Maria Luísa Brasil Gonçalves Ferreira*
Os direitos humanos são direitos básicos, essenciais e inerentes a todos os seres humanos, independente de raça, classe social, gênero, nacionalidade ou qualquer outro tipo de discriminação. Com a promulgação da Declaração Universal de Direitos Humanos, em 1948, a comunidade internacional celebrou acordo que visa garantir a todos, de forma equânime, o exercício de seus direitos inatos.
A Declaração de Estocolmo, em 1972, incluiu o meio ambiente no rol de direitos humanos, determinando que é dever de todos proteger e buscar melhoria do meio ambiente humano. No mundo, mais 2,5 bilhões de pessoas vivem sem acesso a banheiros e sistema de esgoto adequado.
Em 2015, durante a 70ª sessão da Assembleia Geral da ONU, criou-se a Agenda 2030 que fixou vários objetivos, dentre eles, o objetivo nº 6, que determinou que os países devam se esforçar para que, até 2030, todos tenham acesso a saneamento e higiene adequados e também para acabar com a defecação a céu aberto. Contudo, somente em 2017 é que o saneamento básico foi reconhecido como direito humano.
O acesso ao saneamento básico é uma garantia do mínimo existencial, de qualidade de vida e de efetivação do princípio da dignidade humana, intimamente relacionado com o direito a sadia qualidade de vida. Portanto, é de interesse de toda a sociedade que seja diagnosticado como o racismo institucional influencia no acesso ao saneamento básico, para que, posteriormente, seja encontrada forma eficaz de interromper essa influência.
A universalização do acesso ao saneamento básico, além de significar o cumprimento de legislação federal, significa a efetivação de recomendações internacionais e possibilita a efetivação de direitos humanos.
De acordo com estudo realizado pelo Instituto Trata Brasil, os estados que menos receberam investimentos em saneamento básico entre 2015 e 2017 foram Amazonas, Acre, Amapá, Alagoas e Rondônia, totalizando 1,7%. Todos esses Estados são da Região Norte do país, onde se encontra a maior concentração de pobreza, portanto, onde há menos acesso a infraestrutura, está também a maior concentração de pobreza – junto com a Região Nordeste.
A política pública relacionada ao saneamento básico já existe, e um dos seus princípios basilares é a universalização do acesso. Em 2007 entrou em vigência a Lei nº 11.445, que estabeleceu a universalização do acesso ao saneamento básico como um dos princípios fundamentais e definiu universalização como sendo a ampliação progressiva do acesso de todos os domicílios ocupados ao saneamento básico. Este princípio da universalização, mesmo após dez anos de vigência da lei, não atingiu seu objetivo tendo em vista os números alarmantes de população sem acesso ao saneamento básico no Brasil.
Entre 2007 e 2017, houve aumento no acesso ao tratamento de água e esgoto: o total de brasileiros atendidos por abastecimento de água tratada passou de 80,9% para 83,3%; enquanto a população atendida por coleta de esgoto passou de 42% para 50,3%.
Apesar do aumento global no acesso, a região Norte do país possui números preocupantes: apenas 8,7% da população possui acesso a esgoto e 16,4% da população possui acesso ao tratamento desse esgoto. Além disso, somente 56% da população possui cobertura de água potável, números muito inferiores aos da Região Sudeste – que possui os melhores indicadores do país (91,2% de cobertura de água, 77,2% tem acesso à rede de esgoto e 47,4% ao tratamento de esgoto).
Em ranking dos vinte melhores municípios em relação ao saneamento básico, realizado em 2017 pelo Instituto Trata Brasil (2017), treze posições são ocupadas por municípios da Região Sudeste (as quatro primeiras, inclusive), cinco posições ocupadas por municípios da Região Sul (todas são cidades do Paraná) e as duas posições restantes ocupadas pela Região Nordeste (municípios da Bahia e Paraíba). Em contrapartida, o estudo apresentou o ranking dos dez piores municípios: dois são da Região Sudeste (Rio de Janeiro), um da Região Sul (Rio Grande do Sul), um da Região Centro-Oeste (Mato Grosso), um da Região Nordeste (Pernambuco) e cinco municípios são da Região Norte (Amazonas, Amapá, Rondônia e Pará).
No ranking dos dez piores municípios em relação ao saneamento básico, quatro pertencem à Região Norte e atendem menos da metade de sua população com água.O município de Santarém, no Pará, não realiza nenhuma coleta de esgoto apesar de possuir mais de 200 mil habitantes.
As análises dos dados de saneamento básico na região Norte são alarmantes, sobretudo se comparada com as outras regiões do país. os Estados que menos receberam investimentos em saneamento básico nos últimos três anos foram Amazonas, Acre, Amapá, Alagoas e Rondônia, totalizando 1,7%. O mais impressionante desses dados é que a Região Norte é a maior do Brasil e corresponde a 45% de todo o território nacional.
Políticas públicas são ações de governo para realizar interesses coletivos por meio da prestação de serviços e entrega de bens à sociedade. A formulação de uma política pública envolve diversas etapas e não se esgota quando é colocada em prática.
Após a criação e implementação de determinada política pública, é necessário que se faça a avaliação de sua dinâmica, isto é, avaliando como a implementação da política está interferindo na sociedade. A avaliação é feita por diversos atores sociais, como políticos, entidades de classe, organizações não governamentais e os próprios cidadãos, e cada conjunto de atores faz essa avaliação utilizando-se de técnicas diversas. As manifestações públicas, por meio de protestos feitos por atingidos, por exemplo, representam uma avaliação dos méritos, ainda que seja informal, portanto, cada grupo social desempenha papel fundamental no aprimoramento da política pública.
Portanto, a existência de uma política pública, institucionalizada por meio da legislação, não significa a efetiva solução do problema. É necessário que a população se mobilize para fiscalizar e cobrar dos governos a solução do problema. Protestos públicos organizados pela população são consideradas formas de avaliar o mérito da política pública, podendo influenciar o governo a pensar em soluções mais efetivas ou a reformular a política vigente.
*Maria Luísa Brasil Gonçalves Ferreira – Bacharel em Direito pela Escola Superior Dom Helder Câmara. Pós-graduanda pela Escola Superior de Advocacia da OAB. Assistente jurídica no Tribunal de Justiça de Minas Gerais.