Manchas de petróleo de origem desconhecida se espalham há quase dois meses ao longo dos mais de 2 mil km de litoral do nordeste brasileiro, sem que ninguém saiba como deter o fluxo, nem quais serão seis impactos ecológicos, sanitários e econômicos.
“É desolador, desesperador especialmente quando se tem conhecimento da área, e se sabe que o impacto será enorme. É muito revoltante não poder proteger os manguezais e os estuários”, disse a oceanógrafa Mariana Thevenin.
A cientista começou a ver as manchas em meados de outubro em Salvador (BA) e fundou com amigos o grupo “Guardiões do Litoral”, que mobilizou centenas de pessoas para limpar os balneários. Milhares de voluntários tiveram a mesma iniciativa, muitos com as próprias mãos.
Em Carneiros (PE), considerada uma das praias mais belas do país, Lula Terra, ator e dono de pousada, achou petróleo há uma semana. “Vi a praia e comecei a chorar”, disse. A Marinha informou que já foram recolhidas mais de mil toneladas de óleo cru.
Imagens de pessoas retirando óleo das areias das praias afetadas ou do mar, trazido pelas ondas, circularam nas redes sociais, mas sem causar o mesmo impacto que os incêndios na Amazônia semanas atrás. Mas a gravidade da situação não é menor, alertam especialistas.
“É uma situação muito crítica”, diz Anna Carolina Lobo, gerente do programa marinho do Fundo Mundial para a Natureza-Brasil (WWF-Brasil). “Ainda não é possível medir o estrago. O que a gente sabe é que as praias vão levar pelo menos 20 anos para se recuperar, e o impacto econômico, para a pesca e o turismo é enorme”, acrescenta.
Negligência?
Segundo reportagem do jornal O Globo, as autoridades demoraram 41 dias para executar o Plano Nacional de Contingência para essas situações. Cinco mil militares foram enviados na semana passada como reforço para ações de limpeza 51 dias depois da detecção das primeiras manchas.
“É absolutamente inacreditável, e de fato isso mostra um extremo despreparo em lidar com esse tipo de coisas”, disse Lobo.
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, assegura, no entanto, que o governo agiu desde o princípio. O governo afirma, ainda, que o petróleo é venezuelano, mas há divergências sobre a origem e diferentes hipóteses sobre as causas do vazamento.
A Petrobras informou na sexta-feira (25) que o petróleo se move sob a superfície do mar, e por isso é impossível mantê-lo distante das praias com barreiras de contenção. “É como procurar agulha em um palheiro”, afirmou um porta-voz da empresa.
“Nenhum radar consegue ver o petróleo no fundo”, reforça o diretor de proteção ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), Olivaldi Azevedo. Mas estes argumentos não convencem especialistas ou voluntários.
“É demolidora a omissão do governo federal”, disse Thevenin.
Impacto por anos
Autoridades locais e regionais informam sobre os riscos de tomar banho nestas praias e consumir peixe, mas o governo federal não decretou emergência, nem centralizou orientações.
Segundo informações publicadas na imprensa, 17 pessoas foram aos hospitais com mal-estar após tocar no petróleo.
“Trata-se de um material tóxico”, que entra na cadeia alimentar, ao se depositar na microfauna consumida pelos peixes, que são consumidos por mamíferos maiores e por seres humanos, disse Luciana Salgueiro, coordenadora de políticas públicas do Instituto Biota de Conservação, em Alagoas.
Em termos ambientais, ela afirma que “a situação configura um desastre sem precedentes, cujos efeitos ainda irão permanecer na natureza por anos”.
Tartarugas, golfinhos e aves morreram ou foram resgatados quase asfixiados pelo petróleo. As manchas se aproximam de locais de migração de baleias e muitos crustáceos foram encontrados com vestígios de petróleo, segundo veículos locais.
Apesar de que as manchas continuam aparecendo diariamente, com a chegada do verão, o turismo ainda não sente o impacto. A CVC, uma das maiores operadoras de turismo do país, informou através de sua assessoria de comunicação que “curiosamente os clientes estão tranquilos”. A empresa recebeu alguns pedidos para alterar viagens, mas a grande maioria manteve até o momento suas reservas.
Quase dois meses depois do aparecimento das primeiras manchas, Lobo afirma que uma das poucas certezas é que “não sabemos quando o petróleo vai acabar”.
O governo federal notificou 11 países cobrando esclarecimentos sobre 30 navios mapeados dentro da investigação sobre a origem do vazamento de óleo que atingiu diversas praias do Nordeste. A informação foi dada pelo coordenador de operações navais da Marinha, almirante de esquadra Leonarndo Puntel, em entrevista no sábado (26).
A investigação conduzidA investigação conduzida pela Marinha trabalha com a tese de que o responsável teria sido um navio-tanquea pela Marinha trabalha com a tese de que o responsável teria sido um navio-tanque. A apuração inicial avaliou 1.500 embarcações e afunilou a análise para 30 veículos marinhos de 11 países. O comandante não detalhou que nações estariam neste grupo, mas disse que o requerimento pede informações para os governos para saber se têm conhecimento de algum acidente.
Os 30 navios estão entre os que passaram pela costa do Nordeste no período, identificados por fazerem comunicações por sistemas marítimos. Conforme Puntel, os investigadores calculam que o vazamento teria ocorrido no mês de agosto, com o óleo chegando às praias no fim daquele mês.
O almirante não descartou a possibilidade de que o episódio tenha sido causado por embarcações não oficiais, denominadas “dark ships”. Neste caso, contudo, a apuração será mais complexa e terá de envolver outras fontes de informação, como análise de imagens de satélite.
Puntel declarou que não é possível afirmar que o veículo era venezuelano. Mas que pesquisas da Petrobras teriam identificado o óleo como proveniente daquele país. “Laudo da Marinha concluiu que óleo não era brasileiro. O laudo da Petrobras foi além, porque tem amostras de óleos de outros países. Ele é de bacias venezuelanas. O navio a gente não sabe”, comentou.
Manchas
A coordenadora-geral de emergências ambientais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Fernanda Pirilo, afirmou na entrevista coletiva que não há novo óleo nas praias.
“Não há mais chegada de óleo novo, mas algumas praias ainda têm vestígio de óleo, temos os pontos identificados em que ainda há óleo residual, a maioria nos estados de Pernambuco e Bahia”, pontuou.
O comandante Leonardo Puntel acrescentou que a despeito da dificuldade de monitorar a evolução das manchas, dado que elas se deslocam debaixo da água a partir das correntezas marinhas, o exame realizado pelos órgãos envolvidos no grupo de acompanhamento detectou que houve um decréscimo da quantidade.
“As manchas de óleo tiveram dinâmica diferente. No início de setembro e outubro ela estava tranquila, não tinha grandes quantidades. Teve período na semana passada que houve aumento do volume no óleo na Bahia, Sergipe, Alagoas e Sul de Pernambuco. E este volume começou a decrescer agora”, observou.
A coordenadora do Ibama orientou a população dos locais a não entrar em contato com a substância. Já as condições de banho de cada praia são avaliadas pelos órgãos de saúde dos estados e municípios e devem ser verificadas juntamente a esses órgãos.
Brasília
O grupo de órgãos federais encarregados da coordenação das atividades mudou sua base para Brasília. Durante esta semana, várias autoridades do governo federal estiveram em Pernambuco. O comandante da Marinha relatou que ainda permanecem coordenações locais montadas em Recife e Salvador.
A coordenadora de emergências ambientais do Ibama acrescentou que a mudança facilita a atuação do grupo, já que aproxima seus integrantes do centro de decisão política do país. Questionada por jornalistas, ela negou dificuldades na interlocução das entidades tanto em relação ao Executivo quanto no tocante a administrações estaduais.
O óleo que atinge o Nordeste brasileiro há mais de um mês chegou na madrugada de quarta-feira, 23, à Praia Barra da Jangada, onde está a foz do Rio Jaboatão, em Jaboatão dos Guararapes, cidade vizinha do Recife, em Pernambuco. Funcionários da prefeitura, da Marinha, do Exército e 50 presos em regime semiaberto atuam na praia, que está isolada para o acesso de voluntários.
Resíduos foram identificadas em alto-mar por um pescador na noite anterior, por volta das 23h, enquanto as manchas foram detectadas na praia por volta das 4h30. Segundo o superintendente da Proteção e Defesa Civil de Jaboatão Artur Paiva, foram retiradas 44 toneladas de óleo somente nas primeiras horas da manhã. Agora, as ações são para tirar pequenos pedaços da substância. “A nossa preocupação foi tirar rápido, não dá para deixar desse jeito”, diz. “Não pode deixar entrar no estuário. A barreira foi acionada e não encontramos nada lá.”
A Marinha justifica o isolamento da praia como medida de segurança. “Pode ser um problema para a saúde de quem manuseia. Nem todos os voluntários têm material”, diz o comandante do destacamento dos fuzileiros, capitão-tenente Gilson Cunha.
Ao todo, 1,5 mil homens da Marinha atuam no Nordeste, dos quais 380 estão em Jaboatão. “É importante que a população confie na ação conjunta (dos governos municipal, estadual e federal).”
O trabalho está sendo majoritariamente dentro da água, pois o óleo afunda no rio (enquanto boia no mar). Não está descartada ação com mergulhadores para retirar o óleo do fundo. “Quando a maré baixar, vai se poder ter uma melhor compreensão da situação”, diz o capitão.
Por volta das 9h, chegaram ao local 50 reeducandos do regime semiaberto, da Penitenciária Agroindustrial São João, em Ilha de Itamaracá, no Grande Recife. Eles foram divididos em trios para recolher restos do óleo com sacos de lixo. A ação valerá como hora trabalhada e poderá ser deduzida da pena.
Inicialmente, o grupo iria para Cabo de Santo Agostinho, onde está grande parte do óleo, mas foram remanejados após a divulgação da chegada da nova mancha. “Não imaginava que estava nessa situação”, comentada o apenado Paulo Henrique da Silva, de 21 anos. “Estamos separando o óleo com as luvas. Alguns, temos mais sorte, outros são mais difíceis de tirar. Estou achando legal poder ajudar.”
A área está isolada com fitas, com a restrição de acesso até para a imprensa e os voluntários – alguns reclamavam da situação e apontavam que os militares não deveriam atuar de bermuda (por questões de segurança). Um dos poucos voluntários que conseguiu ajudar estava em um stand up paddle, que usava para se deslocar para longe da margem para procurar manchas.
“Não estão deixando ninguém. Assim que cheguei em Itapuama, soube que tinha chegado aqui. Veio gente da Marinha e do Exército para cá, aí a gente também se dividiu”, conta a bióloga e voluntária Gabriela Barros, de 31 anos. “Viemos dar suporte e não estamos podendo fazer nada. Trouxemos doação para cá abastecendo eles. A gente está usando o mesmo tipo de proteção que eles e já temos o conhecimento de quem está atuando nisso.”
O Rio Jaboatão tem cerca de 75 quilômetros de extensão, sendo local de pesca e de reprodução de espécies, incluindo tubarões. “Aqui tem caranguejo, camarão, peixes, logo na frente tem a colônia de pescadores que nos ajudou bastante a monitorar”, conta Edilene Rodrigues, superintendente de Meio Ambiente de Jaboatão. “A nossa barreira de contenção rompeu na madrugada (por causa da maré), mas o intuito é que, se viesse boiando (o óleo), conseguiria reter”, conta. “Várias redes de camarão foram distribuídas e conseguiram interceptar uma grande massa que chegou no domingo.”
Segundo o governo de Pernambuco, boias de contenção estão sendo colocando no mar e em rios desde o dia 17. Como o estuário do Rio Jaboatão tem densidades distintas, por reunir águas doce e salgada, o óleo consegue escapar por baixo da boia. Por isso, foi iniciada a colocação de redes submersas abaixo das boias, que somam três quilômetros de extensão.
A ausência de um sistema de monitoramento de desastres ambientais no oceano por satélite e a escassez de imagens do alto-mar dificultam a investigação sobre a origem do óleo achado em mais de 200 pontos do litoral do Nordeste. Cientistas de diferentes instituições buscam imagens que deem alguma pista, mas não encontraram nada que mostrasse o deslocamento da mancha até agora.
O único satélite que produz o tipo de imagem capaz de mostrar um vazamento de óleo no mar e a oferece gratuitamente é o Sentinel da Agência Espacial Europeia (ESA, na sigla em inglês). E há limitações. As imagens são criadas com intervalos de dias. E a maioria é de regiões mais próximas da costa. Sobre essas, o interesse comercial dos países é maior.
Estudos com base nas correntes marítimas já indicam que o acidente ocorreu além das 200 milhas da costa, em alto-mar. É menor a chance de haver imagens dessas regiões.
Ainda assim, grupos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), do Laboratório de Análise e Processamento de Imagem de Satélite da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e do Laboratório de Métodos Computacionais em Engenharia do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio (UFRJ), buscam imagens que deem alguma pista. “O Inpe já olhou todas as imagens disponíveis das proximidades da costa de 60 dias para cá, e não foi detectada nenhuma mancha expressiva indicativa da origem do vazamento”, disse o oceanógrafo Ronald Buss de Souza, pesquisador do Inpe.
Nas análises da Ufal, os resultados obtidos foram semelhantes. “Até agora não conseguimos identificar nenhuma imagem com um padrão clássico de derramamento de óleo”, disse o coordenador do laboratório da Ufal, Humberto Alves Barbosa, especialista em sensoriamento remoto. “Mas não existe uma sequência completa, há falhas de dois, três dias. Além disso, a dificuldade de interpretação das imagens é grande. Precisaria de mais gente, de mais recurso, de mais tecnologia.”
Para Luiz Landau, coordenador do laboratório da Coppe/UFRJ, seria sorte achar uma imagem com informações sobre a origem do vazamento dentre as feitas pela ESA. “Não temos imagens para nos ajudar, porque não temos programa de monitoramento para eventos desse tipo”, explicou. “Temos uma constelação de satélites privados nos céus, mas eles têm de estar programados para olhar para onde nos interessa.” Além disso, o óleo se movimenta na sub-superfície, o que dificulta a visualização do material, segundo especialistas.
Cooperação
Para os especialistas, a melhor estratégia para determinar a origem do vazamento é contar com a ajuda de oceanógrafos e modelos matemáticos capazes de estudar as correntes marítimas e, ao menos, reduzir a área possível do acidente. Análises geoquímicas do óleo também poderiam rastrear o caminho até as praias.
Eles reclamam, porém, que o gabinete de crise estabelecido pelo governo não convocou os cientistas oficialmente. “A gente pode continuar procurando se for chamado oficialmente”, disse Souza, do Inpe. “Após 50 dias, não se conseguiu descobrir a fonte do vazamento. Essa lerdeza gera um desastre ambiental sem precedentes.” Procurado pela reportagem, o gabinete de crise do governo não se manifestou.
As imagens de toneladas e toneladas de óleo retiradas das praias do Nordeste têm levantado uma questão: e depois, o que fazer com tudo isso? A resposta em Pernambuco foi levar o material à Central de Tratamento de Resíduos, a Ecoparque, empresa contratada em regime de urgência, cujo aterro é sediado em Igarassu. Para lá, foram destinadas mais de 1,3 mil toneladas de óleo e itens contaminados pela substância, como baldes, luvas e máscaras.
O material passa por uma triagem para reduzir a presença de areia e, em seguida, é triturado com tecidos, borrachas e outros itens que tiveram contato com produtos industriais. O resultado são pilhas de fragmentos diversos, em que o óleo se destaca pelo brilho.
Forma-se, então, o que se chama de blend energético, que é vendido para ao menos três empresas de produção de cimento, sendo utilizado como combustível de fornos junto com o coque – um subproduto destilado do petróleo. “O petróleo sólido é muito caro e exige grande logística, porque vem de navio. Assim como o coque, esse blend tem o poder calorífico alto”, explica Romero Dominoni, diretor geral da Ecoparque.
Na Bahia, os resíduos encontrados nas praias têm se transformado em carvão, com a ajuda de cientistas. Dentro de uma betoneira, são usados bioaceleradores desenvolvidos por um grupo de pesquisadores do Instituto de Química da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Esses componentes ajudam na degradação do óleo e o transformam em carvão. “Esses bioaceleradores, dois sólidos e três líquidos, não agridem o solo nem os vegetais”, disse a professora da UFBA Zenis Novais.
Segundo Zenis, o produto é bem menos agressivo do que o petróleo cru. O procedimento pode complementar ou substituir o que se pretende fazer com o petróleo: incinerar. “O processo de incineração produz enxofre, nitrogênio e libera gases que afetam o meio ambiente”, diz Zenis.
A aplicação do carvão, no entanto, demanda mais estudos. Segundo a professora, a depender da composição, o carvão pode ser misturado com terra e colocado nas plantas, como uma espécie de adubo. Outra opção é usá-lo como combustível na produção do cimento, como vem sendo feito em Pernambuco.
Três meses depois do primeiro registro, a mancha de petróleo continua se espalhando pelo litoral brasileiro, sem que sua origem tenha sido identificada. Neste desastre, até as soluções viáveis, como a destinação adequada dos resíduos coletados nas praias, se tornaram fonte de impactos ambientais.
Como apurou a Agência Pública, um dos problemas é a desarticulação das ações. Garantir a destinação adequada do óleo é uma responsabilidade do governo federal, como prevê o próprio Plano Nacional de Contingência, mas a tarefa ficou a cargo dos estados. Assim, cada ente federativo decide o que vai fazer com o material. São as prefeituras, entretanto, as responsáveis pela coleta e pelo armazenamento do produto, até que a destinação final seja orientada pelos governos estaduais.
Por falta de coordenação, de estrutura ou até de orientação, muitas dessas ações estão sendo feitas, na base do improviso, nos municípios. Descartes irregulares e estocagem inadequada foram registrados sobretudo nas cidades pequenas e mais afastadas das capitais.
Na Bahia, por exemplo, os municípios de Canavieiras e Maraú estavam depositando resíduos em lugares impróprios. Em Maraú, moradores denunciaram que o descarte estava sendo realizado em um lixão a céu aberto. Como mostra o vídeo exclusivo da nossa reportagem, também uma escola abandonada serviu de área de estocagem no município de Canavieiras.
Além da escola, tonéis cheios de petróleo cru ficaram guardados no prédio do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) por aproximadamente cinco dias, durante as primeiras coletas, em outubro. Mesmo depois que o material foi retirado, a contaminação permaneceu. Os profissionais que atuam no local relataram sinais de intoxicação, como alergias. O próprio coordenador da unidade, Raimundo Bonfim, contou que foi ao hospital duas vezes sentindo dores no estômago e náuseas. Ele acredita que os sintomas têm relação com o material tóxico, porque resquícios podem ter permanecido no ambiente de trabalho.
“Já fizemos duas limpezas, mas as pessoas continuam passando mal”, relatou. Bonfim informou que os técnicos do ICMBio apontaram o aeroporto local como o lugar mais adequado para a estocagem, porém a prefeitura preferiu utilizar uma escola abandonada, em uma área residencial. Dezenas de tonéis cheios de óleo chegaram a ser estocados nessa escola.
Agora, o material está sendo retirado e encaminhado a empresas especializadas na estocagem de resíduos, garantiu o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia (Inema). O órgão fez questão de ressaltar que “o estado não tem obrigação de fazer a coleta do óleo, mesmo assim está apoiando as ações municipais, até que seja definida uma destinação final do produto”.
Informações desencontradas
As informações sobre o descarte do óleo retirado das praias do Nordeste são desencontradas. Por exemplo, em nota, o governo federal garantiu que, em todos os estados, os resíduos estão sendo destinados a fábricas de cimento, que usam o material para aquecer os fornos industriais, ou aterros industriais ambientalmente adequados.
A informação do Grupo de Acompanhamento e Avaliação (GAA) – formado pela Marinha do Brasil (MB), Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) – contraria o que disse à Pública o Inema, da Bahia, e a Secretaria de Meio Ambiente do município de Tibau do Sul, no Rio Grande do Norte, ou seja, que o material recolhido nos estados já tem destino final garantido.
Na praia de Pipa, distrito de Tibau do Sul, embora o GAA garanta que o óleo já está sendo destinado a fábricas de cimento, isso ainda não ocorreu. As bombonas (espécies de tonéis plásticos) cheias de petróleo continuam sendo mantidas na garagem da prefeitura, que está isolada. “A Petrobras [que foi mobilizada pelo GAA para atuar no transporte dos resíduos oleosos dos locais de armazenamento temporário até a destinação final] informou que vai definir uma data para a retirada em breve”, afirmou o secretário de Meio Ambiente de Tibau do Sul, Leonardo Tinoco, durante conversa na última segunda-feira (2).
Tibau do Sul foi um dos municípios mais atingidos pelo óleo no Rio Grande do Norte. De lá foram recolhidas quase 3 toneladas. O Ministério do Meio Ambiente levou 41 dias, após os primeiros sinais do derramamento de petróleo, para acionar o Plano de Contingência. “Não recebemos qualquer aviso prévio”, disse o secretário de Tibau. Por isso, em um primeiro momento, muitos voluntários e pescadores descartaram o material no lixo comum. “Por iniciativa própria, começamos a armazenar nas bombonas”, detalhou. Depois o mesmo protocolo foi adotado pelo estado do Rio Grande do Norte, que distribui as bombonas e sacos resistentes para as prefeituras, embora a coleta e o armazenamento sejam responsabilidade de cada município.
Lixo comum
Em Alagoas, o armazenamento do óleo retirado das praias estava concentrado em uma Central de Tratamento (CT), no município de Pilar. É o único espaço da região apto a receber o petróleo cru, altamente tóxico e inflamável. O custo com a coleta e a destinação foi de R$ 3,5 milhões, bancado pelo governo do Estado. Contudo, somando outros custos da operação de limpeza das praias, como a contratação de 590 pessoas para a remoção do material, além de veículos, máquinas e equipamentos de proteção individual (EPIs), o governo de Alagoas estima despesas de R$ 4,3 milhões até agora.
Desde 14 de novembro, de acordo com a Secretaria de Meio Ambiente do estado, o governo federal assumiu as operações de descarte dos resíduos, que estão sendo direcionados para uma cimenteira da Votorantim Cimentos situada em Laranjeiras (SE). Ocorre que nem sempre os fragmentos de óleo retirados das praias seguem esse fluxo.
A Pública visitou o município de Barra de São Miguel, no litoral de Alagoas, no feriado de 15 de novembro. A praia estava aparentemente limpa e lotada de turistas, mas quem se atrevia a ficar descalço saía com os pés melados, porque toda a beira-mar estava impregnada de pequenos fragmentos de óleo, camuflados na areia.
Apesar disso, não encontramos agentes do poder público orientando os banhistas sobre os riscos do contato com o petróleo, nem trabalhando na coleta. Por diversas vezes vimos turistas, sem luvas, recolhendo porções do produto tóxico e descartando os resíduos no lixo comum.
“Esta é a pior coisa que pode ser feita”, alertou Beate Saegesser, professora de química da Universidade Federal de Pernambuco e integrante do Comitê UFPE SOS Mar, que acompanha ações de remoção do óleo no litoral desde as primeiras ocorrências. Quando vai para o lixo comum, o material pode entrar em contato com o solo e contaminar os lençóis freáticos. “Também tem o risco de emanar substâncias tóxicas e desprender pequenas frações, que são absorvidas pela matéria orgânica, com ação das chuvas, e se espalham pelo ambiente”, detalhou.
O petróleo é rico em hidrocarbonetos, que são compostos de hidrogênio e carbono, como o benzeno. São substâncias tóxicas. Mas não é apenas isso. Todo petróleo incorpora também metais pesados, explica a professora de química, como o chumbo, e ainda pode conter metais radioativos, a exemplo do tório. Essas substâncias causam a contaminação dos organismos, que podem sofrer mutações. “De fato, não sabemos nem qual é o nível real de toxicidade do que estamos recolhendo nas praias porque, depois de meses em contato com a água do mar, com a areia, recebendo radiação ultravioleta, as propriedades físico-químicas do petróleo já foram alteradas. O que já sabíamos que era tóxico pode estar se tornando mais tóxico ainda”, analisou.
Do mar para as indústrias
A professora Beate Saegesser avaliou que a melhor forma de evitar que o petróleo vá parar nos lixões realmente é transformá-lo em energia para indústrias, como já está sendo feito em alguns estados. No Ceará, por exemplo, o óleo está virando combustível para os fornos das cimenteiras. O composto substitui o coque de petróleo, que é um subproduto da queima do combustível fóssil.
As prefeituras guardam o óleo em recipientes cedidos pelo governo estadual. Depois, a cimenteira Apodi, sediada no município de Quixeré, recebe os resíduos contaminados com óleo (areia, madeira e outras coisas misturadas ao óleo), sem custos para a administração pública.
Em Pernambuco, o óleo está sendo beneficiado na Central de Tratamento de Resíduos (CTR), localizada no Ecoparque, em Igarassu, no litoral norte do estado. O governo paga R$ 150 por tonelada para que o Ecoparque faça o beneficiamento do produto, que é misturado a outros resíduos industriais e vendido a indústrias de cimento. As indústrias pagam à CTR, em média, R$ 100 por tonelada, segundo o presidente do Sindicato da Indústria de Cimento de Pernambuco (Sinprocim), Bruno Veloso.
Em Sergipe, uma fábrica de cimento da Votorantim está recebendo o material, de acordo com o governo federal, mas o envio tem sido feito pela Petrobras. Ubirajara Barreto, secretário de Meio Ambiente do estado, explica que a petrolífera está contribuindo para a coleta e a destinação dos resíduos desde que Sergipe – onde a Petrobras tem muitas operações – decretou estado de emergência. “Também recebemos R$ 2,5 milhões da União para retirada e transporte do material. Não cobre todos os custos, mas é uma ajuda”, comentou.
A pedido do GAA, a Petrobras assumiu o transporte dos resíduos no Rio Grande do Norte. O material será enviado ao município de Baraúna, onde fica a Mizu Cimentos. A empresa vai utilizá-lo para aquecer seus fornos, conforme termo de cooperação, sem custos para o poder público. Porém, de acordo com o Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema), que é uma autarquia estadual, a Petrobras ainda não está fazendo a coleta porque “alegou que não tem contrato vigente com o governo federal para fazer o serviço”.
Por telefone, a assessoria de imprensa da Petrobras informou que assumiu o transporte do óleo dos municípios no Rio Grande do Norte atendendo a um pedido do GAA, feito por meio de ofício, mas a “destinação final do material recolhido é de responsabilidade do Ibama, com apoio dos órgãos ambientais estaduais”.
A Petrobras não informou quando esse recolhimento deve começar nem quais os custos das operações. Além da questão do descarte, a empresa divulgou a mobilização de 1.700 agentes ambientais para ajudar nas ações de limpeza do Ibama, em várias áreas impactadas do Nordeste. Mas o secretário de Meio Ambiente de Pernambuco, José Bertotti, disse que a petrolífera “não contribuiu com nada nas coletas nas praias pernambucanas”, lembrando que o estado tem uma refinaria da Petrobras, a Abreu e Lima, localizada em Suape.
Sem ressarcimento
Ainda contabilizando as despesas com as operações de descontaminação das praias, que continuam sendo realizadas em Pernambuco, Bertotti recorda que o governo federal prometeu ressarcir os gastos dos estados com a limpeza e o tratamento do óleo.
O compromisso do repasse foi assumido pelo comandante de operações navais da Marinha, almirante Puntel, durante coletiva de imprensa, em visita a Pernambuco, no fim de setembro. “Mas até agora não vimos um centavo desse dinheiro. A única ajuda que recebemos foram alguns equipamentos de proteção [EPIs]”, reclamou.
Ricardo César de Barros, coordenador do gerenciamento costeiro do Instituto de Meio Ambiente de Alagoas, reforça o coro. Ele revela que “nenhuma compensação financeira foi feita pelo governo federal até agora”, embora o estado já tenha desembolsado R$ 4,3 milhões com a limpeza do óleo nas praias.
O governo do Ceará disse que já gastou cerca de R$ 50 mil apenas com equipamentos de proteção, além de aproximadamente R$ 400 mil com a colocação da contenção da poluição na foz do rio Jaguaribe. “Também, foram investidos recursos na comunicação e na implantação do novo procedimento de análise das águas e das areias das praias, agora, sob aspectos toxicológicos, não apenas biológicos”, informou a Secretaria de Meio Ambiente. Até agora nada foi ressarcido pelo governo federal.
O Piauí também aguarda os repasses federais. O estado segue sem uma decisão sobre a destinação final do produto, que está sendo armazenado pelas prefeituras dos municípios afetados. “O petróleo é colocado em bombonas plásticas e mantido em áreas de piso impermeável”, informou a Secretaria de Meio Ambiente.
Deusdete Queiroga, secretária de Infraestrutura, Recursos Hídricos e Meio Ambiente da Paraíba, revelou que o governo local ainda nem chegou a solicitar compensação pelas despesas com a tragédia porque “a quantidade coletada nas praias foi pequena em comparação com outros estados [0,4 tonelada]”. Atualmente, o petróleo está sendo encaminhado para um aterro sanitário.
No Maranhão, os resíduos estão sendo estocados em uma base da Marinha, no terminal de Ponta da Espera, em São Luís, até que o volume recolhido “justifique o transporte do material para o local de descarte”, segundo o governo do estado. Quando atingirem uma quantidade considerável – que não foi informada nem pelo estado nem pela Marinha –, os resíduos serão enviados para uma indústria cimenteira localizada em Sobral (CE).
A reportagem questionou o governo federal sobre o ressarcimento dos estados pelos gastos com a gestão dos resíduos de óleo retirado das praias. Não houve respostas até a publicação.
Transformações no semiárido brasileiro: “A luta pela água não pode acabar; ela é permanente”. Entrevista especial com Glória Araújo
“É importante fortalecer a agroecologia no semiárido, porque a metade dos agricultores brasileiros está na região”, diz a coordenadora executiva da Articulação Semiárido Brasileiro – ASA.
Na última década, a instalação de cisternas que permitem a captação da água da chuva garantiu que 85 mil famílias do semiárido passassem não só a teracesso à água para o consumo humano, mas pudessem produzir seus próprios alimentos. “A água utilizada para a produção de alimentos vem transformando a paisagem do semiárido”, diz Glória Araújo à IHU On-Line.
Antes de iniciativas como essa, que foram desenvolvidas através do Programa Um Milhão de Cisternas, “a realidade das famílias agricultoras do semiárido brasileiro era marcada pela dificuldade do acesso à água. Essas famílias, principalmente as mulheres e as crianças, caminhavam mais de seis quilômetros para pegar água em grandes propriedades”, lembra.
De acordo com a coordenadora executiva daArticulação Semiárido Brasileiro – ASA pelo estado da Paraíba, entre as mudanças que têm chamado atenção nos últimos anos no semiárido, destaca-se a queda nosprocessos migratórios do campo para a cidade. “No Nordeste houve inclusive um retorno ao campo justamente porque as pessoas passaram a ter água. Mesmo num período de estiagem não houve uma migração brusca do campo para a cidade”, informa. Apesar dos avanços dos últimos anos, frisa, “é preciso implementar políticas públicas para a população do campo, porque não podemos nos iludir achando que somente as cisternas vão resolver todos os problemas do semiárido”.
Na entrevista a seguir, concedida por telefone, Glória comenta ainda algumas das principais mudanças que tem evidenciado na região na última década, com destaque para o desenvolvimento da produção agroecológica, através do cultivo de sementes locais, que envolve 12.800 famílias. “Fizemos um mapeamento das sementes que estão sendo conservadas, diversificadas e usadas pela agricultura familiar e chegamos a identificar que o patrimônio genético do semiárido é fantástico. Esse trabalho da valorização das sementes locais é algo importante para que o semiárido seja dinâmico e para que as populações camponesas possam viver melhor. Nesse sentido, água, semente e terra são questões fundamentais”, pontua.
Glória Araújo é coordenadora executiva da Articulação Semiárido Brasileiro – ASA pelo estado da Paraíba.
Confira a entrevista.
Foto: patacparaiba.blogspot.com.br
IHU On-Line – Qual tem sido o impacto do programa de cisternas na transformação do semiárido? Pode nos apresentar um balanço de qual era a situação do semiárido antes da implantação das cisternas e como essa realidade mudou?
Glória Araújo – Antes desse programa a realidade dasfamílias agricultoras do semiárido brasileiro era marcada pela dificuldade do acesso à água. Essas famílias, principalmente as mulheres e as crianças, caminhavam mais de seis quilômetros para pegar água em grandes propriedades. A partir da concretização desse programa, quando a Articulação Semiárido Brasileiro – ASAapresentou a proposta da instalação das cisternas para a sociedade e para o governo a fim de atender as populações difusas do semiárido, essas famílias passaram a ser beneficiadas pelo Programa 1 milhão de Cisternas e passaram a ter, ao lado da casa, acesso à água de qualidade. As cisternas têm capacidade de armazenar 16 mil litros de água e podem atender uma família de até cinco pessoas durante um período prolongado de estiagem. Os últimos seis anos foram um período de violento processo de estiagem, e muitas vezes não choveu o suficiente para abastecer as cisternas, mas mesmo assim as famílias tiveram acesso à água em casa, algo que antes não tinham.
Além do acesso à água para o consumo humano, desde 2007 estamos trabalhando para que as pessoas tenham acesso à água para a produção de alimentos: trabalhamos com cisternas com capacidade para 52 mil litros de água, que são construídas nos quintais das casas e têm os transformado em locais de produção de alimento. As mulherestêm um papel importante nesta atividade, porque agora não só produzem suas plantas medicinais, como também reproduzem suas sementes e criam aves. Nesse sentido, a água utilizada para a produção de alimentos vem transformando a paisagem do semiárido. Hoje, já foram feitas cerca de 800 mil cisternas pela ASA e também por outras organizações e pelo governo do Estado, que tem incorporado a tecnologia de cisternas de placas da ASA. Nesse sentido, cerca de 85 mil famílias do semiárido já têm acesso à água para a produção de alimentos e isso está transformando a vida das pessoas, porque agora elas não só têm água para consumir, mas também para produzir alimentos.
Também desenvolvemos junto aos agricultores um trabalho de gestão da água para o consumo e para a produção de alimentos. Isso tem trazido impactos incríveis na vida das pessoas não só porque elas passam a ter acesso à água, mas porque conseguem produzir uma diversidade de alimentos sem uso de agrotóxicos. Esses alimentos passam a ser consumidos pelas famílias e, mesmo em momentos de estiagens, elas têm conseguido vender seus alimentos no mercado da comunidade ou nas feiras locais, além de terem uma parceria com o Programa Nacional de Alimentação Escolar. Chama a atenção que, mesmo no período de seca, em 2014 foram organizadas quatro feiras, que oferecemprodutos agroecológicos produzidos pelas famílias.
"Mesmo no período de seca, em 2014 foram organizadas quatro feiras, que oferecem produtos agroecológicos produzidos pelas famílias"
IHU On-Line – Uma das reivindicações da ASA era a instalação das cisternas de placa e não as de plástico, conforme havia sido sugerido pelo governo federal há alguns anos. Hoje se investe mais em qual tipo de cisterna?
Glória Araújo – Hoje diminuiu o número de cisternas de plástico, porque fizemos um movimento contrário a essa tecnologia, justamente porque ela vem de fora, tem um preço mais elevado e os agricultores ficariam dependentes da empresa que comercializa esse tipo de cisterna caso ocorresse algum problema. Além disso, a construção das cisternas de placa fomenta o comércio local.
IHU On-Line – Além do avanço em relação ao acesso à água, quais são as principais dificuldades que a população do semiárido ainda enfrenta quando se trata de ter acesso à água?
Glória Araújo – Apesar do avanço, ainda é preciso construir mais cisternas para que toda a população do semiáridopossa ter acesso à água, e não apenas para o consumo humano, mas também para poderem plantar seus alimentos.
Um dado que tem nos chamado a atenção é que embora tenha esse processo migratório do campo para a cidade, noNordeste houve inclusive um retorno ao campo justamente porque as pessoas passaram a ter água. Mesmo num período de estiagem não houve uma migração brusca do campo para a cidade. Tendo em conta esse cenário, é preciso implementar políticas públicas para a população do campo, porque não podemos nos iludir achando que somente as cisternas vão resolver todos os problemas do semiárido. Elas têm um papel importante no acesso à água, mas também é preciso olhar para as bacias hidrográficas, para as águas subterrâneas, os mananciais, ou seja, é preciso de políticas públicas que levem em conta o conjunto do meio ambiente. Isso faz com que se tenha um olhar mais sistêmico e integrado, ou seja, temos de olhar para as diversas formas de ter e garantir o acesso à água nosemiárido. A luta pela água não pode acabar; ela é uma luta permanente.
Para se ter uma ideia, em alguns locais ainda não conseguimos instalar as tecnologias desenvolvidas pela ASA, porque algumas famílias não têm espaço em seus territórios para construir uma cisterna-calçadão de 200 metros. Então, a luta pela terra é algo importante para transformar a situação do semiárido.
IHU On-Line – Que tipos de políticas públicas seriam fundamentais para garantir a melhor qualidade de vida no semiárido e o desenvolvimento da região? O que tem sido feito em termos de outras políticas?
Glória Araújo – Primeiro temos que entender que o semiárido não é aquele lugar que muitas vezes é apresentado como um local de terra rachada, de vida seca. O semiárido tem um potencial muito grande e uma diversidade enorme que pode ser vista na Caatinga. Temos de olhar para essa potencialidade e capacidade naturais e humanas, ou seja, é preciso olhar o semiárido com outra lente: como um local que tem vida e capacidade de transformá-lo num local digno para se viver.
Entre os programas que vêm sendo realizados junto ao BNDES, destaco o Programa Sementes do Semiárido, que valoriza as variedades de sementes locais. Esse projeto será finalizado neste mês de maio, mas durante seu desenvolvimento conseguimos trabalhar com 640 bancos de sementes e 12.800 famílias. Fizemos um mapeamento das sementes que estão sendo conservadas, diversificadas e usadas pela agricultura familiar e chegamos a identificar que o patrimônio genético do semiárido é fantástico. Esse trabalho da valorização das sementes locais é algo importante para que o semiárido seja dinâmico e para que as populações camponesas possam viver melhor. Nesse sentido, água, semente e terra são questões fundamentais.
Também são desenvolvidas políticas voltadas para a agricultura familiar para que os agricultores possam vender seus produtos orgânicos, porque em geral eles não usam nem agrotóxicos nem sementes transgênicas; há um entendimento de que a agricultura se faz numa relação harmônica entre o homem e a natureza. Então, é importante fortalecer a agroecologia no semiárido, porque a metade dos agricultores brasileiros está no semiárido. Nessa linha, ainda seria preciso desenvolver algumas políticas que possibilitassem trabalhar a questão da produção, da organização da produção, do acesso ao mercado, a exemplo do Programa Nacional de Alimentação Escolar, que compra a produção das famílias e a repassa para as escolas.
É importante ressaltar que algumas políticas foram bastante importantes para o semiárido, como o Programa Bolsa Família, que transformou a vida das pessoas não no sentido de elas ficarem dependentes do programa, mas, ao contrário, de elas terem condições de iniciar uma produção e passarem a ter acesso a créditos. As pessoas que recebem o Bolsa Família são trabalhadoras, vivem da agricultura, e esses programas sociais são um apoio a elas, porque à medida que acessam renda, deixam de precisar dos programas. De modo que se pode dizer que esses programas sociais também deram uma contribuição para a transformação do semiárido. Agregando isso à política de acesso à água e às sementes, foram colocados novos elementos para que essas famílias vivessem em melhores condições.
"Temos que entender que o semiárido não é aquele lugar que muitas vezes é apresentado como um local de terra rachada, de vida seca"
IHU On-Line – Como a transposição do rio São Francisco tem sido discutida na região do semiárido, depois de 85% das obras já estarem concluídas na Paraíba e de o governo sustentar a tese de que a transposição garantirá a segurança hídrica na região?
Glória Araújo – A transposição poderá trazer vantagens, mas será para um segmento social específico, e não para a população deagricultores, indígenas e quilombolas que vivem no semiárido, porque a água não vai chegar a essas populações. Nós temos muitas críticas à transposição, porque a história brasileira mostra que quando se investe em grande obras, elas não servem para atender ao grande público. Sem falar que essas obras não levam em conta os limites da própria natureza, porque a transposição vai trazer transtornos para o velho Chico, considerando que muitos estudos demonstram que a transposição causará impactos ambientais para o rio.
Outra crítica que fazemos à transposição é em relação aos altos recursos que são utilizados para realizar a obra. Se esse dinheiro fosse utilizado para desenvolver outras políticas, seria possível atender a um público bem maior e mais pobre.
IHU On-Line – Com uma possível mudança de governo, vislumbra alguma mudança na continuidade da implantação das cisternas no semiárido?
Glória Araújo – O novo governo está desmontando o Estado brasileiro e as conquistas sociais também serão desmontadas. Desde o período da colonização até hoje, foram poucos os governos que de fato trabalharam com as populações excluídas. Nos últimos 12 anos houve mudanças para o povo excluído, e as organizações da sociedade civil terão de denunciar e lutar pela continuidade de direitos daqui para frente.
O que provocou o enorme vazamento de resíduos de petróleo que contaminou mais de 150 praias do nordeste permanece um mistério. A Marinha, que coordena as investigações, explica que este incidente é “muito complexo e sem precedentes” e trabalha com “várias hipóteses” sobre suas causas.
Autoridades afirmam que o vazamento, detectado no começo do mês e que contaminou mais de 2 mil km da costa, “muito provavelmente” tem origem venezuelana, mas a estatal Petróleos da Venezuela (PDVSA) nega as acusações.
Nesta terça-feira, uma especialista que acompanha as investigações confirmou informes publicados na imprensa segundo os quais os resíduos podem ter vazado de um “navio fantasma” que carregava petróleo venezuelano e tentava evitar sanções dos Estados Unidos.
“Ontem, tivemos uma reunião com [representantes de] vários órgãos, como Ibama, Marinha, Ministério Público Federal, pesquisadores e prefeitos, e na verdade pouquíssima coisa foi esclarecida, mas houve essa suposição de que poderia ter sido um navio fantasma”, disse Maria Christina Araújo, professora de Oceanografia e Limnologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), um dos estados afetados pelo vazamento.
“Poderia ser um navio fantasma, que navega de forma ilegal, seguindo rotas pouco conhecidas, e poderia estar transportando petróleo cru da Venezuela por conta dessas sanções”, acrescentou.
A Venezuela, que chegou a ser um país rico em virtude da exploração de suas reservas de petróleo, as maiores do mundo, atravessa sua pior crise econômica e um enfrentamento político entre o presidente Nicolás Maduro e o líder opositor e presidente autoproclamado Juan Guaidó.
A situação da Venezuela piorou após as sucessivas sanções dos Estados Unidos contra o governo Maduro, incluindo medidas para restringir a venda de petróleo venezuelano.
O ministro do Meio Ambiente brasileiro, Ricardo Salles, disse a uma comissão do Congresso que o petróleo vazado “muito provavelmente vem da Venezuela”, citando um relatório da Petrobras, que ajuda nas operações de limpeza das mais de 150 praias afetadas em nove estados do nordeste.
A Petrobras assegura que os resíduos encontrados não são produzidos nem vendidos pela empresa.
Até agora, foram recolhidas 200 toneladas de resíduos de petróleo nas áreas atingidas, que castigam uma região já empobrecida que abriga as praias mais exuberantes do país e vive da exploração da pesca e do turismo.
A oceanógrafa da UFRN sustentou que aparentemente o vazamento foi acidental. “Não acredito numa teoria proposital”, disse.
“Na verdade, ainda existem muitas dúvidas”, acrescentou a pesquisadora, destacando que nunca houve no país um desastre dessa magnitude, que afeta uma área tão extensa.
Segundo o Ibama, em virtude do vazamento foram encontradas 13 tartarugas mortas, enquanto a ONG Verdeluz reportou 21 quelônios mortos só no estado do Ceará, um dos atingidos.
Enquanto as manchas de óleo avançam pelas praias do Nordeste, grupos de voluntários se organizam para ajudar na remoção do poluente, que fica impregnado na areia e nos corais. Nos mutirões, os grupos conseguem recolher grandes porções do material, mas pedaços menores podem ficar vários anos depositados no ecossistema.
Para a bióloga Yana Costa, foi “uma das experiências mais tristes da vida” ir até a Praia de Muro Alto, em Ipojuca, um dos cartões-postais de Pernambuco, para ajudar na força-tarefa. “Havia diversos fragmentos de óleo na praia e na areia. Nos corais, não dava para tirar porque estava impregnado”, conta. No Estado, o poluente também chegou nesta segunda-feira, 21, ao Cabo de Santo Agostinho e a outros destinos turísticos bastante procurados, como Carneiros.
Os grupos de voluntários trabalham em turnos, geralmente com início pela manhã. A maior parte sai do Recife até o litoral sul pernambucano. A comunicação é feita, principalmente, pela internet, em grupos de mensagens instantâneas. “Durante a experiência, você sente dois sentimentos opostos. Fica triste por ver aquilo acontecendo com as praias que frequenta. Mas também é bom ver que as pessoas estão se engajando por um bem comum, que é limpar e tentar deixar o mínimo de estrago possível”, diz o estudante Yan Lopes, outro voluntário.
Os grupos têm recebido orientação da organização Xô Plástico de se protegerem totalmente com luvas e botas e evitar ao máximo entrar em contato com o óleo. Além da Xô Plástico, organizações como PE Lixo, Recife sem Lixo e Salve Maracaípe recrutam voluntários.
A recomendação dos órgãos públicos é para uso de luva e bota de borracha, além de máscara e calça comprida. Apesar disso, muitos trabalham sem a segurança necessária. “Tem gente que se melou toda de óleo”, conta a estudante de Educação Física Louise Foster, que faz limpeza voluntária na Praia de Itapuama, no Cabo de Santo Agostinho. Já o secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Pernambuco, José Bertotti, afirma que o tamanho do desastre dificulta a distribuição de kits de proteção a todos. “A gente conseguiu material de doação de empresas e a Defesa Civil fez distribuição.”
Riscos
Especialistas afirmam que o óleo pode desencadear doenças respiratórias e da pele, mas seria necessária exposição prolongada para levar a problemas mais graves. “Petróleos que possuem mais benzeno em sua composição podem, em casos mais graves, provocar alterações neurológicas e até leucemia”, diz o médico toxicologista Anthony Wong, diretor do Centro de Assistência Toxicológica da Universidade de São Paulo (USP).
A inalação dos gases liberados com a vaporização do petróleo pode levar a doenças respiratórias, como bronquite e asma. É recomendável que banhistas se mantenham longe do mar e, em caso de contato, lavem imediatamente com água e sabão.
Protesto no Nordeste
Os clubes do Nordeste seguem fazendo bonito fora dos gramados com questões sociais. CSA, CRB, Ceará, Fortaleza, Sport e Vitória deixaram a rivalidade de lado e se uniram para se manifestar lamentando os episódios de aparecimento de manchas de óleo de petróleo em praias nordestinas.
Todos os seis clubes postaram em suas contas oficiais do Twitter a mensagem de que o Nordeste está unido e repudia o ocorrido.
“O Nordeste está ainda mais unido pelo óleo que invade nossas praias. Manchamos nossas mãos, lamentamos pela beleza da nossa costa, vimos o avanço com tristeza mas não medimos esforços para salvar a natureza da nossa Região. Essa é uma luta de todos”, diz a mensagem, ilustrada com uma mão suja de petróleo.
Sport Club do Recife
✔@sportrecife
O Nordeste está ainda mais unido pelo óleo que invade nossas praias. Manchamos nossas mãos, lamentamos pela beleza da nossa costa, vimos o avanço com tristeza mas não medimos esforços para salvar a natureza da nossa Região. Essa é uma luta de todos. #SOSNordeste
Enquanto país se torna referência no combate à insegurança alimentar, há grupos em situação de vulnerabilidade, entre eles muitos indígenas.
A reportagem é de Camila Nobrega e Rogério Daflon em artigo publicado Canal Ibase, 31-10-2013.
Eis o artigo.
A chegada de uma mineradora a uma região próxima a um quilombo nos arredores da cidade de Goiânia mudou a rotina dos moradores. Eles sonharam com empregos, mas poucos se concretizaram. A disputa pela terra se acirrou, o espaço para plantar diminuiu. O jeito passou a ser comprar comida. Os modos de vida se alteraram, as relações foram atropeladas. E, como resultado, as comunidades vivem hoje uma nova tragédia: em troca de alimento, há famílias que oferecem até suas filhas a operários da mineração. A prostituição infantil passou a ser uma triste realidade no quilombo.
A denúncia foi feita recentemente no Fórum Brasileiro de Segurança e Soberania Alimentar (FBSSAN), em junho, pelo Grupo de Mulheres Negras Malunga. Desde então, de acordo com a organização, nada mudou e a situação só se agrava. O caso se perde em meio a outros que se multiplicam Brasil afora, invisíveis frente à euforia das estatísticas que mostram a redução da fome em nível nacional. Segundo a ONU para Alimentação e Agricultura (FAO), o número de 22,8 milhões de pessoas em 1992 com fome caiu para 13,6 milhões em 2012. A mudança foi significativa, pois, em 1990, 15% dos brasileiros passavam fome. Hoje, são 6,9%. Procurado pelo Canal Ibase, o MDS disse não ter os dados das áreas específicas onde há insegurança alimentar, sugerindo que se procurasse o IBGE.
Os dados recentes poderiam ser festejados, já que a economia brasileira é a sétima do mundo em termos de Produto Interno Bruto e, em alguma medida, isso se reverteu em mudança social. Mas, ao seguir à risca um modelo de desenvolvimento excludente, surge um anticlímax: o país se expõe a um vexame quando se verifica a persistência da fome em algumas regiões. O que vem à tona claramente sobre o tema é que o Norte e o Nordeste apresentam quadros de insegurança alimentar incompatíveis com a riqueza nacional. Nessa geografia da fome atual, existem territórios em que populações vivem situações gravíssimas, como afirma Francisco Menezes, pesquisador do Ibase e referência nacional no tema:
– Eu diria que os que estão em pior situação atualmente são os indígenas. Em muitas regiões, perderam suas terras (com a chegada da soja, cana, etc), foram muito violentados em sua cultura e vivem situações de calamidade, ao qual o Estado pouco ou nada contribui – diz Menezes, fazendo um contraponto à euforia das estatísticas.
Na Terra Indígena Governador, no município de Amarantes, a 700 km da capital maranhense, o problema da fome está associado ao conflito com latifundiários do agronegócio e, consequentemente, à dificuldade de acesso à terra. Como o Brasil nunca consolidou uma reforma agrária de fato, há muitas comunidades abandonadas pela ausência de garantia do território pelo Estado. Segundo Joaquim Cardoso, morador da TI de Governador e membro do comitê gestor da Fundação Nacional do Índio (Funai), há muitos indígenas sofrendo por escassez de alimentos:
– A falta de acesso à terra no país é uma das causadoras da fome. Sem regularização de terras, o governo deixa que as batalhas continuem. Os pequenos, claro, continuam perdendo. Há índios na beira da estrada, sem ter onde plantar e sem dinheiro para comprar – contou Joaquim em entrevista ao Canal Ibase.
Nordeste é maior foco da fome no país
A situação dos índios só ganhou visibilidade com o anúncio de um possível suicídio coletivo dos Guarani-Kaiowa, um ano atrás. Mas a situação permanece inalterada lá e em muitos outros territórios indígenas espalhados pelo país.
A professora Sandra Maria Chaves dos Santos, da Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia, afirma que os dados dos últimos 20 anos deixam clara a diminuição da fome do país, mas isso não é justificativa, enfatiza ela, para deixar de combatê-la. Ela estuda o tema na região Nordeste e afirma que, em Sergipe, por exemplo, houve melhora. Mas a insegurança alimentar continua grave em outros estados.
– E como serão os resultados do próximo censo do IBGE em relação à fome, levando-se em conta que a seca da região já dura quase três anos? – ressalta ela.
No Vale do Jiquiriçá, a professora fez uma pesquisa com base na Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) e de um questionário socioeconômico. O resultado é que, de 2.002 domicílios, constatou-se insegurança alimentar em 70,3%, com predomínio da insegurança grave e moderada (36,0%) em nove municípios.
– Há que se chamar atenção quanto às estatísticas do Censo de 2010. Embora tenha havido uma redução importante da fome, o que se vê nos dados é a manutenção das desigualdades regionais. O problema é estrutural. Quanto menor o nível de escolaridade, por exemplo, maior é o risco de insegurança alimentar – diz ela.
No contexto atual, em que muitas populações estão na iminência de perder acesso à terra com a chegada de megaempreendimentos e a expansão do agronegócio, a situação se agrava. É o que afirma o coordenador-executivo da Action Aid Brasil, Adriano Campolina: – As obras de infraestrutura no Brasil estão gerando novas pobrezas, com a expulsão das pessoas de seus locais de origem. Precisamos reverter isso, que também ocorre em função dos megaeventos esportivos: a Copa e as Olimpíadas.
A presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Maria Emília Melo, diz que o desafio é frear esse processo.
– É preciso investir na agricultura familiar, no banimento do uso de agrotóxicos. Há um conjunto articulador de políticas que está diretamente relacionado à segurança alimentar. O alimento tem que ser visto como direito humano e não como mercadoria.
Para Maria Emília, a soberania alimentar ainda não foi alcançada no país. Isso, prevê a presidente do Consea, só ocorrerá quando todos os povos tiverem direito de estabelecer suas políticas do direito humano à alimentação.
– É preciso pensar a produção, a distribuição e o acesso ao alimento. E não adianta apenas comer, é preciso saber quais alimentos estão chegando à mesa dos brasileiros. O Brasil assiste neste momento, por exemplo, ao aumento do sobrepeso. E há casos que combinam subnutrição com sobrepeso devido à baixa qualidade dos alimentos.
Há pesquisadores que questionam, inclusive, se alguns alimentos superprocessados devem ser chamados de alimentos.
A professora Inês Rugani, do Departamento de Nutrição da Uerj, vê um um aspecto dramático no país, que aparece também no programa Bolsa Família. Ela alerta que famílias cuja renda é mais baixa estão adquirindo o hábito de comprar alimentos processados, a fim de consumir produtos semelhantes aos da classe média.
– A qualidade da alimentação cai muito, e a consequência na saúde é direta, como o aumento da diabetes. Um grande exemplo são os refrigerantes. Os mais baratos são ainda mais nocivos do que os mais divulgados pela propaganda maciça.
As pessoas a que Rugani se refere ao menos são beneficiadas por políticas públicas, como o Bolsa-Família. Mas há aquelas que ainda sofrem de privação.
– Ainda se morre de fome no Brasil – afirma Francisco Menezes.