Pequenos produtores de cacau criam nova economia na Amazônia


O cacau está mudando a face de São Félix do Xingu, no sul do Pará. Em menos de uma década, a cultura cacaueira conseguiu se tornar a melhor alternativa econômica para uma região que fez do estado um dos campeões nacionais do desmatamento. Planta nativa da Amazônia, o cacau mostra-se mais lucrativo que a criação de gado, que ajudou a pôr abaixo milhares de quilômetros quadrados de floresta nativa no município.
 
 
Com aproximadamente 82 mil quilômetros quadrados, São Félix do Xingu ainda tem na pecuária de corte sua base econômica, com cerca de 1,7 milhão de cabeças de gado. Mas é a produção e a comercialização do cacau que se coloca como a alternativa ao desmatamento e põe o futuro da região nas mãos dos pequenos agricultores, aqueles que detêm menos de 300 hectares de terra. A lavoura cacaueira começa a deslocar o eixo do desenvolvimento regional.
 
E esse eixo aponta para uma situação impensável há algumas décadas no município. Pressionados por grandes fazendeiros de gado da região e garimpeiros ilegais, os pequenos agricultores não viam outra saída senão vender suas terras e partir, ou então entrar nos sucessivos ciclos agrícolas de produção de arroz e outros cerais que se esgotavam em pouco tempo. Mas a atuação de entidades de apoio ao manejo sustentável e organização social conseguiu dar às comunidades rurais motivos de sobra para ficar, lutar e prosperar.
 
Na região desde 2011, os técnicos do IMAFLORA – Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola – estão ajudando a mudar a história de São Félix. São 32 famílias de pequenos agricultores amparadas por iniciativas como o projeto Florestas de Valor, que promove a conservação da floresta amazônica ao fortalecer as cadeias de produtos florestais não madeireiros e disseminar as boas práticas agrícolas. O projeto conta com patrocínio da Petrobras desde 2013 e participa do Programa Petrobras Socioambiental, um dos instrumentos da política de responsabilidade social da companhia. O trabalho na região se dá em parceria com a CAMPPAX – Cooperativa Alternativa Mista de Pequenos Produtores do Alto Xingu a ADAFAX – Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Familiar do Alto Xingu.
 
SOMBRA E ÁGUA FRESCA – Com sistemas de produção conhecidos como agrofloresta, construídos através do diálogo entre os técnicos do instituto e os agricultores, as árvores do cacau são plantadas à sombra de outras espécies e ajudam a recuperar áreas degradadas. “O cacau recompõe a paisagem nativa, favorece a regeneração da floresta e a recuperação de fontes de água limpa, ao mesmo tempo em que gera significativa renda ao produtor”, explica a engenheira agrônoma do IMAFLORA, Amanda Souto, que desde 2011 atua na região.
 
Atualmente, ela coordena o apoio aos agricultores familiares na recomposição das matas ciliares, áreas florestais, reservas legais e auxilia na interpretação do novo Código Florestal, para que os proprietários possam se adequar ao Cadastro Ambiental Rural (CAR).
 
De acordo com a especialista, a organização das famílias em cooperativas, a adequação socioambiental das propriedades e o domínio de tecnologias apropriadas ao manejo do cacau fazem com que os pequenos produtores sintam-se motivados a permanecer nas áreas rurais, criando condições para o surgimento de cadeias produtivas sustentáveis.
 
Estabelecer e fortalecer os elos dessas cadeias são parte do trabalho do IMAFLORA na região. Com a cultura cacaueira que floresce em São Félix, as grandes indústrias começam a se aproximar. E elas querem grande quantidade de matéria prima de alto padrão. Mas já começam a exigir também que o produto seja “correto” do ponto de vista ambiental e social, explica a especialista do IMAFLORA. O cacau desses produtores de São Félix cumpre todos esses requisitos, garante Amanda Souto.
 
BERÇO – Por ser originário da Amazônia, o cacaueiro desfruta de ambiente ideal para crescer na região, principalmente pela abundância de água e as defesas naturais contra o ataque de pragas, reduzindo a aplicação de fungicidas. Os frutos apresentam a tonalidade avermelhada, aroma frutado, mais nutrientes e manteiga na quantidade exata. As técnicas de cultivo com podas constantes e o processo de beneficiamento (quebra dos frutos, fermentação ideal e seleção das amêndoas) agregam ainda mais qualidade ao cacau produzido em São Félix.
 
No ano passado, a pedido do IMAFLORA, o cacau das regiões atendidas pelo projeto Florestas de Valor passou pelo crivo de testes profissionais entre eles a da Indústria Brasileira de Cacau – IBC e Cacau Show. Aprovado como um cacau de Tipo 1 – destinado à fabricação de chocolates finos –, o produto ganhou ainda mais destaque na vitrine nacional e internacional. “Há bons negócios no horizonte”, anima-se Amanda Souto, que estima que a produção de cacau em São Félix salte das atuais cem toneladas para o dobro disso até 2015.
 
Cada hectare plantado de cacau tem um rendimento de aproximadamente 7 hectares em pastagens para criação de gado e ainda ajuda a conservar o meio ambiente. Cada família pode cuidar de até 10 mil pés de cacau, ocupando apenas 10 hectares, favorecendo a manutenção da Reserva Legal, já que o cacau pode ser produzido dentro da floresta. É um negócio e tanto para um município que já foi o vilão do desmatamento na Amazônia e que ressurge no cenário com um novo modelo de economia florestal.
 
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Sobre o projeto Florestas de Valor
 
O projeto Florestas de Valor existe para fortalecer as cadeias de produtos florestais não madeireiros, disseminar a agroecologia e conservar a floresta em três regiões do estado do Pará: na Calha Norte do rio Amazonas, na Terra do Meio e no município de São Félix do Xingu. O projeto apoia a implantação de sistemas produtivos responsáveis, conecta extrativistas e empresas na lógica do mercado ético e busca sensibilizar a sociedade para o consumo consciente de produtos florestais e para a conservação dos recursos naturais. Saiba mais em www.imaflora.org.br/florestasdevalor
 
Fonte: IMAFlora

Comitê mato-grossense propõe Programa de Municípios Sustentáveis


                                             

   Representantes do Comitê Articulador do Programa Mato-grossense de Municípios Sustentáveis se reuniram nesta segunda-feira (04) com o governador Silval Barbosa para apresentar a proposta de criação do programa.  O Comitê foi criado em julho deste ano durante o I Seminário Mato-grossense de Municípios Sustentáveis, com objetivo de trabalhar na estruturação de uma proposta de programa estadual que apoie e promova o desenvolvimento sustentável dos municípios da Amazônia Mato-grossense, através do fortalecimento da economia local, da melhoria da governança pública municipal, da promoção da segurança jurídica e da redução do desmatamento e degradação ambiental.

   Valmir Ortega, consultor do ICV para o tema, disse que a proposta já conta com o apoio das secretarias de Estado de Meio Ambiente (Sema) e de Desenvolvimento Rural (Sedraf) e, agora, conseguiu o aval do governador. “O programa precisa de um maior engajamento do Estado nesse processo de elaboração, o que foi garantido pelo governador”, explicou.

   Silval Barbosa garantiu que o Estado será parceiro no desenvolvimento do programa. “Colocamos nossas ferramentas e secretarias à disposição para que o programa seja desenvolvido de forma rápida”, disse.

   Irene Duarte, coordenadora da Iniciativa Municípios Sustentáveis do Instituto Centro de Vida (ICV), ressaltou que a disposição do governador em colaborar com os trabalhos do Comitê agrega valor a proposta que está sendo elaborada. “O Comitê articulador do programa de municípios sustentáveis de Mato Grosso é multissetorial e precisa do envolvimento dos atores locais, estaduais e federais para realmente se tornar uma política pública”, reforçou.

   Nos dias 26 e 27 de novembro, representantes do Comitê participarão de uma Oficina no Ministério do Meio Ambiente (MMA), em Brasília, com o objetivo de conhecer os programas do governo federal que tenham relação com a proposta mato-grossense.

Comitê Articulador 

  Em julho de 2013, o ICV, em parceria com a The Nature Consersancy (TNC) e o Instituto Socioambiental (ISA), realizou o I Seminário Mato-grossense de Municípios Sustentáveis. Como encaminhamento desse evento, foi organizado um grupo para dedicar-se a elaboração de uma proposta de Programa de Municípios Sustentáveis para o estado de Mato Grosso, formalizando, assim, o Comitê Articulador que conta com 12 integrantes oriundos de consórcios intermunicipais, de órgãos estaduais, federais e organizações da sociedade civil.

Veja o vídeo reportagem do evento aqui:

Fonte: Instituto Centro de Vida

Amazônia Mundi convida público a viver experiências inesquecíveis na floresta


            

Imagine embrenhar-se em uma aventura pela Amazônia, seus encantos e mistérios. Visualizar igarapés, rios voadores e ouvir os sons da mata. Isso é possível na região Leste de São Paulo. Reunindo instalações, murais, fotos, vídeos, vitrines e ambientes com história, lendas e mitos sobre a região, a exposição Amazônia Mundi, no Sesc Itaquera, proporciona ao visitante a oportunidade de imersão na realidade da floresta.

Realizada pelo Sesc SP, a exposição  pretende sensibilizar o público para realidades ainda pouco conhecidas da região, dona de um patrimônio humano, cultural, social e biológico incalculável. “A exposição Amazônia Mundi é uma continuidade do processo de reflexão que o Sesc busca trazer ao seu público de forma aprofundada e lúdica. Importante como oportunidade de conhecermos melhor a população da região e reconhecê-los como parte do nosso conjunto humano, e à sua diversidade de fauna e flora como patrimônio brasileiro, sempre com o intuito de preservar, mas especialmente, de valorizar os aspectos socioculturais das regiões que formam este país”, afirma Danilo Santos de Miranda, diretor regional do Sesc.

Amazônia Mundi traz para a unidade Itaquera uma cenografia inédita, resultado de um trabalho iniciado em 2002, no Sesc Pompeia, com o projeto Amazônia Br, que percorreu o mundo em 11 montagens nos últimos 10 anos, e  foi visto por 1,5 milhão de pessoas. “Amazônia Mundi aproveita repertórios e experiências anteriores, incorporando as grandes mudanças pelas quais a Amazônia está passando, a partir de novos conteúdos, imagens e soluções expositivas”, afirma a curadora Anna Claudia Agazzi.

Com uma proposta de reflexão ampliada, além de aproximar o público do patrimônio amazônico e instigar a curiosidade, a exposição pretende provocar a responsabilidade em relação a ele. Com mais de 1.200m² de ambiente expositivo, Amazônia Mundi é uma das mais importantes exposições sobre a região amazônica – que traz ao público a experiência de viajar pela maior biodiversidade do planeta e conhecer o chamado “Brasil profundo” – e não poderia estar instalada em lugar mais apropriado, os 350.000m2 que compõe a unidade do Sesc em Itaquera estão localizados em uma área de proteção ambiental.

A exposição conta com um espaço que convida o visitante a conhecer festas populares da região amazônica, e ambientes multimídia que levam conhecimento sobre projetos em desenvolvimento na região, imagens de satélite do Rio Amazonas e muitas outras imersões.

             

A aventura de viajar por esse universo é amplificada pela trilha sonora desenvolvida pelo violonista e engenheiro de som Alvise Migotto. Utilizando softwares, sintetizadores, processadores de áudio e de tratamento, Alvise captou e recriou de forma artesanal sons de pássaros, insetos, vento e chuva, que compõem cada ambiente de forma diferente.

Para trazer ao público uma dimensão mais rica da diversidade da região – evitando as reduções, simplificações e estereótipos que muitas vezes caracterizam o senso comum sobre ela -, os idealizadores foram buscar conteúdo junto a organizações que pesquisam e atuam na Amazônia. São eles: Instituto Peabiru, ISA – Instituto Sócio Ambiental, INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais INPA – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, OGPTB – Organização Geral dos Professores Ticuna Bilíngues, IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, WWF – World Wide Fund for Nature, Governo do Amapá, FAS – Fundação Amazonas Sustentável e ICMBio –  Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.

A exposição que entrou em cartaz no mês de novembro permanece aberta ao público até maio de 2015. Com ingressos acessíveis a partir de R$ 1, e visitação de quarta a domingo e feriados. Endereço: Sesc Itaquera – Av. Fernando do Espírito Santo Alves de Mattos, 1000, Itaquera, São Paulo, SP; informações: (11) 2523 9200.

Fonte: http://www.dci.com.br/panoramabrasil/amazonia-mundi-convida-a-familia-para-viver-esperiencias-inesqueciveis-na-floresta-id375533.html

Laísa Mangelli

ONU abre conferência do clima em Madri


As negociações começaram sob um cenário de impactos cada vez mais visíveis do aumento das temperaturas no ano passado (AFP)

Madri – A Organização das Nações Unidas (ONU) abriu nesta segunda-feira (2) uma cúpula do clima de duas semanas em Madri, na qual líderes mundiais enfrentam crescente pressão para provar que podem demonstrar vontade política de evitar os impactos mais catastróficos do aquecimento global.

As negociações começaram sob um cenário de impactos cada vez mais visíveis do aumento das temperaturas no ano passado, com incêndios florestais se espalhando do Ártico e da Amazônia até a Austrália, e regiões tropicais atingidas por furacões devastadores.

Michael Kurtyka, ministro polonês do clima que liderou a rodada anterior de negociações climáticas da ONU na cidade polonesa de Katowice em dezembro do ano passado, disse que um aumento no ativismo climático entre jovens enfatizou a urgência da questão.

“Talvez o mundo ainda não esteja se movendo no ritmo que gostaríamos, mas minha esperança ainda está particularmente entre os jovens”, disse Kurtyka na cerimônia de abertura oficial das negociações em um centro de conferências em Madri.

“Eles têm a coragem de falar e nos lembrar que herdamos este planeta de nossos pais, e precisamos entregá-lo às gerações futuras”, disse Kurtyka.

A conferência tem como objetivo estabelecer as peças finais necessárias para apoiar o Acordo de Paris de 2015 para combater as mudanças climáticas, que entra em uma fase crucial de implementação no próximo ano.

As promessas existentes feitas sob o acordo estão aquém do tipo de ação necessária para evitar as consequências mais desastrosas do aquecimento global em termos de elevação do nível do mar, seca, tempestades e outros impactos, de acordo com os cientistas.

Matthew Green e Jake Spring/Reuters

Tríplice fronteira


Evento no Acre abordará políticas para áreas protegidas da Amazônia na Tríplice Fronteira

A atividade é convocada pela organização latino-americana Redparques — cuja secretaria técnica é exercida pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).

Mudanças climáticas ameaçam a Amazônia e, consequentemente, disponibilidade de recursos hídricos para países da região. Foto: Flickr (CC) / Dams999

Mudanças climáticas ameaçam a Amazônia e, consequentemente, disponibilidade de recursos hídricos para países da região. Foto: Flickr (CC) / Dams999

Delegados dos sistemas de áreas protegidas e governos locais de Bolívia, Brasil e Peru, além de diretores de parques ecológicos e líderes comunitários, se reunirão em Rio Branco, no Acre, nos dias 24 e 25 de maio para identificar linhas de trabalho conjuntas que permitam articular políticas em áreas de proteção ambiental nos três países.

A atividade, convocada pela organização latino-americana Redparques — cuja secretaria técnica é exercida pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) — abordará políticas para as áreas protegidas Parque Nacional Alto Purus e Reserva Comunal Purus, do Peru; Parque Estadual Chandless e Reserva Extrativista Cazumbá-Iracema, no Brasil, e a Reserva Amazônica Manuripi, na Bolívia, localizadas na Tríplice Fronteira.

A iniciativa também tem o apoio do projeto de Integração das Áreas Protegidas do Bioma Amazônico (IAPA) – Visão Amazônica, projeto financiado pela União Europeia, que busca criar uma rede de trabalho em torno aos sistemas de áreas protegidas situados na região amazônica.

O objetivo do IAPA é contribuir para o aumento da resiliência da Amazônia às mudanças climáticas, mantendo a provisão de bens e serviços que beneficiam a biodiversidade, as comunidades e as economias locais. A iniciativa tem como parceiros, além da FAO, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).

A expectativa é que o ao final do evento os países tenham definido linhas de ação para trabalhar conjuntamente nessas temáticas. Saiba mais clicando aqui.

Gráfico: IAPA/FAO/divulgação

Gráfico: IAPA/FAO/divulgação

Gráfico: IAPA/FAO/divulgação

Gráfico: IAPA/FAO/divulgação

 

Gráfico: IAPA/FAO/divulgação

Gráfico: IAPA/FAO/divulgação

Fonte: ONUBR

Corte de madeira na Amazônia atinge 2.133 quilômetros e já é o maior desde 2016


Total de 2.133 km2 é o equivalente à área do Município de São Paulo multiplicada por 1,4 (Marizilda Gruppe/Greenpeace/Arquivo)

Em pouco mais de três meses, de 1º de agosto a 13 de novembro, o corte seletivo de madeira da Amazônia – quando só algumas árvores são tiradas com o objetivo de exploração de madeira – afetou uma área de 2.133 km2, superando em 35% toda a extração ao longo dos 12 meses anteriores (agosto de 2018 a julho de 2019 em que a perda foi de 1.573 km2). É o que revela o Deter, sistema de detecção rápida por satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia.

O total de 2.133 km2 é o equivalente à área do Município de São Paulo multiplicada por 1,4. Esse corte seletivo na Amazônia em pouco mais de um trimestre já é maior do que em cada um dos três ciclos anteriores de monitoramento do Inpe, que vão de agosto a julho (2016-2017, 2017-2018 e 2018-2019).

Os dados se referem ao primeiro movimento de degradação da floresta, quando árvores mais nobres, como ipê e jatobá, são retiradas para fins madeireiros. É a etapa inicial de um processo que vai rareando a floresta até o ponto em que ela é queimada ou cortada totalmente – o chamado corte raso – para a colocação posterior de pastagem, por exemplo.

O balanço oficial de desmate do Inpe se refere só ao corte raso e não engloba o corte seletivo, que integra outro monitoramento do Inpe. Este mês, o Inpe mostrou alta de 29,5% do desmate da Amazônia. Esse balanço, portanto, não inclui essas perdas esparsas de árvores dentro da mata.

Na semana passada, reportagem revelou que Jair Bolsonaro estuda liberar a exportação de madeira in natura – hoje essa venda é ilegal. A madeira nativa explorada legalmente só pode ser exportada após passar por algum processamento, o que agrega valor ao produto exportado e oferece proteção extra à floresta, uma vez que cria mais etapas passíveis de fiscalização.

A expectativa do setor madeireiro é, se liberada a exportação, elevar a receita do mercado de R$ 600 milhões (com madeira processada e legal) para cerca de R$ 1,2 bilhão anual. De 2.133 km2 de corte seletivo desde agosto, a maior parte foi no Pará (907 km2), Mato Grosso (765 km2) e Amazonas (276 km2). Procurados, Ministério do Meio Ambiente e Secretarias de Ambiente de Pará, Mato Grosso e Amazonas não se manifestaram até as 21 horas.

Causa

O aumento, para especialistas e fiscais do Ibama ouvidos pela reportagem, segue a mesma lógica das altas seguidas no desmate (o corte raso) e estaria ligado à fiscalização menor. De janeiro a setembro, autuações de crimes contra a flora (como extração irregular de madeira) na Amazônia Legal caíram 40% ante o mesmo período de 2018.

Só com imagens de satélite não é possível diferenciar o corte seletivo ilegal do legal, mas a exploração legal só pode ocorrer com plano de manejo aprovado pela autoridade federal ou local – e não há indícios de que tenham sido aprovados mais planos nos últimos meses.

Além da possibilidade de autorizar a exportação de madeira in natura, o presidente do Ibama, Eduardo Bim, flexibilizou normas de fiscalização e de multa a serrarias que comprem madeira ilegal. Bim enviou documento a fiscais dizendo que empresas que compraram madeira acompanhadas de documentos de origem florestal fraudados não podem ser multadas pelo Ibama a menos que demonstrado indício de que o comprador sabia antes que o documento era falso.

Previsões

“Temos, em média, 10% a 15% do mercado de madeira sendo exportado. Nossa intenção é que esse volume chegue a pelo menos 30%”, diz o superintendente do Fórum Nacional de Base Florestal, Valdinei Bento dos Santos. O Fórum é formado por 24 instituições do setor madeireiro do país.

Beto Mesquita, da BVRio, que promove negócios que cumpram a lei ambiental, discorda. Ele lembra que o mercado internacional de madeira, especialmente Estados Unidos e União Europeia, demanda garantias, por parte dos compradores de seus países, de que os produtos que importam são legais.

Para Paulo Barreto, pesquisador do Imazon, o veto à venda de madeira in natura é uma política de desenvolvimento econômico local, com o processamento de toras. “Liberar exportação de toras reduzirá a oportunidade de desenvolvimento local. E pode ser um problema ambiental se aumentar a exploração, porque há muita extração ilegal.”

Agência Estado

O Açaí, fruto típico da palmeira amazônica, ganhou o mundo


O açaizeiro é uma palmeira tipicamente tropical, encontrada no estado silvestre e faz parte da vegetação das matas de terra firme, várzea e igapó. A palmeira também é explorada na região para a extração do palmito. Conhecido por ter uma polpa com grande poder nutritivo, a fruta é consumida no mundo todo em bebidas, mix de frutas, sorvetes e cápsulas.

              

O Açaí, fruto típico de uma palmeira amazônica, ganhou o mundo. É vedete nas lanchonetes de cidades litorâneas do Brasil, em quiosques de Los Angeles e Nova Iorque (EUA) e até em Paris (França). Açaí, típico da região Amazônica, fruto do açaizeiro (Euterpe oleracea, família Palmae)  é muito utilizado pelos habitantes no preparo de sucos, vinhos, doces, licores e sorvetes. O açaizeiro é uma palmeira tipicamente tropical, encontrada no estado silvestre e faz parte da vegetação das matas de terra firme, várzea e igapó. A palmeira também é explorada na região para a extração do palmito. Conhecido por ter uma polpa com grande poder nutritivo, a fruta é consumida no mundo todo em bebidas, mix de frutas, sorvetes e cápsulas.     

Na região amazônica, o suco feito com a polpa é conhecido como “vinho de açaí”. Consumido geralmente com farinha de tapioca, faz parte da alimentação local. Hoje, o estado que lidera a produção é o Pará, com quase 90% do mercado, mas o açaí é apreciado em toda a região amazônica e recentemente tem sido também consumido pelos estados do Sul e Sudeste do Brasil, principalmente por academias e atletas.Despolpamento do fruto    
Pelo despolpamento do fruto, obtem-se o tradicional "vinho do açaí", bebida de grande aceitação e bastante difundida entre as camadas populares, considerado um dos alimentos básicos da região.    O caroço (endocarpo e amêndoa), após decomposição é largamente empregado como matéria orgânica, sendo considerado ótimo adubo para o cultivo de hortaliças e plantas ornamentais.    

Utilização da Estirpe do Açaí    
Quando adulto e bem seco, a estirpe é bastante utilizado como esteio para construções rústicas, ripas para cercados, currais, paredes e caibros para coberturas de barracas, lenha para aquecimento de fornos de olarias. Experiências realizadas pelo Idesp-Pará, demonstraram a sua importância como matéria-prima para produção de papel e produtos de isolamento elétrico.    

A Copa    
As folhas do açaí servem para cobertura de barracas provisórias e fechamento de paredes, especialmente as de uso transitório como as utilizadas pelos roceiros e caçadores. Quando verdes e recém-batidas, servem como ração, sendo bastante apreciada pelos animais. As folhas do açaizeiro, após trituração, também fornecem matéria-prima para fabricação de papel. Na base da copa, constituída pela reunião das bainhas e o ponto terminal do estipe, encontra-se um palmito de ótima qualidade e muito procurado pelas indústrias alimentícias.    

               

As bainhas da folhas, por sua vez, após separação para extração do palmito e os resíduos deste, são utilizadas como excelente ração para bovinos e suínos, bem como – após decomposição – excelente adubo orgânico para hortaliças e fruteiras. 

A Planta    
É palmeira de belo porte, apresentando-se bastante alta, quando em concorrência na floresta, porém de porte médio se cultivada isoladamente ou sem influência de árvores de grande porte. Presta-se com ótimos resultados para ornamentação de jardins e parques. Pelas características de cultura permanente, pode ser recomendada para proteção do solo, por apresentar uma deposição constante de folhas, aliado ao sistema radicular abundante que possui.    

Importância Comercial    
O açaí é de importância incalculável para a região amazônica em virtude de sua utilização constante por grande parte da população, tornando-se impossível, nas condições atuais de produção e mercado, a obtenção de dados exatos sobre sua comercialização. A falta de controle nas vendas, bem como a inexistência de uma produção racionalizada, uma vez que a matéria-prima consumida apoia-se pura e simplesmente no extrativismo e comercialização direta, também impedem a constituição de números exatos.

Variedades
O açaizeiro apresenta duas variedades bastante conhecidas pelo homem interiorano, cuja diferenciação é feita apenas pela coloração que os frutos apresentam quando maduros, as quais podem ser assim caracterizadas: 
Açaí Roxo:    
É a variedade regional predominante conhecida com açaí preto, pois seus frutos apresentam, quando maduros, uma polpa escura, da qual se obtém um suco de coloração arroxeada "cor de vinho", originando assim, a denominação popular de "vinho de açaí". 
Açaí Branco    
É assim denominado por produzir frutos cuja polpa, quando madura, se apresenta de coloração verde-escuro brilhante, fornecendo um suco (vinho) de cor creme claro.

Além de ser aproveitado de todas estas formas, o palmito do açai, que é muito apreciado e considerado como um prato fino, é comercializado em grande escala e chega a ser exportado.

Bom para a Saúde    
O mais recente resultado da pesquisa traz nova boa notícia aos consumidores do açaí. Em artigo publicado no JournalofAgriculturalandFoodChemistry, os cientistas descrevem que os antioxidantes contidos no fruto são absorvidos pelo organismo humano. O estudo envolveu 12 voluntários, que consumiram açaí em polpa e na forma de suco, esta última contendo metade da concentração de antocianinas – pigmentos que dão cor às frutas – do que a versão em polpa. Os dois alimentos foram comparados com sucos sem propriedades antioxidantes, usados como controle.    

Amostras do sangue e da urina dos participantes foram tomadas 12 e 24 horas após o consumo e analisadas. Segundo os pesquisadores, tanto a polpa como o suco apresentaram absorção significativa de antioxidantes no sangue após terem sido consumidos. "O açaí tem baixo teor de açúcar e seu sabor é descrito como uma mistura de vinho tinto e chocolate. Ou seja, o que mais podemos querer de uma fruta?", disse Susanne Talcott, principal autora do estudo, do qual também participaram cientistas das universidades do Tennessee e da Flórida.    

Segundo ela, trabalhos futuros poderão ajudar a determinar se o consumo do açaí pode resultar em benefícios para a saúde com relação à prevenção de doenças. O grupo do qual faz parte tem estudado a ação do açaí contra células cancerosas. “Nossa preocupação é que o açaí tem sido vendido como um superalimento. E ele definitivamente tem atributos notáveis, mas não pode ser considerado uma solução para doenças. Há muitos outros bons alimentos e o açaí pode ser parte de uma dieta bem balanceada”, disse Susanne.

Fonte: AmbienteBrasil

Laísa Mangelli

Há pouca preparação para conter mudanças climáticas e seus efeitos, aponta relatório do IPCC


No entanto, ainda há tempo para fazer com que impactos não sejam tão severos

 

 

Seres humanos e o meio ambiente já estão sentindo os efeitos das mudanças climáticas e, caso atitudes não sejam tomadas, o pior cenário pode ser catastrófico. A má notícia é que ainda estamos pouco preparados para efetuar essas alterações nos modelos de reprodução social que afetam o planeta. Essas são, resumidamente, as principais novidades divulgadas pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) na segunda parte do seu quinto relatório, batizado de "Sumário para Formuladores de Políticas" e que veio a público no último domingo.

 

Os pesquisadores partem do pressuposto de que o mundo já está pagando o preço pelas emissões ocorridas desde a Revolução Industrial, mas afirmam que há possibilidades de os danos serem amenizados. O relatório prevê cenários para os casos mais otimistas e pessimistas. Mas quanto mais tempo as medidas demorarem para serem tomadas, mais problemas ocorrerão – e podem ser irreversíveis.

 

Cenários

Caso não sejam freadas as emissões de CO2 e de demais gases do efeito estufa, o nível do oceano pode aumentar até 82 cm em 2100. Mas caso medidas sejam tomadas, ele pode aumentar "apenas" 26 cm. Já a alta de temperatura pode variar de 2,6ºC a 4,8ºC, até 2100. As geleiras do Ártico podem ser derretidas de 46% a 94%, novamente até 2100.

 

Onde estão os problemas?

Mas além de estimar os danos máximo e mínimo, o relatório também tenta ser mais concreto com relação aos efeitos das mudanças climáticas nos ecossistemas e na vida humana. O infográfico abaixo é a melhor expressão desse esforço. Nele, são mostrados em que medida incêndios, inundações, problemas com a produção de alimentos, entre outros aspectos, foram causados como reflexo das alterações no clima até os dias atuais.

 

 

Foco no humano

Desta vez, as previsões também dão conta de possíveis conflitos que podem ser causados devido aos efeitos climáticos, como falta de segurança alimentar, aumento de preço dos alimentos e escassez de água – crises que já começam a aparecer nos dias de hoje e que podem afetar principalmente a população pobre de países tropicais, como o Brasil.

 

Amazônia e América do Sul

Talvez a melhor notícia seja a de que o risco de savanização da Amazônia diminuiu mesmo com a possibilidade de grande aumento de temperatura. Isso não significa que o bioma não sofra riscos – eles podem ocorrer principalmente devido à mudança no regime de chuvas, mas mesmo que haja mudança na vegetação, não será uma savanização. A América do Sul, de modo geral geral, sofre riscos de chuvas excessivas, com deslizamentos e enchentes, além de mais dias secos e mais calor.

Para acessar o documento (em inglês), clique aqui.

Fonte: ECycle

Terras indígenas protegem 30% do carbono da Amazônia


Segundo relatório do Ipam, territórios demarcados evitam emissões de 431 milhões de toneladas de gás carbônico entre 2006 e 2020; povos indígenas têm alta vulnerabilidade a mudanças do clima

Floresta em área indígena na Amazônia (Foto: Damian Nery/Ipam)

 

Floresta em área indígena na Amazônia (Foto: Damian Nery/Ipam)
CÍNTYA FEITOSA (Observatório do Clima)A conservação de terras indígenas é importante não só para a manutenção do modo de vida desses povos, mas também para a política de clima no Brasil. De acordo com estudo do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) em parceria com a Sociedade Alemã para a Cooperação Internacional (GIZ), que será lançado nos próximos dias, os territórios indígenas na Amazônia brasileira representam uma reserva de cerca de 13 bilhões de toneladas de carbono (46,8 bilhões de toneladas de CO2) – 30% do que existe estocado na floresta.

 

O relatório estima que as comunidades indígenas na Amazônia terão sido responsáveis ​​por evitar a emissão de 431 milhões de toneladas de CO2 desde 2006 até 2020, graças à proteção dos estoques de carbono em suas terras. Se fosse aplicado o mesmo valor monetário por tonelada de COdestinado ao Fundo Amazônia por compensação por redução do desmatamento, a contrapartida pela preservação nessas terras seria equivalente a quase R$ 7,5 bilhões, ou cerca de R$ 500 milhões por ano.

Isso equivale a quase metade do orçamento do Ministério do Meio Ambiente em 2015, excluindo salários e pagamento de aposentados, segundo dados do portal Siga Brasil.

O estudo também alerta para a urgência em lidar com a vulnerabilidade dos povos indígenas às consequências do desmatamento e efeitos da mudança climática global. “Os povos indígenas são os que mais sofrem os efeitos de mudanças no regime de chuvas e aumento das temperaturas, e também são os que menos têm condições de enfrentar essas mudanças”, diz Paulo Moutinho, pesquisador do IPAM.

“Além disso, são os povos indígenas os que mais preservam a vegetação”, conclui Moutinho, afirmando que a preservação de territórios indígenas é uma política de mitigação de mudanças climáticas e de adaptação ao mesmo tempo. Segundo o relatório, a taxa de desmatamento em terras indígenas é inferior a 2%, enquanto as áreas em volta apresentam índices que vão de 25% a 30%.

Além do papel de estocar de carbono e das baixas taxas de desmatamento, as terras indígenas têm um efeito inibidor do desmatamento também em seu entorno. Segundo o relatório, a área preservada chega a ultrapassar 10 km das fronteiras dos territórios, influenciando positivamente também na conservação da biodiversidade regional e na produção de alimentos. “As florestas mantidas pelos índios funcionam como ar-condicionado natural e como regadores da região onde estão”, diz Moutinho.

As principais recomendações dos pesquisadores são a elaboração de um plano indígena de adaptação às mudanças climáticas, agregado ao Plano Nacional de Adaptação, e a implementação urgente da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI), de incentivo a iniciativas sustentáveis desenvolvidas em conjunto por povos indígenas, Estado e organizações parceiras. Os pesquisadores também recomendam a articulação entre políticas direcionadas a povos indígenas e a futura Estratégia Nacional de REDD (Redução de Emissões por Desmatamento), que o governo promete elaborar há quatro anos.

Impactos

De acordo com o estudo, entre 2000 e 2012, aproximadamente 58% das 385 terras indígenas na Amazônia foram negativamente afetadas por secas anormais. Em 2012, membros de mais de 40 tribos da Amazônia relataram aumentos incomuns na temperatura média nas suas aldeias, inundações e incêndios florestais em seus territórios. A safra foi prejudicada, levando a aumento do consumo de alimentos processados, problemas de saúde e migração para áreas urbanas.

Além da produção de alimentos, a mudança no regime de chuvas também interfere nas tradições das comunidades indígenas. “Os rituais de chegada da chuva, por exemplo, estão sendo afetados”, relata Moutinho. As cerimônias dependem do fornecimento de plantas e animais que estão passando por mudanças em seus ciclos biológicos.

O estudo alerta para a possibilidade de piora nesse cenário, com a mudança climática global e devido ao fato de que as florestas estão mais inflamáveis. “A seca e os incêndios não prejudicam só os indígenas, mas todos os produtores de alimentos e criadores de animais da região”, alerta Moutinho.

Nesta semana, o Ipam também publicou um estudo projetando que a PEC-215, a proposta de emenda constitucional que visa retirar do Executivo o poder de demarcar terras indígenas, pode provocar a emissão de 100 milhões de toneladas de CO2.

in EcoDebate, 22/09/2015

Biopirataria X internacionalização: a utilização econômica da biodiversidade.


Entrevista especial com André de Paiva Toledo

“Não apenas as riquezas naturais da Amazônia, mas dos trópicos de maneira geral, têm sido sistematicamente exploradas como matéria-prima do setor de produção econômica de tipo capitalista, implementado globalmente a partir do século XVI”, denuncia o advogado.

 

Foto: Envolverde

A exploração dos recursos naturais sem autorização do poder público, conhecida como biopirataria, é um processo recorrente na história do Brasil. Entretanto, o país “não rompe com esse modelo, porque há nele uma relação de interdependência econômica internacional que cria uma série de obstáculos a um rompimento absoluto. Ou seja, os demais Estados, frequentemente apoiados por setores da própria sociedade brasileira e em vista de seus interesses, pressionam o Brasil no sentido de se manter nessa condição”, explica André de Paiva Toledo, em entrevista concedida à IHU On-Line por e-mail.

 

Entre as implicações dessa atividade ilegal, Toledo destaca o impedimento do Estado de origem dos recursos naturais em exercer direitos soberanos no processo de utilização econômica dos produtos gerados a partir da biopirataria. “Isso faz com que o Estado de origem não apenas deixe de se beneficiar quando da seleção de espécimes, mas seja obrigado a adquirir os produtos sem qualquer transferência de recursos financeiros e biotecnológicos”, acentua.

 

André de Paiva Toledo, que ministrará a palestra Biopirataria e Direito Internacional no I Congresso de Direito, Biotecnologia e Sociedades Tradicionais, que ocorre hoje e amanhã, na Unisinos, também chama a atenção para a discussão acerca da internacionalização da Amazônia que, apesar de ser positiva, “não é discutida nos termos da teoria do patrimônio comum da humanidade”. E esclarece: “Faz-se de maneira implícita nos fóruns internacionais de normalização do Direito Internacional do Comércio, especialmente no que concerne ao direito de propriedade intelectual. Atualmente a internacionalização da Amazônia é feita de maneira paulatina, com a concessão, por parte de Estados do Norte, de registro de patente de elementos que fazem parte do ecossistema amazônico. Pode-se dizer que esta forma de internacionalização é muita menos ruidosa que a primeira e, consequentemente, mais difícil de se perceber. Daí sua eficiência”.

 

André de Paiva Toledo é doutor em Direito pela Université Panthéon-Assas Paris II. É professor de Direito da Escola Superior Dom Helder Câmara e da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas.

 

Foto: Ache Tudo e Região

Confira a entrevista.

IHU On-Line – O senhor diz que a exploração sistemática das riquezas naturais da Amazônia iniciou ainda no século XV e, desde então, não foi cessada. Quais são os mecanismos de exploração envolvidos nesse processo e por que o Brasil não rompe com ele?

André de Paiva Toledo – Não apenas as riquezas naturais da Amazônia, mas dos trópicos de maneira geral, têm sido sistematicamente exploradas como matéria-prima do setor de produção econômica de tipo capitalista, implementado globalmente a partir do século XVI. A menção ao século XV é feita para coincidir com o início das grandes navegações, que permitiram aos europeus, especialmente aos ibéricos, conquistar novos territórios de onde pudessem obter matéria-prima para sua burguesia.

 

O Brasil entrou nesse sistema em 1500, quando aqui aportou Pedro Álvares Cabral, e tem permanecido um dos grandes parceiros do setor capitalista industrial ao cumprir a função de fornecedor de matéria-prima, de mão de obra barata e de mercado consumidor de mercadorias produzidas no exterior. A Amazônia, por sua vez, pelas dificuldades de acesso humano, é mais especificamente mencionada nesse contexto no século XIX, com o fornecimento de borracha para a indústria automobilística, especialmente dos Estados Unidos.

 

Nos séculos seguintes, com a queda da demanda por borracha amazônica, esse importante espaço sul-americano transformou-se em fornecedor de matéria-prima para a produção biotecnológica, fundada das indústrias farmacêutica, cosmética e alimentar. O Brasil não rompe com esse modelo porque há nele uma relação de interdependência econômica internacional que cria uma série de obstáculos a um rompimento absoluto. Ou seja, os demais Estados, frequentemente apoiados por setores da própria sociedade brasileira e em vista de seus interesses, pressionam o Brasil no sentido de se manter nessa condição.

 

O Golpe de Estado contra o governo de João Goulart, por exemplo, que neste mês completa 50 anos, é um exemplo de como é difícil para um país detentor de riquezas naturais (biológicas ou não) se opor soberanamente a um sistema econômico internacional de tipo colonial. Isso sem mencionar o fato de que boa parte da exploração dos recursos naturais da Amazônia é feita à margem do Direito, sem que o Estado brasileiro consiga controlar.

 

IHU On-Line – Como e por que se discute a internacionalização da Amazônia? Quais são os discursos referentes a essa temática?

André de Paiva Toledo – A internacionalização da Amazônia foi discutida a partir do início da década de 1980, quando, diante do acúmulo de catástrofes ambientais e do desenvolvimento cada vez mais veloz de produtos biotecnológicos (farmacêuticos, cosméticos e alimentares), propôs-se que a biodiversidade da Amazônia fosse considerada uma espécie de patrimônio comum da humanidade do qual toda a coletividade global pudesse usufruir livremente, seja como reserva florestal mundial, seja como celeiro de recursos para a bioindústria.

 

Discute-se essa questão de forma tão apaixonada porque a internacionalização de um determinado objeto significa, na prática, a extinção da soberania dos Estados em que ele se encontra, como é o caso, por exemplo, do espaço sideral da Antártida e do alto-mar. A intenção era retirar dos Estados amazônicos (Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela) a competência de administrar soberanamente aqueles espaços. Hoje, a questão da internacionalização da Amazônia não é discutida nos termos da teoria do patrimônio comum da humanidade.

 

Faz-se de maneira implícita nos fóruns internacionais de normalização do Direito Internacional do Comércio, especialmente no que concerne ao direito de propriedade intelectual. Atualmente a internacionalização da Amazônia é feita de maneira paulatina, com a concessão, por parte de Estados do Norte, de registro de patente de elementos que fazem parte do ecossistema amazônico. Pode-se dizer que esta forma de internacionalização é muito menos ruidosa que a primeira e, consequentemente, mais difícil de se perceber. Daí sua eficiência.

 

“Boa parte da exploração dos recursos naturais da Amazônia é feita à margem do Direito sem que o Estado brasileiro consiga controlar”

IHU On-Line – Em seu livro, menciona que o discurso da internacionalização encobre a desnacionalização das riquezas dos Estados sul-americanos. Nesse contexto, como a questão indígena e os saberes tradicionais são tratados diante desse discurso de internacionalização?

André de Paiva Toledo – Se pensarmos em termos do Direito Internacional, os conhecimentos tradicionais dos indígenas associados aos recursos biológicos recebem o mesmo tratamento, isto é, estão submetidos à soberania do Estado titular da soberania territorial.

 

Grosso modo, especialmente diante do discurso sobre a internacionalização, o patrimônio cultural indígena é tratado como parte do conceito de biodiversidade, inclusive por estarem intrinsecamente relacionados aos recursos da fauna e da flora, de modo que muitas vezes não possa tratá-los separadamente. Entretanto, em termos mais específicos, por serem objetos culturais, há evidentemente algumas distinções de tratamento entre eles e os objetos essencialmente naturais.

 

Não é à toa que diversas normas jurídicas internacionais prevejam a participação obrigatória dos possuidores desses conhecimentos tradicionais em todo projeto de utilização levado a cabo pelo Estado titular da soberania territorial.

 

Assim, quando ocorre, em outro país, o registro da propriedade intelectual de um elemento dos saberes indígenas, está-se diante do mesmo fenômeno já mencionado da internacionalização pela privatização, ou seja, um outro Estado concedeu soberanamente a alguém a titularidade do direito de propriedade intelectual sobre aquele objeto e, consequentemente, coloca à sua disposição todas as ferramentas de proteção da propriedade privada, tanto no âmbito interno quanto no âmbito internacional. Falamos em internacionalização porque, em termos do Direito Internacional, ocorrerá, neste caso, uma dupla incidência de soberanias sobre o mesmo objeto.

 

"A biopirataria é a transferência transfronteiriça de um recurso biológico sem o consentimento prévio fundamentado do Estado de origem"

IHU On-Line – A internacionalização da Amazônia está na pauta das preocupações nacionais prioritárias? Que ações são realizadas nesse sentido?

André de Paiva Toledo – O Brasil sempre esteve preocupado com a internacionalização da Amazônia. Trata-se de uma preocupação — como você bem mencionou — nacional, pois vemos, nos últimos 30, 40 anos, todos os governos se dedicando à questão, sejam militares, sejam civis, de direita e de esquerda. Percebe-se que a proteção da soberania nacional na Amazônia é um ponto que une bem a sociedade brasileira, independentemente de seu viés político.

 

Além disso, o Brasil é tradicionalmente um país muito atuante e respeitado na comunidade internacional. Quando, por exemplo, encerrou-se a iniciativa de internacionalizar a Amazônia pela aplicação da teoria do patrimônio comum da humanidade, no início da década de 1990, o Brasil foi um dos Estados que exigiram a reafirmação da soberania nacional sobre os recursos biológicos, feita no texto da Convenção sobre Diversidade Biológica, resultado dos debates da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, ocorrida justamente no Brasil, mais especificamente na cidade do Rio de Janeiro.

 

Atualmente o Brasil faz parte do Grupo de Países Megadiversos Afins, isto é, uma reunião dos Estados com grande riqueza biológica, cujo propósito é coordenar ações internacionais de combate à biopirataria e, consequentemente, à internacionalização pelo registro da propriedade intelectual. Em conjunto com outros países ricos em biodiversidade, o Brasil tem liderado as posições em favor da reforma do sistema internacional da propriedade intelectual tanto na Organização Mundial da Propriedade Intelectual quanto na Organização Mundial do Comércio.

 

IHU On-Line – Como o processo de biopirataria ocorre no Brasil? Quais são os principais atores envolvidos nesses casos e quais são as implicações sociais, ambientais e econômicas desse processo?

André de Paiva Toledo – O processo de biopirataria acontece no Brasil de maneira semelhante àquela ocorrida em outros países ricos em biodiversidade. Realiza-se, sem qualquer autorização por parte do Poder Público, nos locais biologicamente estratégicos (na Amazônia, por exemplo), trabalho de campo de seleção de espécimes interessantes para a bioindústria, muitas vezes — mas não necessariamente — com auxílio de membros de comunidades indígenas contratados para facilitar a identificação dos recursos.

 

Esse trabalho de campo é liderado por um especialista que sabe identificar as potencialidades bioquímicas da fauna e da flora. Este especialista pode ser agente do próprio laboratório ou instituto de pesquisa estrangeira, muitas vezes travestido de missionário ou ativista; pode ser membro de organização não governamental de proteção ambiental com atividade naquele ecossistema; pode ser inclusive um pesquisador nacional contratado pelo laboratório ou instituto de pesquisa.

 

Feito o trabalho de campo, os espécimes selecionados são acondicionados de forma a facilitar sua remessa para o exterior. Esta etapa é realizada normalmente longe do local de trabalho de campo, sem a participação de membros das comunidades indígenas. Deve-se colocar os espécimes em embalagens que impeçam sua identificação quando da remessa para o exterior. Esta se dá evidentemente de forma clandestina, utilizando-se sistemas próprios do tráfico de drogas, armas e pessoas, o que implica a utilização de rotas alternativas e, eventualmente, a cooptação de agentes de controle de fronteira.

 

Ocorre que, muitas vezes, o que é contrabandeado são elementos muito pequenos da biodiversidade como, por exemplo, folhas, pétalas ou pólen, que são facilmente escondidos e dificilmente controlados na saída do país. A grande implicação da biopirataria é socioeconômica. Ao impedir que o Estado de origem do recurso exerça seus direitos soberanos no processo de utilização econômica, a biopirataria acaba por privar esse Estado de compartilhar dos benefícios advindos da produção e comercialização de medicamentos, cosméticos e alimentos.

 

Isso faz com que o Estado de origem não apenas deixe de se beneficiar quando da seleção de espécimes, mas seja obrigado a adquirir os produtos sem qualquer transferência de recursos financeiros e biotecnológicos. É a face mais radical do neocolonialismo, em que os países tropicais têm suas riquezas naturais levadas clandestinamente para os países desenvolvidos, os quais, por sua vez, transformam tais riquezas em mercadorias a serem posteriormente vendidas àqueles. O Estado de origem fornece matéria-prima e mão de obra a baixo custo e importa os produtos industrializados com o preço de mercado.

 

"Não se pode confundir biopirataria com internacionalização, embora os termos sejam conexos à utilização econômica da biodiversidade"

IHU On-Line – Como, juridicamente, os casos de biopirataria são tratados no país?

André de Paiva Toledo – No âmbito interno, o Brasil não tem atuado de forma tão interessante quanto externamente. Isso se deve muito ao fato de que a biopirataria é um problema de abrangência internacional.

 

Isso não significa, entretanto, que internamente não se deva dar um tratamento mais específico à questão. Pelo contrário, vimos que o início do fenômeno da biopirataria inicia-se no território do Estado prejudicado, sendo necessária uma legislação interna capaz de combater eficazmente a questão enquanto ela se dá no interior de suas fronteiras.
 

No Brasil, há a Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998) que ainda não tipifica o crime de biopirataria, o que dificulta sua repressão. Outra norma ambiental importante é a Medida Provisória 2.186/2001, cujo objetivo é proteger o patrimônio genético brasileiro ao regulamentar internamente alguns aspectos da Convenção sobre Diversidade Biológica de 1992. Nesta Medida Provisória, há menção expressa de que o acesso aos recursos genéticos localizados no território brasileiro depende de autorização expressa da União.

 

Pode-se encontrar nesta norma também a previsão de medidas de participação do Estado, titular da soberania sobre os recursos biológicos, nos lucros das empresas que utilizarem material obtido no território brasileiro. Se o Poder Legislativo é lento para modernizar o Direito brasileiro sobre a biopirataria, o Poder Executivo, fora a medida provisória mencionada, tem agido por meio do Ministério do Meio Ambiente para que sejam adotadas medidas mais claras sobre o assunto.

 

De fato, o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético, em conjunto com o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, tem trabalhado para fixar um regime que impeça a concessão de patente sobre produto derivado da biodiversidade sem a apresentação prévia da autorização da União.

 

"A biopirataria só será de fato eficazmente combatida quando houver a modificação dessas normas internacionais comerciais"

IHU On-Line – Como a biopirataria é tratada no âmbito do Direito Internacional?

André de Paiva Toledo – Internacionalmente, a biopirataria é mal definida. Alguns entendem que ela significa a apropriação do recurso biológico pelo sistema internacional de propriedade intelectual. Não concordamos com isso. A biopirataria é a transferência transfronteiriça de um recurso biológico sem o consentimento prévio fundamentado do Estado de origem, independentemente do que se vai fazer com o dito recurso posteriormente.

 

Mesmo que não haja qualquer utilização econômica e, por consequência, qualquer concessão de direitos de propriedade intelectual, a biopirataria existe como fato consolidado. Como vimos, esta concessão de patente significa a internacionalização do recurso pela dupla incidência de soberanias. Não se pode confundir biopirataria com internacionalização, embora os termos sejam conexos à utilização econômica da biodiversidade.

 

Apesar de falta de consenso do que seja biopirataria internacionalmente, é fato que o Direito Internacional assegura e reafirma a soberania do Estado sobre os recursos biológicos de seu território. Logo, este Estado deve ser sempre consultado quando houver interesse em ter acesso aos seus recursos naturais. Entretanto, a brecha que ainda existe para o fomento da biopirataria é aquela que o Direito Internacional do Comércio abre.

 

Quando a Organização Mundial do Comércio não impede o patenteamento de seres vivos, ou quando não exige a apresentação do certificado de origem do recurso biológico utilizado no objeto a ser patenteado, isso corresponde, na prática, a um incentivo substancial ao acesso clandestino de recursos biológicos. A biopirataria só será de fato eficazmente combatida quando houver a modificação dessas normas internacionais comerciais. É por esta reforma do sistema internacional de propriedade intelectual que tem se batido o Brasil e os demais países ricos em biodiversidade.

Fonte: IHU – Unisinos