O alerta de ambientalistas e entidades ligadas à saúde sobre o risco cada vez maior de químicos na agricultura é sustentado por dados. O cruzamento das estatísticas de safra do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e de comercialização do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg) mostra que, nos últimos cinco anos, a venda de agrotóxicos subiu 22,1%, três vezes acima do crescimento da área cultivada. Se comparado ao avanço da produtividade, é quatro vezes maior.
Criado para monitorar esse mercado, o observatório da indústria de agrotóxicos da Universidade Federal do Paraná (UFPR) confirma que, na última década, o consumo de defensivos disparou no país. O faturamento da indústria do setor no Brasil de 2001 a 2010, por exemplo, saltou 215%, enquanto a área plantada com as principais commodities subiu 30%. Outro indicador que reforça o excesso é o de importações. Em valor, subiram 650% entre 2000 e 2011, enquanto a Alemanha, segunda no ranking, teve avanço de 192% – e a média mundial ficou em 80%.
"Esse ritmo indica o uso cada vez maior de agrotóxicos, que não é acompanhado pela expansão dos principais cultivos", avalia Victor Manuel Pelaez Alvarez, coordenador do observatório da UFPR.
Descontrole faz surgir pragas
Para Alvarez, a venda de agrotóxicos deixou de seguir boas práticas agronômicas, como diagnóstico da situação da lavoura por profissional habilitado e uso mediante receita.
"Estão usando de forma preventiva. É como fazer quimioterapia para prevenir o câncer",compara.
Visão semelhante tem o pesquisador de controle de pragas Adeney de Freitas Bueno, da Embrapa Soja. Para o especialista, uma das causas é o esfacelamento da assistência técnica oficial a partir da década de 1980. À época, a agricultura brasileira adotava o manejo integrado de pragas (conjunto de técnicas que mantém o volume das pragas em níveis abaixo do capaz de causar prejuízo). A prática foi modelo no mundo, mas acabou abandonada.
"Com a saída da assistência técnica oficial, os agricultores ficaram na mão das assistências técnicas das revendas de agrotóxicos. Por mais isentas que sejam, sua função é vender e são remuneradas por isso. Assim, ficam comprometidas", ressalta Bueno.
O pesquisador lembra que, na década de 1980, os plantadores de soja brasileiros faziam de uma a duas aplicações de inseticidas por ano. Agora, dependendo da região, são de cinco a 10 doses. Existe temor de possíveis efeitos colaterais.
"O uso descontrolado e intenso vai causar o surgimento de outras pragas. A explosão da helicoverpa é um exemplo – sustenta Bueno, referindo-se à lagarta que na última safra aterrorizou produtores de soja e algodão e teve confirmação também no Rio Grande do Sul."
Procurada, a Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef), que reúne 15 fabricantes de agrotóxicos no Brasil, não se manifestou.
Fonte: Zero Hora