Por Naiara Carolina Fernandes de Mendonça*
Água. Tecnicamente conceituada como composto químico formado de dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio (H2O). Um elemento tão simples quanto essencial à vida humana.
Nosso planeta, embora denominado Terra, possui 2/3 de água em sua superfície, sendo que 96,5% dela formam os oceanos como água salgada, e apenas 3,5% se encontram em forma de lagos, geleiras ou calotas polares, onde podemos encontrar a água doce.
Desta água doce tem-se que 73% é utilizada na agricultura, 21% na indústria e 6% resulta em água potável, ou seja, própria para o consumo doméstico. Todavia, embora denominemos esse tipo de água como potável, sua qualidade ainda é muito precária, uma vez que na maioria dos países subdesenvolvidos, a maior parte das doenças e mais de 1/3 da taxa de mortalidade provêm da péssima qualidade do recurso.
Além disso, a luta pelo acesso ao recurso hídrico tem se tornado um dos principais pontos de conflito internacionais, em especial das regiões áridas e semiáridas.
Diante, então, da problemática da escassez e degradação da qualidade dos recursos hídricos do planeta, a necessidade de estabelecer mecanismos e instrumentos eficazes, capaz de criar um manejo integrado, proteger e assegurar a existência de recurso de qualidade para a presente e futura geração vem se fazendo cerne das questões globais.
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), até o ano de 2025 a quantidade de pessoas que vivem em países onde o recurso hídrico é escasso, passará de aproximadamente 700 milhões para mais de 3 bilhões. Atualmente, 1,2 bilhão de pessoas não têm acesso a água potável e cerca de 5 milhões morrem, por ano, devido a contaminações provenientes da ausência de abastecimento do recurso.
O Brasil se encontra em posição de vantagem. Contando com três bacias hidrográficas as quais resultam no maior volume de água doce do mundo – Bacia Amazônica, Bacia de São Francisco e a Bacia do Paraná – possui, assim, 12% dos recursos hídricos do planeta.
De acordo com o Itamaraty, essa porcentagem significa 53% dos recursos hídricos da América do Sul. Além disso, uma parte significante das fronteiras do país se faz por corpos d’água, sendo 83 rios fronteiriços e transfronteiriços, bem como bacias hidrográficas e aqüíferos, ocupando 60% do território brasileiro.
Por outro lado, apesar de toda essa contribuição da natureza, permitindo que o volume de água distribuído por pessoa seja 19 vezes superior ao mínimo estabelecido pela ONU (1.700 m3/s por habitante por ano), o país ainda sofre com a escassez do recurso em determinadas áreas de seu território.
Assim, e com o objetivo de tentar sanar os problemas que pairam sobre o tema, em todo o mundo, a comunidade internacional passou a adotar princípios fundamentais para a utilização sustentável e conservação das águas para as futuras gerações. Estes princípios foram firmados durante a Conferência Internacional sobre a Água e Desenvolvimentos, realizada em Dublim, na Irlanda, no ano de 1922.
O objetivo destes princípios é reconhecer a água como um recurso finito, vulnerável e essencial para a manutenção da vida e desenvolvimento do meio ambiente. Buscar o desenvolvimento e administração da água por uma abordagem participativa. E, por fim, estabelecer um valor econômico para todos os tipos de uso do bem.
Além disso, desde o ano de 1997, o Conselho Mundial da Água (CMA), organiza trimestralmente um dos eventos mais importantes sobre o tema, o Fórum Mundial da Água. Este evento conta com a participação de representantes de governos, ONGs e sociedade civil. Importante destacar que, recentemente, o Brasil foi palco da última edição do Fórum (2018), com o tema “Água Compartilhada”.
O Fórum, embora não constitua um foro intergovernamental, é considerado o principal ambiente com vista a conscientizar a sociedade sobre a relevância do recurso, criar compromissos políticos com o objetivo de elevar o tema como prioridade dos governos e estabelecer um diálogo internacional entre diferentes setores envolvidos com a temática dos recursos hídricos, contando com ampla participação da sociedade civil.
Todos esses eventos e discussões sobre o tema são de extrema importância, uma vez que incorporam ao setor hídrico especificidades que devem ser ressaltadas e respeitadas, diante dos inúmeros conflitos existentes em relação aos recursos hídricos. Todavia, embora haja todos esses esforços a fim de trazer uma solução para o problema da água, o que se observa é a negligência com a qual os recursos hídricos são geridos e distribuídos no Brasil e no mundo
Os argumentos a fim de justificar a desigual distribuição de água giram em torno das características geográficas peculiares de cada região, além das alterações de vazão dos rios, que se dão por conta das variações de clima. Fato é que, a quantidade de recursos hídricos do mundo é capaz de abastecer toda a população. No Brasil, por exemplo, tem-se que a quantidade de água existente no país é suficiente para atender 57 vezes a demanda atual, todavia não é o que se passa no cenário brasileiro e mundial.
Claro que a questão geográfica dificulta a chegada do recurso a determinadas regiões, mas o principal fator que nos leva à essa desigualdade hídrica é político. A má gestão dos recursos hídricos leva a um dos maiores problemas enfrentados quando se trata do tema.
Segundo José Esteban Castro, um dos grandes especialistas no assunto, se a gestão dos recursos hídricos fosse pautada nos princípios da igualdade e democracia, isso não aconteceria.
Ele destacou que em uma cidade do México, por exemplo, na qual um rio passava na porta das casas de uma determinada população, estes não possuíam água em suas torneiras. Já em uma outra cidade, localizada em meio ao deserto, cerca de 80% de sua população recebia água em suas casa.
Nesse sentido, é possível afirmar que o problema da água do planeta gira em torno de um fator político e de gestão. O que é lamentável, uma vez que em tempos onde a solidariedade e igualdade são aclamadas e a busca pelo bem estar da comunidade internacional tão necessária, o interesse daquele que gere ainda prevalece sobre as necessidades do outro.
É preciso entender que a gestão da água, diz respeito à gestão da vida, e de uma vida digna. Esse é o compromisso!
*Mestranda em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável pela Escola Superior Dom Helder Câmara.