“Não só nos mares: insetos são contaminados por microplásticos”


Sergio Hanquet / Biosphoto / AFP

Uma pesquisa britânica mostra que larvas nascidas em resíduos contaminadosacumulam os resíduos em seu organismo e podem mantê-los até uma idade avançada: “Agora também já estão nos nossos céus, o próximo animal em que vamos estudar os efeitos será o homem”

A reportagem é de GiacomoTalignani, publicada por La Repubblica, 19-09-2018. A tradução de Luisa Rabolini.

Da água ao ar até entrar na cadeia alimentar. Os microplásticos, fragmentos de polímeros inferiores a 5 mm, já não são mais um problema apenas para as criaturas que vivem nos oceanos atulhados por mais de 8 milhões de toneladas de plásticos por ano. Agora eles estão invadindo as cadeias alimentares de outros animais terrestres e povoando áreas de terra firme anteriormente consideradas intocadas. Como? Voando.

De acordo com uma nova pesquisa da Universidade de Reading, no Reino Unido, publicada na Biology Letters, animais como os mosquitos ou as libélulas podem ingerir e transportá-los. Depois, uma vez que os insetos forem comidos por outros animais, os microplásticos entram totalmente na cadeia alimentar de outras espécies.

Para os biólogos as larvas de mosquito que crescem em águas contaminadas têm condições de acumular esses resíduos em seus corpos: uma boa parte desses microplásticos permanece dentro dos animais mesmo quando atingem uma idade avançada. Trata-se de uma prova determinante de como a poluição do plástico, que somente nos mares estima-se tenha matado mais de 100 mil criaturas, está danificando cada vez mais também na terra firme.

Amanda Callaghan, da Universidade de Reading, e seus colegas fizeram um experimento para testar a ideia por trás do transporte de microplásticos através dosinsetos. Alimentaram 150 larvas de mosquitos comuns em diferentes áreas do mundo (Culex pipiens) com uma mistura de alimentos e microesferas de plástico, semelhantes àquelas em uso em alguns produtos cosméticos, ou seja, pequenos grânulos de dimensões iguais a 0,0002 cm.

Entre os espécimes estudados, depois examinaram 15 selecionados aleatoriamente enquanto ainda estavam na fase larval e outros 15 quando já haviam se transformados em mosquitos adultos. Os microplásticos foram encontrados em todos os 30 animais analisados. Em média, uma larva continha mais de 3.000 esferas de microplásticos. Com o crescimento, os mosquitos deixavam de consumir os polímeros expelindo a maior parte, mas mesmo adultos, os mosquitos ainda tinham em média de 40 esferas de microplásticos.

“Qualquer organismo que se alimenta de insetos de água doce pode ser afetado pelos microplásticos presentes nos ecossistemas aquáticos“, explica Callaghan de maneira alarmante. Segundo a sua equipe, os resultados da análise demonstram que existem, portanto, “novas rotas de dispersão do plástico“.

Provavelmente esse fenômeno “é bastante difundido – afirma a principal autora do estudo – também porque existem muitos insetos que vivem na água e têm o mesmo ciclo de vida das larvas analisadas.” Essa rota implica que animais como pássarosmorcegosaranhas e outros que normalmente se alimentam de insetos, no futuro poderiam de fato ingerir cada vez mais microplásticos.

“É uma realidade chocante que o plástico esteja contaminando quase todos os cantos do meio ambiente e dos seus ecossistemas. Tem sido dada muita atenção aos plásticosque poluem nossos oceanos, mas esta pesquisa revela que agora também está em nossos céus.”

Os cientistas explicam que não há como saber qual será o impacto dos microplásticostransportados por via aérea. Mas eles têm certeza de que a luta contra esse tipo de poluição será muito longa. Há poucos dias, o Parlamento Europeu voltou a declarar guerra aos microplásticos, exigindo sua proibição nos produtos cosméticos até 2020, mas são medidas que poderiam não ser suficientes.

Esses resíduos de polímeros estão hoje em dia em todos os lugares. Uma única lavagem de roupas sintéticas pode liberar 700 mil fibras contendo microplásticos. Estas foram encontradas não só em peixes e/ou aves marinhas, mas também na água engarrafada, na cerveja, no açúcar, no sal marinho e em diversos alimentos que usamos habitualmente. Agora, através da observação dos insetos podemos entender como o plástico entra na cadeia alimentar: é claro – argumentam muitos cientistas – que no futuro o próximo o animal no qual serão estudados os efeitos dos microplásticos será certamente o homem.

IHU