Por Patrícia Azevedo
Repórter Dom Total, enviada especial a Brumadinho.
Brumadinho (MG) – Uma cidade que aguarda notícias e busca respostas. Na tarde deste sábado (26), uma equipe do portal Dom Total seguiu para Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, para registrar a movimentação no local após o rompimento de uma barragem de contenção de resíduos da Vale. O acidente ocorreu na sexta-feira (25) e deixou pelo menos 60 mortos e cerca de 292 desaparecidos, 192 resgatados e 382 localizados.
O número de carros parados no acostamento chamava a atenção já nas proximidades do município de Mário Campos, localizado a 15 quilômetros de Brumadinho. Em pé, às margens da rodovia MG-040, motoristas e passageiros se misturavam aos moradores da região para observar o rio Paraopeba, que ganhou cor marrom devido à presença da lama de rejeitos que desceu o córrego do Feijão.
Entre eles estava o encarregado de obras Cícero Albuquerque, de Sarzedo. Ele seguia para Brumadinho em busca de notícias de quatro amigos que trabalham como terceirizados na Vale e estão desaparecidos. “O clima está muito tenso, esse rompimento nos pegou de surpresa. Eu mesmo estava trabalhando ontem quando recebi a notícia, por volta de meio dia. Isso ‘desmonta’ a gente. Olha o rio, está horrível! Costuma ser mais claro, bem mais claro, agora só tem lama e rejeitos”, afirmou Cícero.
Entre Mário Campos e Brumadinho, o movimento de viaturas das polícias Civil e Militar, Corpo de Bombeiros e Defesa Civil ficou cada vez mais intenso. Em frente ao gabinete de crise da tragédia, estruturado na Faculdade Asa, repórteres de diferentes veículos disputavam espaço e informações. Às 14h40, era grande a expectativa para o depoimento da procuradora-geral da República, Raquel Dodge. A entrevista, no entanto, foi adiada em função da forte chuva que atingiu o local. Restava aos jornalistas aguardar.
Seguimos então rumo ao povoado de Tejuco, que foi parcialmente evacuado em função da lama que atingiu o local. A vendedora Rosilda Rodrigues, que mora no povoado, destacou o sentimento de indignação e medo compartilhado pela comunidade. “As pessoas estão preocupadas, chorando, apreensivas. Estamos com muito medo também, porque existem outras firmas lá para cima. E se acontecer a mesma coisa? O sentimento é de muita indignação. Amigas minhas estão chorando pelos filhos desaparecidos. Não temos notícias. As famílias vão aos hospitais e não acham nada. Já estão abrindo covas no cemitério, é muita tristeza”, contou Rosilda. Para a vendedora, as regras para a mineração precisam ser revisadas. “Tem que ser uma coisa bem olhada. Eles vão esperar acontecer outra vez, outra tragédia?”, completou.
Também morador do Tejuco, o menino Gabriel Nonato, de 11 anos, está em busca de notícias do primo, que trabalha como caseiro em um sítio na área atingida pelo rompimento. “A minha mãe ligou para o meu primo ontem. Ele disse que ia tirar um cochilo, e depois viria à nossa casa. Estávamos na horta quando um amigo disse que a barragem tinha estourado. Desde então a minha mãe tenta ligar para ele e não consegue. Já mandou fotos para os hospitais, saiu às 8h da manhã em busca dele e até agora não voltou. A situação está feia, essa noite não consegui dormir”, disse Gabriel.
Os moradores não eram os únicos sem respostas. Às 16h05, no gabinete de crise, os jornalistas continuavam à espera do pronunciamento de Raquel Dodge e de outras autoridades. A movimentação também era intensa na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Brumadinho, que tinha a entrada de veículos controlada por policiais e membros do Corpo de Bombeiros. Ao lado da UPA, está localizada a Estação Conhecimento, espaço da Vale que está sendo usado para receber familiares e amigos de pessoas desaparecidas após o rompimento. O número de carros chegando ao local continuava grande quando deixamos Brumadinho.
Surpresa previsível
Para o professor José Cláudio Junqueira, que integra o corpo docente do Mestrado em Direito Ambiental da Dom Helder, o risco de ocorrer rompimentos é previsível, tendo em vista o elevado número de barragens de rejeitos em Minas Gerais. “A flexibilização no licenciamento ocorrida em 2017 e o desmantelamento do órgão técnico Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM), somados à lentidão para a aprovação da lei denominada ‘Mar de lama nunca mais’ agravam a situação”, afirmou.
De acordo com o professor, após a tragédia de Mariana, houve uma mobilização em torno do projeto de lei ‘Mar de Lama’, que disciplinava a questão de barragens em Minas Gerais, reduzindo os riscos de rompimento dessas estruturas. “Todavia, a par de várias audiências e dois substitutivos, nossos representantes ainda seguem um rito lento para a tomada de decisão, seguros que a lama nunca os atingirão”, ressaltou.
*Patrícia Azevedo/Com a colaboração de Wellington Kattah.
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