Greenpeace bloqueia refinaria da Total na França que utiliza óleo de palma


Ativistas do Greenpeace bloqueiam em 29 de outubro de 2019 a entrada da biorrefinaria total de Mede, perto de Marselha (AFP)

Ativistas da ONG Greenpeace bloquearam a entrada de uma refinaria no Sul da França, na qual o grupo Total produz combustíveis a base de óleo de palma, considerado uma das principais causas do desmatamento. Com ajuda de contêineres, quase 50 ativistas bloquearam a entrada da refinaria da cidade de La Mède, perto de Marselha. Dois deles se acorrentaram aos contêineres.

Os ativistas desejam alertar a população sobre o uso do óleo de palma, um produto acusado de provocar um grande desmatamento, principalmente no Sudeste Asiático. “Desmatamento made in France” e “Emmanuel Macron cúmplice”, afirmavam duas faixas exibidas pelos ativistas.

A refinaria de La Mède, uma das maiores da Europa, importa 550 mil toneladas de óleo de palma, de acordo com Clément Sénéchal, diretor da campanha sobre o clima e as florestas do Greenpeace França.

Os biocombustíveis a base de milho, cana de açúcar e de óleo de palma pareceram, a princípio, uma boa ideia para substituir os poluentes combustíveis fósseis. Mas a energia necessária para transformar e transportar os biocombustíveis afeta na realidade o propósito inicial de preservar o meio ambiente.

Indonésia e Malásia são os maiores produtores de óleo de palma e dominam praticamente todo o mercado, mas o crescimento da demanda está ampliando o cultivo em todo o planeta. A Colômbia é a quarta maior produtora.

AFP

11 de setembro: Dia do Cerrado


Foto: IHU

O Brasil alcança mais um 11 de setembro, data nacional dedicada ao Cerrado. Entre repetidas promessas de um modelo de desenvolvimento sustentável, essa região estratégica para o futuro do país tem sua vegetação nativa diariamente consumida, ora pelo desmatamento, ora pelas queimadas.

A informação é do sítio da WWF-Brasil, 09-09-2011.

Só não mudam os motivos: ampla margem legal para desflorestamento (80% das propriedades rurais), extração ilegal de madeira e de carvão, avanço desregrado da agropecuária, da urbanização e da geração de energia.

Apesar das agressões impostas ao longo de cinco décadas, a “caixa d”água do Brasil” ainda abastece grandes aqüíferos e bacias hidrográficas, inclusive para a Amazônia e Mata Atlântica. Associando essa riqueza à tecnologia, 40% do Cerrado estão ocupados pela agropecuária. Ao todo, já perdeu metade da vegetação original, e o restante está muito fragmentado.

Complicando o futuro dessa região bela e inspiradora de culturas ímpares, menos de 3% do Cerrado estão protegidos de fato. Logo, o Brasil pode e deve equilibrar de vez a balança entre produção e conservação, construindo um caminho mais seguro para um futuro de incertezas climáticas, onde ainda precisaremos produzir alimentos e commodities.

IHU

Vazamento é a maior agressão ambiental do país, avalia Petrobras


Castello Branco compara o óleo retirado das praias do Nordeste ao desastre ambiental no Golfo do México (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

O vazamento de óleo que tem sido retirado do litoral do Nordeste é a maior agressão ambiental já sofrida pelo Brasil em sua história, disse nesta terça-feira (29), no Rio de Janeiro, o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco. Ele participou de um seminário da Fundação Getulio Vargas (FGV) sobre a matriz energética brasileira e comentou o desastre ambiental.

“[O vazamento] é maior agressão ambiental sofrida por nosso país, creio eu, em nossa história”, disse. Afirmou que o assunto tem sido abordado de forma “politizada e ideologizada”, com “versões falsas” sobre o que poderia ter sido feito.

“Na realidade, era impossível combater isso na origem. As empresas de petróleo e a Petrobras estão preparadas para combater vazamentos de petróleo, uma vez identificada a fonte do vazamento”, afirmou.

Castello Branco comparou a quantidade de óleo retirada das praias ao desastre ambiental no Golfo do México, em que o vazamento partiu da petrolífera British Petroleum (BP). “É semelhante”, disse.

Ainda não se sabe de onde vazou o óleo que atinge as praias nordestinas, mas pesquisadores já apontaram que o vazamento ocorreu no oceano, em uma área entre 600 e 700 quilômetros de distância da divisa entre Sergipe e Alagoas. Uma das hipóteses é que o óleo foi extraído de três campos na Venezuela e, provavelmente, estava sendo transportado quando ocorreu o acidente.

Leilões

O presidente da Petrobras afirmou, ainda, que o setor petrolífero vive um “ano extraordinário” no país e avaliou que o leilão de excedentes da cessão onerosa, marcado para semana que vem, é uma vitória do governo.

“A demanda global por petróleo tende a crescer lentamente, quem sabe estagnar e, no futuro, reduzir. Não podemos esperar e deixar o petróleo no fundo do mar”, defendeu ele.

A seguir, disse que, por uma questão de priorizar os ativos de maior retorno, a Petrobras manifestou preferência por apenas dois campos, os de Itapu e Búzios, este o maior já descoberto no Brasil. Ele disse que a estatal está otimista com o resultado. “Vamos com entusiasmo para ganhar”.

Agência Brasil

Brasileiro quer ficar mais perto da natureza, diz pesquisa


Alto Paraíso (GO) – Plantação de soja em área do município de Alto Paraíso (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Uma pesquisa do IBOPE Inteligência encomendada pelo WWF-Brasil sobre o que o brasileiro pensa sobre as áreas protegidas e o meio ambiente revela uma população que valoriza o meio ambiente, quer estar cada vez mais perto da natureza e acha que cuidar do verde é uma responsabilidade também do cidadão.

A reportagem é de Jaime Gesisky, publicada por WWF-Brasil, 04-09-2018.

A coleta de dados foi realizada entre os dias 21 e 26 de junho de 2018 com pessoas de 16 anos ou mais, de diferentes classes sociais e com representatividade nacional. Esta é a segunda rodada da mesma pesquisa encomendada pelo WWF-Brasil em outubro de 2014.

Em 2018, o desmatamento e a poluição das águas continuam sendo vistos como as principais ameaças ao meio ambiente, com 27% e 26% de menções, respectivamente, praticamente o mesmo percentual de 2014.

A pesquisa está sendo lançada no mês em que há o Dia da Amazônia, em 5 de setembro, e o Dia do Cerrado, em 11 de setembro, dois biomas ameaçados pelo desmatamento. Considerando os dados de monitoramento do Prodes 2017divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), a cada dois meses, uma área equivalente à cidade do Rio de Janeiro é desmatada na Amazônia(6.947 km²/ano). Já no Cerrado, a cada minuto é desmatada uma área equivalente a quase dois campos de futebol (7.408 km²/ano).

caça e a pesca ilegais, juntamente com as mudanças climáticas, ocupam o terceiro lugar na preocupação dos entrevistados (16%). Obras de infraestrutura, como hidrelétricasrodovias e portos tiveram 15% de menções no ranking de maiores ameaças à natureza.

Segundo a pesquisa, nove entre dez brasileiros acreditam que a natureza não está sendo protegida de forma adequada. Em 2014, a porcentagem era de 82% para esta pergunta. A percepção sobe para 91% dos entrevistados em 2018.

A pesquisa, porém, nota que aumenta significativamente o percentual de entrevistados que atribuem aos cidadãos a responsabilidade por cuidar das unidades de conservação (parquesreservasflorestas nacionais). Em 2018, o número de brasileiros que pensam também ser atribuição dos cidadãos cuidar dessas áreas cresce 20 pontos percentuais em comparação com 2014, saltando de 46% para 66%.

Mas o governo segue como o principal responsável por essa tarefa, com 72% de citações. As ONGs aparecem em 3º lugar, com 23% dos brasileiros afirmando acreditar que as organizações civis devem atuar para defender a causa ambiental.

“A grande maioria espera maior compromisso do poder público na proteção da natureza e por uma melhor qualidade de vida. E uma solução depende da outra: estão intrinsecamente ligadas quando buscamos, por exemplo, melhor qualidade do ar e menos poluição da água”, afirma Mauricio Voivodic, diretor-executivo do WWF-Brasil. “A pesquisa mostra também que as pessoas acreditam que devem participar mais do cuidado com a natureza e se preocupam com o desmatamento, indicando que o apoio da população na defesa das áreas protegidas do país pode crescer”, completa Voivodic.

Orgulho nacional

Perguntados sobre os motivos que os brasileiros consideram razões de orgulho para o país, observa-se queda na avaliação da maioria dos atributos investigados entre as rodadas da pesquisa. Em 2014 – quando se fez a mesma pergunta – 58% dos brasileiros entrevistados afirmavam sentir orgulho do meio ambiente e suas riquezas. Esse número cai para 39% em 2018.

No entanto, os resultados da pesquisa de 2018 apontam que, apesar da queda na avaliação dos atributos relacionados às razões de orgulho para o país comparativamente a 2014, o meio ambiente e as riquezas naturais brasileiras continuam em posição de destaque para os entrevistados, com o total de 39% das menções.

Em seguida, foram citados a qualidade de vida (30%), a diversidade da população/cultura (26%) e o esporte (23%) como principais motivos de orgulho nacional. Uma das possíveis justificativas para a queda geral na avaliação dos atributos em relação a 2014 pode ser o momento negativo vivenciado no país em 2018.

Serviços ambientais

Quando apresentados a uma cartela indicando os possíveis benefícios (serviços ambientais) que as Unidades de Conservação geram para a sociedade, os entrevistados apontam a melhoria qualidade do ar (51%), proteção de nascentes e rios (45%) eproteção da diversidade de animais e plantas (44%) como principais vantagens.

Lazer (31%), geração de renda para a população local (26%) e fornecimento de madeira (8%) também são vistos com bons olhos. Em praticamente todos os itens, a porcentagem foi menor do que a que se viu em 2014 para a mesma pergunta.

Embora se confirme a valorização da natureza no cotidiano dos brasileiros observada em 2014, o desafio de maior conscientização e mobilização da população sobre temas ambientais se faz ainda mais necessário em 2018.

A correlação entre os benefícios das áreas de conservação com a “proteção da diversidade de plantas e animais” e a “proteção das nascentes e rios” são temas que ainda estão distantes da percepção do público em geral, pois além do baixo grau de conexão entre as áreas de conservação e esses tópicos, tais atributos apresentam queda comparativamente a 2014.

A valorização de lugares que tenham paisagens naturais ao viajar, na pesquisa de 2018, sobe 20 pontos percentuais para o total da amostra, se comparado à rodada anterior da pesquisa. Na atual edição, mais da metade da população permanece insatisfeita com as áreas verdes que possuem em suas cidades, embora costumem realizar atividades junto à natureza (52%).

IHU

Cobertura sobre a 4ª Semana de Estudos Amazônicos


O evento acontece entre os dias 29 de outubro e 1º de novembro em diversas instituições ligadas à Companhia de Jesus (Thiago Ventura/DomTotal)

Centro das atenções mundiais nos últimos tempos, a Amazônia ainda é uma grande desconhecida da população brasileira. Reunindo representantes da sociedade civil, do poder público, dos povos amazônicos, de instituições eclesiais e da comunidade acadêmica, a 4ª Semana de Estudos Amazônicos (Semea) é uma resposta a essa lacuna. O evento acontece entre os dias 29 de outubro e 1º de novembro em diversas instituições ligadas à Companhia de Jesus na região de Belo Horizonte, entre elas a Dom Helder Escola de Direito, que recebe grande parte das atividades.

Confira abaixo a cobertura completa do Semea!

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A sustentabilidade e o meio ambiente


Foto: EBC

Por *Evaristo E. de Miranda

Mais de 4 milhões e 275 mil produtores rurais, atendendo às exigências do novo Código Florestal (Lei n.º 12.651, de 25 de maio de 2012), registraram seus imóveis no Cadastro Ambiental Rural (CAR). Todo esse esforço será jogado no lixo caso o Supremo Tribunal Federal (STF) acolha alguma das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) contra artigos do Código Florestal que devem ser julgadas amanhã em seu plenário.

O conhecimento atualizado das áreas efetivamente utilizadas e preservadas pela agricultura nos imóveis rurais teve um avanço significativo com o advento do CAR, sob a responsabilidade do Serviço Florestal Brasileiro do Ministério do Meio Ambiente. As áreas destinadas à preservação da vegetação nos imóveis rurais são registradas em mapas, eles mesmos delimitados sobre imagens de satélite com 5 metros de resolução espacial. E não apenas em declarações de produtores transcritas em questionários, como ocorre nos Censos do IBGE. São duas consequências principais do CAR, todas positivas para o meio ambiente e o Brasil.

Em primeiro lugar, pode-se avaliar de forma circunstanciada a contribuição dos produtores rurais à preservação ambiental no Brasil. Eles dedicam uma área superior a 176 milhões de hectares, em média 47,7% de seus imóveis, para a manutenção da vegetação nativa e da biodiversidade. Isso representa 20,5% do território nacional! Os resultados quantificados e detalhados por município, microrregião, Estado e País estão disponíveis, com mapas, no site da Embrapa Monitoramento por Satélite. E ninguém recebe nada por isso, em que pese os produtores imobilizarem um patrimônio fundiário estimado entre R$ 3 trilhões e R$ 4 trilhões em prol do meio ambiente. Todas as unidades de conservação (parques, estações ecológicas, florestas nacionais) protegem 13% do País e os agentes públicos, para a sua manutenção, recebem muitos bilhões de reais anualmente, do Brasil e do exterior. Nenhuma instituição contribui tanto para a preservação da vegetação nativa e da biodiversidade como os produtores rurais.

Em segundo lugar, com base no CAR estão sendo aplicados os Programas de Regularização Ambiental (PRAs) nos Estados. Neles, quando necessário, os produtores recompõem, protegem e compensam áreas para preservação da vegetação nativa e da biodiversidade. Ou seja, o número de áreas dedicadas à preservação está aumentando e aumentará ainda mais com a execução do PRA pelos Estados. Todo esse esforço será perdido caso o STF acolha qualquer uma das ADIs impetradas por promotores do Ministério Público e membros do PSOL, PV e ONGs. Elas têm o potencial de desestruturar o conjunto harmônico dessa legislação ambiental.

Anulado o artigo 68 – que prevê o respeito à lei do tempo, segundo a qual quem desmatou nos séculos 17 ou 19 não está obrigado a recompor a reserva legal, instrumento criado e generalizado na metade final do século 20 –, teremos milhões de agricultores vitimados e na ilegalidade, principalmente os pequenos produtores, que constituem 89% dos estabelecimentos agrícolas. O módulo fiscal como critério objetivo para adequar as exigências do Código Florestal ao tamanho dos imóveis rurais também é contestado nas ADIs. Se acolhida a ação, até o crédito rural e a reforma agrária serão afetados negativamente.

Quem propõe essas ADIs ignora suas graves e negativas consequências sociais, econômicas e ambientais. Tenta negar que a elaboração do Código Florestal seguiu um processo profundamente democrático e inédito, evidente nas mais de 200 audiências públicas e privadas nas quais foram ouvidos ambientalistas, agricultores, criadores, pesquisadores, ONGs, juristas e gestores ambientais em todo o País. E, quando da respectiva votação, o projeto também recebeu um dos maiores apoios políticos em situações dessa natureza. A primeira versão do Código Florestal foi aprovada na Câmara por 410 a 63, com votos oriundos de todas as bancadas; e, no Senado, a aprovação se deu por 59 votos contra apenas 7.

Os ganhos ambientais advindos do novo Código Florestal foram reconhecidos por todos os que defenderam a lei na audiência pública que o ministro Luiz Fux organizou no STF, Ibama incluído. Houve até um reconhecimento internacional na Conferência do Clima (Paris), inclusive pelas ONGs do Observatório do Código, sobre os avanços trazidos pelo novo Código Florestal.

Aprovado e praticado há mais de cinco anos, o Código Florestal trouxe segurança jurídica para os agricultores e ganhos significativos para o meio ambiente. Não há legislação ambiental tão exigente em país algum do mundo. Mas, para os proponentes das ADIs, o objetivo parece ser o de desestabilizar o setor agrícola, os instrumentos jurídicos legalmente constituídos e destruir o Código Florestal, cuja construção foi negociada e equilibrada, com ganhos e perdas aceitas ao fim por todos os interessados. É fundamental que o STF, de uma vez por todas, declare a constitucionalidade dos artigos contestados e garanta o respeito ao cumprimento dessa lei, no que os produtores rurais, em sua maioria, têm sido exemplares. Ajustes numa legislação são sempre possíveis e uma revisão do Código Florestal está prevista para daqui a quatro anos.

Anulado o CAR, anulam-se o Programa de Regularização Ambiental e os ganhos ambientais dele decorrentes, já em curso na maioria dos Estados. Haverá o retorno do caos jurídico existente antes do Código Florestal, quando quase toda a atividade agrícola do País estava na ilegalidade. Como afirmou em editorial o jornal O Estado de S. Paulo(24/4/2017, A3): “O Código Florestal é uma cabal demonstração de que a democracia funciona e produz avanços. Basta ter o cuidado de respeitar aquilo que é o seu principal instrumento – a lei, votada e aprovada pelo Congresso”.

*Doutor em ecologia, pesquisador da Embrapa

Estadão

Ecossistema da Amazônia tem mais valor que hidrelétricas e mineração


Águas do Rio Xingu liberadas da comporta da casa de força auxiliar no Sítio Pimental da usina hidrelétrica de Belo Monte. (DANIEL TEIXEIRA / ESTADÃO CONTEÚDO)

Patrícia Azevedo

Neste mês, a usina hidrelétrica de Belo Monte alcançou um total de 10.621,97 megawatts (MW) de potência instalada com o início da operação comercial de uma nova unidade geradora (UG). Quando totalmente concluída, contará com 24 UGs e capacidade instalada de 11.233,1 (MW). Será a maior hidrelétrica 100% brasileira e a terceira maior do mundo, perdendo apenas para a chinesa Três Gargantas e para a brasileiro-paraguaia Itaipu. O empreendimento de R$ 42 bilhões, no entanto, descumpre uma de suas principais promessas – o desenvolvimento sustentável da Amazônia. Entre as queixas da população local estão o aumento do custo de vida e da energia elétrica, piora dos sistemas de habitação, água e saneamento, e a diminuição da produção de alimentos e da pesca.

“A reflexão que se deve fazer é por que necessitamos de usinas hidrelétricas na região? Considerando as fontes alternativas, os grandes potenciais do país estão praticamente todos na Amazônia. No entanto, apenas a eólica aparece na nossa matriz energética com alguma contribuição, mesmo assim com limitações de ser considerada como fonte complementar”, aponta o professor José Cláudio Junqueira, da Dom Helder Escola de Direito. Nesta terça-feira (29), ele coordenará a apresentação de trabalhos científicos relacionados ao tema Biotecnologia, populações tradicionais, mineração, hidrelétricas e terras indígenas na 4ª Semana de Estudos Amazônicos (Semea).

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Engenheiro civil por formação, José Cláudio possui especialização e mestrado em engenharia sanitária, e doutorado em saneamento, meio ambiente e recursos hídricos. Foi pesquisador pleno e presidente da Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais (Feam-MG) por três mandatos. Tem ampla experiência em sistemas de gestão ambiental, avaliação de impacto, licenciamento e normalização. “O projeto de Belo Monte era um projeto antigo, que foi modificado ao longo do tempo para não inundar a volta do Xingu – curva de 180º do rio Xingu – área muito importante para as comunidades indígenas da região. Apesar desse ganho, o licenciamento ambiental da usina foi bastante tumultuado, tendo a implantação sido interrompida várias vezes pelo judiciário, que só postergou a obra”, afirma.

De acordo com o professor, a visão antagônica das partes interessadas, sem maior participação mediada, as lacunas nos estudos ambientais e a pressão política para agilização do processo de licenciamento só geraram o acirramento dos ânimos, inclusive com conflitos entre operários e comunidades indígenas. “É claro que a implantação de uma hidrelétrica impacta o bioma da região, seja ele floresta amazônica, cerrado ou qualquer outro. Inicialmente porque, para a formação do reservatório, há que se desmatar a área. No caso de Belo Monte, esse impacto foi minimizado porque a técnica utilizada foi a de usina a fio d’água, que exige menores áreas de inundação”, explica.

Professor José Cláudio Junqueira, da Dom Helder

Professor José Cláudio Junqueira, da Dom HelderDessa forma, na construção da usina, optou-se por dois reservatórios interligados por um canal de derivação, com 20 km de extensão. O reservatório principal, formado no rio Xingu, conta com 359 km². Já o reservatório intermediário, com 119 km², foi estruturado por 28 diques e canais de transposição. “Todavia, a casa de força foi localizada bem distante, mais de 10 km, o que gerou outro impacto: a vazão reduzida na volta do Xingu, restringindo atividades como pesca e navegação nesse trecho”, informa José Cláudio. Em entrevista ao DomTotal, o professor prossegue o debate e aborda os outros temas que estarão em pauta na tarde desta terça-feira (29), como biotecnologia e mineração.

O senhor comentou acima que o licenciamento ambiental da usina foi bastante tumultuado. No fim das contas, ele ficou de acordo com a legislação?

Se a usina de Belo Monte está de acordo com a legislação? Depende de como a legislação está sendo interpretada. Formalmente sim, porque as liminares foram cassadas, a obra se implantou e a Licença de Operação (LO) está válida. A reflexão que se deve fazer é por que necessitamos de usinas hidrelétricas na região? Enquanto isso, a demanda de consumo só aumenta. Nosso estilo de vida é “eletro intensivo”, a começar pelas nossas edificações “modernas” que só funcionam com luzes acesas e ar condicionado, sem contar a variedade de equipamentos eletroeletrônicos do nosso cotidiano. Será que alguém já fez a conta do gasto energético para carregar diuturnamente os mais de 200 milhões de celulares no país?

Além das hidrelétricas, a mineração é outra ameaça ao ecossistema amazônico. Como minimizar os impactos ambientais e os prejuízos para a população local?

A implantação de obras para hidrelétricas e mineração possui impactos ambientais significativos, potencializados pela abrangência das áreas necessárias para a implantação e operação desses empreendimentos, que normalmente são extensas, denominadas áreas diretas de impacto e, ainda, pelas áreas impactadas indiretamente. Isso se traduz em elevados impactos nas populações existentes nessas áreas. No caso de povos indígenas e tradicionais, a complexidade aumenta, pois, são comunidades com cultura e estilo de vida diferenciados.

Para tanto, a Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) deveria se aprofundar no conhecimento das relações existentes e prognosticar como se dariam as novas relações, a partir da implantação e operação do empreendimento. Para os impactos nessas relações, propor as medidas mitigadoras capazes de minimizar os efeitos negativos e as medidas compensatórias nos casos em que haveria incompatibilidade de mantê-las. O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) deveria aprofundar essa questão e ser capaz de apontá-la com clareza e objetividade para subsidiar a tomada de decisão.

Seria muito importante a participação das comunidades atingidas para a tomada de decisão, o que ainda não ocorre no Brasil. As audiências públicas no país são realizadas quando a decisão já está tomada. Esses foros têm sido importantes apenas para acomodação de insatisfações pontuais. Nesse sentido, as relações têm sido conflituosas com alto grau de judicialização.

Como está atualmente a exploração do subsolo na região?

O grande projeto de mineração na Amazônia é Carajás, da Vale, que já está consolidado, com tecnologia de beneficiamento a seco, que dispensa a construção de barragens de rejeitos, com grande área de preservação, protegida das invasões. A grande questão é o potencial mineral existente na Amazônia que desperta grande cobiça, inclusive internacionalmente.

Constitucionalmente, o subsolo é da União, sendo os proprietários da terra denominados superficiários. Se isso vale para todos brasileiros, há que valer para todas comunidades em solo pátrio. Todavia, a exploração dessas riquezas do subsolo deveria ser confrontada com os valores dos serviços ecossistêmicos prestados pela floresta. Se esses serviços beneficiam brasileiros e estrangeiros, todos deveriam pagar pelos mesmos.

De toda forma, se a decisão for explorar essas riquezas minerais, que seja pelo menos subsidiada por uma Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) com participação da população na tomada de decisão. E não apenas das populações tradicionais, mas de todo brasileiro. O subsolo da Amazônia não pertence apenas à população da região.

Por fim, a biotecnologia. Quais os benefícios ela pode trazer?

A biotecnologia, como os novos materiais, são a chave do futuro. A Idade da Pedra não acabou porque as pedras se esgotaram. Muitos minerais de grande utilização na atualidade não o serão no futuro. A transformação de materiais pela biotecnologia, inclusive a digestão de resíduos por bactérias gerando novas substâncias, é uma grande expectativa. Na minha opinião, a floresta amazônica encerra muito mais riqueza em si do que as jazidas sob suas raízes. Demonstrar isso em números é o nosso grande desafio.

Dom Total

As pistas deixadas sobre como era viver na Amazônia


Foto: Jason Auch

arqueologia tem revelado que a Amazônia era uma região com milhões de habitantes antes da chegada dos europeus, que tinham um modo de vida bastante diferente daquele que hoje se tenta implantar na região. Era uma população numerosa e diversa, que domesticou e cultivou plantas importantes até hoje, como a mandioca, pupunha e castanha, mas que desapareceu pouco depois da chegada de portugueses e espanhóis.

A entrevista é de Vandré Fonseca, publicada por ((O)) Eco, 05-09-2018.

O arqueólogo Eduardo Neves, do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (USP), faz escavações e estuda vestígios deixados por estes povos desde a década de 1990. Nesta entrevista, ((O)) Eco conversa com ele para tentar entender melhor como viviam essas populações na Amazônia e o que elas podem nos ensinar.

Nessa conversa por telefone, ele fala da diversidade de culturas que já havia nesta vasta região, provavelmente, há 9 mil anos, e das marcas deixadas. No lugar de pirâmides, imagem que logo vem a cabeça quando se fala em civilizações antigas, na Amazônia os arqueólogos tentam compreender grandes estruturas de barro, que durante anos estiveram escondidas na floresta, e analisam vestígios tão pequenos que precisam ser analisados em microscópios. Para Eduardo Neves, se existe uma palavra que pode representar a Amazônia é ‘diversidade’.

Eis a entrevista.

Em quase 30 anos de estudo, o que a arqueologia mudou sobre a imagem que se tinha da Amazônia antes da chegada dos europeus?

Eu acho que cada vez mais, hoje em dia, as pessoas aceitam a ideia de que tinha muito mais gente vivendo na Amazônia do que se pensava anteriormente. A gente ainda não sabe exatamente quantas pessoas viviam na região, ainda não consegue responder a essa pergunta, só temos estimativas. A estimativa que costumo seguir é que existiam 8 milhões de pessoas em toda Bacia Amazônica. É a imagem de uma Amazônia muito mais densamente ocupada do que a gente imaginava 30 anos atrás.

E aí nós temos que pensar numa questão sobre a Amazônia, que vira política pública não só no Brasil, mas também nos países amazônicos em geral. A visão que a gente tem é de um território nacional, que tem que colonizar. Claramente, aqui no Brasil, em uma série de movimentos desde a época da colônia, e mais fortemente nos últimos tempos, no governo militar, querem ocupar, fazer estradas, projetos de desenvolvimento que partem da premissa que a Amazônia nunca teve histórica, que nunca teve ninguém, sempre foi vazia. E a arqueologia diz que não, que a Amazônia tem uma história de ocupação muito profunda. Nós temos que incorporar essa perspectiva de alguma maneira nas políticas públicas.

O que aconteceu com essas oito milhões de pessoas?

Uma coisa que aconteceu em todo continente americano, não só na Amazônia e no Brasil, foi que, quando os europeus chegam aqui, eles trazem um monte de doenças, contra as quais as populações indígenas não tinham imunidade, vários tipos de gripe, sarampo, varíola. Havia doenças aqui, como tuberculose e sífilis, que são doenças americanas, mas muitas doenças, com catapora, não existiam aqui. Muitas dessas doenças são zoonoses, como gripe aviária, gripe suína. Aqui na América não tínhamos animais domesticados, ao contrário dos europeus que já tinham uma história de convivência com essas doenças. Quando eles vêm pra cá e trazem essas doenças, as populações que não tinham imunidade contra elas desaparecem rapidamente. A gente sabe que existiam redes de trocas conectando populações dispersas pela Amazônia. Quando os europeus entram, eles de alguma forma participam dessas redes de troca, e a partir daí vai ter o contágio antes mesmo do contato direto com os europeus. As doenças chegavam muito antes. Tiveram um impacto que está melhor documentado nas populações andinas, porque havia mais cronistas nos Andes do que na Amazônia, mas teve um impacto terrível nas populações indígenas.

A outra coisa é a própria questão da guerra e da escravidão. Os portugueses e os espanhóis chegam aqui com a mentalidade da Guerra da Reconquista da Península Ibérica do final da Idade Média. Muitos grupos desaparecem, exterminados pela guerra.

E a terceira coisa foi a escravidão. A atividade econômica mais importante na colônia era a escravidão indígena. Então o impacto dessas três coisas, da guerra, das doenças e da escravidão foi muito grande.

Quando os primeiros viajantes cientistas começam a andar pela Amazônia, no final do século XVIII, no século XIX, eles vão ver uma região que está esvaziada porque a população havia diminuído drasticamente nos séculos precedentes. Essa região que antes era ocupada, está recoberta por floresta. Isso deu origem a essa imagem de um trópico que sempre foi desabitado, inóspito e com pouca gente. Só que esse quadro é muito mais histórico, reflexo dos primeiros anos da colonização, do que o resultado de um modo de vida característico das regiões tropicais.

Como a arqueologia está contribuindo para confirmar essas hipóteses.

Darcy Ribeiro já dizia isso nos anos 1950. Essas coisas não são novidades. A questão é que pela primeira vez, nos últimos anos, a gente está tendo… Qual a vantagem da arqueologia? A arqueologia está escrevendo a história dos povos indígenas antes da chegada dos europeus, e essa história se só tem como saber pela tradição oral, não tem escritos deixados. A vantagem da arqueologia é que ela dá uma perspectiva histórica profunda de milhares de anos. A arqueologia é história, a diferença é que em arqueologia a gente trabalha com intervalos de tempo muito longos, milhares de anos. A gente perde a resolução, nem sempre a qualidade dos dados é refinada, porque não é como um arquivo escrito com informações detalhadas. Mas ao mesmo tempo, a gente ganha em profundidade cronológica. Então a gente consegue entender o que aconteceu, quero dizer, a gente está começando a entender. A gente consegue delinear, digamos assim, a história de ocupação da Amazônia, nos últimos dois mil anos antes da conquista europeia.

Qual impacto que essa população para a floresta? Elas tinham atividades sustentáveis ou causavam impactos grandes na floresta. Existe a hipótese de que, com o desaparecimento dessas populações, a floresta pode se recuperar, provocando uma grande absorção de carbono e interferido no clima global.

Escavação em Monte Castelo. Foto: USP

É uma hipótese bem interessante. Tem gente que correlaciona a Pequena Idade do Gelo, que aconteceu mais ou menos nessa época, no final da Idade Média, início da Idade Moderna, século XVI, à redução da emissão de gases de efeito estufa, porque teríamos menos fogo. Essa pessoas desaparecem, então param de fazer roça, param de queimar a floresta. Quando desaparecem essas populações indígenas, a floresta começa a crescer absorvendo esse gás carbônico que está na atmosfera, garantindo até um impacto no resfriamento da temperatura do planeta. É uma hipótese interessante.

O que temos de trabalho sobre fogo vem da periferia da Amazônia. Tem um trabalho que saiu de uma região de campos, no litoral da Guiana Francesa, não é da floresta, que mostra porém que o fogo aumenta depois que os europeus chegam. Antes havia técnicas de manejo, baseadas no manejo do fogo, que não deixavam vestígios de muito carvão encontrados nos depósitos. Quando os europeus chegam, aumenta muito mais a deposição de carvão. O que a gente está percebendo agora… estou abrindo um artigo que saiu com dados de Santarém. A gente tem registros de 4.500 anos nesse lago. Parece que nesse contexto, o uso do fogo é um uso mais controlado.

É meio óbvio, mas naquela época não tinha machado de metal. Era tudo com machado de pedra, não tinha motosserra. O fogo era um instrumento importante de manejo, mas que não tinha a escala que se tem hoje em dia. Era uma escala muito menor e mais localizada. O que está acontecendo agora é que a gente está retroalimentando. Se você ver o que que tem lá no Xingu. Os índios sempre usaram fogo para manejar a floresta. Só que agora todo o entorno do Xingu está desmatado, por causa das fazendas de soja, de gado e de milho. Na Terra Indígena, onde a floresta está em pé, você não tem aquela mata de entorno que proteja, então qualquer queimada de roça hoje em dia vira um incêndio de proporções catastróficas.

Então, as evidências arqueológicas não contribuem para a hipótese de que o esvaziamento da Amazônia tenha contribuído para a Pequena Idade do Gelo?

Acho que não. Eu penso que não. Tinha muita gente, tinha um efeito interessante de modificação da floresta, mas acho que o modelo que esses autores têm para fogo estão muito mais baseados nos padrões de uso de fogo atuais do que nos padrões antigos. Apesar de achar essa hipótese interessante, ela é contrária ao que defendo. Se a gente coloca a Amazônia numa escala global, não sei se temos evidências para apoiá-la.

Qual é a sua hipótese?

Se a gente pudesse fazer uma viagem e voltar para a Amazônia, mais ou menos, ao ano de 1.500, a gente veria uma espécie de arquipélago, com algumas áreas mais manejadas, com áreas de capoeira mais antigas, em diferentes estágios de sucessão, permeadas por áreas de floresta. As evidências de modos tradicionais de vida, que estão desaparecendo rapidamente no interior da Amazônia, mostram a questão da roça de coivara, em que eles vão mudando de lugar a cada 5 anos, por exemplo. Isso era muito forte até os anos 1950 e 1960, na verdade. Eles faziam uma roça noiva, depois mudavam de lugar, naquela itinerância, em que vão se deslocando através da paisagem. Mas os dados arqueológicos mostram para nós que esses povos antigos eram muito mais sedentários, ficavam muito mais tempo no mesmo lugar. Isto quer dizer que, no entorno desses assentamentos, o impacto de desmatamento ou de sucessão talvez sido muito mais marcado e mais forte. Por outro lado, o fato de não terem machados de metal, e sim machados de pedra, sugere que não existia esse modelo de roça quadradinha, de um hectare, no meio da floresta, que é resultado da motosserra e do machado de metal. Imagino que essas roças antigas eram meio amorfas, não tinham uma forma bem definida. Eles aproveitavam as derrubadas naturais das florestas, plantavam ao longo dos caminhos e das trilhas. Imagino que o gradiente entre o mundo da floresta e o mundo da aldeia era muito mais sutil também.

Outra coisa importante, que pouca gente fala, é a arboricultura, o cultivo de árvores. Talvez os melhores exemplos que a gente tenha agora sejam do açaí e da castanha, que são árvores superimportantes e muito produtivas. Uma castanheira, depois que começa a produzir, pode continuar por centenas de anos. É muito comum ter castanhal em terra preta. A castanheira para crescer precisa de acesso ao sol. Uma muda de castanha para poder crescer, tem que estar em lugar aberto. Se estiver em local fechado, na floresta, ela não consegue crescer. É de se imaginar que havia sistema de manejo incentivando o crescimento dessa planta. Então essa ideia de cultivo de árvores, arboricultura, bacaba, açaí, castanha, pequi, um monte de árvores importantes na Amazônia, podem ter tido papel importante na construção dessas paisagens.

E a caça? Existem hipóteses de que populações antigas tenham provocado extinção da megafauna na América e em outros lugares.

Tem uma revisão que saiu três ou quatro anos atrás, que é a última coisa que eu li, que acompanhei. Parece que no norte de continente, a megafauna se extinguiu antes da chegada dos humanos. Se bem que os dados da chegada dos humanos estão ficando cada vez mais antigos. A questão é que acho que não há uma correlação da extinção da megafauna e da chegada dos humanos. Enquanto que no Sul do continente, no Argentina, na Patagônia, tem uma relação entre a presença humana e a megafauna, inclusive com presença de megafauna nos sítios arqueológicos. Eles estavam caçando essa megafauna.

Acho que existe uma combinação de processos naturais, que tem a ver com uma mudança climática bem marcada, na transição do Pleistoceno para o Holoceno, com a megafauna. As populações humanas tiveram seu papel, mas colocar só o fator humano não explica.

Por outro lado, parece cada vez mais que alguns tipos de frutas encontradas atualmente têm um padrão de dispersão que não pode ser explicado a partir da fauna que existe hoje, na Mata Atlântica, no Cerrado ou na Amazônia. São frutas de megafauna. O abacate, que é da Mesoamérica (região que vai da Costa Rica ao Sul do México), é um exemplo ilustrativo. Ele tem uma semente muito grande para qualquer animal dispersar. É provável que a megafauna tenha selecionado esses fenótipos, o mesocarpo (polpa), o tamanho das sementes. E quando os humanos chegam, a megafauna está desaparecendo. Não está claro se o homem tem relação com esse desaparecimento, mas o ser humano assume o papel que a megafauna tinha na cadeia trófica, vai promover a dispersão dessas frutas. De alguma maneira, estou simplificando, a gente ocupa o papel que a megafauna ocupava anteriormente.

É possível falar em fases da ocupação humana na Amazônia?

Geoglifo. Foto: Jenny Watling

A gente sabe que existem humanos na Amazônia há pelo menos 11 mil anos, isto já está bem estabelecido, e provavelmente há 14 mil anos. A gente faz escavações, datas os sítios arqueológicos e coleta amostras de solo para análises químicas. E a gente tem dados que devemos publicar ainda esse ano ou no começo do ano que vem, de evidências de manejo, de mudanças na química do solo, que começam a acontecer há 9 mil anos.

A gente começa a ver a formação de áreas de terra preta na periferia da Amazônia, em Rondônia e na Guiana a partir de, mais ou menos, 6 mil anos atrás. E a partir de 2.500 anos atrás, a ocupação da Amazônia se adensa bastante, a gente tem evidência da presença humana em toda parte. Onde quer que a gente procure, vai encontrar evidência da presença humana. Muita terra preta começa a se formar, evidência de populações humanas sedentárias. Esse processo de adensamento, que começa 2.500 anos atrás, ele vai, com muitas variações locais, até a conquista, até o século XVI.

Algumas áreas da Amazônia tem sequências longas de ocupação, histórias longas de ocupação. Uma delas é a região do Alto Rio Madeira, em Rondônia, por isso trabalho lá hoje em dia. A gente tem ocupações longas, que começam há pelo menos 9 mil anos, ou talvez antes disso. Mas em alguns lugares da Amazônia, nós temos hiatos na história de ocupação, que não estão claros ainda. A gente pode falar de maneira geral que tem gente há pelo menos 11 mil anos na Amazônia, porque desde cedo a gente começa a ver sistema de manejo e caça de pequenos animais. No caso da Amazônia Central, perto de Manaus, temos um sítio que escavamos, que se chama Hata-hara, que fica em Iranduba, na beira do Rio Solimões. Nesse sítio a gente tem muita fauna preservada. A gente tem evidência de consumo de quelônios, muito mais peixes do que mamíferos, quase não tem macaco no registro, mas tem muito osso de réptil, jacaré, tracajá, pirarucu, tambaqui. Alguns peixes consumidos hoje, aparentemente não eram no passado, como é o caso do jaraqui. Não vê muito jaraqui. Muito bagre, pirarucu e peixes grandes, como tambaqui.

É uma população que vai se estabelecendo ou são ondas?

São várias populações diferentes. Uma coisa interessante, a gente fala muito em biodiversidade, que é fundamental, mas a gente tem que falar também da sociodiversidade ou sociobiodiversidade. Se você olhar do ponto de vista cultural, em termos de línguas indígenas, a Amazônia é a região de maior diversidade linguística do planeta. São centenas de línguas indígenas, são mais de 150 línguas diferentes, muitas são aparentadas, muitas isoladas, muitas famílias pequenas de línguas com duas ou três que são faladas só em algumas regiões da Amazônia. Então temos um quadro de diversidade cultural muito grande. Se você olhar para a arqueologia, você vai ver que tem uma diversidade muito grande. Se você voltar ao ano de 1.500, você vai ver que tem um padrão na região de Manaus, uma coisa totalmente diferente em Santarém, outra coisa diferente na Ilha de Marajó, no Amapá seriam outras padrões de ocupação, no Acre, outra história, em Rondônia também.

As áreas que a gente conhece hoje em dia tem uma diversidade muito grande de formas de ocupação. Não é uma única população.

A maioria são populações locais. Quero dizer, teve um começo. A gente pode dizer com certa segurança que, há 30 mil anos, não tinha ninguém na Amazônia. Há 20 mil, eu não sei, podemos encontrar coisas com essa idade. Há 14 mil, tem um sítio datado em 14 mil, lá no Alto Guaporé. As evidências vão ficando menos ambíguas. Há menos de 11 mil, com certeza tinha gente. E há 9 mil, tem gente na Serra dos Carajás, tem gente no Rio Caquetá, na Colômbia, tem gente na Amazônia Central, tem gente no Baixo Amazonas, gente no Alto Madeira. Há 9 mil, não é ainda um quadro de adensamento demográfico, mas a gente vê que diferentes biomas dentro da Amazônia já estavam sendo ocupados. Desde áreas da Serra dos Carajás, nos campos rupestres, até áreas ribeirinhas no Rio Negro e do Rio Solimões.

A gente olha para o tipo artefatos encontrados nos sítios arqueológicos e tenta inferir se tem um padrão de homogeneidade ou não. Se a gente tem a cerâmica muito parecida ou objetos de pedra lascada muito parecidos, em áreas extensas, a gente pode falar que existe uma certa homogeneidade cultural. O caso interessante de Amazônia é que, desde o começo, desde 9 mil anos atrás, não existe uma única categoria de artefato ou um único tipo de artefato que caracteriza a ocupação da região. Se a gente olhar para os objetos de pedra lascada produzidos há 9 mil anos, eles já são muito diferentes entre si. Então a gente tem pontas de projétil bifaciais perto de Manaus, perto de Santarém; tem lascas de quartzo, lá em Carajás; tem lascas de outro tipo de material lá no rio Caquetá, que é o Japurá. Esse quadro de grande diversidade cultural que a gente vê hoje em dia, que está ameaçado de uma maneira inédita, a gente vê ele se estabelecer desde o começo, 9 mil anos atrás.

Acho que a mensagem que eu quero passar para você aqui é que, se existe uma palavra chave para a Amazônia, é diversidade. Ela vale para o Meio Ambiente, mas vale também para a questão cultural.

E as relações dessa população da Amazônia com as paisagem que existem ao redor, como a transição para a caatinga, cerrado e Andes. Existe relações dessas populações do entorno com a Amazônia ou era um universo isolado.

Com a Caatinga, a gente não sabe direito ainda. Mas com os Andes, principalmente Amazônia Ocidental, no PeruColômbiaEquador, as relações os Andes são muitos claras. O cacau é uma planta amazônica, mas é superimportante na Mesoamérica, para os Maias, os Astecas. A mandioca é uma planta amazônica que também era muito consumida na América Central e no Peru. O milho é mesoamericano, vem lá do México, mas entra muito cedo na Amazônia. A pupunha, que uma planta que até hoje é superimportante na América Central, e é uma planta amazônica. A gente vê desde cedo relações pelas plantas, entre plantas amazônicas que são cultivadas há 4 mil anos, ou até antes, fora da Amazônia, como a mandioca, e plantas que entram na Amazônia. O milho não é da Amazônia, mas entra na Amazônia há pelo menos 6 mil anos.

Foto: Edison Caetano

No Peru, existe um sítio arqueológico muito famoso, chamado Chavin de Huantar, na Cordilheira, no alto da serra, coberto de neve. Durante muito tempo, foi considerado o sítio cerimonial mais antigo dos Andes. Tem mais ou menos 3 mil anos. Se você olhar a iconografia, tem muitos objetos de pedra, estátuas de pedra, ela quase que totalmente faz referências a temas amazônicos, o amendoim, que é uma planta amazônica, o jacaré-açu, tem a sucuri, a mandioca. Um monte de planta e bicho representado nessa iconografia, o que levou alguns autores a proporem há muitos anos que esses povos teriam tido uma origem ou uma influência amazônica na configuração desses templos.

Porque não tem pirâmides na Amazônia?

Estou escrevendo um livro que tem esse título. Essa é uma pergunta que todo mundo faz e é superimportante. De fato, não tem. Acho que não tem por causa da abundância. Existia muito recurso, e esse tipo de estrutura aparece em contextos de algum tipo de escassez. Se você olhar na América do Sul, elas aparecem no litoral do Peru, que é uma região muito produtiva, litoral muito piscoso, mas que é deserto. Então você tem recursos muito produtivos e concentrados e circunscritos em áreas específicas. Na Amazônia, não. É difícil de controlar os recursos. Não tem pirâmide porque o sujeito diz ‘ não vou continuar a trabalhar para esse pentelho, eu vou embora, vou cuidar da minha vida’. Aquela coisa do caboclo leso, da “leseira baré”, tem uma cara política também. É muito comum os viajantes contarem que contrataram gente para remar e acordou no dia seguinte e todo mundo sumiu.

Se não tem grandes construções, o que o arqueólogo busca na Amazônia para contar a história da região.

A gente não tem pirâmide de pedra, mas têm estruturas de terra que são monumentais. No Acre, por exemplo, temos sítios com aterro, que são grandes, são geométricos, quadrados, estradas. A gente está descobrindo uma rede de estradas lineares antigas. A gente tem muita coisa que não é de pedra, mas que é de terra. Que se fosse de pedra, talvez fosse chamado de pirâmide ou um sítio monumental. Durante muito tempo nem se consideravam (essas estruturas), não se reconhecia como arqueológico, porque era de barro, debaixo do mato, parecia que era natural. Então tem muita coisa para se estudar, muito aterro, muita vala, muita estrada. Tem a terra preta, tem uma cerâmica maravilhosa, algumas delas que infelizmente queimaram lá no Museu Nacional no Rio de Janeiro, uma coleção marajoara maravilhosa que o Museu Nacional tinha. Uma tragédia, isso.

Tem muita coisa para ser estuda, mas é uma coisa diferente. A arqueologia está dando essa virada porque coisas que a gente considerava naturais na verdade não são, foram transformadas pelos índios. Talvez a terra preta seja o melhor exemplo disso. Mas tem outras coisa também. Essa região do Acre, até os anos 1970 era coberta de floresta. NoOeste do Acre, o pessoal começa a desmatar e aparecem as estruturas. São mais de 500 estruturas de terra. O que é interessante no caso do Acre, a gente tem evidências paleobotânicas….

Isso eu gostaria de saber mais. É também uma arqueologia de coisas minúsculas.

É, de micro vestígios. É a coisa mais legal que está acontecendo. O trabalho da Jenny(Jennifer Watling) mostra que eles convertiam um tipo de floresta, aquela floresta de bambu típica do Acre, em outro tipo de floresta, que é uma floresta de palmeiras. Quando a gente pensa em ocupação de áreas de floresta, nosso modelo é derrubar a floresta, plantar roça, botar pasto… A Jenny mostra que, no Acre, eles manejavam a floresta convertendo um tipo em outro tipo de floresta. Isso é uma coisa meio revolucionária. É um modelo que a gente não tem na nossa cabeça, transformar a floresta em outro tipo de floresta. Os dados da Jenny vem de micro vestígios, são coisas microscópicas. Dados da fauna, de pesca, são ossinhos de peixes conservados. São novos tipos de evidências, muito mais interdisciplinares, que trazem resultados muito interessantes.

Hoje já não se discute se a terra preta em origem natural ou foi produzida por humanos.

Pode ser que tenha uma ou outra pessoa que discorde, mas está estabelecido. E hoje em dia existem centenas de trabalho que assumem que a terra preta tem autoria antrópica. São solos claramente formados pela atividade humana no passado.

O que forma a terra preta?

Em português claro, é composteira. Composto orgânico, carvão queimado a baixa temperatura, não o carvão de queimada, mas aquele carvão de fogueira de casa no interior, que queimou o dia inteiro, na hora de esquentar abana e vira um fogo, depois vira aquela brasa de novo. E muito resto de peixes, osso de peixe, que tem muito fosfato, resto de sementes. É composto, lixo orgânico. As pessoas cavavam buracos, jogavam lixo, e isso vai se formando ao redor das casas e vão ser formando os solos antrópicos.

Mas propositalmente ou de maneira acidental?

Aconteceu. As pessoas estavam paradas e vinham jogando lixo orgânico. Depois, é claro, perceberam que esses solos tinham uma produtividade que era notável. Mas na minha opinião, claramente foi uma coisa não planejada. Até porque a gente tem terra preta em área de várzea. E solos de várzea são solos muito ricos, então não precisaria criar terra preta em solos já produtivos.

Qual a lição esses povos nos deixaram?

Eu acho que a lição que deixam é que na Amazônia dá para viver e é bom para se viver. E a gente tem evidência de ocupações milenares e estáveis. E segundo, que não deve existir uma contradição entre ocupação humana e preservação da floresta. Pelo contrário, a ocupação humana pode até levar a uma geração de mais biodiversidade. Mas obviamente tem que ser uma ocupação diferente daquela que a gente está fazendo hoje em dia. Eu adoro Manaus, mas uma cidade com 2 milhões de habitantes tem um impacto muito grande. E a tragédia contemporânea é que, quando a floresta é destruída, além do impacto sobre as populações que é horroroso e a gente estar perdendo uma biodiversidade imensa, tem também uma história de ocupação que está nessas florestas. Dá para viver bem, dá para viver durante muito tempo, mas não do jeito que está.

IHU

MPF sustenta que governo não acionou plano contra vazamento de óleo no NE


Manchas de óleo atingem praias do litoral do Nordeste (Divulgação/Agência Petrobras)

O Ministério Público Federal entrou nesta segunda-feira (28) com um recurso perante o Tribunal Federal da 5ª Região (TRF5) para que o governo federal cumpra integralmente o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo (PNC) no combate ao desastre ambiental em praias do Nordeste brasileiro atingidas por óleo cru.

Os procuradores alegam que o chamado PNC não foi acionado nos termos da legislação e de acordo com a base técnica e científica que o fundamenta, ao contrário do que havia afirmado União e concordado a Justiça Federal em primeira instância.

O governo tem sido alvo de críticas porque teria demorado a deflagrar uma operação para minimizar os efeitos do óleo vazado nas praias do Nordeste, cujos primeiros indícios foram detectados no início de setembro, segundo autoridades. A última atualização do Ibama dá conta de que 254 localidades nos nove estados foram afetadas.

O recurso do MPF de Sergipe – que abrange toda a costa nordestina, da Bahia ao Maranhão – ao TRF-5 lista 10 pontos que provam que o PNC não foi acionado, conforme os procuradores. Eles dizem, por exemplo, que não foi reconhecida formalmente a “significância nacional do desastre ambiental”, exigência para o acionamento do plano.

Segundo os representantes do MP, o comitê de suporte ao PNC, do qual fazem parte 17 órgãos de governo, jamais se reuniu. Tampouco representantes dos nove estados do Nordeste de órgãos ambientais foram convidados a participar do colegiado.

O recurso ao TRF-5, com sede em Recife, reforça os pedidos para que, em caráter de urgência, a União seja obrigada a acionar em 24 horas o PNC sob pena de multa diária de R$ 1 milhão, em caso de descumprimento.

Os últimos dados do Ibama, divulgados nesta segunda-feira, indicam que o óleo afetou 92 municípios e 254 localidades nos estados nordestinos. Nessas áreas, em 142 delas constatou-se vestígios esparsos de óleo, em 99 o óleo não foi observado na última revisita e em 13 apareceram manchas.

Na semana passada, a Petrobras informou que essas manchas de óleo são uma mistura de material proveniente de três campos de petróleo da Venezuela. Segundo o diretor o diretor de Assuntos Corporativos da estatal, Eberaldo Neto, ainda não foi possível identificar como o petróleo foi liberado na costa do Brasil. Ele afirmou que “provavelmente” o vazamento teve início em um navio de passagem pelo litoral.

Reuters/Ricardo Brito

Califórnia se compromete a produzir 100% de energia limpa até 2045


(Arquivo) O governador da Califórnia, Jerry Brown (GETTY IMAGES/AFP/Arquivos)

A Califórnia, considerada a quinta maior economia do mundo, produzirá 100% de energia limpa até 2045, sem emissões de gases do efeito estufa, anunciou nesta segunda-feira seu governador, Jerry Brown.

O governador assinou uma lei aprovada pelos legisladores estaduais neste sentido.

“Com esta lei, a Califórnia está a caminho de cumprir os objetivos do Acordo de Paris e até mesmo ir além”, afirmou, referindo-se ao compromisso de lutar contra o aquecimento global.

Clique aqui, confira a matéria completa.