Temos boas estratégias contra a perda da biodiversidade?


             

Há 4 anos atrás, em 2010, o quarto super relatório Global Biodiversity Outlook – GBO4 – começou a ser preparado. Foram dezenas e dezenas de contribuições de técnicos governamentais, organizações não governamentais e pesquisadores, em reuniões mais reuniões e encontros de especialistas até seu lançamento público, na abertura da 12ª Convenção das Partes da Convenção de Diversidade Biológica (COP12 da Biodiversidade), nesta segunda feira, na Coreia do Sul. E tudo isso para quê?

Bom, a maioria de nós tem uma vaga ideia sobre a importância da biodiversidade e sua conexão com o desenvolvimento sustentável, mas nem todos sabemos o quanto somos biodependentes. Quer dizer, não dependemos da biodiversidade apenas para obter biotecnologias de vanguarda, mas também para garantir nossas necessidades corriqueiras, como comer, beber, acender a luz, ter opções para vestir, passar na pele, curar doenças, combater pragas, garantir conforto térmico e muitos etc por aí afora (é disso que falo no blog Biodiversa, também aqui no site do Planeta Sustentável).

Pois é, para continuar a ter todas essas coisas das quais dependemos para nosso bem viver, devemos conservar a biodiversidade. E para desenhar estratégias de conservação da biodiversidade precisamos saber onde estamos e para onde vamos. É disso que trata o GBO4: de fazer um retrato de “onde estamos”, em termos de perda da biodiversidade, mirando o “para onde vamos”, com nossas iniciativas para sua conservação e os inevitáveis ajustes de rotas. Isso, acrescido de todas as complexidades envolvidas na coordenação dos esforços de 194 países signatários da Convenção de Diversidade Biológica (CDB), claro!

O super relatório GBO4 é parte do Plano Estratégico para a Biodiversidade 2011-2020. Como tal, deixa claro que as ações mais bem sucedidas são aquelas que atacam as várias causas da perda da biodiversidade, simultaneamente. Quase todos os países signatários estão fazendo suas “lições de casa”, retratadas nos relatórios nacionais, e muitos já têm bons resultados ao demonstrar a conexão entre economia e conservação. Ainda falta alterar as políticas de incentivos e integrar os valores da biodiversidade em muitos setores produtivos. Mas começam a aparecer indicadores, confirmando que este é um caminho certo a percorrer. A redução do desmatamento alcançada nos últimos anos, por exemplo, já se traduz em um ganho anual quantificado em US$ 183 bilhões, em serviços ambientais. E este é um quesito no qual o Brasil se destacou positivamente no cenário mundial (embora a tendência de queda nas taxas de desmatamento não seja tão estável quanto gostaríamos).

O uso mais eficiente dos recursos naturais é significativo, tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento. A poluição por excesso de nutrientes estabilizou-se em diversas regiões da Europa e América do Norte e cresceu o número de áreas com agricultura, pesca e manejos florestais sustentáveis e certificados, sobretudo nas zonas boreais e temperadas.  Porém, ainda preocupa o aumento do consumo em termos absolutos, seja pelo aumento populacional, seja pela melhoria do acesso a bens de consumo. E a biodiversidade continuará sofrendo perdas irreparáveis enquanto não mudarmos os padrões de consumo e não reduzirmos os desperdícios.

As boas práticas existem, estão sendo registradas. Há modelos inovadores de gestão de áreas protegidas, inclusive com o envolvimento de culturas tradicionais e comunidades locais. O combate a espécies invasoras já deu certo em algumas ilhas e áreas isoladas. Experiências de proteção e restauração ambiental se multiplicam em diferentes ecossistemas, provando ser economicamente viáveis e até rentáveis. O que falta é escala, um problema que as forças no sentido inverso – da degradação e do consumo predatório – infelizmente não têm.

Em resumo, temos, sim, boas estratégias para frear a perda da biodiversidade; para tornar nossa biodependência conhecida; para aumentar nossa eficiência e reverter os danos das espécies invasoras, da poluição, da fragmentação e das atividades prejudiciais. Mas nos faltam tempo e recursos financeiros para generalizar a adoção dessas estratégias.

Por isso é vital transformar o super relatório GBO4 em um guia para orientar ações, em lugar de colocá-lo em alguma gaveta ou para enfeitar uma prateleira qualquer. Por isso ele foi lançado no primeiro dia da COP12 e – esperamos – será lido, usado, emprestado, distribuído, reproduzido e, sobretudo, será posto em prática. Por todos nós. Só assim teremos chances reais de reduzir a fome e a pobreza; melhorar a saúde humana; assegurar estoques sustentáveis de energia, alimentos e água potável e incorporar a biodiversidade às metas de desenvolvimento sustentável.

Foto: Andreas Kay/Creative Commons/Flickr

Texto por Liana John