Sustentabilidade Energética


A sustentabilidade é um termo bastante adotado por várias empresas para representar seus valores de responsabilidade socioambiental. Isso é uma resposta aos questionamentos frequentes sobre a busca do lucro privado às custas de impactos arcados por toda a sociedade. Por exemplo, se uma indústria deixa de investir em prevenção à poluição, economizará num primeiro momento, mas provavelmente se exporá a maiores riscos e causará impactos que afetarão sua imagem e sua competitividade no médio e longo prazos.

Com a energia isso é muito patente. Assim como nós precisamos de alimentos para nos aquecer e movimentar, as empresas precisam de eletricidade e combustíveis para produzir seus produtos e serviços. Como isso se dá de maneira sustentável? Aliás, o que significa ser sustentável?

O desenvolvimento sustentável preserva, em todos os seus três pilares – econômico, social e ambiental –, os direitos de todos à qualidade de vida. Por todos, devemos entender tanto os que aqui habitam como os que ainda não nasceram. Dessa forma, a base de sustentação das atividades econômicas deve ser socialmente inclusiva e ambientalmente preservada para também as gerações futuras.

A energia sustentável é aquela que minimiza seus impactos a ponto de preservar essa base. Entendido esse conceito, estratégias energéticas precisam ser ao máximo possível eficientes e renováveis.

Fontes renováveis de energia nós conhecemos bem. O sol, os ventos, os potenciais hidráulicos, o calor do fundo da terra e a biomassa (plantas e resíduos) podem e devem substituir progressivamente o carvão, o petróleo e os demais combustíveis fósseis responsáveis por grande parte do aquecimento global. A energia nuclear não é renovável, apresenta riscos e, acima de tudo, é cara.

As políticas energéticas reconhecem o valor das fontes renováveis, mas muitas vezes priorizam os combustíveis fósseis por uma série de motivos: tecnologias convencionais mais conhecidas, preferência por grandes obras de infraestrutura e até, porque não, fortes influências políticas. Um argumento frequente é a falta de confiança nas fontes renováveis, mas diversas experiências bem-sucedidas ao redor do mundo se contrapõem a essa tese. Devidamente integradas, as fontes renováveis se complementam.

O que uma empresa pode fazer nesse sentido? Se queimar combustíveis diretamente, pode preferir aqueles da biomassa, mais sustentáveis – caso do etanol e das florestas plantadas. Se essa biomassa for certificada quanto às suas práticas socioambientais, melhor. Se gerar energia elétrica ou térmica, pode tentar a alternativa solar, pelo menos de forma complementar.

                                                      

O segundo ponto é a eficiência. Ser eficiente é obter o mesmo produto ou serviço final consumindo menos, ou seja, desperdiçando menos energia e materiais em seus processos. Como fazer isso? De várias formas. Nos transportes, adequando a logística e evitando que veículos circulem vazios.

Pode-se também preferir modelos de veículos mais leves e ágeis. Nos processos industriais, as empresas podem observar as melhores práticas (benchmarks) aqui e no exterior. Há bastante informação para isso disponível na internet, dentre as quais os relatórios da UNIDO (United Nations Industrial Development Organization) e do Lawrence Berkeley National Laboratory dos Estados Unidos.

Por exemplo, o Brasil produz uma tonelada de aço com 24 unidades de energia (chamadas megajoule), mas pode produzir com menos de dois terços, ou até com 4 megajoules por tonelada. Isso não se faz da noite para o dia, mas deve ser considerado nos planos estratégicos bastando, para tal, uma disposição, que nas conversas informais chamamos de vontade política. Outro exemplo: basta ir a uma praça de alimentação de shopping e verificar que há vários fornos elétricos, fontes de calor em ambientes climatizados com ar- condicionado.

Gasta-se eletricidade para aquecer e para esfriar num mesmo ambiente. Como se combate esse desperdício? Primeiro, com bons projetos. Segundo, com alguns ajustes, isolando os fornos e dando exaustão ao ar quente. Nos escritórios e residências, soluções simples também resolvem problemas de ineficiência: boa ventilação substituindo o ar-condicionado, lâmpadas eficientes, desligar aparelhos não utilizados ou em modo stand by fazem uma enorme diferença.

Outra forma simples de se economizar energia: não perder materiais. Alimentos que são mal-acondicionados e manuseados estragam rapidamente e viram lixo. Menos alimentos na ponta significa maior produção necessária de matérias primas e maior geração de lixo. Tudo isso consome muita energia. Mais um exemplo: construção civil, que além de desperdiçar materiais intensivos em energia, como cimento, utiliza conceitos de projetos importados e mal-adaptados que demandam muito ar-condicionado.

Um enorme contrassenso que vemos todos os dias é a “obesidade veicular”. Verdadeiros tanques, alguns pesando quase três toneladas, transportam uma pessoa pelas ruas congestionadas das cidades. Ao parar por uma hora na rua, privatizam um espaço público que poderia ser utilizado de forma mais inteligente. O comércio afirma que precisa de vagas de estacionamento, mas, curiosamente, quando se faz compras em Nova Iorque, Paris ou até na Rua 25 de Março, não há lugar para se parar e nem por isso as vendas diminuem.

Outro ponto da eficiência energética está no valor agregado aos produtos. O Brasil é um grande produtor de commodities, sabemos bem. Trocamos vagões pesados de minérios e soja, que ficam presos nas filas dos portos, por tablets, aplicativos, artigos de grife e tantos outros produtos e serviços que consomem proporcionalmente pouca energia e que rendem muito para seus países de origem.

A contenção do desperdício deveria estar também nas instituições. Gastamos muita energia para suprir nossa ineficiência. A juventude nas ruas é resultado de um colapso nos sistemas. Enquanto lá fora se desenvolvem polos de inovação, nosso projeto de futuro está em algumas competições esportivas e na esperança num concurso público. Há falta de engenheiros e excesso de advogados.

Em vez de ampliarmos agressivamente nossos tímidos planos de eficiência e de geração distribuída, gastaremos centenas de bilhões de dólares para buscar petróleo no fundo dos oceanos e daremos mais incentivos para as pessoas comprarem ainda mais carros. Isso sem falar nos resgates com dinheiro público a projetos mirabolantes falidos e tantos outros casos que levam a classe alta a Miami e a classe média às ruas.

Precisamos canalizar adequadamente nossas energias. No sentido mais estrito, é preciso ser eficiente e renovável. Algumas empresas mais proativas já perceberam que isso é questão de sobrevivência e defendem políticas coerentes nesse sentido. Elas precisam, contudo, se fazer representar mais fortemente junto aos seus conselhos, associações e federações.

Isso é importante do ponto de vista estratégico: o mundo está mudando, novas tecnologias estão sendo desenvolvidas e, se quisermos nos manter competitivos, devemos perceber que isso não acontecerá à base de desperdícios e protecionismo. Desperdício aumenta custos e reduz lucros. Menos lucros, menos empregos. Lutar permanentemente contra isso significa ser sustentável.

Por Oswaldo Lucon

Oswaldo Lucon é professor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo, assessor em Mudanças Climáticas da Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo e coautor do livro Energia, Meio Ambiente e Desenvolvimento (Edusp).

Fonte: Ideia Sustentável