Avanço das manchas de petróleo no Nordeste gera frustração crescente


Manchas de petróleo em Camacari, Bahia, em 17 de outubro de 2019 (AFP)

Manchas de petróleo de origem desconhecida se espalham há quase dois meses ao longo dos mais de 2 mil km de litoral do nordeste brasileiro, sem que ninguém saiba como deter o fluxo, nem quais serão seis impactos ecológicos, sanitários e econômicos.

“É desolador, desesperador especialmente quando se tem conhecimento da área, e se sabe que o impacto será enorme. É muito revoltante não poder proteger os manguezais e os estuários”, disse a oceanógrafa Mariana Thevenin.

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A cientista começou a ver as manchas em meados de outubro em Salvador (BA) e fundou com amigos o grupo “Guardiões do Litoral”, que mobilizou centenas de pessoas para limpar os balneários. Milhares de voluntários tiveram a mesma iniciativa, muitos com as próprias mãos.

Em Carneiros (PE), considerada uma das praias mais belas do país, Lula Terra, ator e dono de pousada, achou petróleo há uma semana. “Vi a praia e comecei a chorar”, disse. A Marinha informou que já foram recolhidas mais de mil toneladas de óleo cru.

Imagens de pessoas retirando óleo das areias das praias afetadas ou do mar, trazido pelas ondas, circularam nas redes sociais, mas sem causar o mesmo impacto que os incêndios na Amazônia semanas atrás. Mas a gravidade da situação não é menor, alertam especialistas.

“É uma situação muito crítica”, diz Anna Carolina Lobo, gerente do programa marinho do Fundo Mundial para a Natureza-Brasil (WWF-Brasil). “Ainda não é possível medir o estrago. O que a gente sabe é que as praias vão levar pelo menos 20 anos para se recuperar, e o impacto econômico, para a pesca e o turismo é enorme”, acrescenta.

Negligência?

Segundo reportagem do jornal O Globo, as autoridades demoraram 41 dias para executar o Plano Nacional de Contingência para essas situações. Cinco mil militares foram enviados na semana passada como reforço para ações de limpeza 51 dias depois da detecção das primeiras manchas.

“É absolutamente inacreditável, e de fato isso mostra um extremo despreparo em lidar com esse tipo de coisas”, disse Lobo.

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, assegura, no entanto, que o governo agiu desde o princípio. O governo afirma, ainda, que o petróleo é venezuelano, mas há divergências sobre a origem e diferentes hipóteses sobre as causas do vazamento.

A Petrobras informou na sexta-feira (25) que o petróleo se move sob a superfície do mar, e por isso é impossível mantê-lo distante das praias com barreiras de contenção. “É como procurar agulha em um palheiro”, afirmou um porta-voz da empresa.

“Nenhum radar consegue ver o petróleo no fundo”, reforça o diretor de proteção ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), Olivaldi Azevedo. Mas estes argumentos não convencem especialistas ou voluntários.

“É demolidora a omissão do governo federal”, disse Thevenin.

Impacto por anos

Autoridades locais e regionais informam sobre os riscos de tomar banho nestas praias e consumir peixe, mas o governo federal não decretou emergência, nem centralizou orientações.

Segundo informações publicadas na imprensa, 17 pessoas foram aos hospitais com mal-estar após tocar no petróleo.

“Trata-se de um material tóxico”, que entra na cadeia alimentar, ao se depositar na microfauna consumida pelos peixes, que são consumidos por mamíferos maiores e por seres humanos, disse Luciana Salgueiro, coordenadora de políticas públicas do Instituto Biota de Conservação, em Alagoas.

Em termos ambientais, ela afirma que “a situação configura um desastre sem precedentes, cujos efeitos ainda irão permanecer na natureza por anos”.

Tartarugas, golfinhos e aves morreram ou foram resgatados quase asfixiados pelo petróleo. As manchas se aproximam de locais de migração de baleias e muitos crustáceos foram encontrados com vestígios de petróleo, segundo veículos locais.

Apesar de que as manchas continuam aparecendo diariamente, com a chegada do verão, o turismo ainda não sente o impacto. A CVC, uma das maiores operadoras de turismo do país, informou através de sua assessoria de comunicação que “curiosamente os clientes estão tranquilos”. A empresa recebeu alguns pedidos para alterar viagens, mas a grande maioria manteve até o momento suas reservas.

Quase dois meses depois do aparecimento das primeiras manchas, Lobo afirma que uma das poucas certezas é que “não sabemos quando o petróleo vai acabar”.

AFP

Justiça do Sergipe suspende instalações de boias para conter petróleo


A ideia de instalar barreiras de contenção para reter o óleo no litoral de Sergipe tem encontrado dificuldades. Estruturas instaladas em alguns locais do litoral foram levadas pela água. (Governo de Sergipe)

Até mesmo as estratégias para contenção da borra de petróleo que desde 2 de setembro suja o litoral do Nordeste têm causado atrito. Na noite desta terça-feira (15) o juiz federal substituto na 1ª Vara Federal em Sergipe decidiu suspender a instalação de novas boias para conter o avanço do óleo das praias e rio do Sergipe.

A ideia de instalar barreiras de contenção para reter o óleo no litoral de Sergipe tem encontrado dificuldades. Estruturas instaladas em alguns locais do litoral foram levadas pela água. A informação foi confirmada por pessoas que atuaram diretamente na instalação das estruturas. A tentativa agora é reposicionar as instalações.

O governo já tinha afirmado que a medida poderia não dar certo. O Ministério Público Federal acionou a Justiça, exigindo a instalação do equipamento no prazo de 48 horas, sob risco de ser multado diariamente em R$ 100 mil.

Na segunda-feira (14) o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse que o governo federal cumpriria a decisão da Justiça Federal em Sergipe e que faria a instalação das barreiras nos rios São Francisco, Japaratuba, Sergipe, Real e Vaza Barris.

A decisão judicial atendeu a um pedido do Ibama, que solicitou a reconsideração ou suspensão da decisão que, em caráter liminar, determinou a instalação de barreiras de proteção nos rios São Francisco, Japaratuba, Sergipe, Vaza-Barris e Real e seu monitoramento.

“Considerando as diversas variáveis, entendo ser possível postergar a determinação de instalação das boias até a realização da audiência em questão visando aquilatar melhor a forma de proteger o meio ambiente. Neste passo, a oitiva dos especialistas poderá ajudar a esclarecer melhor a questão”, declarou Fábio Cordeiro de Lima.

O Ibama afirmou que, desde o dia 2 de setembro, quando as primeiras manchas de óleo atingiram o litoral brasileiro, vem avaliando e investigando a causa deste derramamento, monitorando a situação e agindo com a utilização de recursos humanos e materiais.

O órgão disse que as barreiras de contenção não teriam eficácia completa neste caso porque o óleo que vem atingindo o Nordeste fica submerso na água e as barreiras funcionam em correntes de até um nó, quando a velocidade das ondas é bem maior que isso.

Segundo o Ibama, as “barreiras devem ser constantemente reajustadas, em função dos efeitos de maré, para que não percam sua efetividade”. O órgão informou que, se o manguezal já estiver atingido, a barreira de contenção poderá ter efeito inverso, impedindo a depuração natural do ambiente.

Mais de 200 toneladas do óleo já foram recolhidas até agora. Ainda não há informações detalhadas sobre a origem do problema.

Agência Estado

Mancha de óleo atinge Morro de São Paulo, famoso destino turístico da Bahia


Morro de São Paulo é o terceiro destino turístico mais visitado da Bahia (Divulgação Prefeitura)

A praia de Morro de São Paulo, no município de Cairu, a 176 km de Salvador, foi atingida por uma grande quantidade de óleo na madrugada desta terça-feira (22). O poluente começou a chegar à faixa de areia por volta das 2h, segundo pescadores da região.

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A segunda e a terceira praias foram as mais afetadas. Por questões de segurança, a prefeitura da cidade interditou inicialmente o acesso de banhistas aos locais, mas, logo em seguida, as praias foram liberadas. Considerado como o mais requisitado e conhecido de Morro, o passeio “Volta à Ilha” também foi temporariamente suspenso, mas liberado logo depois.

Desde às 2h30 da madrugada até a manhã desta terça-feira (22), 1,5 tonelada de óleo foi retirada pelas equipes das Secretarias Municipais de Desenvolvimento Sustentável e Especial de Morro. Voluntários e homens da empresa responsável pela limpeza pública da região também auxiliaram na operação de retirada do resíduo.

Divulgação Prefeitura
Divulgação Prefeitura

A quantidade foi a maior registrada até o momento em praias na região sul da Bahia. No último fim de semana, manchas foram encontradas em Ilhéus e Itacaré, mas em menor porção.

Além de Morro, fragmentos de óleo foram registrados nas praias da Cueira, em Boipeba, e de Ponta do Quadro, em Garapuá. As áreas também estão sendo limpas pela prefeitura e voluntários.

Segundo a secretária de Desenvolvimento Sustentável de Cairu, Fabiana Pacheco, a situação está controlada. O material foi reunido e aguarda a retirada da ilha pelos órgãos responsáveis: Defesa Civil, Marinha do Brasil e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Uma reunião realizada nesta manhã, com equipes da pasta, vai definir o plano de ação que será adotado diante da chegada do poluente.

Segundo o superintendente do Ibama na Bahia, Rodrigo Alves, equipes do órgão e da Marinha já estavam monitorando a região, diante da possibilidade de avanço do óleo para o sul baiano. Isso possibilitou que a ação de resposta à chegada do poluente fosse mais rápida. Equipes que atuam no Litoral Norte foram deslocadas para a região ainda pela manhã.

Plano de Emergência Individual

Ainda de acordo com o superintendente, o Ibama vai oficiar a Petrobras para que empregue o Plano de Emergência Individual (PEI), desenvolvido para a plataforma de Manati, que fica na bacia de Camamu. O planejamento é acionado quando há incidentes de poluição por óleo. Mesmo que o poluente encontrado não seja da petroleira, o objetivo é de que a expertise da estatal seja usada para minimizar os impactos em Morro. “A Petrobrás pode disponibilizar monitoramento e equipamentos da plataforma nesta operação”, explica Rodrigo.

A preocupação agora é que o vazamento avance para a Baía de Camamu. Terceira maior do Brasil e segunda maior da Bahia, a baía é considerada bem preservada e ambientalmente sensível, já que é irrigada por rios pequenos com muitos manguezais, nascedouros e berçários de várias espécies marinhas. A área poluída nesta madrugada também abriga a Área de Proteção Ambiental (APA) das Ilhas de Tinharé e Boipeba.

Com uma população de cerca de 100 mil habitantes, Morro é o terceiro destino turístico mais visitado da Bahia, perdendo apenas para Salvador e Porto Seguro, no extremo sul do Estado. Cerca de 400 mil turistas que passam pelo local por ano, atraídos pelas belas praias.

Ações

A prefeitura de Cairu afirmou que o monitoramento das praias do arquipélago e adoção das estratégias do Plano de Emergência Ambiental foram adotados desde os primeiros sinais de impacto do vazamento de óleo na Bahia. “Todos os materiais necessários para proteção e limpeza também foram adquiridos antecipadamente”, informou em nota.

O município aguarda nesta terça as equipes do Grupo de Avaliação e Acompanhamento (GAA), formado por Marinha do Brasil, Ibama, Inema (órgão estadual) e Agência Nacional de Petróleo (ANP) para mensurar os danos causados. O monitoramento de outras praias prossegue. A prefeitura afirmou também que continuará com uma operação de pente-fino, que será realizada por equipes da gestão municipal em todas as localidades do município para assegurar que não há vestígios de óleo.

Rodrigo Alves ressaltou que as praias do Nordeste estão recebendo quantidade cada vez menor de óleo nos últimos dias. A situação é mais crítica em Pernambuco e Alagoas. De acordo com balanço feito na segunda à noite, 21, pelo Ibama, 75 praias da região estão limpas e não voltaram a registrar vestígios do poluente.

Apesar desta tendência, a praia de Carneiros, um dos maiores destinos turísticos pernambucanos, amanheceu coberta de óleo na sexta, 18. Um dia antes, o material poluiu a praia e a área de proteção ambiental de Maragogi, no litoral norte de Alagoas.

Na Bahia, o óleo atingiu esta semana 11 praias de Salvador, incluindo pontos turísticos como o Farol da Barra. Até as 18h de sexta-feira, 90 toneladas de óleo tinham sido recolhidas na capital, de acordo com a prefeitura.

O superintendente do Ibama destacou a preocupação do governo federal com a atividade turística no Nordeste e reforçou que as pessoas não devem ter receio de visitar as praias da região. “As pessoas estão muito impressionadas com as imagens de grande quantidade de óleo em alguns locais, mas não é todo o Nordeste que está assim. É importante frisar isso”, ressaltou.

Susto em Vera Cruz

A morte de 12 tartarugas marinhas desde 11 de outubro deixou em alerta o governo de Vera Cruz, região metropolitana de Salvador. O fato de praias do município terem sido atingidas por manchas de óleo levantou a possibilidade dos animais terem sido intoxicados pelo material.

Uma análise feita pelo Projeto Tamar, que atua na preservação de espécies de tartarugas-marinhas em extinção, apontou, no entanto que a matança foi provocada pela atividade pesqueira. Diretora de Fiscalização de Meio Ambiente de Vera Cruz, Priscilla Velloso informou que nenhum dos animais foi encontrado com manchas de óleo. A orientação dada pela prefeitura é de que, caso alguma espécie seja vista com marcas do poluente, o animal seja encaminhado para análise do Ibama.

Além de Morro de São Paulo, o óleo também atingiu outras duas praias do município de Cairu, que é um arquipélago formado por 26 ilhas.

Agência Estado