Dia internacional da Água: Água fonte de vida ou de lucro?


Neste dia mundial da água, convém fazermos pequena reflexão sobre o que ela significa e as ameaças que pesam sobre esse bem tão vital. Pois a questão da água potável constitui um dos maiores problemas da humanidade, tão grave quanto o aquecimento global. Consideremos  os dados básicos acerca da água. Ela é extremamente abundante e simultaneamente extremamente escassa.

Existe cerca de um bilhão e 360 milhões de km cúbicos de água na Terra. Se tomarmos toda essa água que está nos aceanos, lagos, rios, aquíferos e calotas polares e distribuissemos equitativamente sobre a superfície terrestre, toda a Terra ficaria mergulhada na água a três km de profundidade. 97% é água salgada e  3% é água doce. Mas somente 0,7% desta é diretamente acessível ao uso humano.

 

A renovação das águas é da ordem de 43 mil km cúbicos/ano, enquanto o consumo total é estimado em 6 mil km cúbicos/ano. Há, portanto, superabundância de água mas desigualmente distribuída: 60%  se encontra em apenas 9 países, enquanto 80 outros enfrentam escassez. Pouco menos de um bilhão de pessoas consome 86% da água existente enquanto para 1,4 bilhões é ela insuficiente (em 2020 serão três bilhões) e para dois bilhões, não é tratada, o que gera 85% das doenças constatáveis.. Presume-se que em 2032 cerca de 5 bilhões de pessoas serão afetadas pela crise de água.

 

O problema não é a escassez de água mas sua má gestão para atender as demandas humanas e dos outros seres vivos da natureza.

 

O Brasil é a potência natural das águas, com 13% de toda água doce do Planeta perfazendo 5,4 trilhões de metros cúbicos. Apesar da abundância, 46% dela é desperdiçada, o que daria para abastecer toda a França,  a Bélgica, a Suíça e o Norte da Itália.

 

Por ser um bem cada vez mais raro, ela é objeto da cobiça daqueles que querem fazer dinheiro com ela. Por isso nota-se uma corrida mundial para a privatização da água. E então surge o dilema:

 

A água é fonte de vida ou fonte de lucro? É um bem natural, vital e insubstituível ou um bem econômico e uma mercadoria?

 

Os que apenas visam lucro, tratam a água como mercadoria e no máximo como recurso hídrico. Os que dão centralidade à vida, como a maior criação do universo e o supremo dom de Deus, a vêem como bem essencial aos seres humanos e a todos os organismos vivos.

 

O direito sagrado à vida implica o direito à água potável gratuita. Mas pelo fato de haver custos na sua captação, no seu tratamento, distribuição, uso e reuso existe inegável dimensão econômica. Mas isso não justifica que ela se transforme em fonte de lucro. Os custos não podem invalidar o direito. Os custos devem ser cobertos pelo poder público e pela a sociedade com fundos destinados ao acesso universal de água doce.

 

Há de se questionar a expressão “água como recurso hídrico”. Ela, propriamente, não é recurso. É patrimônio natural que herdamos e que devemos preservar para todos os seres vivos atuais e futuros. Água é vida. Por isso os cientistas buscam água em Marte, porque sabem, se existe água lá, estão dadas todas as condições para a vida, por mais rudimentar que seja.

 

Quando falamos em água como vida ressoam em nós outros valores como vida, fecundidade, purificação, renascimento. Todos estes temas estão presentes nas religiões que transformaram a água num dos símbolos fundamentais de Deus,  e nós cristãos de Cristo e da vida eterna.

 

A água tem imenso valor mas não tem preço. Para garantir água para todos faz-se mister uma ética do cuidado de suas fontes, das matas ciliares junto aos rios e de sua purificação. Por ser desigualmente distribuida na natureza, o direito  de todos à água demanda uma ética da solidariedade na sua distribuição. E para que não haja  disperdício precisamos de uma ética da responsabilidade; o que jogamos fora fará falta a outros.

 

Se houver cuidado, solidariedade e responsabilidade a Terra será generosa e garantirá água abundante para todos e de qualidade.

 

*Leonardo Boff é filósofo e teólogo, escritor, assessor do projeto Cultivando Agua Boa da Itaipu Binacional  e um dos co-redatores da Carta da Terra

Fonte: Leonardo Boff.wordpress

Fotos: Marcos Amend via Agenda Sustentabilidade

Cada gota conta: o valor da gestão responsável da água


Cada gota conta: o valor da gestão responsável da água (© FSC GD)

© FSC GD

Ao passar pelo Dia Internacional das Florestas, reconhecemos o trabalho de manutenção de todo um ecossistema florestal, além de apenas as árvores. O Diretor Geral do FSC®, Kim Carstensen, explica como a água pode ser cultivada e gerida por gestores de florestas para o benefício do ser humano, da vida vegetal e animal.


Neste ano, o Dia Internacional das Florestas chamou a atenção sobre a importância da água. No FSC, consideramos a água como uma parte importante do manejo florestal responsável. Sem ela, nenhuma árvore jamais poderia crescer. Na verdade, nenhuma vida poderia ser sustentada. Os benefícios da água excede a floresta também: você sabia que um terço das maiores cidades do mundo obtém uma parte significativa da sua água potável diretamente de áreas florestais?

Fonte de vida para todas as coisas, a água é o bem mais precioso de qualquer floresta. Florestas agem como reservatórios naturais e purificadores de água, mas para manter a prosperidade há uma necessidade real de que haja o tipo certo de intervenção humana.
A boa notícia é que o abastecimento de água pode ser gerenciado tão cuidadosamente quanto qualquer árvore na floresta. Para as pessoas que vivem e trabalham nas florestas, esta é uma habilidade vital que merece ser reconhecida.

Considere, por exemplo, a necessidade de proteger os cursos de água, para que a água possa fluir através da floresta, sem perturbação em direção às comunidades que dependem dela. Ou, considere a necessidade de documentar o fornecimento de água limpa medindo os níveis de pureza da água ao longo do tempo. Tudo isso é um trabalho contínuo e desafiador, e agora centenas de gestores e comunidades florestais estão fazendo isso.

Boas práticas gratificantes

Em 2011, o FSC lançou o projeto ForCES com a ONU. Hoje, em 2016, estamos preparando as ferramentas que descrevem como esses "serviços ecossistêmicos", incluindo a água, podem ser medidos e mantidos.

Como parte do nosso trabalho é manter os serviços dos ecossistemas florestais, queremos incentivar os proprietários de terras e gestores florestais para manter os ativos florestais não-madeireiros, como a água, carbono, alimentos e solo. Ao fazer isso, acreditamos que o verdadeiro valor das florestas será mais bem refletido. E para os proprietários e gestores florestais, estas atividades trarão novos fluxos de receita.

De onde vem o dinheiro vem? Com os serviços ecossistêmicos, os pagamentos são feitos pelos beneficiários imediatos, principalmente empresas e governos que desejam proteger os ecossistemas contra a degradação do solo ou de catástrofes naturais. É um processo que considera o verdadeiro valor das florestas e garante que o trabalho necessário para mantê-las não se torne um impasse.

Não devemos entender que a nossa água está garantida, e do ponto de vista do FSC, a gestão deste recurso é uma parte central da nossa missão.

Fonte: FSC Internacional – adaptado

Casos de contaminação da água são mais comuns do que se conhece


Entrevista especial com Ricardo Hirata

      

“Há ainda várias contaminações que carecem de estudos, como o nitrato em grandes cidades, fertilizantes e agroquímicos nas zonas rurais e solventes clorados em áreas industriais”, destaca o diretor do Centro de Pesquisa de Águas Subterrâneas.

 
 

A grave crise de abastecimento de água que vem assolando aregião metropolitana de São Paulo chamou a atenção do País para um problema que vinha sendo anunciado há muito tempo. A crescente demanda hídrica, seja para o fornecimento de eletricidade, seja para o consumo ou para a produção industrial, aumentou a níveis muito superiores do que as alternativas tradicionais são capazes de suprir.

Falar em desertificação talvez seja um exagero. No entanto, o fato obrigou governos e especialistas a buscarem alternativas para o abastecimento, e uma delas é o uso de águas subterrâneas. Para o diretor do Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas – CepasRicardo Hirata, enquanto países da Europa e da América do Norte são fortemente dependentes das águas subterrâneas, no Brasil seu uso ainda é tímido frente à potencialidade de aproveitamento.

Em entrevista concedida por e-mail à IHU On-LineHirata defende que o uso da água subterrânea de forma mais ampla e integrada aos demais recursos hídricos é uma solução que vem chamando atenção do mundo inteiro. “Isso é particularmente verdade quando analisamos que as cidades que são abastecidas por mais de um recurso de forma integrada e inteligente são mais resilientes a problemas de longos períodos de estiagens, como os observados hoje em São Paulo”, destaca.

No entanto, esta alternativa deve ser bem estudada e medidas de suporte devem ser tomadas para permitir sua viabilidade. Isto porque, ainda que institutos de pesquisas como o próprio Cepas analisem a qualidade destas águas subterrâneas, Hirata reconhece: há muito menos casos de contaminação conhecidos do que a realidade apresenta. “Há ainda várias contaminações que carecem de estudos, como o nitrato em grandes cidades, fertilizantes e agroquímicos nas zonas rurais e solventes clorados em áreas industriais”, destaca o diretor.

O nitrato é um contaminante pouco tóxico, mas muito insidioso nas águas subterrâneas. É possível afirmar que quase todas as cidades do país sofrem em algum grau desse problema, advindo de vazamento da rede pública de esgoto ou da sua ausência, quando a população faz uso de fossas negras. O grande problema é que em áreas onde há algum monitoramento da qualidade das águas subterrâneas, vê-se que as concentrações estão aumentando persistentemente. Resolver esse problema que atinge áreas tão grandes é difícil e caro.

Alternativas de tratamento da água também são caras, e em algumas cidades, como Natal (RN), a solução tem sido de mesclar as águas contaminadas com águas de outras fontes, sem nitrato.

Foto: Cecília Bastos/Jornal da USP

Ricardo Hirata é geólogo formado pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP, com mestrado e doutorado na Universidade de São Paulo – USPe pós-doutorado na Universidade de Waterloo, no Canadá. Atualmente é professor do Instituto de Geociências da USP e Diretor do Cepas.

Hirata atua ainda como consultor da Unesco e de diversas outras organizações sobre o tema hídrico.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Com a crise de abastecimento em São Paulo, fala-se em possíveis riscos de desertificação, como de extermínio das reservas hídricas existentes no subsolo. Esse risco existe de fato? Em que proporção, no atual momento?

Ricardo Hirata – É um exagero pensar que temos risco de desertificação de parte do Estado de São Paulo. A crise da água é muito mais um descompasso entre a produção da água e a demanda. Ou seja, as concessionárias públicas, sobretudo a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – SABESP, não se prepararam adequadamente para eventos climáticos dessa natureza, embora os hidrólogos e outros especialistas tenham previsto que eles poderiam ocorrer. A desertificação existe em outras áreas, mas não há riscos na Região Metropolitana de São Paulo.

IHU On-Line – A partir da sua experiência de trabalho em outros países, é possível fazer comparações entre os recursos hídricos e as águas subterrâneas brasileiras com a de outros locais do mundo, tanto em relação ao atual quadro das águas subterrâneas quanto às políticas públicas desenvolvidas para garantir a qualidade dos recursos hídricos?

Ricardo Hirata – Muitos países da Europa e da América do Norte são fortemente dependentes das águas subterrâneas, assim como na Ásia, onde há milhões de poços fornecendo água para a agricultura e para as cidades. No Brasil o uso ainda é pequeno (frente à potencialidade), mas estima-se que 53% dos municípios se abastecem total ou parcialmente do recurso subterrâneo. O uso privado, geralmente complementar à rede pública, faz o diferencial da água subterrânea, embora não apareçam nas estatísticas. Há centenas de milhares de poços pelo Brasil participando da economia e fornecendo água de boa qualidade para os usuários, e em alguns lugares sendo a única alternativa econômica.

 

“Muitos países da Europa e da América do Norte são fortemente dependentes das águas subterrâneas, assim como na Ásia”

Mas o mundo tem acordado para o uso da água subterrânea de forma mais ampla e mais integrada aos demais recursos disponíveis para o abastecimento de uma cidade ou um empreendimento. Isso é particularmente verdade quando analisamos que as cidades que são abastecidas por mais de um recurso de forma integrada e inteligente são mais resilientes a problemas de longos períodos de estiagens, como os observados hoje em São Paulo. Assim, cidades como Madri, que se abastece de água superficial e subterrânea, sofrem menos com as secas.

 

Os países europeus e norte-americanos, com maior tradição na gestão dos recursos hídricos, possuem leis que têm funcionado de forma adequada. O Brasil está apenas iniciando esse processo. O país tem avançado muito nos últimos anos, mas ainda são as águas subterrâneas a parte mais frágil da gestão dos recursos. Como o recurso hídrico subterrâneo é de competência dos estados, há ainda diferenças significativas entre as Unidades da Federação, mas em todas elas ainda há uma grande quantidade de poços ilegais e vários problemas de contaminação de solo e aquíferos que ainda estão para ser estudados, inclusive avaliando os impactos na população e na ecologia.

IHU On-Line – Quais são as principais constatações do Centro de Pesquisa de Águas Subterrâneas – Cepas e do Instituto de Geociências da USP em relação à contaminação da água?

Ricardo Hirata – Acreditamos que o número de casos conhecidos de contaminação das águas subterrâneas e dos solos pelas agências ambientais seja imensamente menor do que os casos existentes. Há ainda várias contaminações que carecem de estudos adequados, como o nitrato em grandes cidades, fertilizantes e agroquímicos nas zonas rurais e solventes clorados em áreas industriais e, sobretudo, em aquíferos profundos fraturados. Em paralelo, ainda estamos começando a descontaminar os aquíferos, e nos faltam técnicas adequadas e adaptadas às condições climáticas e geológicas brasileiras. Ou seja, há muito que fazer, e as universidades e centros de pesquisas ainda não estão respondendo à altura das reais necessidades da sociedade.

IHU On-Line – Quais são as implicações da presença de nitrato na água a ser consumida pela população?

Ricardo Hirata – O nitrato é um contaminante pouco tóxico, mas muito insidioso nas águas subterrâneas. É possível afirmar que quase todas as cidades do país sofrem em algum grau desse problema, advindo de vazamento da rede pública de esgoto ou da sua ausência, quando a população faz uso de fossas negras. O grande problema é que em áreas onde há algum monitoramento da qualidade das águas subterrâneas, vê-se que as concentrações estão aumentando persistentemente. Resolver esse problema que atinge áreas tão grandes é difícil e caro. Alternativas de tratamento da água também são caras, e em algumas cidades, como Natal (RN), a solução tem sido mesclar as águas contaminadas com águas de outras fontes, sem nitrato.

IHU On-Line – Segundo notícias da imprensa, com base numa pesquisa da USP, aproximadamente 75% das cidades paulistas têm abastecimento de água público feito por águas de aquíferos. O senhor confirma essa informação? O que esse dado representa?

Ricardo Hirata – Sim, o estado de São Paulo é dependente das águas subterrâneas para o abastecimento público nessas proporções. Quando consideramos a população em números absolutos, vemos que 36% da população é abastecida pelas águas subterrâneas.

Adicionalmente, há dezenas de milhares de poços que suprem o usuário privado. A maioria das indústrias e grandes empreendimentos têm poços que servem ao abastecimento adicional e complementar à rede pública. É importante dizer que muitos desses poços ainda são ilegais e desconhecidos dos órgãos gestores, dificultando uma avaliação do real papel que essas águas desempenham na sociedade e na economia do estado.

Veja a Região Metropolitana de São Paulo, que tem o abastecimento público baseado em sistemas de água superficial. Por ano são perfurados mais de mil poços, fornecendo mais de 0,8 m3/s, sem nenhum investimento do poder público. Essa água está aliviando as pressões do sistema público hoje deficitário. No total, temos mais de 10 m3/s extraídos dos aquíferos. É o terceiro maior manancial de água da região, disperso entre 12 mil poços nas mãos da iniciativa privada. Se não fosse a presença desses poços no abastecimento complementar, o sistema público de água já estaria em crise há muito tempo.

IHU On-Line – O senhor concorda com especialistas, que afirmam não haver solução de curto prazo para solucionar a questão do abastecimento de água em São Paulo?

Ricardo Hirata – Todos os sistemas de abastecimento, sejam eles para fornecer água para uma casa ou uma cidade, têm riscos de um dia falhar. Cabe aos tomadores de decisão fazer com que esses riscos sejam mínimos. Em sistemas apoiados em água superficial, os riscos são avaliados estatisticamente baseados no histórico de chuvas de uma região, pois estão associados à intensidade de chuvas que alimentam os reservatórios. Claro que para serem mínimos, precisamos de investimentos para aumentar a produção e/ou reduzir a demanda.

O que houve em São Paulo é que esses riscos foram negligenciados. Estudos mostravam que havia riscos pequenos de secas dessa magnitude. Optou-se por não investir na melhora do abastecimento, em detrimento a outros investimentos de governo. O problema é ainda pior, pois faltou a esses tomadores de decisão uma avaliação correta dos prejuízos que a falta desse investimento na produção de água traria à região. Mas também faltou um plano de contingência. Ou seja, um conjunto de ações coordenadas sobre o que fazer caso determinado problema de estiagem ocorresse. Faltou pesar tudo isso e dizer à população: há um risco pequeno, podemos arriscar? Quais são as perdas? É aceitável? Isso é gestão do recurso hídrico. Hoje fomos todos surpreendidos.

“Em algumas cidades, como Natal (RN), a solução tem sido de mesclar as águas contaminadas por nitrato com águas de outras fontes”

IHU On-Line – Em que medida investimentos em saneamento básico poderiam garantir uma melhora na qualidade da água subterrânea?

Ricardo Hirata – Há uma forte correlação entre a falta de redes de esgoto ou redes antigas de esgoto e a contaminação das águas subterrâneas. Ter redes novas, feitas de tubos de plástico, e com boa manutenção é fundamental para reduzir a contaminação de nitrato em aquíferos urbanos. Aliás, recomendamos que, em qualquer novo empreendimento urbano, a rede de esgoto chegue antes da população, evitando assim a contaminação dos aquíferos e garantindo que a nova população possa inclusive fazer uso dessas águas subterrâneas. A falta de saneamento traz também outro problema de contaminação dos rios, reduzindo a oferta de água de superfície. A falta de saneamento faz com que os rios sejam perceptivamente feios, dando a ideia do “mal cuidado”, não cria o valor do cuidar, que o cidadão deve ter, além, obviamente, da redução da vida aquática, etc.

Por Patricia Fachin e Andriolli Costa

Água: bem universal ou privilégio de poucos?


“O acesso à água deve ser universal, para todas as pessoas, independente de qualquer aspecto financeiro ou de privilégio”

Por Roberta Romão

Há alguns anos, a ciência afirmava que o ciclo da água que ia da terra para a atmosfera em forma de vapor e retornava como chuva seria eterno. O problema é a não existência de uma purificação neste processo, uma vez que a chuva ácida se mantém no ambiente. Passa-se a pensar, então, que este recurso natural é finito, uma vez que a poluição compromete sua qualidade.

Além disso, estamos enfrentando um período longo de seca em São Paulo, o pior em 84 anos. O Sistema Cantareira está com 13,8% de sua capacidade, isso considerando o Volume Morto, visto por alguns como impróprio.

“O volume morte é destinado a sedimentação de partículas em suspensão, visando garantir uma melhor qualidade de água do volume útil, logo, a qualidade de sua água é inferior a do volume útil. A captação de água do volume morto para consumo humano precisa estar associada também ao biomonitoramento e não apenas a aplicação de procedimentos de controle e de vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade”, afirma Roberta Baptista Rodrigues, professora de Engenharia Ambiental e Sanitária e de Engenharia Civil da Universidade Anhembi Morumbi.

Em abril, o Consumidor Consciente apresentou algumas dicas sobre como economizar no consumo de água e em que interfere a compra de itens com tecnologia voltada à sustentabilidade. E falamos também sobre o relatório final do Plano da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê, produzido pela Fundação de Apoio à USP em 2009. Ele destacava que o Cantareira tinha um “déficit de grande magnitude” e aconselhava que medidas fossem tomadas para evitar seu colapso.

 Mas como não nos preparamos, cabe, agora, mudar atitudes. “A sensibilização das pessoas é uma ação preponderante na busca pelo uso eficiente da água. Disseminar o conhecimento sobre atos cotidianos mais eficientes, assim como de tecnologias e soluções de fato comprovadamente mais sustentáveis, certamente poderia ser uma ação importante do poder público, através do desenvolvimento de campanhas para o engajamento das pessoas para o tema”, afirma o engenheiro MSc. Osvaldo Barbosa de Oliveira Junior, do setor de Engenharia de Aplicação Deca.

Osvaldo cita como exemplo a quantidade de água que cada um consome e qual seria o ideal. Como comparação e informação, a média de consumo hoje nos apartamentos em São Paulo varia entre 150 a 200 litros de água por pessoa por dia, e poderia chegar a cerca de 120 litros de água por pessoa por dia. “Resta buscar o engajamento de todos e a sensibilização para o tema, de forma a utilizar a água de maneira mais eficiente em nosso cotidiano, até mesmo nas atividades mais simples”.

Utilização de outros mananciais
O governador Geraldo Alckmin disse que o estado planeja a interligação entre os reservatórios Atibainha e Jaguari. Porém, o engenheiro Osvaldo comenta que tanto o rio Atibainha quanto o reservatório Atibainha fazem parte do sistema Cantareira, e portanto sua utilização já é crítica.

“Entretanto, mesmo em se tratando do volume final restante, também denominado “volume morto”, não deve haver maiores complicações quanto a qualidade da água, pois os sistemas de tratamento de água estão preparados para adequar a água a ser tratada aos padrões de potabilidade exigidos por Lei”.

Ainda segundo Osvaldo, o uso de qualquer novo manancial deve ser exaustivamente avaliado, “pois a transposição de águas entre bacias e mesmo a exploração de águas subterrâneas geram impactos relevantes para as pessoas que habitam as regiões próximas a estes mananciais. Portanto, uma avaliação técnica precisa deve ser desenvolvida, avaliando-se a disponibilidade hídrica das regiões e utilizando este dado como diferencial estratégico na idealização das ações necessárias”.

Rodízio
Em janeiro, a Sabesp entregou um plano de rodízio de água na região da Grande São Paulo, recomendado pelo Ministério Público Federal, mas descartado pelo governador do estado, Geraldo Alckmin. Umas das alternativas que constam no documento é o rodízio de 48 horas com e 24 horas sem água.

“Do ponto de vista técnico, esta é uma solução que deve ser evitada ao máximo, dado possíveis riscos de contaminação da rede. Ao se paralisar o abastecimento, ocasionando o esvaziamento das tubulações, pode ocorrer o ingresso de material indesejado nesta tubulação vazia, visto que nossas redes não são totalmente estanques, podendo gerar contaminação”, explica Osvaldo.

“Vale ressaltar que as concessionárias detém grande conhecimento sobre o assunto, e deverão minimizar estes riscos com métodos adequados para a aplicação de um possível rodízio, dado o extenso arcabouço legal que requisita da concessionária a garantia na qualidade da água de abastecimento”.

Com o programa de bônus lançado em fevereiro e a redução da pressão da água durante a noite, medidas do Plano de Contingência 2, o Sistema conseguiu uma economia de 8.400 litros por segundo no mês de junho. “Assim, pelo poder público, o ideal no momento seria dar enfoque à disseminação de informações sobre o assunto, além de estudos de contingência sobre possíveis fontes alternativas de abastecimento”, opina Osvaldo.

Bônus e multa
O governador Geraldo Alckmin desistiu de aplicar multa aos consumidores que aumentarem o consumo de água devido ao número de pessoas que conseguiram diminuí-lo. De acordo com a Sabesp, até 23 junho, 87% dos clientes abastecidos pelo Sistema Cantareira haviam reduzido o consumo, dos quais 55% atingiram a meta de 20% de economia e receberam 30% de desconto na fatura.

Osvaldo cita os edifícios verticais residenciais antigos, que foram projetados com várias entradas de água nos apartamentos, dificultando uma possível medição do consumo de cada unidade. No final da década de 90 e início dos anos 2000, iniciativas do poder legislativo, em nível estadual e federal, buscaram obrigar à instalação de medidores individuais também nos apartamentos, e não somente em casas.

“Com as primeiras obras finalizadas e os primeiros apartamentos sendo utilizados, ficou claro que o consumo, em geral, é bastante elevado, dado que os apartamentos têm uma condição de pressão e vazão muito melhor que uma casa térrea. Com isso, as primeiras contas recebidas sempre geraram descontentamento e até mesmo indignação, pois as pessoas não esperavam que fossem gastar tanto. Entretanto, imediatamente após a constatação de que realmente gastavam muito, e poderiam economizar, a procura por produtos e tecnologias para redução do consumo em condomínios foi enorme”.

Como exemplo, o engenheiro cita um estudo da Poli-USP em Guarulhos que mostrou que, em uma mesma região, para edifícios similares, aqueles que dispunham de medição individualizada gastavam em média 17% menos água do que aqueles que não possuíam este tipo de tecnologia.

“Portanto, além dos fatores sensibilização e conhecimento já citados, o fator financeiro deve ser levado em consideração, com a aplicação não somente de bônus, mas também de multas. Entretanto, para isso, a metodologia para se atribuir o bônus e a multa deve também ser disseminada e entendida pela população, pois esta ação deve ter uma caráter muito mais educativo do que punitivo”.

Crédito da imagem: Portal Rádio Regional de Ipu.

Fonte: Consumidor Consciente

Contaminantes emergentes na água: Entrevista especial com Wilson Jardim


“Verificamos que as capitais costeiras apresentaram uma água de abastecimento de melhor qualidade quando confrontadas com águas de capitais localizadas no interior do país. Uma das explicações para este fato seria que as capitais costeiras lançam seu esgoto no mar, impactando bem menos os mananciais”, diz o pesquisador.

 

 

Análise recente da água de 20 capitais brasileiras demonstra que há altos índices de contaminantes emergentes, substâncias “não legisladas”, presentes na água utilizada para consumo. Entre os contaminantes, foram encontrados fármacos, produtos de higiene pessoal, hormônios naturais e sintéticos, agentes antichamas, protetores solares, nanomateriais e pesticidas.

 

O coordenador da pesquisa,Wilson Jardim, professor do Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, explica que existem mais de mil substâncias que se encaixam nessa categoria e que, “nas últimas décadas, por uma série de fatores, como padrão de consumo, falta de saneamento e adensamento populacional, entre outros, aumentaram sua concentração no ambiente e podem fazer com que a exposição humana a elas seja preocupante”.

 

 

Jardim assinala que ainda não é possível identificar como os contaminantes emergentes afetam o equilíbrio do sistema hormonal dos seres vivos e essa falta de informação é“preocupante”, porque já foram identificados casos de mudanças hormonais em algumas espécies. “Há inúmeras evidências relatando a feminização de peixes e répteis em rios que recebem cargas elevadas de esgoto sanitário.

 

Por outro lado, em seres humanos, há um número crescente de casos de câncer em testículo, na tireoide, na mama em mulheres jovens, diminuição do número de esperma em homens férteis, má formação genital, e isso tem chamado a atenção da Organização Mundial de Saúde – OMS. O fato é que este crescimento não pode ser explicado apenas pela genética e, portanto, deve haver outro fator”, aponta, na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail.

 

Na avaliação do pesquisador, os dados da pesquisa revelam que grande parte dos mananciais brasileiros está “criticamente impactada com o lançamento de esgoto sanitário”.

 

E acrescenta: “O Brasil tem um saneamento deplorável, totalmente incompatível com uma economia que se situa entre as dez maiores do planeta. Isso exige muito das estações de tratamento de água, que ainda usam um processo secular e que não estão preparadas para tratar uma água de péssima qualidade, muito embora o preço das tarifas seja elevado”.

 

Wilson Jardim é graduado em Química pela Universidade Federal de São Carlos e doutor em Ciências Ambientais pela University of LiverpoolInglaterra. Atualmente é professor titular do Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas, onde desenvolve pesquisas na área de química ambiental, processos oxidativos avançados, remediação de áreas contaminadas, contaminantes emergentes em águas, fotocatálise, desinfecção de atmosferas internas e externas e ciclo do mercúrio na Amazônia.

 

Confira a entrevista.

 

Foto: Unicamp


IHU On-Line – O que são os contaminantes emergentes encontrados na água de 20 capitais brasileiras? Pode nos contar como ocorreu o processo de identificação dos contaminantes na água? Quais foram os contaminantes encontrados nas águas brasileiras?

Wilson Jardim – Contaminantes Emergentes – CE são substâncias não legisladas e que nas últimas décadas, por uma série de fatores, como padrão de consumo, falta de saneamento e adensamento populacional, entre outros, aumentaram sua concentração no ambiente e podem fazer com que a exposição humana a elas seja preocupante.

 

Dentre os CE podemos citar os fármacos, produtos de higiene pessoal, hormônios naturais e sintéticos, agentes antichamas, protetores solares, nanomateriais, pesticidas e inúmeros outros. Dentre as mais de mil substâncias que se encaixam na definição de CE, nós trabalhamos com os hormônios naturais e sintéticos (como o da pílula anticoncepcional), alguns fenóisftalatosatrazinabisfenol-Atriclosan e cafeína. Nosso banco de dados mostrou que a cafeína é um excelente indicador da atividade estrogênica nas águas naturais e de abastecimento.

 

Assim, muito embora a cafeína não seja um problema nas concentrações em que ocorre tanto na água de abastecimento como em mananciais, ela é um indicador da qualidade dessas águas. Desse modo, focamos o trabalho em quantificar a cafeína, muito embora tenhamos encontrado atrazina, bisfenol-A e triclosan.

 

"Apenas no início dos anos 1990, quando o Ministério Público começou a exigir que as concessionárias fizessem seu dever em tratar esgoto, é que o cenário mudou"

IHU On-Line – Porto Alegre é a capital em que o índice de contaminantes é mais elevado. Em contraposição, Fortaleza é a que possui o percentual mais baixo. É possível identificar as razões e diferenças desses resultados?

 

Wilson Jardim – Verificamos que as capitais costeiras apresentaram uma água de abastecimento de melhor qualidade quando confrontadas com águas de capitais localizadas no interior do país. Uma das explicações para este fato seria que as capitais costeiras lançam seu esgoto no mar, impactando bem menos os mananciais.

 

 

IHU On-Line – Como e em que medida o equilíbrio do sistema hormonal dos seres vivos tem sido alterado pelos contaminantes presentes na água?

Wilson Jardim – Não sabemos, e isso é preocupante. Há inúmeras evidências relatando a feminização de peixes e répteis em rios que recebem cargas elevadas de esgoto sanitário. Por outro lado, em seres humanos, há um número crescente de casos de câncer em testículo, na tireoide, na mama em mulheres jovens, diminuição do número de esperma em homens férteis, má formação genital, e isso tem chamado a atenção da Organização Mundial de Saúde – OMS. O fato é que este crescimento não pode ser explicado apenas pela genética e, portanto, deve haver outro fator.

 

IHU On-Line – Internacionalmente, como a questão da contaminação da água por contaminantes tem sido discutida?

Wilson Jardim – Há uma preocupação mundial, a qual foi oficialmente reconhecida pela OMS e pelo Programa das Nações Unidas para o Ambiente – UNEP. A Comunidade Europeia, os Estados Unidos, o Canadá e o Japão têm buscado aprimorar as legislações, mas ainda não há padrões para estas substâncias. Mesmo porque são tantas que seria impossível legislá-las individualmente.

 

"Há várias tecnologias disponíveis, as quais chamamos de tecnologias de polimento. Não são usadas porque as concessionárias não querem"

IHU On-Line – O que essa pesquisa revela sobre o tratamento da água no Brasil?

Wilson Jardim – Revela que grande parte dos nossos mananciais está criticamente impactada com o lançamento de esgoto sanitário. O Brasil tem um saneamento deplorável, totalmente incompatível com uma economia que se situa entre as dez maiores do planeta. Isso exige muito das estações de tratamento de água, que ainda usam um processo secular e que não estão preparadas para tratar uma água de péssima qualidade, muito embora o preço das tarifas seja elevado.

 

IHU On-Line – Os contaminantes emergentes deveriam ser controlados por alguma legislação?

Wilson Jardim – Certamente serão, num futuro breve. Talvez não em termos individuais, mas, por exemplo, pode-se estipular que uma determinada amostra de água não possa apresentar atividade estrogênica acima de um valor estabelecido. Este ensaio não mede compostos individuais, mas sim a somatória de todos eles atuando no sistema endócrino. Acho que caminhamos para este tipo de abordagem, a qual é bem mais realista e adequada para atacar o problema.

 

IHU On-Line – A que o senhor atribui o deterioramento da qualidade da água nos mananciais brasileiros?

Wilson Jardim – Às concessionárias (ou produtoras) de água que nunca se preocuparam com a coleta e otratamento de esgoto. Apenas no início dos anos 1990, quando o Ministério Público começou a exigir que as concessionárias fizessem seu dever em tratar esgoto, é que o cenário mudou. E ainda hoje elas são relutantes em investir nesta área, muito embora esteja provado que é mais barato tratar esgoto do que tratar água de má qualidade. E parte desta culpa é nossa, que não sabemos escolher nossos governantes, que seriam os grandes disseminadores e executores destas mudanças.

 

IHU On-Line – Quais são as tecnologias existentes para tratar a água? Por que elas não são adotadas no Brasil?

Wilson Jardim – Há várias tecnologias disponíveis, as quais chamamos de tecnologias de polimento. Não são usadas porque as concessionárias não querem, ou não se sentem pressionadas a fazer isso.

 

IHU On-Line – Recentemente o senhor declarou que a Portaria 2.914, do Ministério da Saúde, que normatiza a qualidade da água potável, é muito estática. A portaria precisa de uma revisão? Em que sentido?

Wilson Jardim – O mundo anda mais rápido do que a burocracia. A cada ano temos mais de mil novas substâncias sendo introduzidas no nosso dia a dia. Recentemente a portaria foi revisada, mas este processo precisa ser mais dinâmico.

(Por Patricia Fachin)

Publicado em IHU – Unisinos

Projeto Manejo de Água-Uma integração entre direitos humanos e ambientais


            O Instituto Ipesa, que se caracteriza pelo seu aspecto socioambiental, possui um projeto chamado Manejo da Água – Rio limpo e Comunidade Integrada, que através de medidas sustentáveis busca abastecer locais com água proveniente da chuva. Assim, este projeto utiliza de meios ecológicos com o intuito de garantir à população acesso à agua e saúde, direitos humanos fundamentais na sociedade brasileira.Confira o video abaixo que mostra o trabalho realizado.

Para aqueles que se interessaram pelo video, segue o link do mesmo completo:

http://vimeo.com/47625609

Fonte: http://manejoagua.blogspot.com.br/

Energia solar para purificar a água


Comunidades isoladas da Amazônia usam energia solar para purificar a água

 

Purificador Inpa

Os aparelhos funcionam com energia solar e fornecem água limpa para pessoas que vivem em locais remotos, sem acesso à energia elétrica. Foto: Maiana Diniz/Agência Brasil

 

 

Purificadores de água compactos desenvolvidos pelo Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa) estão garantindo água potável para comunidades isoladas da região amazônica. Os aparelhos funcionam com energia solar e fornecem água limpa para pessoas que vivem em locais remotos, sem acesso à energia elétrica. Entre as 13 populações com o purificador já instalado, estão os índios da etnia Deni, que residem a 25 dias de barco de Manaus, no Alto Rio Juruá.

O purificador elimina 99,5% das bactérias, fungos e coliformes da água dos rios por meio de uma lâmpada de luz ultravioleta C, os raios mais perigosos da radiação ultravioleta. A lâmpada é colocada no interior de um tubo metálico. Quando a água passa pelo tubo é bombardeada pela luz e sai desinfetada. Um painel de energia solar carrega a bateria que acende a luz.

Durante a 67ª reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em São Carlos, o pesquisador do Inpa Carlos Bueno, em entrevista à Agência Brasil, disse que o projeto foi desenvolvido para evitar mortes por contaminação e verminoses, principalmente de crianças, devido ao consumo de água não potável. Os testes em aldeias indígenas começaram em 2007. “O purificador é resultado da remodelagem de tecnologias que já existiam”, explicou.

Segundo o pesquisador, apesar da grande quantidade de água doce na região amazônica, há muita água de baixa qualidade. “Nos rios próximos a comunidades, as águas encontram-se poluídas por populações que vivem de costas para o rio”, ressaltou. Bueno atribui o fato a fatores culturais, como a crença de que a sujeira jogada no rio é levada embora.

O Inpa, em parceria com o sistema de saúde, está avaliando os impactos da tecnologia nos números de contaminação e verminoses das populações beneficiadas. “Os resultados são altamente positivos, os indígenas, inclusive, apelidaram o aparelho de ‘benção de Deus’”, disse Bueno.

O Instituto tem 56 aparelhos montados. De acordo com o pesquisador, ainda este ano, serão instalados dois purificadores em cada estado da Região Norte, em comunidades isoladas, unidades de conservação e pelotões de fronteira do Exército.

Purificador Inpa

Acoplado a um painel de energia solar e à caixa de água, o purificador filtra 400 litros por hora. Foto: Divulgação/Ascom Inpa

 

 

O purificador é uma caixa metálica de 13 quilos, e todo o sistema custa R$ 2 mil, incluindo o painel solar e o filtro de entrada. A lâmpada e a bateria duram cerca de 10 mil horas, ou seja, de três a quatro anos. Bueno acrescenta que a manutenção é mínima neste período.

Acoplado a um painel de energia solar e à caixa de água das comunidades, o purificador filtra 400 litros por hora, ou seja, 5 mil litros por dia, o suficiente para fornecer água limpa para beber e cozinhar a 300 pessoas.

Mas, para que o purificador funcione com eficiência, a água que passa pelo aparelho precisa ser límpida, translúcida, permitindo que a luz a atravesse. Bueno conta que as águas dos rios da Amazônia são diversificadas, assim como a fauna e a flora da região. “Temos água branca, preta, como no Rio Negro, e igarapés, vermelha, como em São Gabriel da Cachoeira, barrenta ou branca, como do Rio Amazonas e Solimões, e verde, como a do Rio Tapajós.”

O pesquisador explicou que cada uma dessas águas têm quantidades diferentes de resíduos em suspensão, que precisam passar por um filtro físico antes de entrar no purificador, que é um filtro biológico. “Com água barrenta, por exemplo, a eficiência da radiação não vai ser boa, então o aparelho exige que sejam acoplados filtros para melhorar a qualidade da água antes que seja purificada”, explicou.

Os filtros usados nos purificadores em operação foram comprados prontos no mercado, mas o Inpa está patenteando um projeto de filtro natural feito com sementes de plantas como as palmeiras e tubos de PVC. “Entre as vantagens desse tipo de filtro é que, além de retirar materiais em suspensão, ele tira o cheiro da água. E como as sementes são a parte mais nutritiva das plantas, ricas em minerais, tornam a água mais rica.”

O especialista informou que, para expandir a produção do purificador, o Inpa assinou um contrato de parceria com uma empresa que trabalha com energias alternativas. “Estão trabalhando junto com o Inpa e vão dar escala de produção para o aparelho.”

O instituto também fez parceria com o Exército para desenvolver um projeto chamado Homem Água, que consiste em um modelo mais compacto do aparelho que vai caber em uma mochila. “Quando os soldados estiverem em treinamentos na selva, por exemplo, vão poder instalar o sistema e tratar água para o pelotão inteiro tomar quando pararem”, explicou Bueno.

Por Maiana Diniz, da Agência Brasil, in EcoDebate, 24/07/2015