Presos do semiaberto ajudam na retirada do óleo que chegou à foz Rio Jaboatão


O Rio Jaboatão tem cerca de 75 quilômetros de extensão, sendo local de pesca e de reprodução de espécies, incluindo tubarões. (Reprodução/WhatsApp)

O óleo que atinge o Nordeste brasileiro há mais de um mês chegou na madrugada de quarta-feira, 23, à Praia Barra da Jangada, onde está a foz do Rio Jaboatão, em Jaboatão dos Guararapes, cidade vizinha do Recife, em Pernambuco. Funcionários da prefeitura, da Marinha, do Exército e 50 presos em regime semiaberto atuam na praia, que está isolada para o acesso de voluntários.

Resíduos foram identificadas em alto-mar por um pescador na noite anterior, por volta das 23h, enquanto as manchas foram detectadas na praia por volta das 4h30. Segundo o superintendente da Proteção e Defesa Civil de Jaboatão Artur Paiva, foram retiradas 44 toneladas de óleo somente nas primeiras horas da manhã. Agora, as ações são para tirar pequenos pedaços da substância. “A nossa preocupação foi tirar rápido, não dá para deixar desse jeito”, diz. “Não pode deixar entrar no estuário. A barreira foi acionada e não encontramos nada lá.”

A Marinha justifica o isolamento da praia como medida de segurança. “Pode ser um problema para a saúde de quem manuseia. Nem todos os voluntários têm material”, diz o comandante do destacamento dos fuzileiros, capitão-tenente Gilson Cunha.

Ao todo, 1,5 mil homens da Marinha atuam no Nordeste, dos quais 380 estão em Jaboatão. “É importante que a população confie na ação conjunta (dos governos municipal, estadual e federal).”

O trabalho está sendo majoritariamente dentro da água, pois o óleo afunda no rio (enquanto boia no mar). Não está descartada ação com mergulhadores para retirar o óleo do fundo. “Quando a maré baixar, vai se poder ter uma melhor compreensão da situação”, diz o capitão.

Por volta das 9h, chegaram ao local 50 reeducandos do regime semiaberto, da Penitenciária Agroindustrial São João, em Ilha de Itamaracá, no Grande Recife. Eles foram divididos em trios para recolher restos do óleo com sacos de lixo. A ação valerá como hora trabalhada e poderá ser deduzida da pena.

Inicialmente, o grupo iria para Cabo de Santo Agostinho, onde está grande parte do óleo, mas foram remanejados após a divulgação da chegada da nova mancha. “Não imaginava que estava nessa situação”, comentada o apenado Paulo Henrique da Silva, de 21 anos. “Estamos separando o óleo com as luvas. Alguns, temos mais sorte, outros são mais difíceis de tirar. Estou achando legal poder ajudar.”

A área está isolada com fitas, com a restrição de acesso até para a imprensa e os voluntários – alguns reclamavam da situação e apontavam que os militares não deveriam atuar de bermuda (por questões de segurança). Um dos poucos voluntários que conseguiu ajudar estava em um stand up paddle, que usava para se deslocar para longe da margem para procurar manchas.

“Não estão deixando ninguém. Assim que cheguei em Itapuama, soube que tinha chegado aqui. Veio gente da Marinha e do Exército para cá, aí a gente também se dividiu”, conta a bióloga e voluntária Gabriela Barros, de 31 anos. “Viemos dar suporte e não estamos podendo fazer nada. Trouxemos doação para cá abastecendo eles. A gente está usando o mesmo tipo de proteção que eles e já temos o conhecimento de quem está atuando nisso.”

O Rio Jaboatão tem cerca de 75 quilômetros de extensão, sendo local de pesca e de reprodução de espécies, incluindo tubarões. “Aqui tem caranguejo, camarão, peixes, logo na frente tem a colônia de pescadores que nos ajudou bastante a monitorar”, conta Edilene Rodrigues, superintendente de Meio Ambiente de Jaboatão. “A nossa barreira de contenção rompeu na madrugada (por causa da maré), mas o intuito é que, se viesse boiando (o óleo), conseguiria reter”, conta. “Várias redes de camarão foram distribuídas e conseguiram interceptar uma grande massa que chegou no domingo.”

Segundo o governo de Pernambuco, boias de contenção estão sendo colocando no mar e em rios desde o dia 17. Como o estuário do Rio Jaboatão tem densidades distintas, por reunir águas doce e salgada, o óleo consegue escapar por baixo da boia. Por isso, foi iniciada a colocação de redes submersas abaixo das boias, que somam três quilômetros de extensão.

Agência Estado

Óleo retirado das praias do Nordeste viram cimento no PE e carvão na BA


O carvão pode ser misturado com terra e colocado nas plantas, como uma espécie de adubo (Divulgação/UFBA)

As imagens de toneladas e toneladas de óleo retiradas das praias do  Nordeste têm levantado uma questão: e depois, o que fazer com tudo isso?  A resposta em Pernambuco foi levar o material à Central de Tratamento  de Resíduos, a Ecoparque, empresa contratada em regime de urgência, cujo aterro é sediado em Igarassu. Para lá, foram destinadas mais de 1,3 mil  toneladas de óleo e itens contaminados pela substância, como baldes, luvas e máscaras.

O material passa por uma triagem para reduzir a presença de areia e, em  seguida, é triturado com tecidos, borrachas e outros itens que tiveram  contato com produtos industriais. O resultado são pilhas de fragmentos  diversos, em que o óleo se destaca pelo brilho.

Forma-se, então, o que se chama de blend energético, que é vendido para  ao menos três empresas de produção de cimento, sendo utilizado como  combustível de fornos junto com o coque – um subproduto destilado do  petróleo. “O petróleo sólido é muito caro e exige grande logística,  porque vem de navio. Assim como o coque, esse blend tem o poder  calorífico alto”, explica Romero Dominoni, diretor geral da Ecoparque.

Na Bahia, os resíduos encontrados nas praias têm se transformado em  carvão, com a ajuda de cientistas. Dentro de uma betoneira, são usados  bioaceleradores desenvolvidos por um grupo de pesquisadores do Instituto de Química da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Esses componentes ajudam na degradação do óleo e o transformam em carvão. “Esses  bioaceleradores, dois sólidos e três líquidos, não agridem o solo nem os  vegetais”, disse a professora da UFBA Zenis Novais.

Segundo Zenis, o produto é bem menos agressivo do que o petróleo cru. O  procedimento pode complementar ou substituir o que se pretende fazer com  o petróleo: incinerar. “O processo de incineração produz enxofre, nitrogênio e libera gases que afetam o meio ambiente”, diz Zenis.

A aplicação do carvão, no entanto, demanda mais estudos. Segundo a professora, a depender da composição, o carvão pode ser misturado com  terra e colocado nas plantas, como uma espécie de adubo. Outra opção é  usá-lo como combustível na produção do cimento, como vem sendo feito em Pernambuco.

Agência Estado