Grupo de cientistas e empreeendedores defende Quarta Revolução Industrial para a Amazônia
Quarta Revolução Industrial: é assim que um grupo de cientistas e empreendedores está chamando o que considera a saída para a Amazônia – que caminha para um processo de colapso ambiental caso o atual modelo de desenvolvimento da região não seja alterado. Esse grupo, liderado pelo climatologista Carlos Nobre, doutor pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), acaba de publicar na prestigiada revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) um artigo ressaltando dois pontos importantes: os riscos catastróficos de uma eventual savanização e um plano de inovação em grande escala para a Amazônia.
Seguem abaixo informações divulgadas pela assessoria de imprensa responsável pela divulgação do estudo no Brasil:
A utilização econômica da biodiversidade da Amazônia, dos conhecimentos e avanços da pesquisa em tecnologias avançadas da Quarta Revolução Industrial em curso (inteligência artificial, robótica, internet das coisas, genômica, edição genética, nanotecnologias, impressão 3D ), mas em permanente diálogo com os conhecimentos tradicionais dos povos da floresta, é uma via capaz de mudar o destino a que a maior floresta do planeta está condenada.
As drásticas mudanças no uso da terra, com altas taxas de desmatamento e incêndios cada vez mais frequentes, combinadas com períodos de seca cada vez mais longos e eventos climáticos extremos podem levar a floresta a um processo irreversível de “savanização”.
Os cientistas preveem que até 2050 metade da floresta tropical pode ser substituída por savanas tropicais degradadas ou florestas sazonais, mais secas – e mais pobres. Ou seja, o ponto sem retorno para a sobrevivência da maior floresta tropical do planeta pode estar logo adiante, com consequências catastróficas para o Brasil, a América do Sul e o mundo.
“Se o aquecimento na Amazônia ultrapassar 4ºC , ou mais de 40% da floresta forem desmatados, atingiremos o ponto de ruptura do equilíbrio da floresta com o clima e o processo de savanização poderá se tornar irreversível”, adverte Carlos Nobre.
A recente redução de 80% do desmatamento da floresta Amazônica no Brasil nos últimos 10 anos permite criar uma ponte para inverter radicalmente o modelo econômico vigente na Amazônia e buscar nos ativos da biodiversidade e da biomimética um trampolim para o futuro.
Liderado por Nobre, o grupo é formado ainda pelo empreendedor peruano Juan Carlos Castilla-Rubio, engenheiro bioquímico da Universidade de Cambridge, os pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) Gilvan Sampaio, Laura Borma e Manoel Cardoso, e o pós-doutorando da Universidade de Brasília, José Silva.
Eles defendem que, no curto prazo e com baixa abordagem tecnológica, é viável desenvolver produtos baseados na biodiversidade com alto valor agregado, capazes de atingir mercados globais com um diferencial único.
No artigo, os pesquisadores discutem inovações utilizando as tecnologias da Quarta Revolução Industrial que tentam imitar as formas naturais da floresta, os processos, as moléculas, os materiais, e ecossistemas capazes de inspirar inovações de grande valor para múltiplas industrias no Brasil e no mundo.
“Estamos entendendo rapidamente como as coisas são criadas na natureza e como os organismos sentem o seu ambiente por meio de sofisticados sensores, como interpretam essa informação, como se movem em seu ambiente a partir de princípios biomecânicos e cinéticos, e como se comportam e funcionam processos que levaram milhões de anos para se desenvolver”, afirma Castilla-Rubio.
Além disso, diz ele, a floresta reproduz sistemas biológicos complexos e soluções biomiméticas para problemas numa escala nanomolecular, além de ser capaz de nos ensinar processos ambientais amigáveis, indicando tecnologias de prevenção e remediação da poluição, elaboração de estruturas têxteis inspiradas em animais e vegetais e nas aplicações robóticas de inteligência artificial de comportamento e cognição, que estão na fase inicial do ciclo de inovação.
“Através da biomimética, podemos chegar a inovações revolucionarias de alta eficiência na produção de energia. Na natureza, a fotossíntese gera energia para as plantas, e os microorganismos geram sua própria energia a partir de outras fontes, como é o caso da bactéria que fixa súlfur”, cita Castilla-Rubio.
Ele conta que há uma espécie de rã-túngara, que cria uma espuma de longa duração, e que tem inspirado a geração de novas energias e tecnologias de captura de dióxido de carbono. Sem falar das plantas que influenciaram diretamente o modelo de célula solar potencialmente gerando alternativas muito mais baratas do que as placas fotovoltaicas de silício.
Mas o aproveitamento de todo esse potencial capaz de mudar o rumo da história na Amazônia não pode ser feito de um só passo. Ao contrário. Os cientistas estão propondo uma junção de esforços públicos, privados e da academia em grande escala para a longa caminhada que há pela frente.
“Temos de caminhar na descarbonização da economia para os níveis de aquecimento global de 2ºC ou 1,5ºC, previstos pelo Acordo de Paris, o que deve incluir o desmatamento zero para a Amazônia”, afirma Carlos Nobre. Ele lembra ainda que o conhecimento indígena e das comunidades tradicionais sobre biomoléculas e as formas e os processos dos ecossistemas foi acumulado ao longo de inúmeras gerações na Amazônia pelos povos da floresta.
“O respeito por esse conhecimento e o desenvolvimento inclusivo deve ser a fundação dos modelos de inovação para o futuro da floresta”, defende.
De acordo com Carlos Nobre, o grupo multidisciplinar em ciência e inovação tem urgência e quer estabelecer desde já parcerias público-privadas entre atores chaves no Brasil e os demais países amazônicos, unindo os melhores centros de pesquisa e desenvolvimento, universidades, start-ups e empresas visionárias do mundo. “Desejamos que se inicie uma revolução”.
Fonte: Página 22