O trabalho mais antigo que o homem realiza para transformar uma realidade é a agricultura. Pois, como sabemos, sem ela não teremos o que comer e conseqüentemente, não há como viver. Ao menos três vezes ao dia dependemos de um agricultor do campo para nos alimentar – e de uns anos pra cá – do agronegócio e suas plantas tecnológicas.
Assim como tudo no sistema capitalista que nos rege gira em torno de grandes monopólios corporativistas e cifras volumosas, na agricultura não é diferente. O agronegócio – assim nomeado por tornar a semeadura ecológica em produção industrial e mecânica em um grande negócio comercial – surgiu nos EUA na década de 50 e se popularizou no Brasil nos anos 80, e hoje representa cerca de 30% do PIB nacional.
Nos campos desmatados pelo Brasil que dão lugar a gigantescas plantações, geralmente de grãos que serão exportados e não passarão nem perto do cidadão brasileiro, se concentra os maiores usos de agrotóxicos do planeta. E não é exagero, segundo o próprio Ministério do Meio Ambiente, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos no planeta. Aqui, o seu uso é pouco regulamentado e seus efeitos no organismo humano e no equilíbrio ambiental são danosos e irreversíveis.
Em contra partida, outras tecnologias de defensivos agrícolas vêem sendo lançadas. E a genética entrou nesse ramo a partir dos anos 70, quando os primeiros experimentos em plantas começaram. Na tentativa de produzir artificialmente em laboratório plantas que fossem resistentes às ‘pragas’, cientistas e geneticistas desenvolveram o transgênico e o OGM, que são distintos e muitas vezes confundidos. Ocorre que OGMs e transgênicos não são sinônimos. Todo transgênico é um organismo geneticamente modificado, mas nem todo OGM é um transgênico. OGM é um organismo que teve o seu genoma modificado em laboratório, sem todavia receber material genético (RNA/DNA) de outro organismo.Transgênico é um organismo que foi submetido à uma técnica específica de inserção de material genético (trecho de RNA|DNA) de outro organismo de espécie diferente, na intenção de inserir nele capacidades que ele não possui, beneficiando assim a lavoura e provocando uma mudança genética sem fim procedentes a longo prazo.
Coordenador de pesquisas de Recursos Genéticos e Biotecnologia da Embrapa, Elibio Rech defende uso da tecnologia para baixar custos e acelerar tratamentos. No laboratório, vidro com cultura de tecidos controlados.
As ditas plantas tecnológicas são propagadas e comercializadas pelos benefícios do manejo integrado de pragas eficaz. A transgenia de fato tem os seus pontos positivos, como a redução de uso de agrotóxicos, já que a própria planta foi programada para não ser ”apetitosa” a determinados insetos, daí não há necessidade de pulverizar venenos e disseminar pragas (insetos, fungos, vírus, bactérias e outros) e herbicidas. O mau uso de pesticidas (agente biológico que não é necessariamente um veneno, mas pode ser tóxico ao ser humano) pode causar riscos ambientais, tais como o aparecimento de plantas resistentes a herbicidas e a poluição dos solos e lençóis freáticos. O uso de herbicidas, inseticidas e outros agrotóxicos podem diminuir com o uso dos transgênicos, já que eles tornam possível o uso de produtos químicos corretos para o problema. Uma lavoura convencional de soja pode utilizar até cinco aplicações de herbicida, enquanto que uma lavoura transgênica de Algodão BT (resistência ao herbicida glifosato) utiliza apenas uma aplicação.
E segundo a Embrapa, já existem lavouras familiares aqui e na Europa que adotaram a transgenia em vez de um cultivo agroecológico. Não existem estudos que comprovam qual a reação que tais organismos geneticamente modificados podem causar em nossos ecossistemas e em nós próprios em longo prazo. O que existe são pesquisas realizadas que nos dizem que tais alimentos são seguros e não existem problemas em comê-los. Mas, será verdade?
Manipular genes e modificar a essência da vida, mesmo que seja em uma planta ou animal, e até mesmo em seres humanos, é arriscado e não há como saber com exata precisão o desencadeamento de tudo isso no futuro.
Um outro olhar
Diante de todos esses termos científicos e de tecnologias supostamente capazes de serem a salvação da lavoura comercial, é possível visualizar com um outro olhar este cenário. Em vez de falarmos de pesticidas, tecnologia, venenos, genética, por que não optar pelo natural, ambientalmente correto e humanamente viável?
A decisão sobre o que colocar na lavoura, ou no prato, sofre pressões em favor da economia e da eficiência do agronegócio. Os defensores da engenharia genética em plantas comestíveis argumentam que, só por esta via, será possível alimentar os 9 bilhões de habitantes previstos para 2050 no planeta. No entanto, quando a indústria assume o compromisso de promover a segurança alimentar, a lógica que se sobrepõe é a do alimento como mercadoria, e não como direito.
O cultivo orgânico ainda é pouco valorizado no nosso país, os incentivos para a agroecologia são mínimos e muitas das vezes, surgem de iniciativas privadas. O manejo natural da terra e da comida deve e pode ser orgânica e natural, respeitando o ciclo de vida da natureza, respeitando os seres humanos com dignidade e principalmente lhe dar saúde e bem-estar. Conquistar a soberania alimentar e nos livrar das plantas tecnológicas é um desafio constante e difícil, mas possível.
Adotar um novo olhar para com a nossa comida diária é um exercício. Vivemos em um planeta em que a comida se tornou comércio, e esquecemos de que comida não nasce na prateleira do supermercado. Existe toda uma cadeia produtiva que começa lá no campo até chegar a você. São vários processos, muito trabalho, dinheiro, política, tempo e energia que envolve todo esse processo, e quase sempre passam despercebidos quando pegamos aquele pacote e jogamos no carrinho de compras.
O agronegócio e seus agrotóxicos juntamente com a transgenia só se sustentam, pois existe quem compre e apóie. Mesmo que seja inconscientemente, pois não são assuntos debatidos abertamente em sociedade que possuem visibilidade para que todos saibam o que de fato está no seu prato e a qual monopólio se está financiando.
Por Laísa Mangelli
Junho / 2014