Comunidade internacional se aproxima do fracasso nas negociações climáticas


Ativistas protestam em Madri em 13 de dezembro de 2019 (AFP)

A comunidade internacional parecia neste sábado destinada a dar um passo atrás em seus esforços contra o aquecimento global, apesar dos apelos urgentes da ciência por ações para proteger o futuro das novas gerações.

Após uma noite de negociações, os quase 200 países que participam na 25º Conferência da ONU sobre a Mudança Climática em Madri estão mais divididos do que nunca.

“Inaceitável”, afirmaram os representantes de vários países a respeito do rascunho de acordo apresentado pela presidência chilena da COP25, reunião que deveria ter acabado na sexta-feira.

“A solução que propomos é equilibrada em seu conjunto”, disse, no entanto, a ministra chilena do Meio Ambiente, Carolina Schmidt.

Ante a urgência climática anunciada pelos cientistas e a pressão da sociedade civil cada vez mais mobilizada, a comunidade internacional precisa demonstrar em Madri sua disposição a elevar a “ambição” em 2020, ou seja, as metas de cada país de redução de emissões de gases do efeito estufa.

Os objetivos determinados no Acordo de Paris em 2015 são insuficientes para conseguir limitar o aquecimento a +1,5 ºC, um limite que de acordo com os cientistas permitira conter os efeitos devastadores.

Mas após duas semanas de negociações e apelos a favor da ação liderados pela jovem ativista sueca Greta Thunberg, o rascunho do acordo não reflete a necessidade de reforçar as metas de redução das emissões no próximo ano.

“É impossível sair desta COP sem uma mensagem forte sobre a ambição”, afirmou em nome da União Europeia (UE) a ministra finlandesa do Meio Ambiente, Krista Mikkonen.

“É algo que as pessoas nos pedem e devemos atender a seu apelo”, completou.

Os países insulares e mais vulneráveis à mudança climática denunciaram um passo atrás.

“Todas as referências à ciência perderam força, todas as referências a elevar a ambição desapareceram. Parece que preferimos voltar ao passado”, criticou Carlos Fuller, negociador de um grupo de 44 Estados insulares, que enfrentam uma ameaça existencial pelo aumento do nível do mar.

México, Argentina e Uruguai denunciaram que o rascunho atual retirou as referências à importância de levar em consideração os direitos humanos e os dos indígenas nas ações para lutar contra o aquecimento

ONGs e observadores também criticaram o progresso das negociações.

“A presidência chilena tem uma tarefa: proteger a integridade do Acordo de Paris e não permitir que o cinismo e a ganância o enterrem”, afirmou a diretora do Greenpeace International, Jennifer Morgan. “Mas até agora fracassou”, disse.

“Este é o pior texto que vi em todas as negociações climáticas. Será uma traição para as pessoas de todo o mundo, da mesma maneira que o governo chileno está traindo seus cidadãos em casa”, declarou o diretor da ONG Power Shift Africa, Mohamed Adow, em referência aos protestos sociais no país latino-americano.

“Nos últimos 25 anos, eu nunca vi esta desconexão quase total entre o que a ciência e as pessoas no mundo pedem e o que os negociadores climáticos estão conversando”, afirmou Alden Meyer, observador veterano das negociações.

– Novas objeções do Brasil –

O Brasil, que desde o ano passado trava uma batalha que impede a aprovação do capítulo essencial dos mercados de carbono – um sistema de troca de emissões entre países – expressou objeções neste sábado a respeito de outro assunto.

O país considerou “inaceitável” qualquer referência no recente relatório do grupo de especialistas da ONU sobre o clima que alertou para a superexploração da terra, principalmente devido às práticas agrícolas.

No ritmo atual, a temperatura mundial poderia aumentar até 4 ou 5 ºC no fim do século em comparação com a era pré-industrial.

A ONU considera que é necessário reduzir as emissões em 7,6% ao ano entre 2020 e 2030, mas estas registraram alta em 2019 no mundo.

AFP

Aumentam os apelos para que se evite um fracasso da COP25


Ativistas climáticos protestam na Conferência sobre Mudança Climática da ONU COP25, em Madri (AFP)

De Greta Thunberg ao Greenpeace, os apelos para que o lema da COP25, “Hora de Agir”, não fique apenas no papel se multiplicaram nesta quarta-feira em Madri, onde a comunidade internacional prossegue discutindo a crise climática.

Até sexta-feira, cerca de 200 países estão convocados a impulsionar o Acordo de Paris, concluindo aspectos técnicos importantes, como o funcionamento dos mercados de carbono, além de mostrar sua disposição de fazer mais para limitar o aquecimento a menos de +2 graus e, se possível, + 1,5 grau.

Mas a falta de progresso da comunidade internacional diante da emergência climática decretada pelos cientistas e a mobilização dos cidadãos provocaram discursos raivosos em Madri.

Thunberg, nomeada nesta quarta-feira “Personalidade do ano” pela revista Time, lamentou que “nada esteja sendo feito” e, o que é pior, acusou os países ricos de enganar com metas ambiciosas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa.

A maioria dos estados trabalha com objetivos de redução de emissões de médio prazo e uma das questões centrais das negociações é a necessidade de aumentar a ambição de cada um.

“Um punhado de países ricos prometeu reduzir suas emissões de gases de efeito estufa em X por cento nesta ou naquela data, ou alcançar a neutralidade do carbono em X anos”, afirmou a jovem militante sueca.

“Pode parecer impressionante à primeira vista (…), mas isso não é liderança, é engodo, porque a maioria dessas promessas não inclui a aviação, transporte ou importação e exportação de mercadorias. Em vez disso, incluem a possibilidade de que os países compensem suas ambições fora de suas fronteiras”, denunciou, lembrando as disposições do Acordo de Paris.

Thunberg pediu aos países ricos que assumam sua responsabilidade e atinjam a meta de “zero emissões de uma maneira muito mais rápida e depois ajudem os mais pobres a fazer o mesmo”.

A Conferência das Nações Unidas sobre o Clima parece ter se tornado “uma oportunidade para os países negociarem brechas legais e evitarem maiores ambições”.

Uma manifestação de ONGs e ativistas foi convocada nesta quarta-feira na COP25 para reivindicar “soluções reais” aos países ricos.

Onde estão os adultos?

Os mais velhos compartilham da mesma preocupação.

“Participei da COP durante 25 anos: nunca vi uma lacuna tão grande entre o que acontece dentro e fora destas paredes”, afirmou Jennifer Morgan, diretora do Greepeace International.

“As soluções são acessíveis e estão diante de nossos narizes”, acrescentou. “Mas onde estão os líderes, os adultos?”, questiona.

“O coração de Paris (o acordo) continua batendo, não abandonem”, implorou.

Dados científicos sugerem que qualquer atraso agravará o aquecimento, com consequências catastróficas para o planeta.

As emissões de CO2 aumentaram 0,6% em 2019 em todo o mundo, de acordo com o balanço anual do Global Carbon Project (GCP).

Questão de necessidade

Os dados contrastam com o que, segundo a ONU, teria que ser feito a partir de 2020 para atingir o objetivo de +1,5 grau: reduzir as emissões de gases de efeito estufa de 7,6% ao ano até 2030.

No ritmo atual, a temperatura mundial poderá subir para 4 ou 5°C no final do século em comparação com a era pré-industrial.

Na tentativa de impulsionar as negociações, a ministra espanhola da Transição Ecológica, Teresa Ribera, nomeada “facilitadora” na reta final da COP25, afirmou que “não é mais uma questão de ambição”. “É uma questão de necessidade. Uma necessidade comum de agir”, destacou.

“Se alcançarmos um resultado ruim no final da semana (…), enviaremos um sinal terrível ao mundo”, disse Alden Meyer, da União de Cientistas Preocupados, com sede nos Estados Unidos.

AFP

COP25 entra em semana decisiva sem sinais de ação ambiciosa


Conferência de imprensa de jovens ativistas pelo clima (AFP)

A segunda semana da 25ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas começa em Madri nesta segunda-feira, com uma enorme lacuna entre as expectativas dos defensores do clima e as intenções dos países mais emissores de gases de efeito estufa.

Os jovens gritam sua raiva, o chefe da ONU repete os avisos cada vez mais preocupantes, mas na COP25 os sinais de uma resposta ambiciosa dos países mais responsáveis pelas mudanças climáticas são fracos.

A lacuna até “cresceu”, estima Jennifer Morgan, diretora do Greenpeace Internacional. “A paralisia dos governos é incrivelmente perturbadora”.

Desta forma, nenhum dos grandes emissores deve fazer um anúncio significativo sobre suas ambições. Obviamente, nem os Estados Unidos que formalizaram sua retirada do pacto climático no próximo ano, nem a China, a Índia, o Japão ou mesmo a União Europeia, que concentra todas as esperanças.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, foi mais claro do que nunca na abertura desta COP. “Esperamos um movimento profundo da maioria dos países do G20, que representam três quartos das emissões globais”, disse aos cerca de 200 signatários do Acordo de Paris, pedindo em particular o fim dos subsídios aos combustíveis fósseis e descarbonização de setores-chave da energia e transporte.

Mas o Acordo de Paris, que visa limitar o aquecimento a um máximo de +2 graus, prevê que os Estados revisem seus compromissos de redução de emissões somente em 2020, enquanto a maioria deles se concentra na COP26 em Glasgow.

“O grande evento será a COP26, mas não podemos esperar mais”, insistiu a jovem ativista climática Greta Thunberg, que chegou a Madri na sexta-feira e arrastou milhares de manifestantes pelas ruas.

A cinco dias para o final da reunião, “os sinais não são bons”, comentou Alden Meyer, da Union for Concerned Scientists, observadora de longa data das negociações climáticas.

Para China, Índia ou Japão, “se decidirem agir, será mais próximo da COP26”, disse. Quanto à UE, é em Bruxelas que ações podem ser adotadas em uma cúpula na quinta e sexta-feira.

“Recuo”

Enquanto isso, cerca de 70 países comprometidos em aumentar suas ambições de reduzir as emissões de gases de efeito estufa até 2020 se reúnem em Madri na quarta-feira.

Novos membros poderiam se unir a essa aliança, que representa apenas 8% das emissões globais, mas nenhum grande emissor, prevê Alden Meyer.

Neste contexto, muitos contam com o engajamento do setor privado. Um grupo de mais de 600 investidores institucionais que administram cerca de US$ 37 trilhões pediu nesta segunda-feira o fim do carvão e mais ambições dos Estados.

Mas para as regiões na linha de frente dos impactos já devastadores das mudanças climáticas, tudo isso está longe de ser suficiente.

“Algumas partes influentes dificultam os esforços para responder à emergência climática”, disse Janine Felson, representante do grupo dos 44 Estados insulares.

“Vimos recuos de nossos parceiros desenvolvidos” em matéria de “perdas e danos”, lamentou Sonam P. Wangdi, que preside o grupo dos Países Menos Avançados.

De acordo com um relatório recente do Instituto Internacional para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, as famílias rurais de Bangladesh gastam US$ 2 bilhões por ano para reparar os danos causados por ciclones e outros eventos extremos.

AFP