A represa Billings (foto acima), no extremo sul da capital paulista, possui cerca 800 quilômetros de margens e capacidade de armazenamento dez vezes maior que os 1,46 trilhão de litros do sistema Cantareira. Embora a Sabesp utilize parte disso para o abastecimento, por volta de 7,4 metros cúbicos por segundo em dois pontos distantes da periferia que a cerca, ela está muito aquém do seu potencial. Considerada a “caixa d´água” que salvaria São Paulo da sua atual crise hídrica, planos de aumentar seu uso ainda em 2015 acabaram sendo abandonados pelo governador Geraldo Alckmin por conta dos altos custos para tratar suas águas extremamente poluídas em curto prazo.
Não é para menos. Um dos fatores complicantes é o esgoto não tratado dos 1,5 milhão de moradores que ocupam suas margens. Outro é o Rio Pinheiros, que tem parte de suas águas bombeadas para lá de forma que se evitem enchentes. Nos parâmetros de qualidade do Conselho Nacional de Meio Ambiente, o Pinheiros é considerado um rio de classe 4, ou seja, altamente poluído. Segundo a Associação Águas Claras do Rio Pinheiros, 40% do esgoto gerado nas suas proximidade é despejado em sua bacia, que se estende por 25 quilômetros dentro da metrópole. “Com o tempo, estações de tratamento convencionais que custam milhões apenas conseguem manter os níveis de poluição estacionários, como é no caso da Billings e da Guarapiranga em São Paulo. Reintroduzir a lógica da natureza, porém, custa menos e é mais efetivo. Estamos tentando propor isso para as autoridades brasileiras”, afirma o designer ecológico Galen Fulford.
Desde 2008, Galen e sua empresa com base na Escócia, a Biomatrix Water, tem resgatado rios, córregos e lagos urbanos com ilhas artificiais (foto acima) capazes de fazer a recuperação microbiológica de águas poluídas. Chamadas informalmente de “living machines” (“máquinas vivas”, na tradução), essas funcionam como filtros contra a poluição e reatores de oxigenação da água. “Cada ilha atua com um pequeno reator por onde a água poluída entra e é misturada com o ar. Essa água é levada com pequenas bolhas para outras estruturas cilíndricas e porosas, abaixo da superfície da ilha flutuante, que usamos como suporte inicial de vida para os biofilmes, comunidades bem estruturadas de bilhões de bactérias anaeróbicas que quebram a poluição orgânica e de metais pesados pela desnitrificação”, explica. “É o mesmo princípio das raízes das plantas e dos corais, que criam condições para o surgimento dessas colônias de bactérias. O que fazemos é acelerar o processo enquanto as raízes das plantas não se fixam e ganham profundidade, pois cada metro dessas colunas dinâmicas equivale a 15 metros quadrados de raízes. Uma vez estabilizadas, porém, as raízes das plantas limpam até 20 vezes mais poluentes da água nas estruturas flutuantes do que se estivessem plantadas nas margens”, conta o designer.
De acordo com Galen, os resultados da limpeza feita pelas ilhas artificiais, construídas a partir de aço inoxidável e plásticos reciclados inertes, começam a aparecer em no máximo uma semana e a vida útil de cada estrutura verde flutuante pode durar de 20 a 50 anos. “E isso independente do nível de água. O custo final depende do tamanho da ilha, que pode variar entre dois mil e vinte mil dólares. A vantagem é que o sistema é modular e pode ser usado como uma ilha que flutua ou pode ser construído fixamente também em áreas onde há descarga de água poluída, como uma central de tratamento, mas por metade do valor de uma. No longo prazo, isso diminui o preço também quando o objetivo é melhorar a qualidade da água para processos de reúsono abastecimento humano”, conta. Atualmente, a Biomatrix tem trabalhado com ilhas em formato hexagonais ou octogonais, pois, segundo Galen, elas permitem que mais módulos sejam adicionados conforme a necessidade do sistema. “O formato de colméia é resiliente contra ventos fortes e tempestades”, diz.
A primeira coisa que some com a tecnologia verde desenvolvida pela Biomatrix é o cheiro incômodo de água poluída, comum nos centros urbanos. A redução de amônio na água com o uso da tecnologia é de mais de 47% e de coliformes fecais de até 52% em alguns casos. Com o tempo, pequenos peixes criam hábitat sob as ilhas artificiais, que podem servir como viveiros para aves selvagens e outras espécies de plantas. “Qualquer espécie local pode ser usada nas ilhas, como alopécias, bandeiras espanholas e alpínias. A proposta também é que cada ilha se torne uma atração e resgate pela beleza a interação das pessoas com a água nos lugares onde vivem”, conta Galen, que tem projetos em canais e córregos de cidades na Inglaterra, EUA, Austrália, Índia, China e Bolívia, entre outros. Um dos casos mais bem sucedidos é o do Canal Paco na cidade de Manila, capital das Filipinas. (foto abaixo).
Premiada pela American Society of Landscape Architects ( ) e reconhecida na lista das “100 empresas mais inovadoras na área de sustentabilidade” em 2014 pelo renomado think tank escandinavo Sustainia, a Biomatrix está com planos voltados para o Brasil agora. “Estamos interessados na recuperação da Lagoa Rodrigo de Freitasno Rio de Janeiro antes da Olimpíada de 2016. E, em São Paulo, sabemos que a nossa tecnologia pode funcionar para revitalizar a Billings como fonte de abastecimento. Só tem sido difícil marcar uma reunião”, conclui.
Fotos: Divulgação
Fonte: Planeta Sustentável