Por Caroline Machado
O uso exagerado de agrotóxicos é uma triste realidade no Brasil. O que fazer para mudar este quadro? Há quem se movimente para levar o problema aos mais altos níveis de poder no país.
O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) pretende colocar a importante questão para a presidenta da República, Dilma Rousseff. A expectativa é que ainda este mês, a presidência tome consciência do que está acontecendo.
“Passando pela plenária, consequentemente no mesmo dia, a presidenta já fica ciente do assunto. Nosso objetivo é fazer com que ela tenha consciência ainda em novembro do uso exagerado de agrotóxicos em Minas Gerais”, explica Mariza Rios, professora da Escola Superior Dom Helder Câmara, presidenta da Rede de Ação e Informação pelo Direito a se Alimentar (FIAN-Brasil), do Consea. A plenária a qual se refere Mariza Rios acontece em 29 de novembro.
Feijão de Unaí
Recentemente um episódio relacionado ao uso indiscriminado de agrotóxicos chamou a atenção.
Um mandado de prisão foi expedido para o Frei Gilvander, conhecido padre da Ordem dos Carmelitas e militante dos direitos humanos. Gilvander publicou em seu site www.gilvander.com.br e no YouTube, um vídeo que denuncia o excesso de veneno em feijão no município de Unaí, Noroeste de Minas Gerais, Brasil.
Com a repercussão do caso, conhecido como “Feijão de Unaí”, foi possível agendar um encontro entre Frei Gilvander e Mariza Rios, que aconteceu na terça-feira (21), na Escola Superior Dom Helder Câmara.
O objetivo dele era que Mariza se inteirasse sobre o “Feijão de Unaí” no intuito de encaminhá-lo ao conhecimento da presidência da República. O encontro serviu ainda para a discussão de algumas propostas contra o uso exagerado de agrotóxicos em Minas Gerais.
Propostas de Minas
Foram três as principais propostas do Estado apresentadas à Mariza Rios para serem levadas presidência`. Uma é chamada de “banimento dos banidos”. Existe uma série de produtos, proibidos na maior parte do mundo, e que a Anvisa também já divulgou notas técnicas recomendando o banimento, mas continuam em circulação.
Outra proposta é a questão da isenção fiscal. Alguns impostos não são cobrados na produção e na utilização dos agrotóxicos. A proposta é fazer com que isso não ocorra, evitando a compra desenfreada.
A terceira é a eliminação da pulverização aérea. O Brasil é o segundo país com o maior número de pilotos de aviões de pulverização.
Consea
O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) é um instrumento de articulação entre governo e sociedade civil para a proposição de diretrizes, visando ações na área da alimentação e nutrição. Instalado em 30 de janeiro de 2003, tem caráter consultivo e assessora a presidenta da República Dilma Rousseff, na formulação de políticas e na definição de orientações para que o país garanta o direito humano à alimentação.
As reuniões do Consea, previamente agendadas, são mensais. Em 2012, porém, foi necessário se reunir por mais de uma vez por mês. “Nós preparamos pareceres para a presidência da República, contamos a política, o que foi feito e damos as nossas sugestões”, destaca Mariza.
Neste fim de ano, os conselheiros estão preparando a agenda de um encontro com a presidenta Dilma Rousseff, numa agenda que constam os temas mais importantes para o país. Entre os temas que serão discutidos, o principal é o agrotóxico. “Neste momento em que estamos discutindo o uso excessivo destes produtos surgiu o ocorrido com o Frei Gilvander, que é o chamado ‘Feijão de Unaí’. E por isso eu me disponibilizei para ouvir a história e ver de que forma essa questão pode subsidiar a nossa agenda de reunião com a presidenta”, destaca a professora Mariza.
O assunto vai ser levado para a pauta da reunião do Conselho Federal, que ocorrerá no dia 28 de novembro em Brasília. Nesta reunião serão definidos quais temas serão levados à Plenária do Consea do dia 29 de mesmo mês.
De acordo com Mariza o assunto agrotóxico neste momento, final e início de ano, é a menina dos olhos para o Conselho. “Tem uma linha que pensa assim: ‘Não conseguimos ter alimentos se não utilizarmos agrotóxicos. Passaríamos fome’, isso não é verdade, pois o mundo já utiliza de outros meios, mais caros, porém não inviáveis”, conclui.
Frei Gilvander
Frei Gilvander é padre da Ordem dos Carmelitas, militante dos direitos humanos, assessor da Comissão Pastoral da Terra, conselheiro do Conselho Estadual de Direitos Humanos (CONEDH/MG), apoiador e articulador dos movimentos sociais populares. Gilvander é conhecido por tomar frente da luta contra o uso desenfreado de agrotóxicos no país.
Em entrevista exclusiva ao DomTotal o Frei Gilvander, criado no Noroeste de Minas, diz conhecer a fundo a região e saber que o agronegócio é muito forte em Unaí.
“A cidade de 80 mil habitantes tem mais de 4 mil pessoas com câncer. Construiu um hospital especializado agora, pois a prefeitura gastava mais mandando ônibus lotados com pessoas doentes para outras cidades em busca de tratamento”, afirma o Frei. Conhecendo destes dados, ele decidiu pela realização do vídeo, pois “não podemos ficar parados diante dos fatos”, frisa.
Com relação à expedição do mandado de prisão, o Frei afirma ter estranhado a decisão do juiz. “O mais justo seria ele exigir que a empresa fizesse uma inspeção de seu produto e comprovasse que o feijão não utiliza exageradamente de agrotóxico. Mas não. Mandou prender quem denunciou, é um absurdo. Mas fiquei feliz por outro lado, pois com todo mal concorre um bem e pude me reunir com a conselheira do Consea, Mariza, para apresentar o fato e algumas propostas” diz.
Na busca pela fiscalização do uso de agrotóxicos, os integrantes desta campanha, juntamente com Frei Gilvander, já entraram em contato com a Defensoria Pública que provavelmente entrarão com uma ação civil pública. Agora os esforços estão voltados para um acesso ao Ministério Público Federal na região de Paracatu. “Nosso objetivo é dar força a essa luta para exigir uma vistoria sobre o uso exagerado de agrotóxicos nas plantações do município de Unaí e nas demais regiões. Envenenar a alimentação do povo é um crime hediondo” conclui.
Dados
Enquanto a taxa mundial de consumo de agrotóxicos nos últimos 10 anos cresceu 93%, no Brasil esse índice quase triplicou, chegando a 190% de aumento. A razão disso, conforme especialistas, é o crescimento da produção agrícola brasileira e a importância no cenário internacional da produção que incentiva a monocultura para a exportação.
A última pesquisa anual divulgada pela Anvisa aponta que 28% dos alimentos analisados apresentaram níveis de agrotóxicos acima do indicado pela entidade.
Fonte: Redação DomTotal