Os limites da Terra e os desafios financeiros e ambientais


                

Os problemas ambientais do mundo já ultrapassaram os limites da Terra e a possível continuidade da melhora dos indicadores sociais estão ameaçados pela crise financeira. Nos últimos duzentos anos, o ser humano tem retirado recursos ambientais da Terra, transformando as riquezas naturais em artigos de luxo e devolvido tudo em forma de lixo, para a tristeza do Planeta. Há quem diga que os seres humanos são os vândalos do meio ambiente.

A metodologia da Pegada Ecológica mostra que a humanidade já superou em 50% o uso sustentável da biocapacidade. A metodologia das Fronteiras Planetárias mostra que estamos ultrapassando os limites seguros para a vida na Terra. O IPCC mostra que o aquecimento global é provocado pelas atividades antrópicas e atingiu os maiores níveis nos últimos 12 mil anos. Em todos os cenários, o quadro é de insustentabilidade do modelo de crescimento da produção e consumo, em um quadro de uma população e renda per capita em expansão.

Em pouco mais de dois séculos, a humanidade teve um impacto maior sobre a biosfera do que nos 200 mil anos anteriores da história do homo sapiens. Entramos na Era do Antropoceno, isto é, da dominação humana sobre a Terra e sobre as demais espécies animais e florestais. Mas ao mesmo tempo os ganhos de escala da economia estão virando deseconomias de escala e a sinergia virando entropia. As mudanças climáticas têm provocado diversos desastres naturais e têm aumentado o sofrimento dos refugiados do clima.

Levantamento da FAO mostra que 200 quilômetros quadrados de florestas foram dizimadas por dia no mundo, entre 2000 e 2005, com perda de 7,3 milhões de hectares. Somente o Brasil destruiu 3,1 milhões de hectares de florestas nesse período de 5 anos. Entre 2000 e 2010 aproximadamente 13 milhões de hectares de florestas foram convertidos para outros usos ou perdidos. Aliás, o Brasil já destruiu 93% da Mata Atlântica, mais de 50% do Cerrado e a Amazônia está sendo saqueada de suas madeiras de lei e invadida pela pecuária, as plantações de soja e agora o Congresso permite a plantação de cana-de-açúcar na região. Os ecossistemas brasileiros estão sendo depredados e destruídos.

Segundo o relatório Povos resilientes, Planeta resiliente: “a sobrepesca fez com que 85% de todos os estoques de peixes fossem atualmente classificados como sobre-explorados, esgotados, em recuperação ou totalmente explorados, uma situação substancialmente pior do que há duas décadas. Enquanto isto, os escoamentos agrícolas significam que os níveis de nitrogênio e fósforo nos oceanos triplicaram desde a época pré-industrial, levando a aumentos maciços das zonas mortas costeiras. Os oceanos do mundo também estão se tornando mais ácidos em consequência da absorção de 26% do dióxido de carbono emitido na atmosfera, afetando tanto as cadeias alimentares marinhas quanto a resiliência dos recifes de corais. Se a acidificação dos oceanos continuar, é provável que haja alterações nas cadeias alimentares bem como impactos diretos e indiretos sobre diversas espécies, com consequente risco para a segurança alimentar, afetando as dietas baseadas em alimentos marinhos de bilhões de pessoas em todo o mundo” (p. 30).

Diversos rios e lagos do globo estão sendo destruídos, contaminados ou desviados para diversos usos. O rio Colorado nos Estados Unidos não chega mais ao mar. Os rios da China estão sendo represados e poluídos, gerando conflitos hidropolíticos. Nas grandes cidades brasileiras a transformação de rios em canais de esgoto segue a ritmo acelerado, como nos casos do rio Arrudas em Belo Horizonte, do rio Carioca no Rio de Janeiro e do rio Tietê em São Paulo. Por tudo isto, cresce a luta pelo “Direito das águas”.

A dependência do petróleo, de produtos químicos e o uso de métodos não-orgânicos na agricultura tem gerado agressões ao meio ambiente, provando erosão, infertilidade, desertificação, contaminação dos solos, das águas, dos animais e dos seres humanos. A pecuária não tem causado menos danos, além de acelerar o desmatamento e elevar a emissão de gás metano. A acidificação do solo e dos oceanos reduz a fertilidade em geral e ameaça a biodiversidade.

O apetite humano tem provocado o sofrimento e o desaparecimento de outras espécies de seres vivos e animais sencientes. Segundo a FAO, cerca de 60 bilhões de animais são mortos todos os anos para enriquecer a dieta dos 7,1 bilhões de habitantes do mundo. Cerca de 30 mil espécies são extintas a cada ano. A perda de biodiversidade prossegue de maneira assustadora, mostrando a gravidade dos problemas ambientais.

O Parque Nacional do Iguaçu, considerado por biólogos um dos locais com as melhores condições de abrigar uma grande população de onças-pintadas no pouco que resta da Mata Atlântica no Brasil, sofreu uma redução de mais de 80% no número de indivíduos do final dos anos 1990 para cá. De uma média de cem onças estimadas em estudo naquele período, hoje se acredita que só restem 18, de acordo com reportagem do jornal o Estado de São Paulo.

Segundo a National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA), dos Estados Unidos, os níveis de dióxido de carbono na atmosfera saltaram 2,67 partes por milhão (ppm) chegando ao montante recorde de 395 ppm, em 2012. O registro do ano passado só ficou atrás do aumento de 2,93 ppm ocorrido em 1998. Sem surpresas, em maio de 2013, os níveis de CO2 chegaram ao limite crítico de 400 ppm. Controlar o aquecimento global nos limites dos 2 graus está ficando cada vez mais difícil.

Para agravar tudo isto, os governos continuam emitindo moeda e se endividando para elevar a “demanda agregada” (os níveis de investimento e consumo), com a boa intenção de reduzir o desemprego. Mas gerar crédito fictício pode minorar os problemas do curto prazo, mas não vai resolver os problemas de longo prazo da economia. Os Estados Unidos, por exemplo, estão paralisados pelo debate interminável sobre o teto da dívida pública (a dívida está em US$ 16,7 trilhões atualmente, mas crescendo).

Tanto as economias desenvolvidas quanto as chamadas economia emergentes estão passando por grandes incertezas e redução do crescimento. Enquanto o clima esquenta, a economia esfria. Nunca o mundo se viu diante de tão graves problemas ambientais e financeiros. Não vai ser fácil resolver esta dupla crise.

Referências:

TVERBERG, Gail. Oil Limits and Climate Change. Posted on May 23, 2013

TVERBERG, Gail. Oil Prices Lead to Hard Financial Limits, Posted on August 28, 2013

Kate Raworth. Um espaço seguro e justo para a humanidade: Podemos viver dentro de um “Donut”? Textos para Discussão da Oxfam, 2012

WWF. Relatório Planeta Vivo 2012

ALVES, JED. A destruição dos ecossistemas brasileiros, EcoDebate, Rio de Janeiro, 07/03/2013

ALVES, JED. O Decrescimento Demo-Econômico e a Sustentabilidade Ambiental. XI ENABER – XI Encontro da Associação Brasileira de Estudos Regionais e Urbanos, Foz do Iguaçu, 02 a 04/10/2013

 

* José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

** Publicado originalmente no EcoDebate e retirado do site CarbonoBrasil.

Fonte: Envolverde