Pequenos produtores de cacau criam nova economia na Amazônia


O cacau está mudando a face de São Félix do Xingu, no sul do Pará. Em menos de uma década, a cultura cacaueira conseguiu se tornar a melhor alternativa econômica para uma região que fez do estado um dos campeões nacionais do desmatamento. Planta nativa da Amazônia, o cacau mostra-se mais lucrativo que a criação de gado, que ajudou a pôr abaixo milhares de quilômetros quadrados de floresta nativa no município.
 
 
Com aproximadamente 82 mil quilômetros quadrados, São Félix do Xingu ainda tem na pecuária de corte sua base econômica, com cerca de 1,7 milhão de cabeças de gado. Mas é a produção e a comercialização do cacau que se coloca como a alternativa ao desmatamento e põe o futuro da região nas mãos dos pequenos agricultores, aqueles que detêm menos de 300 hectares de terra. A lavoura cacaueira começa a deslocar o eixo do desenvolvimento regional.
 
E esse eixo aponta para uma situação impensável há algumas décadas no município. Pressionados por grandes fazendeiros de gado da região e garimpeiros ilegais, os pequenos agricultores não viam outra saída senão vender suas terras e partir, ou então entrar nos sucessivos ciclos agrícolas de produção de arroz e outros cerais que se esgotavam em pouco tempo. Mas a atuação de entidades de apoio ao manejo sustentável e organização social conseguiu dar às comunidades rurais motivos de sobra para ficar, lutar e prosperar.
 
Na região desde 2011, os técnicos do IMAFLORA – Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola – estão ajudando a mudar a história de São Félix. São 32 famílias de pequenos agricultores amparadas por iniciativas como o projeto Florestas de Valor, que promove a conservação da floresta amazônica ao fortalecer as cadeias de produtos florestais não madeireiros e disseminar as boas práticas agrícolas. O projeto conta com patrocínio da Petrobras desde 2013 e participa do Programa Petrobras Socioambiental, um dos instrumentos da política de responsabilidade social da companhia. O trabalho na região se dá em parceria com a CAMPPAX – Cooperativa Alternativa Mista de Pequenos Produtores do Alto Xingu a ADAFAX – Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Familiar do Alto Xingu.
 
SOMBRA E ÁGUA FRESCA – Com sistemas de produção conhecidos como agrofloresta, construídos através do diálogo entre os técnicos do instituto e os agricultores, as árvores do cacau são plantadas à sombra de outras espécies e ajudam a recuperar áreas degradadas. “O cacau recompõe a paisagem nativa, favorece a regeneração da floresta e a recuperação de fontes de água limpa, ao mesmo tempo em que gera significativa renda ao produtor”, explica a engenheira agrônoma do IMAFLORA, Amanda Souto, que desde 2011 atua na região.
 
Atualmente, ela coordena o apoio aos agricultores familiares na recomposição das matas ciliares, áreas florestais, reservas legais e auxilia na interpretação do novo Código Florestal, para que os proprietários possam se adequar ao Cadastro Ambiental Rural (CAR).
 
De acordo com a especialista, a organização das famílias em cooperativas, a adequação socioambiental das propriedades e o domínio de tecnologias apropriadas ao manejo do cacau fazem com que os pequenos produtores sintam-se motivados a permanecer nas áreas rurais, criando condições para o surgimento de cadeias produtivas sustentáveis.
 
Estabelecer e fortalecer os elos dessas cadeias são parte do trabalho do IMAFLORA na região. Com a cultura cacaueira que floresce em São Félix, as grandes indústrias começam a se aproximar. E elas querem grande quantidade de matéria prima de alto padrão. Mas já começam a exigir também que o produto seja “correto” do ponto de vista ambiental e social, explica a especialista do IMAFLORA. O cacau desses produtores de São Félix cumpre todos esses requisitos, garante Amanda Souto.
 
BERÇO – Por ser originário da Amazônia, o cacaueiro desfruta de ambiente ideal para crescer na região, principalmente pela abundância de água e as defesas naturais contra o ataque de pragas, reduzindo a aplicação de fungicidas. Os frutos apresentam a tonalidade avermelhada, aroma frutado, mais nutrientes e manteiga na quantidade exata. As técnicas de cultivo com podas constantes e o processo de beneficiamento (quebra dos frutos, fermentação ideal e seleção das amêndoas) agregam ainda mais qualidade ao cacau produzido em São Félix.
 
No ano passado, a pedido do IMAFLORA, o cacau das regiões atendidas pelo projeto Florestas de Valor passou pelo crivo de testes profissionais entre eles a da Indústria Brasileira de Cacau – IBC e Cacau Show. Aprovado como um cacau de Tipo 1 – destinado à fabricação de chocolates finos –, o produto ganhou ainda mais destaque na vitrine nacional e internacional. “Há bons negócios no horizonte”, anima-se Amanda Souto, que estima que a produção de cacau em São Félix salte das atuais cem toneladas para o dobro disso até 2015.
 
Cada hectare plantado de cacau tem um rendimento de aproximadamente 7 hectares em pastagens para criação de gado e ainda ajuda a conservar o meio ambiente. Cada família pode cuidar de até 10 mil pés de cacau, ocupando apenas 10 hectares, favorecendo a manutenção da Reserva Legal, já que o cacau pode ser produzido dentro da floresta. É um negócio e tanto para um município que já foi o vilão do desmatamento na Amazônia e que ressurge no cenário com um novo modelo de economia florestal.
 
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Sobre o projeto Florestas de Valor
 
O projeto Florestas de Valor existe para fortalecer as cadeias de produtos florestais não madeireiros, disseminar a agroecologia e conservar a floresta em três regiões do estado do Pará: na Calha Norte do rio Amazonas, na Terra do Meio e no município de São Félix do Xingu. O projeto apoia a implantação de sistemas produtivos responsáveis, conecta extrativistas e empresas na lógica do mercado ético e busca sensibilizar a sociedade para o consumo consciente de produtos florestais e para a conservação dos recursos naturais. Saiba mais em www.imaflora.org.br/florestasdevalor
 
Fonte: IMAFlora