O uso de corantes naturais para tingimentos na moda mostrou-se uma alternativa eficaz para ligar a indústria têxtil à sustentabilidade. Mais que isso, os corantes provenientes de espécies de origem amazônica movimentam a economia e o mercado de trabalho daquela região. A pesquisa conduzida na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) por Janice Accioli Ramos Rodrigues buscou testar a eficiência de formas de pigmentação com fórmulas menos agressivas para a aplicação em artigos do vestuário de moda, tentando minimizar os impactos ambientais causados pela indústria têxtil, que é considerada uma das maiores poluidoras do meio ambiente. A dissertação de mestrado Uso de corantes de origem natural para o tingimento de artigos têxteis de moda foi orientada pelo professor Mauricio de Campos Araujo.
As espécies utilizadas na pesquisa foram: açaí (Euterpe oleracea), andiroba (Carapa guianensis Aubl.), jenipapo (Genipa americana L.), mamorana (Pachira aquatica Aubl.), urucum (Bixa orellana L.) e cipó- verônica (Dalbergia subcymosa Ducke). Os extratos foram preparados e, após processos químicos, foram testados em tecidos. “Foram feitos testes em tecidos planos PT com ligamento sarja, de algodão 100% fornecido pela empresa Cedro Têxtil, e em um segundo momento tecido meia-malha composto por 98% algodão e 2% elastano, fornecido pela empresa Rosset Têxtil, alvejado e purgado pela Donacor Lavanderia, para comparar-se tal afinidade”, relata Janice. “Deu-se preferência às fibras com algodão pela sua origem vegetal.”
Após o tingimento, foi analisada a potencialidade dos corantes, ou seja, os testes seguintes tinham como objetivo analisar a solidez do corante diante da lavagem. Essa análise contou com alguns fatores como temperatura, alcalinidade, alvejamento e ação abrasiva. Após esse processo, foi criada uma cartela de cores como resultado das colorações, uma coleção e quatro artigos de roupa com os tecidos tingidos.
“No tocante à coleção e aos artigos do vestuário, estes foram elaborados como forma de validar os resultados experimentais do presente estudo. Como o objetivo principal é o uso dos corantes no vestuário de moda, alguns dos corantes foram aplicados nas peças confeccionadas, as quais foram projetadas em um estágio junto ao curso de Design de Moda, da Universidade Técnica de Lisboa, em Portugal, de setembro a novembro de 2012”, explica a pesquisadora. A criação da coleção envolveu uma pesquisa teórica de imagens, definição de uma temática, modelagem das peças escolhidas e a elaboração de peças-piloto para a posterior confecção no Brasil. O tema escolhido para a coleção foi “Navegar é preciso, ser sustentável também é”.
Benefícios além-moda
“Quanto aos resultados, pode-se dizer que se chegou ao objetivo proposto, pois foram obtidos corantes aptos a serem usados na industria têxtil, com boa solidez às lavagens e à luz, além de terem sido produzidas peças de roupa em tamanho normal para a aplicação dos mesmos”, relata Janice.
Além do incentivo à sustentabilidade, a concretização do uso dos corantes naturais pode agregar projetos com base na economia solidária na Ilha do Combú, próxima a Belém do Pará, local de onde advém os materiais estudados. A estruturação de uma cooperativa voltada para a manufatura de produtos de moda com corantes naturais levaria em consideração os aspectos sociais, econômicos, ambientais e culturais.
A pesquisadora tem como metas a reverter benefícios financeiros para a comunidade local, assim como preocupa-se com possíveis impactos causados por pessoas de fora dessas comunidades, que não têm familiaridade com as técnicas utilizadas. Logo, a colaboração dos povos locais deve ser iniciada “pelo manejo dos elementos vegetais, com a devida observação de que a ilha é uma área de preservação ambiental e, portanto, tem certos limites para a exploração dos seus recursos”, explica Janice. “Com a consequente capacitação da população local para trabalhar em algumas das etapas da produção, fruto da participação de profissionais diversos, haveria a geração de trabalho, inclusão social e, consequente, renda.”
A geração de renda a partir da produção dos corantes naturais seria um ganho excepcional, na visão de Janice. A maior parte da população local tem baixa renda e os produtos extraídos por eles não são valorizados, sendo que a produção de corantes pode reverter essa situação e agregar maior valor aos produtos.
“Certamente, por meio de um estudo mais detalhado, o que ocuparia um trabalho inteiro, seria possível trazer as bases certas para este empreendimento e, assim, além de estar cuidando da localidade com melhorias advindas deste trabalho e respeitando a natureza pelo uso adequado das matérias-primas, seria mais uma contribuição para a atmosfera da moda sustentável”, conclui Janice.
(Agência USP)
Fonte: Mercado Ético