Os males sociais e ambientais do cigarro


        

O ato de fumar já foi sinônimo de status, glamour e poder a pouco mais de algumas décadas. Vinculados em mídias de massa com anúncios atrativos e empolgantes, a indústria tabagista teve seu ápice nos anos 20, com suas maliciosas propagandas que anunciavam o cigarro como algo saudável e gostoso. Com o avanço do conhecimento geral dos inúmeros males que o ato de fumar causa ao nosso organismo, hoje é o inverso, existem campanhas anti-tabagistas em todo o mundo. Que o cigarro faz mal ao corpo humano, isso já sabemos. Mas, e ao meio ambiente, como o cigarro contribui para ser um dos maiores inimigos da natureza?

Um dos primeiros prejuízos causados ao meio ambiente está diretamente relacionado ao cultivo do tabaco. O desmatamento em larga escala, para obtenção da lenha usada nas estufas onde é feita a cura (secagem) das folhas do tabaco, contribui para a ocorrência de erosões e destruição do solo que se torna exposto às chuvas fortes e à insolação, e para a perda de matéria orgânica com conseqüente empobrecimento do solo.

Neste processo, queimam-se muitas árvores, na proporção de uma árvore para cada 300 cigarros produzidos. Dados de 1992/93 da Associação de Fumicultores do Brasil (AFUBRA) contabilizam 115.850 estufas para secagem do fumo no sul do Brasil.

Neste período foram consumidas 37.505.000 árvores para o processo de secagem das folhas, o que dá a dimensão do impacto ambiental, principalmente ao se considerar a crescente expansão da lavoura fumageira no Brasil.

Além disso, árvores também são sacrificadas para a fabricação do papel utilizado na manufatura do cigarro. Em 1988, foram produzidos 157,9 bilhões de cigarros no Brasil, o que representou 526 milhões de árvores queimadas. Ainda que as zonas desmatadas sejam reflorestadas, não serão refeitas as condições naturais quanto à flora e à fauna da mata virgem.

O processo insustentável do tabaco

Visando melhores safras e maiores lucros, a indústria fumageira, quase em totalidade de multinacionais que pouco se importam com o social e ambiental dos países onde se instala, tem estimulado o amplo emprego de fertilizantes e de agrotóxicos nas plantações de tabaco.

Na região Sul, maior produtora de fumo do país, é característica a utilização de mão-de-obra familiar na lavoura do tabaco, sendo freqüente o aproveitamento de crianças em algumas fases do cultivo. Esta prática, associada à ausência de orientações para o uso de fertilizantes e pesticidas de forma segura, tem gerado danos à saúde dos agricultores e de suas famílias, tais como intoxicações agudas e incapacitação para o trabalho, bem como danos ao ecossistema em conseqüência da contaminação do solo, dos alimentos, dos animais e dos rios.

A resultante contaminação dos derivados do tabaco que chegam aos consumidores é outra conseqüência resultante do emprego inadequado de agrotóxicos. Nas regiões de plantação fumageiras notam-se também os altos níveis de suicídio, provavelmente pela química utilizada no fumo e absorvidas pelos trabalhadores.

Os incêndios provocados por cigarros constituem também um importante agravo ao meio ambiente: pelo menos 25% dos incêndios rurais e urbanos são relacionados a pontas de cigarros.

O cigarro também é considerado o maior agente poluente dos ambientes domiciliares. Nos ambientes fechados em que se fuma, o nível de partículas suspensas no ar costuma ser bem superior ao limite aceitável (60 mcg/cm3). Em uma festa pode atingir 200 mcg/cm3; em bares e restaurantes, 400 mcg/cm3; sala de jogos, 600 mcg/cm3.

O nível de monóxido de carbono pode atingir limites absurdos (mais de três vezes o limite máximo aceitável) quando pessoas fumam em recintos fechados.

                                           

Depois do prazer proporcionado pela nicotina, o excedente causa grandes problemas ambientais: o filtro do cigarro. Estes deixados nas ruas são levados pela chuva até as galerias pluviais, onde contaminam toda a água e também o solo. Quando o correto seria guardá-las e posteriormente descartar corretamente na lixeira, em vez de simplesmente jogá-las no chão. Ao lado, uma opção para fumantes serem menos poluidores urbanos e mais responsáveis pelo lixo que produzem.

Um estudo coordenado pelo biólogo Aristides Almeida Rocha, professor aposentado da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP), e pelo advogado e jornalista Mário Albanese, presidente da Associa¬ção de Defesa da Saúde dos Fumantes, mostra que duas guimbas de cigarro geram a mesma quantidade de poluição produzida por um litro de esgoto. Segundo Albanese, os tocos deixam a água turva e criam um sedimento tóxico.

No processo de decomposição, micro-organismos como bactérias, protozoários e fungos alimentam-se do material orgânico poluente e consomem o oxigênio dissolvido no meio aquático. Quanto maior for à demanda por oxigênio, mais prejudicada será a sobrevivência dos peixes e de outros organismos aquáticos.

Nas praias, as guimbas de cigarros têm sido um dos principais componentes do lixo recolhido por mutirões de limpeza. Em 2013, um trabalho promovido pela ONG Instituto Conservação Marinha do Brasil (Comar) na Prainha e na Praia Grande, em São Francisco do Sul (SC), resultou na coleta de 237 kg de lixo. Desse total, 1 kg era constituído de duas mil guimbas. Parece pouco, mas essas pontas roubam da água uma quantidade de oxigênio equivalente à retirada por mil litros de esgoto.

Além de graves danos provocados pelo cigarro ao próprio organismo, o processo de fabricação e os maus hábitos de descarte dos filtros geram grandes problemas sociais e ambientais. Se as informações acima não são suficientes para esclarecer que está na hora de abandonar esse hábito nada saudável e perigoso, vale repensar todo o processo ambiental destrutivo que acarreta o ato de fumar. 

Laísa Mangelli