Kasigau, Quênia, 21/8/2014 – Quando Mercy Ngaruiya se mudou para esta localidade do sudeste do Quênia em 2004 encontrou uma floresta empobrecida, como consequência de anos do corte de árvores e queima de mata. Naquela época os índices de pobreza e desemprego eram altos, era limitado o fornecimento de água potável, bem como os medíocres serviços de educação e saúde, afirmou.
Quem se lembra muito bem disso é Mike Korchinsky, presidente da Wildlife Works, uma empresa de gestão e desenvolvimento de projetos para a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação das Florestas (REDD+), um mecanismo que faz parte dos planos de ação adotados dentro da Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática.
“Quando cheguei aqui podia-se ouvir o som dos machados, porque as pessoas cortavam as árvores sem parar. O desmatamento é duplamente alarmante porque há uma emissão imediata quando o carbono que a floresta armazenou durante séculos é liberado na atmosfera, e então não há nada para capturar o carbono produzido pelas atividades humanas”, explicou Korchisnky.
Escondida entre Tsavo do Leste e Tsavo do Oeste, no distrito de Voi, 150 quilômetros a nordeste da cidade costeira de Mombasa, a região de Kasigau ressurge lentamente das cinzas na medida em que prospera sua economia verde. Com aproximadamente cem mil habitantes, cresce na medida em que começa a dar resultado o Corredor de Kasigau, uma iniciativa REDD+ que a Wildlife Works implantou em 2004.
Segundo Ngaruiya, “as coisas estão mudando desde que os moradores aceitaram a conservação do ambiente. O entorno continua melhorando. A cobertura arbórea ao longo do Corredor de Kasigau está em processo de regeneração e o projeto REDD+ empoderou milhares de residentes para que abandonem a destruição da floresta e adotem meios de vida sustentáveis.
Atualmente, o projeto REDD+ de Kasigau gera mais de US$ 1 milhão por ano pela venda de carbono, a cerca de US$ 8 a tonelada, na Bolsa de Carbono da África, com sede em Nairóbi. Um terço do obtido é destinado ao desenvolvimento do projeto e reinvestido em iniciativas ecológicas de geração de renda, como a fabricação de roupa, vendida dentro e fora das fronteiras, a agrossilvicultura e a produção artificial de carvão, entre outras atividades. Outra parte dos ganhos também é distribuída diretamente aos proprietários da terra da localidade.
“Já não precisamos cortar árvores para fazer carvão. Usamos o biogás e o carvão ecológico à base de folhas podadas. Cozinhamos e ao mesmo tempo conservamos as árvores”, contou à IPS Nicoleta Mwende, moradora de Kasigau.
O projeto REDD+ ofereceu soluções reais e diretas para a mitigação da pobreza, assegurou o chefe Pascal Kizaka, administrador de Kasigau. “Além da conservação, parte dos ganhos permitiu a construção de 20 modernas salas de aula nas escolas locais, bolsas para mais de 1.800 alunos, um centro de saúde e uma indústria, o que melhorou nosso nível de vida”, acrescentou.
O de Kasigau é o primeiro projeto REDD+ verificado no Quênia no qual a população da região ganha dinheiro com a conservação de seus recursos naturais. A comercialização dos bônus ou créditos de carbono está em uma etapa incipiente no Quênia, mas o futuro é promissor, segundo Alfred Gichu, especialista em mudança climática florestal do Serviço Florestal do Quênia, órgão estatal que conserva e administra as florestas.
O Quênia tem 16 projetos de bônus de carvão ativos e registrados, e outros 26 em processo. “Desses 26, 19 são de energia, como a Companhia de Desenvolvimento Geotérmico, e sete implicam projetos de reflorestamento”, detalhou Gichu. O governo tem um interesse primordial em incluir a floresta Mau, no vale do Rift, no comércio de bônus de carbono, acrescentou.
As políticas de conservação de florestas do Quênia tiveram muito sucesso, segundo o informe Histórias de Sucesso em Desmatamento 2013, da organização norte-americana Iniciativa para as Florestas Tropicais e o Clima. O informe menciona o projeto REDD+ do Corredor de Kasigau como um grande êxito e indica que a renda gerada com a venda de bônus voluntário de carbono atingiu US$ 1,2 milhão no final de 2012.
Algumas das medidas que favoreceram a expansão da massa florestal no Quênia foram a promoção do plantio de árvores nas fazendas, escolas e outras instituições públicas, proibição do corte árvores nas florestas públicas e a sensibilização a respeito impulsionada pelo governo e pelos conservacionistas privados, segundo o Informe sobre a Disparidade Nas Emissões, publicado em 2013 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).
Mas o Quênia também apresenta obstáculos para o desenvolvimento dos projetos REDD+. Moses Kimani, diretor da Bolsa de Carbono da África, apontou que a falta de experiência e de fundos são alguns dos principais desafios que o desenvolvimento do comércio de bônus de carbono enfrenta. “Além das más políticas e dos contextos legais frouxos, muitos projetos de créditos de carbono no Quênia e na África carecem da experiência e dos fundos necessários”, ressaltou à IPS.
Durante a conferência sobre mudança climática que a Organização das Nações Unidas (ONU) realizou na Polônia em 2013, os participantes acordaram um contexto para a REDD+ e prometeram financiamento de US$ 280 milhões. Mas os ecologistas lamentam a falta de mecanismos que permitam que esses fundos de adaptação alcancem as populações locais.
O conservacionista John Maina disse que os quenianos que gerenciam esses projetos perdem diante dos intermediários porque a falta de conhecimento os leva a vender o carbono a preços irrisórios. “O governo, a sociedade civil e as organizações não governamentais devem trabalhar juntos para fortalecer as leis e sensibilizar os quenianos sobre os projetos de carbono e como podem ter acesso ao financiamento”, destacou à IPS. Envolverde/IPS
(IPS)