Em plena crise do óleo, governo federal retira diretriz de proteção para manguezal


Óleo já atinge manguezais no nordeste (Reprodução Globo)

No momento crítico vivido pelos manguezais, em meio ao derramamento de óleo no Nordeste, o governo federal fez uma alteração em um plano de proteção desses ecossistemas, o que pode fazer com que essas áreas fiquem ainda mais fragilizadas.

À revelia de pareceres contrários de seu corpo técnico, o presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão ligado ao Ministério do Meio Ambiente, publicou no último dia 30 uma alteração no Plano de Ação Nacional (PAN) para os manguezais. Foi revogado um item que previa ações para a erradicação de carcinicultura (criação de camarão em cativeiro) e a recuperação dos sistemas já afetados por estas práticas.

A mudança foi feita após pedido do secretário da Pesca, Jorge Seif Júnior – o mesmo que afirmou na última quinta-feira (31) que os peixes são inteligentes e fogem quando veem óleo e, por isso, não haveria problema em comer pescado das regiões atingidas no Nordeste. A secretaria é ligada ao Ministério da Agricultura.

Segundo o ICMBio, os PANs são instrumentos de políticas públicas que identificam e orientam ações prioritárias para combater ameaças a populações de espécies e ambientes naturais. Existem PANs para mais de 60% das espécies brasileiras ameaçadas de extinção. O documento para os manguezais foi o primeiro a contemplar todo um ecossistema.

Cada PAN conta com um grupo de assessoramento técnico (GAT), mas todos foram extintos no começo deste ano, quando o presidente Jair Bolsonaro decretou um ‘revogaço’ de todos os comitês do governo. Por isso, todos precisaram ser reeditados para o restabelecimento dos seus colegiados.

Criado em janeiro de 2015, o PAN Manguezal tinha vigência até janeiro de 2020. Ele foi republicado por meio de portaria do ICMBio em 10 de setembro nos mesmos termos da versão original. Logo na sequência, conforme apurou a reportagem, Seif Júnior entrou em contato com o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, pedindo a revogação do objetivo 9 do PAN – justamente o que estabelecia ações contra a carcinicultura. No dia 16, ele enviou um ofício formal ao presidente do ICMBio, Homero de Giorge Cerqueira, alegando que o item contraria o Código Florestal.

A lei, reformulada em 2012, considera manguezais como áreas de preservação permanente, mas permite cultivos no chamado apicum, trecho mais seco e sem árvores dos manguezais. O reportagem teve acesso à documentação do processo interno dentro do ICMBio. Houve várias manifestações técnicas das coordenações responsáveis dentro do instituto a favor do objetivo 9 e até mesmo um parecer jurídico da Procuradoria Federal especializada, reiterando a legalidade do instrumento e do objetivo.

Uma equipe de analistas de Santa Catarina, por exemplo, rejeitou a proposta, por considerar que o “PAN não é um instrumento vinculante e que o parágrafo 9 (…) não impede a atividade de carcinicultura, mas busca de fato contribuir para que os impactos negativos apontados pela literatura científica sejam minimizados por ações que fortaleçam a resiliência socioecológica do ecossistema manguezal e garantam a manutenção do modo de vida das populações tradicionais que dependem dos recursos naturais nessas áreas”.

Outro grupo de analistas pontuou que “os PANs são ferramentas que têm o papel de mobilizar esforços em prol da conservação das espécies ameaçadas e seus ambientes”. Eles lembram ainda que o alcance da ferramenta é limitado e “sua abrangência legal não permite que esta se sobreponha a outros instrumentos ou processos legalmente estabelecidos”.

Vai-e-vem

No entendimento do procurador Vinícius Vieira de Souza, os PANs “são documentos de monitoramento ambiental e proposição de medidas protetivas, voltados para a salvaguarda de espécies ameaçadas. Suas conclusões são de cunho técnico e devem contemplar sugestões de medidas a serem adotadas pelo poder público e pela coletividade para o aprimoramento da proteção ambiental. Não há vedação, assim, a que as propostas incluam, inclusive, propostas de alterações legislativas, não tendo elas, entretanto, por si só, força normativa”.

Apesar das manifestações contrárias, Cerqueira publicou, no último dia 30, nova edição do PAN Manguezal, desta vez sem o objetivo 9, atendendo ao pedido de Seif Júnior.

Por meio de nota enviada na quarta-feira (6), o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), por meio da Secretaria de Aquicultura e Pesca, disse entender “como positiva a alteração realizada, pois a publicação anterior criminalizava a atividade de carcinicultura de forma geral, igualando os que atuam de forma ilegal e irresponsável aos que a fazem de forma sustentável e legal, convivendo perfeitamente com a conservação dos manguezais conforme preconiza o Código Florestal e todos os dispositivos complementares”.

A pasta afirmou ainda que “camarões, assim como outros organismos aquáticos dependem de um ambiente saudável, o que traz a responsabilidade aos carcinicultores para a preservação do meio ambiente”. E diz que o “PAN Manguezal deve continuar com o foco de proteção aos manguezais e fiscalização ativa, permitindo efetiva proteção aos manguezais”. Na nota, o Mapa também pontuou que “é importante o equilíbrio entre uma atividade econômica e o meio ambiente, dando origem a produção de alimento saudável, gerando emprego e renda nas regiões inseridas, de forma sustentável”.

O ICMBio e o Ministério do Meio Ambiente, ao qual o órgão é vinculado, foram procurados pela reportagem, mas não se manifestaram.

Especialistas

A carcinicultura, explica a oceanógrafa Yara Schaeffer-Novelli, professora sênior da USP, é danosa para o sensível ambiente dos manguezais, que servem de berçário para diversas espécies, além de serem fonte econômica para comunidades de pescadores e marisqueiras. Yara fez parte do GAT até o começo deste ano, quando ele foi extinto. Ela fazia justamente um estudo sobre impacto da carcinicultura nos manguezais. “A exclusão desse item acaba fazendo com que esses resultados sejam jogados para debaixo do tapete.”

Segundo Yara, um dos problemas é que os manguezais são ecossistemas de usos múltiplos. “A carcinicultura acaba tirando isso. Além disso, é introduzida uma espécie exótica naquele ambiente e os despejos da água dos tanques, com alimentação dos camarões, com antibióticos vão parar no estuário”, explica.

Ela lembra ainda que a maior parte dessas fazendas de camarão está justamente no Rio Grande do Norte e no Ceará, alguns dos Estados afetados pelas manchas de óleo. Pondera também que, apesar da permissão do Código Florestal, boa parte do cultivo é ilegal e escapa dos apicuns, atingindo outras áreas dos manguezais.

Ex-presidente do Ibama na gestão Michel Temer (2016-2018), Suely Araújo explica que os PANs acabam servindo também para nortear os processos de licenciamento ambiental. É uma ferramenta usada na gestão ambiental de empreendimentos no País.

“Esses planos são usados no licenciamento quando o órgão licenciador exige do empreendedor programas para mitigar os impactos do empreendimento ou atividade em espécies ameaçadas da flora ou da fauna, conforme determina instrução normativa do Ministério do Meio Ambiente.” Por causa disso, diz ela, “decisões que reduzam a proteção explícita dos manguezais e outras áreas de grande importância ambiental merecem, no mínimo, questionamento”.

Agência Estado

Governo cobra de 11 países esclarecimentos sobre óleo


Não está descartada a possibilidade de que o episódio tenha sido causado por embarcações não oficiais (Divulgação/Agência Petrobras)

O governo federal notificou 11 países cobrando esclarecimentos sobre 30 navios mapeados dentro da investigação sobre a origem do vazamento de óleo que atingiu diversas praias do Nordeste. A informação foi dada pelo coordenador de operações navais da Marinha, almirante de esquadra Leonarndo Puntel, em entrevista no sábado (26).

A investigação conduzidA investigação conduzida pela Marinha trabalha com a tese de que o responsável teria sido um navio-tanquea pela Marinha trabalha com a tese de que o responsável teria sido um navio-tanque. A apuração inicial avaliou 1.500 embarcações e afunilou a análise para 30 veículos marinhos de 11 países. O comandante não detalhou que nações estariam neste grupo, mas disse que o requerimento pede informações para os governos para saber se têm conhecimento de algum acidente.

Os 30 navios estão entre os que passaram pela costa do Nordeste no período, identificados por fazerem comunicações por sistemas marítimos. Conforme Puntel, os investigadores calculam que o vazamento teria ocorrido no mês de agosto, com o óleo chegando às praias no fim daquele mês.

O almirante não descartou a possibilidade de que o episódio tenha sido causado por embarcações não oficiais, denominadas “dark ships”. Neste caso, contudo, a apuração será mais complexa e terá de envolver outras fontes de informação, como análise de imagens de satélite.

Puntel declarou que não é possível afirmar que o veículo era venezuelano. Mas que pesquisas da Petrobras teriam identificado o óleo como proveniente daquele país. “Laudo da Marinha concluiu que óleo não era brasileiro. O laudo da Petrobras foi além, porque tem amostras de óleos de outros países. Ele é de bacias venezuelanas. O navio a gente não sabe”, comentou.

Manchas

A coordenadora-geral de emergências ambientais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Fernanda Pirilo, afirmou na entrevista coletiva que não há novo óleo nas praias.

“Não há mais chegada de óleo novo, mas algumas praias ainda têm vestígio de óleo, temos os pontos identificados em que ainda há óleo residual, a maioria nos estados de Pernambuco e Bahia”, pontuou.

O comandante Leonardo Puntel acrescentou que a despeito da dificuldade de monitorar a evolução das manchas, dado que elas se deslocam debaixo da água a partir das correntezas marinhas, o exame realizado pelos órgãos envolvidos no grupo de acompanhamento detectou que houve um decréscimo da quantidade.

“As manchas de óleo tiveram dinâmica diferente. No início de setembro e outubro ela estava tranquila, não tinha grandes quantidades. Teve período na semana passada que houve aumento do volume no óleo na Bahia, Sergipe, Alagoas e Sul de Pernambuco. E este volume começou a decrescer agora”, observou.

A coordenadora do Ibama orientou a população dos locais a não entrar em contato com a substância. Já as condições de banho de cada praia são avaliadas pelos órgãos de saúde dos estados e municípios e devem ser verificadas juntamente a esses órgãos.

Brasília

O grupo de órgãos federais encarregados da coordenação das atividades mudou sua base para Brasília. Durante esta semana, várias autoridades do governo federal estiveram em Pernambuco. O comandante da Marinha relatou que ainda permanecem coordenações locais montadas em Recife e Salvador.

A coordenadora de emergências ambientais do Ibama acrescentou que a mudança facilita a atuação do grupo, já que aproxima seus integrantes do centro de decisão política do país. Questionada por jornalistas, ela negou dificuldades na interlocução das entidades tanto em relação ao Executivo quanto no tocante a administrações estaduais.

Agência Brasil/Dom Total

Os retrocessos no Semiárido Brasileiro


Os retrocessos no Semiárido Brasileiro, artigo de Roberto Malvezzi (Gogó)

cisterna

 

[EcoDebate] Vários retrocessos vieram junto com o governo interino desde o primeiro dia. Um ministério do tempo do Brasil Império – só homens de bens e brancos, sem negros, mulheres e indígenas -, o anúncio do corte na saúde, na educação, encolhimento do SUS, desvinculação do salário dos aposentados em relação ao salário mínimo, eliminação do MINC, daí prá frente.

Dentre esses retrocessos os que mais impactam o Semiárido são o da educação, saúde e a desvinculação do salário mínimo, do qual dependem aproximadamente 100 milhões de brasileiros.

Porém, há retrocessos que o Brasil em geral não vê, a não ser nós que moramos por aqui, na busca de vida melhor para a população nordestina que sempre esteve à margem dos avanços brasileiros.

O paradigma da “convivência com o Semiárido”, ganhou carne com os programas “Um Milhão de Cisternas” (P1MC) e o Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), da ASA. O primeiro visando a captação da água de chuva para beber e o segundo para produzir.

Em aproximadamente 15 anos 1 milhões de famílias recebeu a cisterna para beber e cerca de 160 mil famílias uma segunda tecnologia para produzir. É lindo, até emocionante, quando em plena seca vemos espaços tomados de verde com hortaliças ao redor de uma cisterna de produção. Essas tecnologias ainda teriam que ser replicadas ao milhões para garantir a água para beber e produzir, ofertada gratuitamente pelo ciclo das chuvas.

Junto com esses programas veio a expansão da infraestrutura social da energia, adutoras simples, telefonia, internet, melhoria nas habitações rurais, estradas, etc.

A valorização do salário mínimo e o Bolsa Família injetaram dinheiro vivo nos pequenos municípios, movimentando o comércio local, o maior beneficiário desses programas.

Houve também contradições profundas, como a opção pela mega obra da Transposição de Águas do São Francisco ao contrário de adutoras simples e a implantação das cisternas de plástico por Dilma no seu último governo. Além do mais, ela estava encerrando o programa de cisternas para beber, alegando que já tinha atingido o número de famílias necessitadas.

Detalhe, o ministro para o qual ela liberou as cisternas de plástico, orientou o filho para votar contra ela na Câmara dos Deputados e agora ele é ministro das Minas e Energia.

Mas, esse avanço pressupôs a organização da sociedade civil articulada na ASA e a chegada ao poder de governos estaduais menos coronelísticos e corruptos. Sobretudo, supôs o apoio do governo federal a esses programas da sociedade civil.

Acabou. Se perguntarem ao atual presidente onde fica o Semiárido Brasileiro, é provável que ele diga que fica no Marrocos. Como não tem base na região, vai entrar pelas mãos dos velhos coronéis ou de seus descentes.

Não é possível destruir a infraestrutura construída. Ela tornou o Semiárido melhor, sem fome, sem sede, sem migrações, sem mortalidade infantil. Mas, há muito ainda a ser construído para não haver mais retorno ao ponto da miséria. Uma delas é a geração de energia solar de forma descentralizada, a partir das casas. Dilma não quis dar esse passo.

Os velhos problemas poderão voltar? No que depender das políticas públicas federais, sem dúvida nenhuma. Quem está no poder não enxerga o Semiárido.

Tempos estranhos, quando setores da sociedade brasileira preferem retroceder aos tempos da miséria total e parte da população se alegrar com esses retrocessos.

Roberto Malvezzi (Gogó), Articulista do Portal EcoDebate, possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Atua na Equipe CPP/CPT do São Francisco.

 

in EcoDebate, 19/05/2016

Governo não prorrogará prazo para lei que extingue lixões


            

A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, afirmou no final do mês de Julho (31) que o governo federal não determinará a prorrogação do prazo para o início da aplicação da lei que proíbe o uso de lixões no país. Mais de metade dos municípios do país não tomaram as medidas necessárias para cumprir a determinação, que é conhecida como Política Nacional de Resíduos Sólidos. O prazo de adequação venceu no dia 2 de Agosto.

A lei foi sancionada em 2010 e determina que as prefeituras deveriam ter concluído, até a data estabelecida (02 de Agosto), a destinação adequada para o lixo que não possui qualquer possibilidade de reaproveitamento. Entre as medidas possíveis estão a construção de aterro sanitário ou a incineração com baixo impacto ambiental. Sem o cumprimento da lei, os municípios ficam sujeitos a multas e ações na Justiça por crime ambiental.

“O governo entende que o assunto é tão importante que não se trata de prorrogar prazo. A decisão é manter prazo e nos colocarmos à disposição do Congresso para manter o diálogo”, disse Izabella Teixeira. De acordo com a ministra, o governo federal irá se reunir, no próximo dia 22, com autoridades do Ministério Público Federal nos estados para decidir soluções para o caso de municípios que estão descumprindo a nova norma.

De acordo com Ministério do Meio Ambiente (MMA),somente 2.202 municípios, de um total de 5.570, estabeleceram medidas para garantir a destinação adequada do lixo que não pode ser reciclado ou usado em compostagem. Em alguns estados, como Roraima, o Ministério Público tem questionado as ações que estão sendo pelo governo local para o cumprimento da lei.

A ministra evitou falar que os municípios que não cumprem a lei estão em situação irregular. Eles correspondem a cerca de 60% do total dos municípios do país, mas produzem o equivalente a aproximadamente 40% do volume de lixo, segundo o MMA. “Esses [mais de] 3.000 municípios estariam, não sei se irregulares. [Estariam] em situação de questionamento”, disse a ministra.

Recursos disponíveis – O MMA informou que nos últimos quatro anos foram disponibilizados R$ 1,2 bilhão para que estados e municípios realizassem o planejamento das ações e iniciassem medidas para se adequarem à nova legislação de resíduos sólidos. No entanto, segundo Izabella Teixeira, cerca de 50% foi efetivamente aplicado, devido ao que ela chamou de “dificuldades operacionais”.

 

A ministra explicou que, em alguns casos, municípios deixaram de acessar os recursos de investimento na aplicação da lei por terem não terem apresentado um projeto executivo. Em outras ocasiões, a liberação foi suspensa devido à má aplicação.

“São situações de incapacidade técnica de municípios, incapacidade de acessar recursos. Há situações, inclusive, que podem ser resolvidas entendendo melhor a integração dos planos municipais”, declarou Izabella. “O que temos visto é intenção de construir soluções. Há uma grande preocupação de prefeitos em resolver isso, porque ninguém quer ter problema ambiental”, completou.

Pela Política Nacional de Resíduos Sólidos, as autoridades que desobedecem as determinações previstas na norma ficam submetidas a punições previstas na lei de crimes ambientais, que inclui multas que variam de R$ 5 mil a R$ 50 milhões. Atualmente, somente três estados possuem plano de resíduos sólidos: Ceará, Maranhão e Rio de Janeiro. O ministério não divulgou o total de municípios que já têm o plano definido.

Fonte: G1; Ambiente Brasil; www.rj.gov.br

Laísa Mangelli