriga os profetas do mestre Aleijadinho seria praticamente varrida. O colapso afetaria de maneira drástica até mesmo outros municípios.