Há 37 anos estudando a Amazônia, mudanças climáticas e povos indígenas, o antropólogo americano Steve Schwartzman teve o seu primeiro contato com o Brasil nos anos 80, quando iniciou uma pesquisa de campo com os índios da tribo Panará no Parque Indígena do Xingu, onde viveu por dois anos e aprendeu a língua da tribo.
Essa experiência forma uma trajetória que o coloca como um dos grandes especialistas em povos indígenas, florestas tropicais, desmatamento e redução de emissões de carbono.
Para Schwartzman, que é conselheiro do IPAM desde 2005 e também diretor sênior do Environmental Defense Fund, o presidente Temer “joga um jogo muito perigoso” ao atender a bancada ruralista, freando as demarcações de terras indígenas. De acordo com o pesquisador, são atitudes como essa que colocam em xeque a credibilidade do Brasil no mundo.
O antropólogo concedeu entrevista ao Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), 20-07-2017.
Steve Schwartzman
Eis a entrevista.
Na contramão de garantir a floresta em pé, o presidente Temer assinou um parecerque pode parar a demarcação de terras indígenas. Qual o risco dessa ação?
Essa é uma profunda e grave questão. Quem se diz representante dos produtores rurais no congresso tinha de ter consciência que eles dependem da chuva para produzir e já é comprovado que a floresta em pé é uma garantia. A demarcação de terras, além de assegurar um direito dos indígenas, é uma forma de controlar o desmatamento e permitir a produtividade agrícola. Esse parecer é não só uma injustiça como um contrassenso enorme. Esse é um jogo muito perigoso do presidente com a bancada ruralista. São ganhos fictícios que vão manchar seriamente a imagem do Brasil internacionalmente.
Qual a importância de territórios indígenas para o clima mundial?
Os territórios indígenas têm um peso decisivo na conservação do meio ambiente, protegendo 30% do carbono na Amazônia. Porém, grande parte dessas florestas está sob pressão. Se perdermos esse estoque de carbono, ficará mais difícil atingir a meta de conter o aquecimento em 2ºC. Mas se conseguirmos defender essas terras e viabilizar a economia sustentável, isso significará um grande passo para conter a fronteira agrícola e o desmatamento.
O governo brasileiro tem colocado em prática medidas que vão na contramão do discurso, como a redução da Floresta Nacional do Jamanxim, na Amazônia. Falta credibilidade e sobram incentivos a favor do desmatamento?
Propor a redução de Jamanxim por meio de medida provisória, vetar e transformar em projeto de lei, além da MP de grilagem, tudo isso é um sinal preocupante. É um cálculo de curto prazo muito prejudicial que irá impactar o Brasil a longo prazo.
Ampliando para o cenário internacional, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anulou os compromissos assumidos pelos EUA na COP 21. Como isso impacta diretamente nas metas mundiais e como os estados americanos estão respondendo a isso?
É um sinal péssimo, porém precisamos levar em consideração algumas questões. As emissões de gases de efeito estufa dos EUA estão caindo, o que está relacionado com a transformação do mercado de energia. A Califórnia e outros estados mantêm as políticas firmadas, inclusive organizando alianças que envolvem centenas de municípios para participar da Conferência do Clima esse ano.
Apesar dessas iniciativas, a postura de Trump é um prejuízo muito grande para os EUA, afinal China e Europa continuam investindo em um desenvolvimento sustentável. Mesmo economicamente não é interessante apostar em um modelo energético ultrapassado.
Como você se sente dentro do conselho de uma instituição como o IPAM?
É uma honra e um prestígio compor o corpo de conselheiros do IPAM, uma instituição que contribui efetivamente em defesa do meio ambiente. O Brasil e o mundo precisam de um IPAM cinco vezes maior.